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A Resolução do Contrato de Trabalho
segundo a Lei 9.029/95 e a Prevalência dos Princípios na Aferição da
Discriminação na Dispensa
Francisco Montenegro Neto*
Há muito se espera do legislador pátrio alguma iniciativa
que espante a inércia congressista quanto à edição da lei complementar a que se
referem os artigos 7o, I, da Constituição Federal e 10, II, do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias.
Lembre-se, de intróito, que o primeiro dos dispositivos mencionados assegura,
na categoria dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros
que visem à melhoria de sua condição social, a proteção “contra despedida
arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar (...)” (grifos
nossos). Como se sabe, a propalada lei complementar não foi editada até os dias
de hoje, já tendo tal omissão legislativa fornecido terreno fértil para amplas
discussões doutrinárias e jurisprudenciais acerca das normas que –
revestindo-se de efeito supletivo – lograssem obter a colmatação de lacuna tão
substancial. Assim ocorreu, por exemplo, com a controvérsia a respeito da
aplicabilidade da Convenção 158 da OIT, ratificada e depois denunciada pelo
Brasil .
Enquanto isso, o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, em seu
artigo 10, também reclama a (literalmente) indigitada lei complementar para
regulamentar a estabilidade provisória no emprego do cipeiro (inciso I) e da
empregada gestante (inciso II). Não sobrevindo a lei, as disposições em questão
– cada vez menos “transitórias”, conquanto de lege ferenda – vedam a dispensa,
nessas hipóteses, desde que “arbitrária ou sem justa causa”.
Sem embargo da inexistência da lei complementar em questão, muitos dos
operadores do Direito do Trabalho olvidam do fato de que – a despeito da
inércia legislativa compartilhada por todos os legitimados do artigo 61 da
Constituição Federal, sociedade civil e os cidadãos, além dos entes que se
arvoram em imiscuir-se no papel de ardorosos defensores dos trabalhadores
(exemplo dos sindicatos, desde a base até as federações e confederações,
passando pelas centrais sindicais cujo reconhecimento é iminente na reforma
sindical ora paralisada) – há lei ordinária disciplinando alguma forma de
proteção contra a despedida arbitrária e fornecendo os parâmetros de
enquadramento na aludida forma de resolução contratual.
Foi nesse passo que, para efeitos de restrição à despedida imotivada na relação
de emprego, a Lei 9.029, de 13.04.95, definiu ato discriminatório em seu artigo
1o da seguinte forma: “qualquer prática discriminatória e limitativa para
efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo,
origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste
caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7o
da Constituição Federal”.
Com isso, o legislador lançou as bases que deram ensejo à inserção, quatro anos
mais tarde (26.05.99), do artigo 373-A no texto da CLT (lei complementar!),
cujo inciso III veda a motivação da dispensa do trabalho “em razão de sexo,
idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez, salvo quando a natureza da
atividade seja notória e publicamente incompatível”.
Há menção também no texto da CLT sobre despedida arbitrária, extraindo-se do
artigo 165, cuja redação (datada de 1967, portanto anterior à Constituição
vigente) declina uma espasmódica definição dessa prática como a dispensa “que
não se fundar em motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro”.
Conceituou-se de modo extremamente vago a despedida arbitrária, sopesados os
motivos disciplinares evidentemente ligados à prática de falta grave e/ou justa
causa, persistindo a obscuridade quanto aos motivos de ordem técnica, econômica
ou financeira.
Visto que o direito positivado encerra normas de cunho eminentemente subjetivo,
porquanto insuficientemente regulamentados, nem sempre é tarefa fácil
(des)caracterizar-se a dispensa discriminatória, dado o amplo espectro com que
algumas situações mereçam ser encaradas pelos atores envolvidos.
No escopo de aferir a incidência ou não de arbitrariedade no ato da dispensa,
cabe ao magistrado verificar a existência dos reais motivos de natureza
estrutural, comercial ou societária (enquanto gêneros que abarcam as espécies
de ordem técnica, econômica e financeira) e – o que é mais difícil – aplicar a
ponderação de princípios e interesses para detectar as discriminações por
“motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade”.
Afinal, nem sempre serão óbvias tais circunstâncias, que poderão ter efeitos
exacerbados em decorrência das suscetibilidades (seja do empregado, seja do
empregador, por ocasião de término contratual) feridas ou, contrario sensu,
mitigadas pela eventual falta de clamor social em face da situação específica
submetida à prestação jurisdicional.
