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AS DEMANDAS COLETIVAS E O MINISTÉRIO PÚBLICO
Elke Doris Just
Juíza do Trabalho da 10ª Região
 

A presente exposição pretende examinar duas questões:
1. A ação civil pública prevista constitucionalmente como instrumento judicial do Ministério Público comporta, além da defesa de interesses difusos e coletivos, a proteção de interesses individuais homogêneos?
2. Tem o Ministério Público do Trabalho legitimidade para a defesa coletiva de direitos através da ação civil coletiva prevista no art. 91 do código de defesa do consumidor?

1. A defesa de interesses individuais homogêneos através da ação civil pública movida pelo Ministério Público.
A ação civil pública prevista constitucionalmente como instrumento judicial do Ministério Público comporta, além da defesa de interesses difusos e coletivos, a proteção de interesses individuais homogêneos?1
O exame da questão percorre o seguinte raciocínio: (a) Saber se a ação civil pública comporta a defesa de interesses individuais e, em caso afirmativo, (b) saber se a ação civil pública e a ação civil coletiva admitem distinção e (c) saber se cabe ao Ministério Público a defesa de interesses individuais.
1.1. A ação civil pública e os interesses individuais.
A ação civil pública na forma prevista originalmente pela Lei 7.347/85 é destinada à proteção de direitos e interesses difusos e coletivos, ambos de natureza transindividual e indivisível (distintos apenas pelo grau de agregação2), o que significa que o ato lesivo alcança uma massa indeterminada de sujeitos, assim como a reparação do dano é única e usufruída por todos. Não há fracionamento individual, mesmo porque não há titular individual.
O Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), a partir de suas disposições finais, incluiu na Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) o artigo 21, determinando a aplicação do Título III (Da Defesa do Consumidor em Juízo) da Lei 8.078/90, no que for cabível, para a defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais. Esta menção a direitos e interesses individuais na lei da ação civil pública, sem alteração do elenco previsto no art. 1o, que não cogita de situações individuais, suscita dificuldade interpretativa3. A matéria é controvertida tanto no campo doutrinário quanto jurisprudencial. Diferentes soluções são apontadas:
A. Negar a inserção dos interesses individuais no campo da ação civil pública prevista na Lei 7.347/85, em vista da sua destinação específica para a tutela de interesses difusos e coletivos (art. 1o da Lei 7.347/85)4.
B. Concluir pela intenção do legislador em ampliar o rol de situações protegidas pela Lei da Ação Civil Pública. Textos legais anteriores à alteração de 1990 produzida na LACP disponibilizaram a ação civil pública para a proteção de direitos individuais5, assim como também textos legais posteriores reafirmaram a modalidade da ação para este fim6.
C. Concluir pela intenção do legislador de estender a outros direitos individuais homogêneos o regime a que se sujeitam os direitos decorrentes das relações de consumo7.
As duas últimas interpretações, que não se excluem uma à outra, parecem possíveis e socialmente úteis, uma vez que a complexidade das relações modernas necessita de instrumentário processual para extravasar os conflitos de interesses: difusos, coletivos e individuais homogêneos. As ações civil pública e civil coletiva desdobram o caminho do rompimento de princípios individualistas, veiculando a pretensão envolvendo interesses da coletividade.
1.2. A ação civil pública e a ação civil coletiva.
Admitido o ingresso dos interesses individuais homogêneos no rol tutelado por intermédio da ação civil pública, surge a indagação sobre a finalidade que restaria à ação civil coletiva prevista no Código de Defesa do Consumidor. Ela que se destina precisamente à defesa coletiva de direitos individuais, teria sido absorvida pela ação civil pública, pela confusão de objetos?
Não há identidade entre a ação civil pública e a ação civil coletiva. A distinção entre ambas apresenta-se não apenas pelo tipo de interesse tutelado, critério insuficiente quando se admite a defesa de interesses individuais pela via da ação civil pública, mas pela natureza do provimento buscado.
