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Vícios no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor - Diferenças

Por Ricardo Canguçu Barroso De Queiroz, Acadêmico de Direito.

Em consequência da revolução tecnológica, a produção e a comercialização se dissociaram, resultando na evolução da produção em pequena escala para a produção em série. Assim, dada a grande diversidade de produtos no mercado, aumentaram os riscos ao público consumidor, provenientes de erros técnicos e falhas no processo produtivo.

O sistema do Código Civil, com berço no individualismo negocial, em que o mais importante era a preservação do contrato, passou, assim, a não mais corresponder às expectativas do mercado de consumo e do progresso tecnológico da produção em massa, sendo que tais problemas só foram suprimidos com o advento do Código de Defesa do Consumidor.

   Ante a necessidade de uma proteção mais ampla do consumidor na relação de consumo, a noção de vício no CDC é bem mais eficiente do que a estabelecida pelo direito tradicional, senão vejamos:

a)                 Para o CC as expressões "vício" e "defeito" são equivalentes, enquanto que no sistema do CDC "defeito" é vício mais dano à saúde ou segurança, estando associado, portanto aos fatos do produto ou serviço e "vício" está associado à deficiência de qualidade ou quantidade do produto ou serviço.

b) Enquanto no CC vigora a responsabilidade subjetiva pura, baseada na culpa do fornecedor, no CDC a responsabilidade pelos vícios é subjetivo com presunção de culpa do fornecedor, além da inversão do ônus da prova em favor do consumidor.

c) O CC não prevê a solidariedade entre os fornecedores componentes da cadeia de produção e comercialização, assim, o consumidor só pode acionar o fornecedor direito, com quem contratou diretamente. Já no CDC o consumidor poderá acionar quaisquer dos componentes da cadeia de produção e comercialização, seja o comerciante, o fabricante, o distribuidor, ou todos eles conjuntamente.

d) Pelo CC, a responsabilização pelos vícios da coisa, só é permitida se esta tiver sido recebido em virtude de relação contratual (contratos comutativos ou doação com encargo). No CDC, por sua vez, não há necessidade de haver relação contratual entre o consumidor e o sujeito passivo demandado pelo vício do produto ou serviço, afinal como já falamos, há solidariedade entre os componentes da cadeia de fornecedores.


b)                e) O CC não prevê responsabilização pelos vícios aparentes ou de fácil constatação, abrangendo, apenas, os ocultos. Além disso tais devem ser preexistentes ou contemporâneos à entrega da coisa. No CDC, como vigora a vulnerabilidade do consumidor, e com o objetivo de estabelecer-se o equilíbrio contratual, considera-se irrelevante que o consumidor tenha ou não conhecimento do vício e tenha ele surgido antes ou depois da tradição do produto, desde que dentro dos prazos decadenciais.

f) O CC não prevê proteção aos vícios ocorridos na prestação de serviços, mas tão somente do produto, enquanto que o CDC contempla ao consumidor as possibilidades de exigir a reexecução do serviço, a restituição da quantia paga ou o abatimento do serviço caso encontre-se responsabilidade do fornecedor de serviços pelos vício de adequação (quantidade e qualidade).

g) No CC caso comprovada a boa-fé (ignorância) do alienante será obrigado a restituir apenas a coisa viciada, ou seja, a culpa não enseja a responsabilização pelos danos materiais (lucro cessante + dano emergente) ou pessoais (morais), de maneira que somente quando comprovada a má-fé aquele será responsabilizados por perdas e danos. Já no CDC havendo relação de consumo, pouco importa o comprovação ou não de má-fé do fornecedor, para obter-se a reparação integral (danos materiais + danos pessoais).

h) O CC só prevê duas possibilidades de reparação: a ação redibitória (o contrato é levado a termo e o comprador é restituído integralmente pelo pagamento) ou a ação estimatória (o comprador obtém a redução do valor pago). No CDC as possibilidades estão ampliadas, estabelecendo dentre as hipóteses a substituição do produto, a restituição da quantia paga ou abatimento do preço, assim como, a possibilidade da troca do produto por outro de espécie, marca ou modelo diverso, mediante complementação ou restituição de eventual diferença de preço.

i) No CC os prazos de prescrição e decadência são contados à partir da entrega da coisa (a prescrição é de 15 dias para bem móvel e 6 meses para bem imóvel). Por sua vez, o CDC tais prazos se iniciam a partir do momento em que o consumidor toma conhecimento do vício ou do dano (a prescrição é de 5 anos).

A partir dos fatos expostos, podemos, agora, perceber a importância do Código de Defesa do Consumidor para a ampliação de nossos direitos nas relações contratuais de consumo, distribuindo, assim, de forma mais equilibrada, os riscos entre o consumidor e o fornecedor.



 

BIBLIOGRAFIA:

1 - CARNEIRO, Odete Novais - Da Responsabilidade por Vício do Produto e do Serviço - São Paulo: Editora RT, 1998

2 - JÚNIOR, Alberto do Amaral - A responsabilidade pelos vícios dos Produtos no Código de Defesa do Consumidor - Revista de Direito do Consumidor n. 03. Ed. RT: São Paulo, 1992.


3 - LISBOA, Roberto Senise - Vício do Produto e a exoneração da responsabilidade. Revista de Direito do Consumidor n. 05 - São Paulo: Ed. RT, 1993.

4 - DENARI, Zelmo - Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto - Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999.


Informações bibliográficas sobre este artigo (Norma 6023:2002 da ABNT)

QUEIROZ, Ricardo Canguçu Barroso De. Vícios no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor - Diferenças. DireitoNet, São Paulo, 15 out. 2000. Retirado de : http://www.direitonet.com.br/doutrina/artigos/x/19/00/190/>. Acesso em: 06 out. 2004.