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O instituto do consumo à luz do Direito Econômico
Larissa Fialho Maciel
advogada junto à
Stefani & Associados, pós-graduanda em Direito Tributário pela Universidade
de Passo Fundo/RS
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Resumo: dotado de embasamento
teórico, de forma sintética, o artigo procura explicar o instituto do consumo
em face do Direito Econômico. Para tanto, desenvolve reflexões acerca da
importância do consumidor na sociedade, das medidas político-econômicas
aplicadas e das inovações trazidas pelo Código de Defesa do Consumidor.
Unitermos: Código de Defesa do
Consumidor, instituto do consumo, medidas político-econômicas.
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Noções introdutórias
Considerando que a economia de mercado se implementou,
o consumidor passou a exercer papel importante junto à sociedade, aumentando
consideravelmente o campo de incidência dessa economia, o número de participantes
nessa esfera (fornecedores e consumidores) e a quantidade de bens e serviços
ofertados e procurados, e por conseqüência, o número de relações jurídicas
efetivadas. Assim, as relações de consumo que antes eram regidas apenas por
regras de direito privado, passaram a requerer outros dispositivos a seu
respeito, pela própria necessidade de bem regular as relações que passaram a se
estabelecer.
O reconhecimento do consumidor deu-se com o advento da
revolução tecnológica, a partir dos anos sessenta e setenta, após a Segunda
Grande Guerra, quando passou a assumir posição que muitos reconhecem como
hegemônica, calcada nos novos valores expressos em direito à manutenção de
melhor qualidade de vida, de garantia de emprego e ganho suficiente às suas
necessidades, de maior participação na distribuição da renda, de presença e
participação decisional em igualdade de condições com as demais categorias na
política de consumo traçadas pelos órgãos políticos e administrativos (SOUZA,
1994, p. 459-460).
A tendência protetora do consumidor contra a sua
inferioridade econômica é notada em vários países, diferenciando-se, apenas, no
grau de participação ou de proteção que lhe são fornecidos. E, em sendo a parte
econômica mais fraca na relação jurídica, tem seus interesses e direitos garantidos
em lei, com o amparo do poder público, o qual não se implementa apenas com o
direito privado.
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O consumo frente ao Direito
Econômico
De acordo com SOUZA (1994, p. 462), sob o prisma
jurídico, "a noção mais simples de CONSUMO, é a da ‘utilização’ do bem,
pelo fato da transferência do ‘fornecedor’ ao ‘consumidor", o que faz
nascer a relação jurídica de consumo, entre estas duas pessoas, aqui denominadas
de sujeitos. Em relação à utilização desse bem essa será "momentânea’ ou
‘continuada’, caracterizando o ‘bem de consumo durável" (SOUZA, 1994, p.
462).
Todavia, este conceito de consumo difere pelas suas
próprias características do seu conceito econômico. "A primeira delas
refere-se à condição do ‘bem’ satisfazer as necessidades do sujeito"
(SOUZA, 1994, p. 463), a qual, na legislação, em face do Código de Defesa do
Consumidor é a de consumidor final que por sua vez visa a satisfação da
"necessidade pessoal, familiar, ‘seletiva’ ou ‘de defesa" (SOUZA,
1994, p. 464). Se juridicamente essa relação formará ou não um contrato,
"em Direito Econômico ela é observada pelo comportamento da política
econômica a respeito do bem ou serviço de que se trate e das suas conotações
com os interesses e as possibilidades do consumidor" (SOUZA, 1994, p.
464). Acerca do assunto preleciona Camargo (2001, p. 460):
[...] O fato jurídico do consumo pode ou não decorrer
de contrato e, em Direito Econômico, a preocupação ultrapassa o campo da mera
interpretação de cláusulas negociais, porquanto se chega tanto aos instrumentos
de facilitação como aos de estímulo ao consumo, como se pode verificar na
propaganda. [...]
Assim, geralmente, o que interessa aos juristas é o ato
jurídico praticado para o efeito de consumir, ao contrário do Direito
Econômico, que tem o seu interesse voltado às medidas tomadas pelo Estado
(planejamentos e leis de proteção e defesa do consumidor) e pela postura
adotada pelo próprio consumidor, o qual poderá agir pessoal ou coletivamente,
através de ações que lhe são possibilitadas pelo Direito (SOUZA, 1994, p. 464).
Por esses motivos, o consumo em Direito Econômico deve ser entendido como um
verdadeiro instituto.
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Medidas político-econômicas de
consumo
Apesar das Constituições Brasileiras anteriores à de
1988 disporem sobre o salário e as demais fontes de ganho, como inerentes à
possibilidade de consumo, deixaram de abordar com maior profundidade o
instituto do consumo, o que a "realidade econômico-social já estava a
exigir" (SOUZA, 1994, p. 465).