É possível que o abuso de direito reste evidenciado pela simples constatação de
dispensa discriminatória por idade (v.g., prática de determinada empresa de
dispensar seus empregados quando estes completam 60 anos), o que não poderia
ser acobertado pelo manto do poder potestativo. Todavia, também haverá situações
onde a discriminação recairá sobre preconceito de origem sexual. Nem sempre
será tranqüila a prova da dispensa por motivos de orientação sexual, por
exemplo, no caso do empregado que se diz alvo de discriminação por ser
homossexual.
Objetivando dar as cartas de uma sociedade justa, o Preâmbulo da Constituição
de 1988 está vazado nos seguintes termos: “(...) assegurar o exercício dos
direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade
fraterna, pluralista e sem preconceitos (...)” (grifo nosso). Eis a destinação
precípua do Estado Democrático.
Por sua vez, uma sociedade sem preconceitos, acreditamos, construir-se-á com
amparo nos princípios que inspiram e vivificam as normas positivadas,
ultrapassando-se a concepção kelseniana de subsunção do fato à norma.
Construir-se-á essa sociedade mais com mudança de cultura (lato sensu, não
apenas hermenêutico-jurídica, mas política e social principalmente) do que com
mudança de leis.
Nesse passo, imperioso reconhecer que um princípio tem maior amplitude do que
uma norma, já que esta regula situações específicas, ao passo em que o
princípio traduz os fundamentos, as premissas éticas que lastreiam a elaboração
da norma jurídica. O princípio antecede, pois, à regularização de um fato
concreto, já que é de um fato – e não da lei – que surge o direito.
Segundo Dworkin[1], baluarte do pós-positivismo que preconiza a superposição
dos princípios às normas, “(...) Mesmo aqueles que mais se assemelham a regras
não apresentam conseqüências jurídicas que se seguem automaticamente quando as
condições são dadas.” (...) 'Os princípios possuem uma dimensão que as regras
não têm - a dimensão do peso ou importância.”
Américo Plá Rodriguez[2], citando o jurista italiano Luigi Mengoni – que por
sua vez se reporta ao próprio Dworkin – salienta que “Os princípios morais
exercem uma função voltada para o modo de vida e de comportamento, não
indicando abstratamente o conteúdo do dever, que varia segundo a situação
concreta, mas dão os critérios pelos quais podem ser reconhecidos”.
Sendo assim, cumpre ao intérprete laboralista – quando imbuído da missão de
aferir discriminação na despedida – utilizar-se dos princípios (tanto gerais de
Direito, quanto éticos, morais e sociais) mais relevantes, se necessário se
distanciando da letra fria da lei e, quiçá, dos princípios menos relevantes
nalguns casos. Nesse sentido, urgirá equacionar confrontos de princípios. De um
lado, princípios de ordem econômica, com cerne no eventual comprometimento da
saúde financeira da empresa, que assalaria e garante a subsistência de um
sem-número de núcleos familiares, conforme o porte do empreendimento. De outro,
ao reverso, princípios de caráter humano, a dignidade da pessoa humana do
trabalhador ofendido com a dispensa arbitrária, o comprometimento de sua saúde
física e moral, assim também da harmonia e sobrevivência de sua família.
Num país de trabalho precário e baixos salários no emprego registrado em carteira
(ou fora dele), salta aos olhos a gravidade da questão, que envolve sérios
contornos sociais diretamente ligados a uma reação em cadeia: despedida
discriminatória – desemprego – subemprego – marginalização – favelização –
violência – queda na renda – instabilidade social – recessão econômica –
subdesenvolvimento.
Todos perdem neste círculo vicioso, na medida em que pode envolver – se
caracterizada a discriminação na resolução do contrato de trabalho – modalidade
de desemprego mais grave que aquele que tradicional e infelizmente nos assola,
já obtemperado pela dificuldade de recolocação no mercado cada vez mais
informal. Com discriminação, o desemprego em jogo é o desemprego “com requintes
de crueldade”, posto que, a depender das circunstâncias, pode afetar a
auto-estima do trabalhador e causar sérios danos de ordem psíquica a quem
necessita de higidez para travar o já normalmente ingrato duelo contra a falta
de trabalho.
Para disciplinar os parâmetros da dispensa arbitrária, necessário buscar a segurança
jurídica que minimiza o caos social, o que somente se faz possível no âmago dos
princípios fundamentais expressos na Constituição .
É princípio fundamental inserto no artigo 1o, III da Constituição Federal a
dignidade da pessoa humana, bem como constitui objetivo fundamental da
República “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (artigo 3o, IV, da Lei
Maior).
