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TELEMAR DEVERÁ INDENIZAR CONSUMIDOR POR DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO

 

Melissa Fernandes

 

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu uma importante decisão para a defesa dos consumidores do serviço público de telefonia, condenando a Telemar ao pagamento de indenização por danos sofridos pelo usuário em razão do descumprimento do contrato de promessa de assinatura de linha telefônica pela fornecedora.

 

Um grande número de pessoas enfrenta problemas com o serviço de telefonia, sofre o desgaste de diversas reclamações, sem ter seu pedido atendido. O Idec, Instituto de Defesa do Consumidor, divulga mensalmente o ranking de reclamações registradas pelo setor de atendimento ao associado e as empresas de telefonia ocuparam segundo lugar nas reclamações do mês de novembro deste ano. O consumidor fica impotente diante dessas situações, não encontrando meios de resguardar seus direitos frente às empresas concessionárias dos serviços de telefonia. Por isso, é fundamental a atuação do Judiciário no sentido de garantir que os dois participantes da relação de consumo realizem suas obrigações e tenham seus direitos resguardados.

 

O processo decidido pelo STJ, Recurso Especial 419.252-RJ, trata de uma situação em que a empresa de telefonia forneceu o serviço, mas de modo imperfeito, instalando linha diversa da contratada. Em razão do fornecimento do serviço de modo incompleto, o consumidor sofreu todo inconveniente resultante do uso de uma linha compartilhada, da cobrança por serviços não prestados e da necessidade de fazer diversas reclamações.

 

O Código de Defesa do Consumidor (CDC), visando garantir os direitos dos consumidores em todas as áreas de prestação de serviços, tratou especificamente dos serviços públicos em diversos artigos. No artigo 3º, a definição de serviço como "qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração" deixa claro que a relação estabelecida entre o fornecedor do serviço público de telefonia e o usuário é relação de consumo. Por via de conseqüência, as pessoas jurídicas de Direito Público também poderão ser responsabilizadas pela prestação defeituosa dos seus serviços. O art. 4º traz, como um dos princípios da Política Nacional de Relações de Consumo, a racionalização e melhoria dos serviços públicos. Por sua vez, o artigo 6º reconhece, como direito básico do consumidor, a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.

 

É fácil perceber, assim, a preocupação do legislador em incluir esses serviços nas atividades abrangidas pelo CDC. Mas é no artigo 22 que o código cuida, especificamente, da prestação de serviços públicos. Segundo Celso Antonio Pacheco Fiorillo (1), "o art. 22 diz respeito a um dos mais importantes dispositivos do CDC em face da realidade brasileira, à medida em que toda a população em nosso país é considerada consumidora, na forma prevista na Lei 8.078/90, em face do Estado Fornecedor."

 

Estabelece o art. 22 que:

 

"Os órgão públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e quanto aos essenciais, contínuos.

 

Parágrafo único: Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código."

 

Nos termos do referido artigo, quando os órgãos públicos se descuidam da obrigação de prestar serviços, adequados, eficientes, seguros e contínuos, são obrigados a cumpri-los e reparar os danos causados.

 

Interessante observação faz Zelmo Denari (2) ao relacionar o art. 22 com outros dispositivos do código: "Em primeira aproximação, vale observar que os órgãos públicos recebem tratamento privilegiado, pois não se sujeitam às mesmas sanções previstas no art. 20 para os fornecedores de serviços". O artigo 20 cuida da responsabilidade dos fornecedores por vícios de qualidade dos serviços. Ficaram afastadas da responsabilidade dos órgãos públicos, as alternativas, oferecidas ao consumidor pelo referido artigo, de restituição da quantia paga e de abatimento do preço, incluída somente a reexecução dos serviços defeituosos. Prossegue o autor, "Por outro lado, tratando-se de reparação dos danos, vale dizer, da restauração do estado anterior à lesão, responsabiliza as entidades públicas na forma prevista neste código, o que significa, independentemente da existência de culpa, conforme estatui expressamente o art. 14 do CDC". O artigo 14, por sua vez, trata da responsabilidade do fornecedor por defeitos relativos à prestação de serviços, prevendo a responsabilidade objetiva.

 

O CDC impõe à fornecedora de serviços públicos quatro princípios que devem orientar a sua atuação: adequação, eficiência, segurança e continuidade, quando essenciais. Adequado será o serviço quando ele se mostrar ajustado ao fim a que se destina. É justamente esse dever que foi violado na situação tratada pelo acórdão proferido pelo STJ. A empresa de telefonia forneceu o serviço, mas de maneira inadequada, pois diferente do contratado pelo consumidor. O prejuízo advém do ilícito contratual pela falta da prestação, seja esta imperfeita ou inadequada, e, por isso, tem de ser reparado.

 

Observa o relator do acórdão em comento, ministro Ruy Rosado de Aguiar, "O usuário da linha que deixa de cumprir as obrigações contratuais tem contra si proposta ação de cobrança das prestações, multa, suspensão do serviço, inscrição no SPC (Serviço de Proteção ao Crédito) e outras medidas que incidem sobre o devedor inadimplente. O fornecedor do serviço telefônico que desatende aos seus deveres deve, igualmente, responder pelo dano que resulta do seu inadimplemento".

 

A privatização de alguns serviços públicos não tem demonstrado um equilíbrio maior na relação entre os fornecedores e os usuários desses serviços nem tem ajudado na proteção e realização dos direitos dos consumidores. A imposição da obrigação de reparar os danos causados pelo descumprimento contratual é a única maneira de impor limites à situação em que a prestadora elabora os contratos de adesão e neles não faz previsão de sanção para sua falta, deixando "espaço" para descumprir livremente os contratos em prejuízo dos consumidores. Os meios de proteção aos direitos do consumidor estão à disposição de todos, o necessário é a correta utilização da lei, em beneficio do consumidor.

 

 

 

Notas

 

(1) Comentário in CDC Eletrônico Carta Maior.

 

(2) Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto, 7ª edição, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, pg. 196 e 197.

 

 

Fonte: Carta Maior