Esse direcionamento que faltava ao instituto do consumo
surgiu com o advento da Constituição Federal de 1988, quando passou a ser
positivado em vários artigos. Dentre estes artigos, destaca-se: a defesa do
consumidor como princípio geral da atividade econômica (art. 170, inciso V); a
proteção do consumidor como direito e fundamental da pessoa humana (art. 5º,
inciso XXXII); a previsão para a elaboração de um Código de Defesa do
Consumidor (art. 48 das Disposições Transitórias); a possibilidade de
impetração de mandado de segurança coletivo para defesa e preservação dos
interesses e direitos dos consumidores (art. 5º, inciso LXX); a possibilidade
de impetração de ação civil pública pelo Ministério Público para a proteção dos
direitos dos consumidores (art. 129, inciso III); o âmbito em que pode haver
legislação concorrente entre a União, os Estados e o Distrito Federal, restando
incluída nessa esfera a normatização sobre produto e consumo bem como a
responsabilidade por danos ao consumidor (art. 24); a determinação de medidas
para que esclareçam os consumidores acerca dos impostos que incidem sobre
mercadorias e serviços (art. 150, parágrafo 5º); a menção a direito dos
usuários com relação a serviços públicos (art. 175, parágrafo único, inciso II);
e o respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família em relação à
programação de emissoras de rádio e televisão (art. 221, inciso IV).
Assim, pode-se afirmar que esses elementos que foram
reconhecidos pela nossa Carta Magna inspiram no Direito Econômico o que se
chama de medidas político-econômicas, as quais são caracterizadas pela proteção
do consumidor.
O consumidor ao organizar-se também elabora medidas
político-econômicas para a sua própria defesa, seja reunido em associações,
seja em ações individuais, através de "boicotes" a compra de
determinados produtos, por exemplo. No mesmo sentido, agem os órgãos criados
pelo Estado, por meio do Instituto de Defesa do Consumidor, dos Programas de
Proteção ao Consumidor (PROCONs) e de órgãos como o Conselho Nacional de
Metrologia, Normatização e Qualidade Industrial.
Souza (1994, p. 467) esclarece que a política econômica
do consumo pode ser considerada, pelos seguintes prismas
a)as medidas postas em prática pelo Estado, tais como a
que se traduz pela política tutelar ou pelas leis e os planos econômicos.
b)a política econômica da empresa, relacionada com a
oferta de produtos e que, em termos de Direito Econômico, tanto pode ser
tratada no sentido repressivo (exemplo: as leis referentes ao abuso de poder
econômico), como no sentido estimulativo (exemplo: as medidas de incentivo
fiscal, crédito e outras), destinadas a se refletirem na garantia de
abastecimento ou na redução do preço final dos produtos.
c)o indivíduo, na sua política de aquisição e de defesa
própria, utilizando-se dos expedientes de união com os demais, dando-lhe
caráter coletivo com as ações próprias a que nos referimos anteriormente ou com
atitudes pessoais de resistência à compra, e coletivas, de
"boicotes".
O mesmo autor também refere que na defesa direta ou
indireta do consumidor, se encontram a nível estadual os órgãos que se
encarregam do abastecimento (a exemplo da COBAL e dos CEASAs), e a nível
federal, os órgãos tabeladores de preços (SUNAB, Conselho Interministerial de
Preços, Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial)
(SOUZA, 1994, p. 468).
Inclui-se também nesse rol protetivo, o Conselho
Nacional de Defesa do Consumidor, o qual representa o consumidor junto ao
Ministério Público, a fim de que se promovam medidas legais protetivas,
incentivadoras, informadoras e fiscalizadoras dos meios capazes de
prejudicá-lo; o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), previsto no
CDC e integrado de órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal, municipais
e entidades privadas de defesa do consumidor e o Departamento Nacional de
Direito Econômico, junto ao Ministério da Justiça, responsável pelo Sistema
Nacional de Defesa do Consumidor.
Visando dimensionar a legislação protetiva dada ao
consumo, exemplifica-se com as que se referem ao abuso do poder econômico (leis
nºs 1.552, 4.137, 8.137, 8.158, 8.884, de 11.06.94); ao tabelamento de preços;
as de proteção à economia popular (lei nº 5.768, de 20.12.71); as referentes ao
consumo de bebidas (decreto nº 73.267, de 06.12.73). Contudo, a que coroou a
legislação supramencionada é a lei nº 8.078, de 11.09.90, que dispõe sobre o
Código de Defesa do Consumidor.
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O Código de Defesa do Consumidor
A partir de setembro de 1990, com a entrada em vigor do
Código de Defesa do Consumidor, operou-se em nosso ordenamento jurídico,
considerável mudança de rumo na ação protetora do Direito, em obediência e em
conformidade com a Constituição Federal que, a partir de 1988, passou a
prestigiar com status de princípio o direito fundamental da proteção do
consumidor (art. 5º, inciso XXXII).
Este código passou a definir componentes essenciais à
relação de consumo, quais sejam: a) o consumidor, tido como toda a pessoa
física ou jurídica ou a coletividade de pessoas a ela equiparada, a qual adquire
ou utiliza produto ou serviço como destinatário final (art. 2º); b) o
fornecedor, toda a pessoa física, ou jurídica, e também os entes
despersonalizados que desenvolve atividades de produção, montagem, criação,
constituição, transferência, importação, exportação e a distribuição ou
comercialização de produtos ou prestação de serviços (art. 3º); c) o produto,
qualquer bem móvel ou imóvel, material ou imaterial (parágrafo 1º, do art. 3º);
d) o serviço, a atividade fornecida no mercado de consumo, mediante
remuneração, salvo as decorrentes das relações trabalhistas (parágrafo 2º, do
art. 3º).