No mesmo sentido, o princípio da dignidade da pessoa humana traz ínsita a
função social da empresa nos dias de hoje. A função social da propriedade
prevista no inciso XXIII do artigo 5o e no inciso III do artigo 170, ambos da
Constituição Federal, encontra-se permeada pela valorização do trabalho humano,
valor insculpido no inciso IV do artigo 1o e no caput do já mencionado artigo
170, cujo inciso VIII – por sua vez – preconiza a busca do pleno emprego.
Quanto à função social da empresa, entendemos que a função social da
propriedade deve ser lida em sentido amplo (lato sensu), de molde a englobar a
função social da propriedade (strictu sensu – coisa) e a função social do
contrato.
Versando o contrato de trabalho a respeito de rubricas de natureza
eminentemente alimentar, os princípios de probidade e boa-fé inscritos no
artigo 422 do Código Civil possuem função integrativa e são plenamente
aplicáveis às relações de trabalho (não somente de emprego), rendendo ensejo à
conclusão de que comete abuso de direito quem contraria a boa-fé.
A boa-fé – que deve estar presente em todas as fases de um contrato de trabalho
(pré-contratual, contratual e pós-contratual) – é o elemento intrinsecamente
ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana que inspira a vedação de
dispensa arbitrária do trabalho em razão de sexo, idade, cor, situação familiar
ou estado de gravidez. Desse modo, é também a boa-fé (não apenas os direitos da
personalidade do trabalhador) que resulta frontalmente vilipendiada por ocasião
da dispensa discriminatória.
Enquanto a boa-fé subjetiva diz respeito à intenção de agir em conformidade com
as normas e princípios que as inspiram, a boa-fé objetiva apresenta-se por
Miguel Reale[3] como “uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta,
arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever que cada pessoa ajuste a própria
conduta a esse arquétipo, obrando como obraria uma pessoa honesta, proba e
leal. (...). Desse ponto de vista, podemos afirmar que a boa-fé objetiva se
qualifica como normativa de comportamento leal”.
Nessa esteira, aplicados todos os princípios aqui ventilados, restará
facilitada a aferição da existência de discriminação, valendo-nos da exegese in
concreto, sob o prisma da função social. Mister, entretanto, ter-se cautela na
aplicação de tais critérios, sob pena de serem todos direcionados – sem exceção
– à proteção da parte mais frágil da relação de trabalho, no caso, o empregado,
que, admita-se, nem sempre será vítima da discriminação porventura alegada.
O fato é que, uma vez infringida a boa-fé contratual pelo empregador quando da
dispensa discriminatória, forçosa a aplicação de sanção que sirva de
desestímulo à reiteração da prática .
O artigo 4o da Lei 9.029/95 confere direito de opção ao empregado que teve seu
contrato de trabalho rompido por ato discriminatório a uma dentre as seguintes
alternativas: (i) readmissão com ressarcimento integral de todo o período de
afastamento (o que seria mais corretamente designado de reintegração); e (ii)
percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento
Quer nos parecer que somente a vedação da dispensa discriminatória cumulada com
o sancionamento enérgico servirá, pedagogicamente, para coibir a despedida por
motivo de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
preconceito ou discriminação.
Isso não significa que o magistrado não deva se cercar de todas as cautelas e
ferramentas que as máximas de experiência lhe emprestam, ou seja, zelar –
sempre que provocada a tutela jurisdicional nessa matéria – pela escorreita e
ampla produção das provas lícitas, garantindo uma instrução processual
frutífera, apurando claramente os fatos que cercam a dispensa discriminatória
(ou não discriminatória) e hábil com vistas a evitar o julgamento com base em
presunções ou indícios.
Ainda segundo Miguel Reale: “a boa-fé exige que a conduta individual ou
coletiva – quer em Juízo, quer fora dele – seja examinada no conjunto concreto
das circunstâncias de cada caso”.
Nesse diapasão, julgar por indícios (assim dirão as máximas de experiência), às
vezes, será inevitável. Tampouco escapará o julgador de julgar por presunção,
mas deve, repita-se, evitá-la a todo custo, a fim de mitigar o risco ou
intensidade da ciranda consubstanciada no círculo vicioso do desemprego “com
requintes de crueldade”.
