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Leandro Moreira da Rocha Rodrigues*
Inúmeros são os questionamentos suscitados no momento em que as empresas
decidem pela transferência de sua localização, muitas vezes optando por outro
município, alongando as distâncias em relação à sua antiga sede,
conseqüentemente refletindo na situação do contrato de trabalho de seus
empregados.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) dispõe em seu artigo 469 sobre
a transferência de empregados para outras localidades, sendo certo que o § 2°
de referido dispositivo legal autoriza a transferência apenas quando ocorrer
a extinção do estabelecimento em que trabalha o empregado. Veja-se o texto
legal:
Art. 469 - Ao empregador é vedado transferir
o empregado, sem a sua anuência, para localidade diversa da que resultar do
contrato, não se considerando transferência a que não acarretar necessariamente
a mudança do seu domicílio.
§ 1º - (...)
§ 2º - É licita a transferência quando
ocorrer extinção do estabelecimento em que trabalhar o empregado.
§ 3º - (...)
Nesse sentido, em caso de extinção do estabelecimento em que trabalha o
empregado, poderá este ser transferido, sendo certo que a extinção parcial do
estabelecimento ou o mero fechamento do setor de trabalho não se coadunam com a
extinção do próprio estabelecimento, pois esta, de maior abrangência, supõe a
completa desativação das atividades empresariais na localidade de origem. A
supressão da atividade, e não do estabelecimento, não é suficiente para
autorizar a transferência do empregado. É esse, inclusive, o entendimento da
jurisprudência:
"Promoção. Não se considera desvio funcional a transferência de um empregado de um
setor extinto para outro. O ato faz parte do poder do empregador, para a
manutenção do contrato. A
transferência não gera direito de promoção ou de reenquadramento. É lícita
quando ocorrer extinção do estabelecimento em que trabalhar o empregado (CLT,
art. 468, parágrafo 2º)."
(TRT 2ª Região - RO n° 20000561350 - Acórdão n° 20010515512 - 9ª Turma –
Desembargador Relator Luiz Edgar Ferraz de Oliveira – DOESP 04/09/2001)
"TRANSFERÊNCIA. LICITUDE. EXTINÇÃO DO
ESTABELECIMENTO. Nos termos do
parágrafo 2º do art. 469 da CLT, a extinção do estabelecimento em que laborar o
empregado é pressuposto de licitude da ordem de transferência do local de
trabalho. Mero fechamento do setor de trabalho não se coaduna com a
extinção do próprio estabelecimento, pois esta, de maior abrangência, supõe a
completa desativação das atividades empresariais na localidade de origem. A
supressão da atividade, e não do estabelecimento, desautoriza a incidência da
exceção legal prevista no parágrafo 2º do art. 469 consolidado."
(TRT 2ª Região – RO n°19990432271 - Acórdão n° 20000639260- 8ª Turma –
Desembargadora Relatora Wilma Nogueira de Araújo Vaz da Silva – DOESP
16/01/2001)
"ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA - INDEVIDO NA TRANSFERÊNCIA DEFINITIVA. O fechamento do estabelecimento autoriza a transferência definitiva do
trabalhador, sendo indevido
o adicional de 25%, porque só obrigatório nas transferências provisórias."
(TRT 15ª Região – RO n°017123/1997 Acórdão n° 017123 – 1ª Turma –
Desembargador Relator Antonio Miguel Pereira – DOESP 01/12/1999)
Desta forma, ocorrendo a extinção do estabelecimento da empresa, deverá
ser oferecido aos empregados a possibilidade de transferência de seus contratos
de trabalho para a nova sede, sendo certo que em caso de recusa, poderá a
empresa rescindir o contrato, conforme entendimento jurisprudencial abaixo:
"EXTINÇÃO
DA EMPRESA - RECUSA DA TRANSFERÊNCIA - Nos termos do art. 469, parágrafo 2o, da CLT, é lícita a transferência
quando ocorrer extinção do estabelecimento em que trabalhar o empregado. Assim,
tendo a empresa encerrado suas atividades nesta capital, na oportunidade sendo
oferecido à reclamante a transferência do seu contrato de trabalho para a
matriz (São Paulo) e não tendo a mesma aceitado, correto o procedimento da 1a.
reclamada ao dispensá-la."
(TRT 3ª Região – Processo n° 01547-2003-005-03-00-9 - 3ª Turma –
Desembargadora Relatora Maria Cristina Diniz Caixeta – DJMG 21/08/2004)
Ainda assim, aceitando o empregado ser transferido em razão do
fechamento do estabelecimento e recebendo ajuda de custo para o deslocamento
(as despesas resultantes da transferência são de responsabilidade do empregador
– artigo 470 da CLT), deverá se apresentar no novo local de trabalho, sob pena
de ser caracterizada a figura do abandono de emprego, que autoriza a rescisão
do contrato de trabalho por justa causa.
