Mas será mesmo que desde o mês de setembro de
1990, com vigência a partir de março de 1991, finalmente, o Estado tem cuidado
dos interesses do consumidor? É cediço o fato de que muito se tem feito em prol
da proteção do cidadão-consumidor. Houve, de maneira contundente, um incremento
significativo nesse sentido. Mas, igualmente, é notório de que muito ainda
falta para dar melhores condições àquele de exercer seus direitos!
Hoje o consumidor, além da lei específica e
demais normas afins, conta com Delegacias, Procons, Juizados Especiais,
Instituto (Idec), Revistas e, recentemente, a Agência Nacional de Defesa do Consumidor
e da Concorrência – ANC. Esta, segundo o Idec, após análise de anteprojetos de
lei submetidos à consulta pública, não cuidará tanto quanto se propõe dos
direitos do consumidor, eis que abordará, concomitantemente, dois tópicos
distintos como defesa do consumidor e concorrência. Inclusive, ainda segundo
aquele Instituto, no que diz respeito à própria estrutura, o consumidor terá
desvantagem, uma vez que ela contará com seis diretores: um geral, três para o
assunto concorrência e apenas dois para a defesa do consumidor.
Em
contrapartida, o consumidor, entre outros, tem a seu desfavor o
"monstro" criado pelas associações comerciais, câmaras de diretores
lojistas e ou entidades similares: o famigerado Serviço de Proteção ao Crédito
– SPC; serviço esse que nasceu em Porto Alegre, com ata de criação lavrada na
data de 22 de julho de 1955. Além do SPC, o consumidor ainda enfrenta o SERASA,
que, há muito, deixou de ser uma empresa voltada para os serviços do sistema
financeiro.
Os mencionados instrumentos de proteção à
classe empresarial e às instituições financeiras, com o passar do tempo,
sofreram um desvio em sua finalidade. Foram criados para proteger o crédito em
si mesmo, mas, com a deturpação em sua causa "finalis", têm se
prestado mais às necessidades do próprio patrocinador da informação negativa.
Os referidos serviços são comparados hoje em
dia aos "juízos" e "tribunais de exceção", inadmitidos e
expressamente vetados pelo Texto Constitucional", como cita Carlos Covizzi,
em sua obra "Práticas Abusivas da Serasa e do SPC" , Editora Edipro,
2ª Edição – 2000.
De fato, por ofenderem direitos e garantias
fundamentais, aquelas empresas atuam como verdadeiros "tribunais de
exceção" .
Passo, em seguida, a dar um exemplo de violação
ao consumidor, e que faz parte de nossa vida cotidianamente: a deslealdade e
abusividade da cláusula de pagamento mínimo em cartões de crédito e
assemelhados.
Alguns desses serviços prestados por empresas
acenam com a faculdade de o usuário satisfazer, apenas, parte de sua obrigação.
O consumidor, se assim desejar, poderá liquidar um percentual insignificante da
sua dívida junto às mesmas. Com essa "benesse", o consumidor é
iludido – e convencido – de que com aquele pagamento ínfimo estará adimplindo
com sua obrigação, ou seja, não se encontrará em mora para com aquela. De fato,
estará honrando sua obrigação, mas somente parte dela. Em mora não estará
mesmo, mas o restante da dívida será objeto de um financiamento junto àquela!
Fica claro o fato de que o consumidor terá sido
ludibriado, iludido, enganado, pois dificilmente conseguirá saldar, de uma vez
por todas, a sua obrigação, haja vista os juros praticados por aquelas empresas
prestadoras daquela natureza de serviço serem, ainda, muito altos! Com muito
esforço, sua renda fará jus, tão somente, ao pagamento daqueles juros.
Tenho convicção de que a cláusula que cuida do
pagamento mínimo fere direito básico do consumidor, previsto no artigo 6º, IV,
da Lei nº 8.078/90. Este, como nos falam os princípios básicos relativos a
contrato do CDC, pela sua hipossuficiência jurídica, econômica e técnica é,
facilmente, induzido a achar, ou melhor, ter certeza de que está fazendo um bom
negócio ao acatar tal permissibilidade.
As empresas, por outro lado, alegarão que os
juros são noticiados nos extratos e só paga o mínimo quem quiser. Concordo,
pois acho mesmo que o consumidor tem que ter disciplina em seus gastos. Porém,
tentar "ajuda-lo", oferecendo a possibilidade de pagar uma quantia
insignificante da dívida, para, depois, retirar do mesmo a paz, a tranqüilidade
econômico-financeira é até leviano. Induzir, ou por que não dizer, seduzir
alguém a fazer algo, ciente de que este poderá vir a se prejudicar, creio ser
demasiadamente injusto!
Sem invocar o paternalismo, mesmo porque o CDC
não pode ter este tipo de postura, mas além da notícia – o que não é favor
algum e sim, obrigação, considerado o aspecto da transparência da oferta -,
deveriam se amoldar a um juro acessível o qual não venha de encontro ao crédito
do consumidor. O próprio Governo colabora para isso, já que estendeu, de
maneira indevida, às empresas prestadoras de serviços de cartão de crédito, -
que não são instituições financeiras -, o direito de praticarem juros acima dos
permitidos por lei. Os tribunais têm decidido, reiteradamente, acerca da
ilegalidade da cobrança de juros acima do previsto pela Lei Maior, ou seja, é
auto-aplicável o artigo 192, § 3º desta.
Havendo ofensa ao consumidor, estará
comprometida a relação de consumo, estará a mesma viciada! Com uma simples
pergunta, se infere a lesão: se os juros praticados fossem os legais, ou seja,
12% (doze por cento) ao ano, será que as empresas ofertariam ao consumidor a
hipótese de honrarem o mínimo necessário à satisfação do débito? Com certeza,
não, eis que não valeria à pena, porque perderiam dinheiro.
Vale ressaltar que a abusividade e a
deslealdade da cláusula estão umbilicalmente ligadas aos juros altos.
Obviamente, se assim não fosse, aquelas não se concretizariam. Tratar-se-ia,
sim, de uma verdadeira vantagem para o consumidor.
Com uma educação básica, o cidadão, finalmente,
terá consciência plena do exercício de seus direitos, e, quando isso ocorrer,
da verdadeira cidadania.
Disponível em http://orbita.starmedia.com/~jurifran/aj10acdc.html