A Lei 7.345/85 constitui a matriz processual para a ação civil pública que não tenha regime específico previsto em outro texto legal. Ali a ação civil pública foi modelada para a proteção de interesses difusos e coletivos, almejando provimento judicial cujo cumprimento satisfaz a integralidade dos interesses lesados. Pode destinar-se à reparação do dano através de indenização que reverte a um fundo próprio destinado à reconstituição do bem de vida lesado (e não à reparação de direitos individuais), à imposição de obrigação de fazer ou não fazer (Lei 7.347/85, arts. 3o e 13).
Os provimentos que a ação civil pública viabiliza são inadequados para reparação de lesões individuais, sob a forma de indenização. Contudo, a via é satisfatória para a proteção de interesses individuais homogêneos quando o provimento buscado é a condenação para cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer que tenha natureza indivisível. É o momento da indivisibilidade na forma da satisfação que gera identidade entre os interesses individuais homogêneos, os difusos e os coletivos, permitindo a veiculação da pretensão através da ação civil pública.
Assim, a ação civil pública apresenta-se como instrumento apto à defesa de interesses difusos, coletivos e também à proteção de interesses individuais homogêneos. Pela via da ação civil pública os interesses difusos e coletivos podem alcançar provimento condenatório consistente em obrigação de dar (indenizar), fazer ou não fazer. Para a tutela de interesses individuais homogêneos, contudo, a mesma via permite apenas a obtenção do provimento condenatório de obrigação de fazer ou não fazer, excluída, portanto, a indenização individual.
Já a ação civil coletiva, modelada para a proteção de direitos individuais homogêneos, busca um provimento genérico, reconhecendo a culpa do réu na lesão praticada a uma massa de indivíduos, e condenando-o à reparação do dano (Lei 8.078/90, arts. 91 e 95). Em liqüidação, que corre ou não no juízo prolator da sentença, é buscada a reparação individual, em amplo conhecimento que permite examinar se o postulante insere-se ou não nos parâmetros da sentença genérica. Trata-se, aqui, unicamente de obrigação de dar. A ação é de natureza indenizatória apenas.
Assim a ação civil pública é imprópria para propiciar ressarcimento individual. A via adequada para tanto é a ação civil coletiva.
1.3. O Ministério Público e os interesses individuais.
A legitimidade do Ministério Público para o ajuizamento de ação civil pública em defesa de interesses difusos e coletivos tem previsão constitucional expressa (CF, art. 129, III). A falta de inclusão, no mesmo dispositivo constitucional, dos direitos individuais homogêneos tem explicação no fato de que nem todas as situações individuais homogêneas alcançam dimensão a justificar a atuação do MP, ao contrário do que ocorre com os interesses difusos e coletivos, que, pela natureza, têm afetação à coletividade e não ao indivíduo. E tanto é assim que a reparação pecuniária, quando postulada, reverte em favor de um fundo destinado à reconstituição do bem lesado.
A legitimidade do Ministério Público, prevista em textos legais8, para o ajuizamento de ação civil pública visando a proteção de interesses individuais homogêneos não sucumbe no confronto com a Constituição Federal.
Quando a proteção reclamada pela via da ação civil pública envolve direitos individuais, a legitimidade do Ministério Público emerge de forma indireta. Tratando-se de interesses individuais indisponíveis, a legitimação repousa no caput do art. 127 da Constituição Federal que ampara a Lei Complementar 75/93 e a Lei 8.625/93. Tratando-se de interesses individuais homogêneos disponíveis a atuação do Ministério Público somente admite estar voltada para a proteção do interesse social que possa transparecer a partir da conduta lesiva, e não para a proteção da situação individual. Esta perspectiva impessoal9 é que ampara a legitimidade ativa do Ministério Público, que passa a atuar na defesa do interesse social (CF arts. 127, caput, e 129, IX).
A ação civil pública constitui apenas veículo com padrões de provimento e procedimento pré-estabelecido, cujo conteúdo concreto deve estar ajustado ao fim buscado. Ao utilizar-se deste instrumento para a defesa de interesses individuais homogêneos cabe ao Ministério Público descrever as circunstâncias concretas que expressam a amplitude social justificadora de sua intervenção para qualificar a sua legitimidade ativa.