Não há dúvida de que o desemprego é um mal social. O empregado discriminado,
porém, é um mal psico-social. Assim, se tiver de se escorar em presunções, que
não se escuse o julgador de tentar, antes, ir fundo nos fatos e provas. Se hoje
as instruções na Justiça do Trabalho correm “a toque de caixa”, resulta
imperativa uma estipulação de proposta orçamentária mais generosa, a fim de que
a lei de diretrizes orçamentárias permita a admissão de mais Juízes na Justiça
do Trabalho. Mediante a realização de concursos públicos visando a admitir um
maior número de juízes nos Regionais é que a demanda envolvendo despedida
discriminatória passará a ser julgada com o apreço que cada caso concreto
requer.
A aferição da existência de prática discriminatória, abuso de direito e quebra
da boa-fé reputa-se de crucial importância para o enquadramento da terminação
na classificação das modalidades extintivas do contrato e, consequentemente,
fixação da indenização legal devida. Utilizando-nos da diferenciação concebida
por Délio Maranhão, à qual adere Maurício Godinho Delgado[4], a “resolução
contratual corresponderia a todas as modalidades de ruptura do contrato de
trabalho por descumprimento faltoso do pacto por qualquer das partes”, ao passo
em que a “resilição contratual corresponderia a todas as modalidades de ruptura
do contrato de trabalho por exercício lícito da vontade das partes”. Decerto,
pois, que a discriminação rende ensejo à despedida indireta – espécie do gênero
resolutivo.
Recente acórdão do Tribunal Superior do Trabalho[5] relatado pelo Ministro Barros
Levenhagen valeu-se da presunção para considerar discriminatória a dispensa do
empregado portador do vírus da AIDS.
Por força de sua Súmula 126, a Corte Maior Laboral está impedida de adentrar
fatos e provas. Mas é certo que, no caso mencionado, amparou-se no fato de que
o empregador já detinha conhecimento da síndrome que acometia o empregado. O
mero conhecimento dessa circunstância pelo empregador incutiria no julgador a
presunção de discriminação, frente à impactante existência do mal ainda incurável,
alvo de preconceito oriundo da discriminação com os grupos de risco que – em
incipientes etapas da doença – reuniam o maior contingente de indivíduos
vitimados. O forte apelo social e emocional envolvido, ainda que não admitido
expressamente nesse tom, justificaria a presunção de discriminação, conforme
tendência atual do TST.
Em que pese a priori a decisão referida haja esposado uma tendência humanista
salutar, também salutar seria que o TST, ainda que apenas em casos onde a
dignidade do trabalhador esteja contraposta à suposta quebra da boa-fé pelo
empregador, flexibilizasse a Súmula 126 e, por conseguinte, também a Súmula 279
do STF, não somente para examinar os fatos (no caso, a ciência do empregador a
respeito da existência da doença), mas também para adentrar o exame das provas.
Isso porque das provas pode resultar, quiçá, indícios ou elementos mais
robustos do que a mera presunção, tanto no sentido de robustecer a prática de
discriminação, quanto, se for o caso, na direção de afastá-la.
Dessa forma, o interesse da coletividade na consagração dos princípios
constitucionais do trabalho suplantaria a questão processual em que reside o
não revolvimento de fatos e provas em grau extraordinário, justificando, via de
conseqüência, o exame das supostas circunstâncias discriminatórias pelos
magistrados com mais experiência de vida e sensibilidade para distinguir o
abuso de direito da pretensão infundadaO acórdão do TST aqui tomado por
paradigma condenou o empregador a reintegrar o empregado mediante o pagamento
da indenização prevista na Lei 9.029/95, indeferindo o pagamento de indenização
por danos morais, o que importaria em dupla responsabilização, em afronta ao
princípio do non bis in idem, que veda a dupla sanção pelos mesmos fatos e fundamentos.
Malgrado a presunção tenha sido o remédio ministrado no julgamento – a ela nos
opomos, com reservas quanto à gravidade de cada caso – e com a ressalva de que
não acessamos as provas daqueles autos, a ponderação dos princípios (econômicos
versus humanos) e o respeito à importância e gravidade de cada qual sugerem que
a decisão foi justa, com base na lei (quanto à reintegração) e apesar da lei
(quanto à indenização não concedida). Nesse aspecto, digno de aplauso o
referido aresto, porquanto deva ser restritivamente interpretada a norma do
artigo 4o da Lei 9.029/95; adequada e compatibilizada sua aplicação conforme a
hipossuficiência (tanto econômica, quanto jurídica, desde que devidamente
comprovada) do trabalhador; e, se necessário, flexibilizada a Súmula 126 do
Tribunal Superior do Trabalho para que, em casos em que se discuta dispensa
discriminatória, possam os Ministros da mais alta corte laboral adentrar o
exame de fatos e provas, o que é premente e se mostra imprescindível nesse tipo
de demanda.