Convém salientar que o Código de Defesa do Consumidor,
por se tratar de norma de ordem pública, impôs novo regime geral, propugnando
pelo equilíbrio, a boa-fé e a equidade em todas as relações de consumo,
revogando eventuais disposições e cláusulas abusivas fixadas em contratos
antigos ou novos, em perfeita harmonia com a Constituição Federal de 1988.
Assim, pode-se dizer que "com a edição do Código de Defesa do Consumidor,
todas as questões que dizem respeito a relações de consumo receberam tratamento
inovador" (EFING, 2000, p. 24).
Acerca do assunto, Camargo (2001, p. 467) enfatiza
[...] cumpre ainda esclarecer, ainda, que a Lei 8078/90
repeliu a idéia de um maniqueísmo, puro e simples, em que o fornecedor seria um
vilão e o consumidor uma pobre vítima. É ele convocado, inclusive, a colaborar
na política de consumo, seja na celebração das convenções coletivas, seja pela
obtenção de incentivos na criação de meios eficientes de controle de qualidade
e segurança de produtos e serviços e de mecanismos alternativos de solução das
controvérsias instauradas com os consumidores. [...]
Para Efing (2000, p. 29) "o CDC, instrumento
normativo regente dos direitos do consumidor e como tal adotado de
particularidades inerentes à relação de consumo, encontra na sua base
princípios próprios que distinguem o direito do consumidor dos demais ramos do
direito". E dentre as várias inovações por eles trazidas, destaca-se: o
princípio da vulnerabilidade do consumidor diante do fornecedor (art. 4º); o
tratamento tutelar ao contrato, através do qual as cláusulas são interpretadas
favoravelmente ao consumidor (art. 23, art. 47 e art. 51, inciso XV); a
responsabilidade e a culpa pelo fato e pelo vício do produto e do serviço (art.
12, parágrafo 3º, inciso III e art. 22); a inversão do ônus da prova (art. 6º,
inciso VIII, art. 38 e art. 51, inciso VI); a desconsideração da personalidade
jurídica (art. 28); a consagração dos interesses difusos, coletivos e
homogêneos, como as de pessoas indeterminadas e de entes despersonalizados
(como sujeitos de direitos e obrigações); a preocupação com a facilitação do
acesso à justiça para concretização da proteção do consumidor; a possibilidade
do juiz tomar medidas adequadas, principalmente de caráter cautelar, que
permitam a obtenção de resultado prático visando a satisfação dos direitos do
consumidor; e a admissibilidade de todas as espécies de ações capazes de
propiciar a efetiva tutela dos direitos e interesses protegidos pelo referido
Código.
Não obstante todas
essas inovações, o direito do consumidor dota-se de princípios que o difere dos
demais sistemas jurídicos. Todavia, não "ocorre de todo o desligamento do
direito o consumidor com os demais ramos, pois em casos de lacunas na lei de
defesa do consumidor, outros diplomas legais concorrerão para suprimi-las, ao
mesmo tempo em que não deverão contrariar os princípios vigentes no CDC"
(EFING, 2000, p. 31).
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Considerações finais
O presente artigo, de cunho teórico, abordou sem o
compromisso de esgotar a matéria, alguns aspectos nos quais se desenvolve o
instituto de consumo à luz do Direito Econômico, a partir do reconhecimento do
papel exercido pelo consumidor no seio da sociedade ao longo dos tempos, bem
como as medidas político-econômicas criadas e as maiores inovações trazidas
pelo Código de Defesa do Consumidor.
Percebeu-se de modo claro que o instituto do consumo
perante o Direito Econômico se interessa pelas medidas político-econômicas que
devem ser criadas e aplicadas, através de planejamentos e legislações, visando
sempre a tutela do consumidor. Mais, medidas que deverão ser tomadas pelo
Estado, através de seus órgãos, e pelo próprio consumidor, através de ações
individuais e coletivas, para que assim, possa concretizar os seus direitos.
E, em relação ao Código de Defesa do Consumidor,
frise-se que esse surgiu para estabelecer nova forma de agir, de conduta da sociedade
de consumo brasileira, o qual consagrou as alterações que já vinham sendo
pretendidas pela doutrina e também pela jurisprudência, no que se refere às
relações de consumo.
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Referências bibliográficas
CAMARGO, Ricardo Antônio Lucas. Direito econômico:
aplicação e eficácia. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2001.
EFING, Antônio Carlos. Contratos e procedimentos
bancários à luz do código de defesa do consumidor. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2000.
SOUZA, Washington Peluso Albino de. Primeiras linhas de
direito econômico. 3. ed. rev. atual. São Paulo: LTr, 1994.
Retirado de: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5498. Acesso em : 28 out. 2004.