É possível concluir, portanto, que a ação civil pública viabiliza a defesa de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos10 pelo Ministério Público, observados os limites do provimento próprio da ação civil pública e da legitimidade do Ministério Público cujo espaço de atuação prende-se essencialmente às suas finalidades institucionais.

2. O Ministério Público do Trabalho e a ação civil coletiva11.
Tem o Ministério Público do Trabalho legitimidade para a defesa coletiva de direitos através da ação civil coletiva prevista no art. 91 do código de defesa do consumidor?
A ação civil coletiva prevista no Código de Defesa do Consumidor apresenta familiaridade, no âmbito do processo do trabalho, com as ações admitidas ao sindicato, na qualidade de substituto processual da categoria. Ambas são ações que visam ao ressarcimento de direitos individuais homogêneos lesados12.
Embora inserida no Código de Defesa do Consumidor, a ação civil coletiva permite, em tese, instrumentalizar a defesa de outros direitos individuais homogêneos. Foi o próprio Código de Defesa do Consumidor que acrescentou o art. 21 à Lei da Ação Civil Pública determinando a aplicação "à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da Lei que instituiu o Código de Defesa do Consumidor" (art. 117).
O uso da ação civil coletiva no âmbito trabalhista não expressa impedimento sob a ótica da legitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho. A dificuldade apresenta-se na adequação do meio processual, para a proteção de direitos trabalhistas.
2.1. A ausência de restrição sob a ótica da legitimidade do Ministério Público do Trabalho.
A Lei Complementar 75/93 prevê, dentre os instrumentos de atuação do Ministério Público da União, a ação civil pública para a defesa de outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos (art. 6o, VII, "d") além daqueles especificamente enunciados, e a ação civil coletiva para a defesa de interesses individuais homogêneos (art. 6o, XII).
Os instrumentos de atuação encontram-se topograficamente inseridos no título das disposições gerais. Este elenco não alcança, genericamente, todos os ramos do Ministério Público. Assim, por exemplo, não cabe a qualquer dos ramos do Ministério Público da União, indistintamente, ajuizar ação direta de inconstitucionalidade. Apesar de inserido no rol geral de instrumentos de atuação, o ajuizamento da ação cabe ao Procurador-Geral da República (art. 46).
De outro lado, a ação civil coletiva para a proteção de interesses individuais homogêneos, instrumento de atuação previsto nas disposições gerais, não restou inserida expressamente dentre as atribuições discriminadas de qualquer dos ramos do Ministério Público da União. Aqui a utilização do instrumento ficou aberta para os diversos ramos, desde que compatível o uso com os limites das atribuições do órgão.
Na enumeração das atribuições do Ministério Público do Trabalho (art. 83) o legislador inicia o elenco estabelecendo a competência para "promover as ações que lhe sej> eis trabalhistas" (Inciso I).
Apesar de não ter previsão em "lei trabalhista", a ação civil coletiva tem o seu ajuizamento permitido ao Ministério Público na própria Lei Complementar 75/93 e no Código de Defesa do Consumidor. E o ingresso na investigação da aplicabilidade da ação, em seu conjunto, no âmbito trabalhista se faz por intermédio do art. 769 da CLT que estabelece ser o direito processual comum a fonte subsidiária do processo do trabalho.
Acresce-se, ainda, que o elenco do art. 83 da Lei Complementar 75/95 revela-se como aberto diante da disposição do art. 84 que determina ao Ministério Público do Trabalho, no âmbito de suas atribuições (arroladas no art. 83) exercer as funções institucionais previstas nos Capítulos I, II, III e IV do Título I (Das Disposições Gerais) e, especialmente, [...] "V - exercer outras atribuições que lhe forem conferidas por lei, desde que compatíveis com sua finalidade".
A ação civil coletiva, assim, não está imediatamente excluída do rol do instrumentário de que dispõe o Ministério Público do Trabalho para a sua atuação. Importa saber é se este instrumento processual permite veicular o exercício das atribuições típicas do Ministério Público do Trabalho.
