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Contratos Eletrônicos Internacionais

Renato M. S. Opice Blum

Rafael Augusto Paes de Almeida



O mundo virtual está cada vez mais influenciando o comportamento do consumidor brasileiro. É cada vez maior a oferta de produtos em sites especializados na rede mundial de computadores, devido, principalmente, a enorme comodidade que este tipo de comércio proporciona a todos, bem como a redução de custos de forma global.

Para ilustrar melhor o panorama mundial do crescimento do comércio eletrônico, o serviço Nielsen/NetRatings, oferecido na América Latina pelo IBOPE eRatings.com, mostra que, em setembro de 2000, os sites de comércio eletrônico ganharam popularidade. A Amazon passou do 14º para o 12º lugar no ranking dos mais visitados e o e-Bay da 16ª para a 13ª posição. Juntos os dois sites atraíram mais de 30 milhões de visitantes.

Nos domicílios, os resultados mostram que mundialmente os portais Yahoo! AOL e MSN continuam na liderança do tráfego da Internet, atraindo um audiência de 80 milhões, 71 milhões e 65 milhões de pessoas, respectivamente. Os dados também revelam que, em setembro, o número de usuários ativos (que acessam a Internet pelo menos uma vez por mês) chegou a 159 milhões, um crescimento de 15% em relação ao mês anterior. Os internautas mundiais gastam 8h31min por mês na Web e visitam 12 sites em média. 

O Brasil, devido ao seu enorme potencial de consumo, não podia ficar de fora. O mercado envolvido no comércio eletrônico em nosso país é bastante expressivo, haja vista que respondemos por aproximadamente 90% do comércio eletrônico da América Latina.

Uma questão de extrema relevância é a proteção jurídica do consumidor brasileiro na ocasião em que celebra um contrato de compra e venda em algum site internacional de compras.


A partir do momento em que há a celebração do contrato eletrônico com o site responsável pela venda, (note-se que se trata de um site cuja a sede social não está no Brasil), cria-se, obviamente, uma obrigação de adimplemento do contrato celebrado entre o vendedor virtual estrangeiro e o consumidor brasileiro. Com efeito, caso a empresa vendedora possua filial ou sucursal em território brasileiro, estas serão acionadas em eventual processo judicial.


A Constituição da República, em seu artigo 5.º, inciso XXXII, prevê a proteção estatal do consumidor através de lei ordinária. Essa lei é o Código de Defesa do Consumidor, (Lei n.º 8078/90). A proteção do Código abrange todas as pessoas, sejam elas físicas ou jurídicas, desde que estas sejam destinatárias finais do produto ou do serviço. Deve-se consignar que, após duríssimos anos que levaram à consolidação do respeito do consumidor brasileiro, através do advento da lei de proteção e defesa consumerista, o comércio eletrônico não possui o condão de afastar a sua aplicabilidade. O comércio virtual deve ser entendido apenas como um meio de efetuar as transações, assim como o telefone ou o telefax.


Em caso de inadimplemento contratual, isto é, o não cumprimento da data correta de entrega do produto, a existência de vícios, o fato do produto, dentre outros, é importante ressaltar que tais desobediências infringem, frontalmente, uma obrigação que deve ser executada em território brasileiro. Por conseguinte, aplicar-se-á o artigo 9.º § 1.º, da Lei de Introdução ao Código Civil, (elemento de conexão)  que preceitua:


Art. 9.º : Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem.

§ 1.º Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será está observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato.


Com efeito, o artigo artigo 9. º § 2.º da LICC, é um elemento de conexão.

Art. 9.º : Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem.

§ 2.º A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente.



O elemento de conexão acima referido em uma relação regida pelo direito comercial, poderia ser aplicado. Entretanto, estamos tratando de direito do consumidor e este, por sua vez, está previsto nos direitos e garantias fundamentais da Constituição Federal Brasileira, e, como sabemos, o artigo 5.º é cláusula pétrea. Permitir a aplicação do direito estrangeiro seria negar a Constituição Federal, e tal conduta não é da tradição jurídica brasileira.

Acrescente-se o fato de que estamos tratando de obrigação não cumprida, isto é, não houve a entrega do produto ou a realização do serviço pela empresa estrangeira ao consumidor brasileiro, portanto deve-se aplicar o art. 9.º § 1.º da LICC.

Ademais, o Código de Processo Civil em seu artigo 88 trata da competência internacional e em especial seu inciso II preleciona:


Artigo 88 : É competente a autoridade judiciária brasileira quando:

II - No Brasil tiver de ser cumprida a obrigação.


Deve-se trazer à lume, também, que o próprio Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 101, I, é taxativo quanto a possibilidade de opção pelo domicílio e edita:



Artigo 101: Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos ou serviços, sem prejuízo no disposto nos capítulos I e II deste título, serão observadas as seguintes normas:

I - a ação pode ser proposta no domicílio do autor.


Por fim, o que nos interessa asseverar é que em uma compra realizada pela rede, cuja a empresa vendedora possua sede social em país estrangeiro, o consumidor brasileiro terá dois caminhos: Poderá mover uma eventual ação judicial no país sede da empresa, ou, poderá processar no Brasil, pois está amparado pela Constituição Federal, Lei de Introdução ao Código Civil, por normas de caráter processual e principalmente pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8078/90). Por derradeiro, deve-se destacar que se consumidor move uma ação judicial no Brasil e sagra-se vencedor, tem-se, por conseqüência, que a execução da sentença brasileira deverá ser realizada no país de origem da empresa virtual. Dessa forma, os requisitos do artigo 15 da Lei de Introdução ao Código Civil, de forma analógica deverão ser observados. Caso a execução do comando judicial brasileiro afronte a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes, tal execução poderá ter restrições na sua eficácia em solo estrangeiro, como por exemplo, se a sentença brasileira determinar a inversão do ônus da prova da relação consumerista, e não existir previsão semelhante na legislação estrangeira.

Finalmente, mister se faz mencionar que há dois caminhos a seguir, quais sejam, a ação judicial poderá ser movida no estrangeiro em conformidade com o direito alienígena e também há a opção de se mover o processo no Brasil, em consonância com o ordenamento pátrio e realizar sua posterior execução em solo estrangeiro, com suas possíveis implicações jurídicas com o ordenamento local.



Fonte:http://www.direitonaweb.com/colunista.asp?ctd=444&l=renato

Acesso em 14/03/2002