Destaque-se, por fim, que com a assunção da competência para julgar os feitos
cuja natureza era antes afeta à Justiça Comum, os operadores do Direito do
Trabalho deveremos, pari passu com o aprofundamento dos estudos acerca da
aplicabilidade e adequação dos institutos de Direito Civil e sem nos distanciar
da segurança jurídica necessária a um ramo do Direito intimamente ligado à
suavização ou agravamento do caos social, aprofundar cada vez mais a utilização
dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e valorização do
trabalho, ponderando-os com o da boa-fé (contratual e da empresa) aos quais
estão umbilicalmente ligados. Sempre ponderar os princípios entre si, para
depois mesclá-los com as normas positivas.
Em novos tempos para o ramo do Direito do Trabalho, para o bem da segurança
jurídica e do bem coletivo e estabilidade social, o sub-ramo (se assim podemos
chamar) do Direito Constitucional e Coletivo (na acepção mais ligada aos
interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos do que sindicais strictu
sensu) do Trabalho preferirá ao “Direito Civil do Trabalho” (terminologia
nossa), cuja concepção individualista – assim quer nos parecer – prestará
auxílio mais processual do que material, emprestando ferramentas mais ligadas
às soluções individuais do que àquelas de ordem pública ou social.
A coexistência pacífica destes dois sub-ramos, por meio de sua aglutinação no
campo maior de um Direito do Trabalho mais abrangente será, todavia, ao mesmo
tempo e sem risco de inviabilidade ou de cair na incoerência, plenamente
cabível, inovadora e enriquecedora da cultura jurídico-laboral.
Acresça-se, ainda, nesse contexto de coexistência de sub-ramos na seara
laboral, elementos de Direito Penal na aferição da discriminação (crimes contra
honra, v.g., calúnia; e contra o patrimônio, como o dano, etc.) e, por que não
dizer, influenciada pela Psicologia na definição do que é ou não
discriminatório para este ou aquele indivíduo, dotados de diferentes valores e
diferentes bagagens culturais (aqui incluindo as partes e os julgadores), pela
Medicina na questão dos acidentes do trabalho, etc..
Em apertada síntese, é possível concluir que os princípios éticos, morais e
gerais do direito, inclusive os princípios fundamentais constitucionalmente
assegurados, devem ser sopesados com as normas positivadas (por exemplo, na Lei
9.029/95) a fim de ensejar a mais justa e equânime aferição da discriminação na
despedida resolutiva do contrato de trabalho. Se necessário, os princípios
sobrepujarão as normas, bem como deverão ser balanceados entre si – quando
colidentes e ainda que parcialmente – para que os princípios mais relevantes
prefiram aos menos substanciosos.
Após período de adaptação e sedimentação da nova cultura, emergiremos todos –
com a ajuda da jurisprudência a se consolidar e de algum esforço inovador do
Legislativo no sentido de preencher as lacunas apontadas − a um status
que comporte pacificação e soluções preventivas no âmbito das empresas e
respostas prontas, céleres e adequadas, com distribuição de justiça aos
jurisdicionados da Especializada do Trabalho, a quem incumbirá pacificar o
entendimento acerca dos parâmetros principiológicos da despedida
discriminatória .
Referências Bibliográficas:
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho, LTr, 3a edição, São
Paulo, 2004, p. 1.121/1.122.
DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de: Nelson Boeira. São
Paulo: Martins Fontes, 2002.
REALE, Miguel. A Boa-Fé no Código Civil. Artigo publicado em
http://www.miguelreale.com.br (acesso em 15/12/2005)
RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho, LTr, 3a edição, São
Paulo, 2000.
--------------------------------------------------------------------------------
[1] DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução de: Nelson Boeira.
São Paulo: Martins Fontes, 2002.
[2] RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho, LTr, 3a edição,
São Paulo, 2000, p. 41.
[3] REALE, Miguel. A Boa-Fé no Código Civil. Artigo publicado no website
www.miguelreale.com.br em 16.08.2003
[4] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho, LTr, 3a edição,
São Paulo, 2004, p. 1.121/1.122.
[5] RR 2438/2001-069-09-00.3, in Notícias do Tribunal Superior do Trabalho
09/12/2005, extraída do website www.tst.gov.br
* Advogado Trabalhista em
São Paulo, Pós-Graduado e Mestrando em Direito do Trabalho pela PUC/SP.
Disponível em: < http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=751
>. Acesso em: 18/09/06.