Caso o empregado, além de não justificar o motivo de seu não
comparecimento, também obtenha novo emprego na antiga localidade, resta
plenamente demonstrada sua intenção subjetiva de abandonar o emprego, conforme
abalizado entendimento jurisprudencial. Senão vejamos:
"ABANDONO
DE EMPREGO - ART. 482, ALÍNEA "I", DA CLT. Na caracterização
da justa causa de abandono de
emprego, fixada pelo art. 482, alínea "i", da CLT, existe um elemento
objetivo, que é o afastamento do emprego, e um elemento subjetivo, consistente
na intenção de não mais retornar. Se a
prova dos autos revela que o empregado, tendo aquiescido na transferência
licitamente determinada, em razão da extinção do estabelecimento (art. 469,
parágrafo 2o., da CLT), recebe a ajuda de custo para o deslocamento e deixa de
se apresentar no novo local de trabalho, não atendendo à posterior convocação
do empregador, evidencia-se o elemento objetivo do abandono de emprego. Se,
além disso, o empregado tampouco justifica perante o empregador o motivo de não
o fazer, ainda obtendo novo emprego na antiga localidade, resta demonstrado o
ânimo de abandonar em relação ao anterior contrato de trabalho, acrescentando o
elemento subjetivo. Na situação fática assim retratada, aperfeiçoa-se a
figura jurídica do abandono de emprego, justa causa do empregado para a
dissolução do vínculo contratual."
(TRT 3ª Região – Processo n° 01426-2003-013-03-00-1 - 6ª Turma –
Desembargador Relator Sebastião Geraldo de Oliveira – DJMG 03/02/2005)
Para a configuração do abandono de emprego, há necessidade do
preenchimento dos seguintes requisitos: (i) ausência injustificada mais ou
menos longa (a jurisprudência fixa em torno de 30 dias), mas pode ser inferior
em caso de outras circunstâncias evidenciadoras, como o exercício de outro
emprego e (ii) intenção de abandono, que passados 30 dias compete ao empregado
o ônus de provar que não tinha a intenção de abandonar o emprego.
Com relação ao limite entre a distância do antigo e do novo
estabelecimento, prevê o artigo 469 da CLT, acima citado, que não se considera
transferência a que não acarretar necessariamente a mudança de domicílio do
empregado, ou seja, entende-se por transferência apenas o ato que obriga o
empregado a mudar seu domicílio, de modo que não tendo de mudar de domicílio em
razão da mudança de domicílio da empresa, inexistente a figura da
transferência.
O julgado abaixo, por analogia, serve de orientação a este caso, na
medida em que não considera transferência a alteração contratual que não
acarreta necessariamente a mudança de domicílio do empregado, sendo que
considera, ainda, que em se tratando de municípios limítrofes (e.g. São Paulo e
Guarulhos), não há que se falar em transferência, isto é, a empresa não é
obrigada a oferecer aos seus empregados a possibilidade de transferência de
seus contratos de trabalho para a nova sede, uma vez que não existe
transferência para fins legais.
"ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. ART. 469 DA CLT. A transferência que perdura por mais de cinco anos, até a extinção do
vínculo empregatício, tem natureza definitiva, incompatível com o pagamento do
adicional perseguido, por força do art. 469, § 3º, da CLT. Também não é considerada transferência aquela
alteração contratual que não acarreta necessariamente a mudança de seu
domicílio, por força do
disposto no art. 469, caput, da CLT. Se a residência da trabalhadora é
localizada em Santo André e sua remoção se dá para São Bernardo do Campo, esta
não é considerada para os efeitos do pagamento do adicional de
transferência, vez que são municípios limítrofes, sendo desnecessária a
mudança residencial. Adicional de transferência indevido."
(TRT 2ª Região – Processo n° 00498-2002-461-02-00 - Acórdão n°
20050440882 - 4ª Turma – Desembargador Relator Paulo Augusto Camara – DOESP
15/07/2005)
Com relação aos empregados que possuam garantia provisória no emprego,
como o cipeiro, dirigente sindical, gestante e acidentado ou equiparado,
importante se torna verificar alguns relevantes aspectos.
Ocorrendo a extinção do estabelecimento da empresa, não há que se falar
em manutenção da estabilidade garantida ao cipeiro, tendo em vista que a CIPA,
criada em determinado estabelecimento para a proteção de determinada
coletividade, quando da extinção do estabelecimento, fica sem objetivo e,
portanto, implica o término da estabilidade. A jurisprudência caminha nesse
sentido:
"CIPA. Extinção do estabelecimento.