Na medida em que a situação fática puder expressar dano que venha a desbordar da simples lesão individual (esgotada em si mesma), para ter repercussão configuradora de interesse social, admissível é a intervenção do Ministério Público.
Entretanto, se a questão examinada sob a ótica da legitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho não apresenta óbice ao ajuizamento da ação civil coletiva, a dificuldade situa-se na esfera da adequabilidade da ação para a tutela de direitos trabalhistas.
2.2. O dever de indenizar e o direito de ser indenizado: o enfoque da ação civil coletiva.
A ação civil coletiva insere-se na conjuntura dos esforços voltados para a efetividade do processo, pela realização do direito material.
A ação civil coletiva aparelha a sociedade, através de entes ideológicos, para o exercício do dever de indenizar mais do que do direito de ser indenizado. A sua estrutura está armada de mecanismos próprios para evitar a impunidade do agente causador de lesão ainda que os indivíduos lesados em seu patrimônio individual permaneçam inertes.
Nos moldes previstos atualmente, a ação civil coletiva instrumentaliza apenas a reparação de danos individuais. O provimento que a ação civil coletiva permite alcançar é uma sentença condenatória genérica, "fixando a responsabilidade do réu pelos danos causados" (Lei 8.078/90, art. 95). A partir daí processa-se a liquidação para o exame do ajuste da situação individual aos limites da sentença.
Se os titulares individuais não se habilitarem à liquidação no prazo de um ano após o trânsito em julgado da sentença condenatória submetem-se à decadência do direito, e o resultado pecuniário reverte em favor do fundo previsto na Lei da Ação Civil Pública (Lei 8.078/90, art. 100). Este dispositivo atende à mecânica da tutela de direitos individuais homogêneos, entrelaçada com a de interesses difusos e coletivos, compondo sistema eficaz de proteção da coletividade, atenta para o dever de indenizar.
É diante desta complexa estrutura que se revela a inadequabilidade da ação civil coletiva para a proteção de direitos trabalhistas individuais homogêneos.
O prazo prescricional dos direitos trabalhistas previsto constitucionalmente (CF, art. 7o, XXIX) não poderia sofrer estreitamento pela incidência de prazo decadencial decorrente da ação civil coletiva.
Contudo, sustentar a manutenção dos prazos prescricionais ordinários trabalhistas e deixar de aplicar o dispositivo próprio da ação, por incompatibilidade com o direito e o processo do trabalho, levaria a uma ruptura do sistema idealizado.
A solução de manter a técnica da execução em favor do fundo após um ano do trânsito em julgado, sem prejuízo das postulações individuais posteriores arrimadas na falta de prescrição da ação individual, transformaria o fundo beneficiado com o resultado da indenização em devedor13, vindo, então, o empregado a postular contra este. Neste momento surge novo óbice, o da falta de competência da Justiça do Trabalho (CF, art. 114), uma vez que deixaria de haver lide entre trabalhador e empregador.
A estrutura da ação civil coletiva, portanto, plena de mecanismos viabilizadores de resultados materiais, não se acomoda na moldura jurídica do campo trabalhista porque inadequada para a proteção de direitos individuais homogêneos decorrentes da relação de trabalho. E, diante desta conclusão, torna-se inviável o ajuizamento a ação civil coletiva pelo Ministério Público do Trabalho.
A ação civil coletiva, em seu estrutura, apesar de inadequada para o âmbito trabalhista, constitui fonte de subsídios processuais para as demandas coletivas típicas do processo do trabalho, em que o sindicato atua como substituto processual da categoria.
Novembro/95.
