Breves
considerações sobre a multa prevista no art. 477 celetista e sua vinculação
direta e exclusiva ao ato jurídico "pagamento"
Ney Stany Morais Maranhão
*
1. Introdução
Em tempos de nova reforma do CPC e amplo debate acerca das
dimensões jurídicas promovidas pela EC 45/2004, ainda assim, em seu cotidiano,
o magistrado trabalhista se vê frente a frente com polêmicas que envolvem
antigas espécies legais.
Esse parece ser o caso do artigo 477 do Texto Consolidado,
cujo conteúdo e alcance jurídicos têm rendido ensejo a debates de relevo no
âmbito dos tribunais.
Neste breve escrito, a análise dar-se-á apenas quanto a
uma das controvérsias que envolvem o assunto. Com efeito, limito-me a apontar,
objetivamente, as razões que delineiam, no meu sentir, o escorreito raciocínio
jurídico no tocante à multa prevista no artigo 477, § 8º, da CLT, quando o ato
jurídico pagamento é efetivado dentro dos prazos previstos no parágrafo
6º do mesmo dispositivo de lei, ocorrendo, todavia, o ato jurídico homologação
somente em momento posterior.
Avalio, então, nesse quadro delineado, se há ou não
viabilidade na pretensão de percepção da multa respectiva.
2. O Artigo 477, parágrafo 8º, da CLT, e sua
vinculação ao pagamento rescisório
A multa do artigo 477 celetista está prevista em seu
parágrafo 8º, que assim dispõe:
"A inobservância do disposto no § 6º
deste artigo sujeitará o infrator ... (omissis) ... ao pagamento da
multa a favor do empregado..." (grifo meu)
O § 6º citado, cuja inobservância implica o direito à
multa, aduz:
"O pagamento das parcelas constantes
do instrumento de rescisão ou recibo de quitação deverá ser efetuado nos
seguintes prazos..." (grifo meu)
Logo, a multa é cabível tão-somente quando acorre o pagamento
intempestivo ou não pagamento das parcelas
rescisórias.
A lei, neste particular, é clara, sendo que o cabimento da
penalidade, como se vê, nada diz respeito ao fato de ter havido ou não
homologação da rescisão contratual, pois o dispositivo vincula expressamente a
incidência da multa, repito, ao ato pagamento, não ao ato homologação.
Note-se que o ato homologação recebe normatização
legal no § 4º, que, por sua vez, não fora mencionado no § 8º - preceito esse
que dá guarida à multa em apreço.
Portanto, uma análise menos açodada do texto legal
demonstra que, a bem da verdade, o simples pagamento oportuno das verbas
rescisórias, em obediência aos prazos fixados no § 6º do artigo 477 da CLT, é
fator suficiente para ilidir a multa prevista no § 8º.
Assim, a escorreita exegese legal implica o manuseio
tão-só dos dispositivos constantes dos §§ 6º e 8º do artigo 477 da CLT, não
havendo que se averiguar as nuances estabelecidas em seu § 4º, por
impertinente, à vista dos claros termos da norma em foco.
De mais a mais, sabe-se que, tratando-se de norma que
encerra penalidade, a interpretação aplicada há de ser necessariamente
restritiva, regra essa das mais comezinhas no campo profícuo da hermenêutica.
Vale apontar que, em tese, a homologação realizada fora
dos prazos citados no § 6º, tout court, prejuízo algum acarreta ao
obreiro, desde que suas verbas rescisórias tenham sido pagas em tempo oportuno.
Outro ponto relevante: como o eixo normativo do artigo
gira em torno do ato pagamento, por certo está se referindo a uma típica
obrigação consistente em pagar valores. Não se cogita, pois, em obrigação de
fazer, tal qual a corriqueira hipótese do fornecimento das guias do
seguro-desemprego.
É claro que, em qualquer caso, em havendo abuso patronal
e/ou delonga no fornecimento das guias do seguro-desemprego, de modo a
proporcionar dano, descortina-se a favor do obreiro a alternativa de deduzir a
pretensão indenizatória pertinente junto à Justiça Laboral (Constituição
Federal, artigo 5º, inciso XXXV).
3. Conclusão
A multa prevista no artigo 477, § 8º, da CLT, nada tem a
ver com o fato de ter ocorrido ou não a homologação rescisória, pois o
dispositivo canaliza expressamente a incidência da multa à inobservância do
prazo do § 6º, que trata do ato pagamento, não do ato homologação.
Pleitear a referida multa, carecendo de amparo legal e não
se fundando em qualquer tipo de prejuízo, configura intento estritamente
patrimonial, individualista, calcado em mero formalismo, o que afasta a
inarredável função social que deve revestir qualquer direito invocado - como
sabiamente já doutrinava Josserand...
* Juiz do Trabalho substituto em Belém
(PA).
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8610>. Acesso em: 07 jul. 2006.