Estabilidade. A estabilidade do cipeiro é direito que, embora individual, se
projeta para uma proteção coletiva, para torná-lo imune às pressões do empregador,
assegurando-se a efetividade da CIPA, à qual se atribui a função de investigar
acidentes, acusar deficiências, adotar medidas, tudo para garantir a saúde e a
segurança dos trabalhadores. Daí que se
a CIPA é formada em função de determinado estabelecimento (NR 5, item 5.2),
para a proteção de uma determinada coletividade, a extinção deste esvazia o
objetivo da CIPA e, por isso, implica o término da estabilidade. E ainda
que ocorra a transferência do local de trabalho, a estabilidade também não
persiste, pois a lei não obriga a coexistência de mais de uma CIPA para o mesmo
estabelecimento."
(TRT 2ª Região – Processo n° 01230-2002-074-02-00 - Acórdão n°
20030475850 – 3ª Turma – Desembargador Relator Eduardo de Azevedo Silva – DOESP
23/09/2003)
"ESTABILIDADE PROVISÓRIA - Membro da CIPA - Não subsiste à extinção de
estabelecimento. A transferência do cipeiro não se justifica: ou em outros setores e estabelecimentos já
há CIPA instalada e a atuação do trabalhador não encontraria oportunidade
porque preenchidos os cargos, ou neles dispensada legalmente a instalação da
CIPA. Artigos 10,II, do ADCT, 163 e 165 da CLT."
(TRT 2ª Região – Processo n° 02591-2000-065-02-00- Acórdão n°
20030651039 – 8ª Turma – Desembargadora Relatora Catia Lungov – DOESP
09/12/2003)
Desta forma, ao analisar a Norma Regulamentadora n° 5, que trata da
CIPA, em seu item 2, verifica-se que a referida comissão é constituída por
estabelecimento, de modo que não se pode transferir um cipeiro de um
estabelecimento para outro, sendo certo que a extinção de um estabelecimento
esvazia o objetivo da CIPA e, por isso, implica no fim da estabilidade.
"5.2 Devem constituir CIPA, por estabelecimento, e mantê-la em regular
funcionamento as empresas privadas, públicas, sociedades de economia
mista, órgãos da administração direta e indireta, instituições beneficentes,
associações recreativas, cooperativas, bem como outras instituições que admitam
trabalhadores como empregados."
Ainda assim, nos termos do inciso II da Súmula 339 do Tribunal Superior
do Trabalho, verifica-se que extinto o estabelecimento, não há despedida
arbitrária, sendo impossível a reintegração e indevida a indenização do período
estabilitário. Vejamos:
"339 - CIPA. Suplente. Garantia de
emprego. CF/1988. (Res 39/1994, DJ 20.12.1994. Nova redação em decorrência da
incorporação das Orientações Jurisprudenciais nºs 25 e 329 da SDI-1 - Res.
129/2005, DJ. 20.04.2005)
I - O suplente da CIPA goza da garantia de
emprego prevista no art. 10, II, "a", do ADCT a partir da promulgação
da Constituição Federal de 1988. (ex-Súmula nº 339 - Res 39/1994, DJ 20.12.1994
e ex-OJ nº 25 - Inserida em 29.03.1996)
II - A estabilidade provisória do
cipeiro não constitui vantagem pessoal, mas garantia para as atividades dos
membros da CIPA, que somente tem razão de ser quando em atividade a empresa.
Extinto o estabelecimento, não se verifica a despedida arbitrária, sendo
impossível a reintegração e indevida a indenização do período estabilitário.
(ex-OJ nº 329 - DJ 09.12.2003)"
Também o dirigente sindical não tem assegurada a sua estabilidade em
caso de fechamento do estabelecimento da empresa, nos termos do inciso IV da
Súmula 369 do Tribunal Superior do Trabalho, que segue abaixo:
"369 - Dirigente sindical. Estabilidade provisória. (Conversão das
Orientações Jurisprudenciais nºs 34, 35, 86, 145 e 266 da SDI-1 - Res.
129/2005, DJ 20.04.2005)
I
– (...)
II
– (...)
III
– (...)
IV - Havendo extinção da atividade empresarial no âmbito da base territorial
do sindicato, não há razão para subsistir a estabilidade. (ex-OJ nº 86 - Inserida em 28.04.1997)
V – (...)"
Neste caso, somente persistiria a garantia no emprego se a mudança da
localidade da empresa se desse na mesma base territorial de atuação do
Sindicato do qual o empregado é dirigente.