 

(Notas de rodapé: 1 - A definição dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos encontra-se legalmente estabelecida nos incisos do art. 81, Parágrafo Único, do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90): "I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato; II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base; III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum." 2 - "Quer dizer, não há, propriamente, uma diferença de essência ou de natureza entre esses dois tipos de interesses: ambos integram o gênero 'metaindividual'; a particularidade está em que um interesse difuso pode tornar-se 'coletivo' se e quando estiver revestido de grau de definição, coesão e organização destes últimos. " (MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Interesses Difusos - Conceito e legitimação para agir. 2a ed. rev. at., São Paulo. Revista dos Tribunais. 1991. p. 107). 3 - ZAVASCKI, Teori Albino. O Ministério Público e a Defesa de Direitos Individuais Homogêneos. Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 117, jan./mar. 1993. p. 180. A propósito da legitimidade do MP à vista do art. 21 da LACP introduzido pelo CDC, afirma o autor: "Realmente, a referência a direitos individuais soa desafinada no contexto da lei da ação civil pública, que se destina a reger unicamente direitos e interesses difusos e coletivos, como faz certo o seu art. 1o. [...]" 4 - Em resposta a consulta afirma Galeno Lacerda: "A rigor, os quesitos terceiro e quarto já se encontram respondidos pelas considerações anteriores. Com efeito 'a não ser nos casos de relação de consumo e outros previstos especificamente no art. 1o da Lei 7.347 (com redação da Lei 8.078), a ação civil pública só pode ser intentada para defesa de interesses difusos ou coletivos, não podendo abranger interesses homogêneos individuais'. E 'os interesses difusos ou coletivos não abrangem os interesses individuais homogêneos, mesmo quando estes últimos têm importantes reflexos sociais'." (Ação Civil Pública e Contrato de Depósito em Caderneta de Poupança. Revista dos Tribunais. v. 715, p. 111, maio, 1995 ). 5- A Lei 7.913 de 07/12/1989, que dispõe sobre a ação civil pública de responsabilidade por danos causados aos investidores no mercado de valores mobiliários, propõe-se à defesa de direitos individuais disponíveis. O seu art. 1o estabelece que, "Sem prejuízo da ação de indenização do prejudicado, o Ministério Público, de ofício ou por solicitação da Comissão de Valores Mobiliários - CVM, adotará as medidas judiciais necessárias para evitar prejuízos ou obter ressarcimento de danos causados aos titulares de valores mobiliários e aos investidores do mercado [...]" nas circunstâncias que especifica. Trata-se da defesa de direitos individuais homogêneos disponíveis. Também a Lei 8.069 de 13/07/1990, que institui o Estatuto da Criança e do Adolescente atribui competência ao Ministério Público para "promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à adolescência [...]"(art. 201, V). 6- A Lei 8.625 de 12/02/1993, que institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público dos Estados, elenca dentre as funções do Ministério Público "promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei: a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos;" (art. 25, IV, "a"). Também a Lei Complementar 75 de 20/05/1993, que institui o Estatuto do Ministério Público da União, elenca dentre os instrumentos de atuação do Ministério Público, no Título das Disposições Gerais, o inquérito civil e a ação civil pública (art. 6o, VII), para: "a) a proteção dos direitos constitucionais; b) a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, dos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; c) a proteção dos interesses individuais indisponíveis, difusos e coletivos, relativos às comunidades indígenas, à família, à criança, ao adolescente, ao idoso, às minorias étnicas e ao consumidor; d) outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos;" 7 - ZAVASCKI, Teori Albino. O Ministério Público ... "[...] Há, ademais, a referência a interesses e direitos individuais, constante do atual art. 21 da Lei n. 7.347, de 24-7-85 (introduzido pelo art. 117 da Lei n. 8.078/90) que teria tido, ao que parece, o propósito de estender a todos os direitos individuais homogêneos, o mesmo regime a que se sujeitam os direitos decorrentes das relações de consumo, inclusive, portanto, no que tange à legitimação do Ministério Público para defendê-los coletivamente." (p. 174). 