Com relação à gestante, por outro lado, não fica o empregador
desobrigado do pagamento dos salários do período da estabilidade provisória,
conforme entendimento jurisprudencial abaixo:
"EMENTA: ESTABILIDADE PROVISÓRIA
GESTANTE. EXTINÇÃO DA EMPRESA. INDENIZAÇÃO. Havendo confirmação da gravidez,
anterior à dispensa, deve a empresa arcar com o ônus dos pagamentos
indenizatórios, entre eles, o salários devidos d o período da estabilidade. A extinção da empresa não desobriga o
empregador do pagamento dos salários do período da estabilidade provisória da
gestante (Art. 10, inc. II, letra b, do ADCT)."
(TRT 15ª Região – RO n° 011760/1992 – 5ª Turma – Desembargador Relator
Voldir Franco de Oliveira)
Esse entendimento também se aplica ao empregado acidentado, ou seja,
ocorrendo o encerramento das atividades da empresa, deverá esta indenizar o
período correspondente à estabilidade provisória acidentária. Sendo assim, na
impossibilidade de reintegrar o trabalhador, em virtude da extinção da
atividade empresarial, deverá a empresa pagar-lhe a indenização substitutiva. A
jurisprudência caminha nesse sentido:
"EMENTA - ACIDENTE DE TRABALHO - ENCERRAMENTO DA ATIVIDADE NA UNIDADE INDUSTRIAL EM
QUE TRABALHAVA O RECLAMANTE. - REINTEGRAÇÃO. O encerramento das atividades na filial da empresa onde trabalhava o
Reclamante, motivado em rescisão do contrato de arrendamento do parque
industrial, não é capaz de eximir a Reclamada da obrigação de indenizar o
período correspondente à estabilidade provisória acidentária. Sobreleva destacar que, na
impossibilidade de reintegrar o trabalhador, em virtude da extinção da
atividade empresarial, deve o Empregador pagar-lhe indenização substitutiva,
após a cessação do recebimento do benefício previdenciário, isto porque a
finalidade maior insculpida no art. 118 da Lei n.o 8.213/91 é, exatamente, a
proteção do empregado acidentado, na volta ao trabalho.’
(TRT 3ª Região – Processo n° 01022-2006-057-03-00-5 – 8ª Turma –
Desembargador Relator Márcio Ribeiro do Valle - DJMG 19-12-2006)
Com base em todo o exposto, pode-se concluir que, em caso de fechamento
do estabelecimento da empresa, nada obsta na transferência dos empregados, vez
que, conforme sábio ensinamento de Délio Maranhão, "nem pode o empregado recusar-se a acatar a
ordem de transferência alegando razões de ordem pessoal, por mais respeitáveis
que sejam" [1]. Havendo
recusa do empregado e não comparecendo ao novo local da prestação dos serviços,
é aplicável a dispensa por justa causa decorrente de abandono de emprego
(artigo 482, "i", da CLT).
Caso a nova sede da empresa se localizar na mesma cidade da antiga sede
ou em município próximo (limítrofe), sequer é necessário que a empresa ofereça
aos seus empregados a possibilidade de transferência de seus contratos de
trabalho, tendo em vista que não haverá necessidade de alteração do domicílio
destes e, conseqüentemente, não haverá transferência, para fins legais.
NOTA
[1] MARANHÃO, Délio. Instituições
de Direito do Trabalho. Volume 1. 22ª Edição. São Paulo: LTr, 2005, p. 553
BIBLIOGRAFIA
HASSAN, Jamil Ahmad Abou. Processo do
Trabalho: Prática e Teoria. São Paulo: Editora WVC, 1ª Edição, 2002.
MARANHÃO, Délio. Instituições
de Direito do Trabalho. Volume 1. 22ª Edição. São Paulo: Editora LTr, 2005.
MARTINS. Sérgio Pinto. Direito
Processual do Trabalho. São Paulo, Editora Atlas, 25ª Edição, 2006.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao
Direito do Trabalho. São Paulo, Editora LTR, 30ª Edição, 2004.
SILVA, De Plácido e. Vocabulário
Jurídico. Rio de Janeiro. Editora Forense, 26ª edição, 2005
JORGE NETO, Francisco Ferreira e PESSOA CAVALCANTE,
Jouberto de Quadros. Manual de Direito do Trabalho. Rio de Janeiro, Editora Lúmen Júris, 1ª
Edição, 2003
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito
do Trabalho. São Paulo, Editora LTR, 4ª Edição, 2005.
CARRION, Valentin. Comentários à
Consolidação das Leis do Trabalho. São Paulo, Editora Saraiva, 31ª Edição
atualizada por Eduardo Carrion, 2006
* Bacharelando em
Direito em São Paulo (SP).
Disponível em:
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11678
Acesso em: 04 set.
2008.