8 - A constitucionalidade de texto legal que amplia a função do Ministério Público para a defesa de direitos individuais é questionada pelo Professor Ives Gandra da Silva Martins: "[...] o alargamento do espectro da ação civil pública por força de lei ordinária fere, violenta, macula a Constituição Federal. Não pode o Ministério Público ter forças superiores àquelas que a própria Constituição lhe ofereceu." (MARTINS, Ives Gandra da Silva. Ação Civil Pública - Limites Constitucionais. Revista do Ministério Público do Trabalho. Brasília, n. 9, mar. 1995, p. 24). 9 - ZAVASCKI, Teori Albino. O Ministério Público..., p. 175. 10 - No sentido da viabilidade da tutela de interesses e direitos individuais homogêneos, o acórdão prolatado no Recurso Especial 49.272-6/RS, pela Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça em 21.09.94, tendo como relator o Ministro Demócrito Reinaldo. A ementa, publicada no DJU de 17.10.94, Seção 1, p. 27868, tem o seguinte teor: "PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA DEFESA DE INTERESSES E DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA. POSSIBILIDADE. A Lei n. 7.345, de 1985, é de natureza essencialmente processual, limitando-se a disciplinar o procedimento da ação coletiva e não se entremostra incompatível com qualquer norma inserida no Título III do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90). É princípio de hermenêutica que, quando uma lei faz remissão a dispositivos de outra lei de mesma hierarquia, estes se incluem na compreensão daquela, passando a constituir parte integrante do seu contexto. O artigo 21 da Lei no 7.345, de 1985 (inserido pelo artigo 117 da Lei no 8.078/90) estendeu, de forma expressa, o alcance da ação civil pública à defesa dos interesses e 'direitos individuais homogêneos', legitimando o Ministério Público, extraordinariamente e como substituto processual, para exercitá-la (artigo 81, Parágrafo Único, III, da Lei 8.078/90). Os interesses individuais, 'in casu' (suspensão do indevido pagamento de taxa de iluminação pública), embora pertinentes a pessoas naturais, se visualizados em seu conjunto, em forma coletiva e impessoal, transcendem a esfera de interesses puramente individuais e passam a constituir interesses da coletividade como um todo, impondo-se a proteção por via de um instrumento processual único e de eficácia imediata - 'a ação coletiva'. O incabimento da ação direta de declaração de inconstitucionalidade, eis que, as leis municipais nos 25/77 e 272/85 são anteriores à Constituição do Estado, justifica, também, o uso da ação civil pública, para evitar as inumeráveis demandas judiciais (economia processual) e evitar decisões incongruentes sobre idênticas questões jurídicas. Recurso conhecido e provido para afastar a inadequação, no caso, da ação civil pública e determinar a baixa dos autos ao Tribunal de origem para o julgamento do mérito da causa. Decisão unânime." 11 - O termo civil na denominação da ação civil coletiva, assim como na ação civil pública aparenta opor-se à qualificação de penal. Rodolfo de Camargo Mancuso, examinando a denominação da ação civil pública aborda o aspecto da exclusão do caráter penal (MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação Civil Pública. 3a ed. rev. amp. São Paulo, Revista dos Tribunais. 1994.). Neste sentido não há exclusão imediata, portanto, do âmbito trabalhista. 12 - A aplicabilidade de normas do CDC no processo do trabalho é matéria que vem apresentando crescente exame (DELGADO, Maurício Godinho. O Direito do Trabalho no Universo Jurídico Contemporâneo. Revista LTR, São Paulo, n. 06, p. 659-666, jun. 1992; Meireles, Edilton. As Ações Coletivas no Processo do Trabalho. Normas Aplicáveis do Código de Defesa do Consumidor. Revista LTR, São Paulo, n. 09, p. 1079-1083, set. 1993; Laurino, Salvador Franco de Lima. A Aplicação do Procedimento do Código de Defesa do Consumidor na Tutela dos Interesses Individuais Homogêneos no Processo do Trabalho. Revista LTR, São Paulo, n. 03, p. 313-319, mar. 1995). 13 - Para Hugo Nigro Mazzilli, a falta de habilitação no prazo legal remete o interessado à ação individual, observado o prazo prescricional, onde poderá "buscar o levantamento junto ao fundo gestor do produto da indenização" (MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 6a ed. rev. amp. at. São Paulo, Revista dos Tribunais. 1994. p. 322). As demandas coletivas e o Ministério Público.)
 

Retirado do site: www.solar.com.br/~amatra/edj1.html