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A sentença ultra, citra e
extra petita no Direito Processual do Trabalho: cabíveis
ou ilegais?
Carmen Roberta dos Santos advogada em Recife (PE)
I
- Direito versus faculdade
Sabemos
que Direito é uma faculdade, onde a parte lesada poderá ou não procurar a
prestação jurisdicional do Estado, fazendo valer esse direito.
Normalmente,
o direito lesado de uma pessoa faz com que a mesma almeje o sucesso
jurisdicional através de um processo até se chegar a sentença positiva, ou
melhor dizendo, que ocorra uma sentença reconhecendo a procedência do que foi
pedido, mas para que tudo isso aconteça, faz-se necessário o interesse de agir
da parte prejudicada, provocando o poder jurisdicional, através de uma ação,
caso contrário, não será possível se chegar ao reconhecimento ou não de um
direito; temos nesse caso supra uma faculdade da parte de pedir ou não a
efetiva realização do que realmente lhe pertence, pois caberá ao Juiz dar a
cada um o que é seu.
Vale
salientar que enquanto na faculdade absoluta de um direito, a parte prejudicada
poderá abrir mão do mesmo, renunciando-o, há casos em que ela não poderá optar,
porque independe do livre arbítrio aquele direito, sendo este indisponível ou
irrenunciável.
No
Direito do Trabalho, temos o exemplo do direito às férias do empregado como um
direito irrenunciável. Se o trabalhador renunciar a suas férias, não terá
qualquer validade este ato do operário, podendo o obreiro reclamá-las na
Justiça do Trabalho.
Vejamos o
que dispõe o artigo 9º da Consolidação das Leis Trabalhistas:
"Serão nulos de pleno direito os
atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação
dos preceitos trabalhistas".
E no
mesmo sentido o artigo 444 do mesmo diploma legal:
"As relações contratuais de
trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo
quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos
coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes".
Mesmo
assim, poderá o trabalhador renunciar a seus direitos se estiver em juízo,
diante do juiz do trabalho, através da transação, mas esta deverá ser
interpretada restritivamente segundo o artigo 114 do Código Civil.
Concluímos
então que, estando o empregado na empresa é que não poderá falar em renúncia a
direitos trabalhistas, pois poderia dar ensejo a fraudes, e que nem todo
direito irrenunciável poderá ser renunciado através da transação pelo empregado
na Justiça do Trabalho. É o que dispõe o Enunciado 276 do TST, in verbis:
"O Direito ao aviso prévio é
irrenunciável pelo empregado. O pedido de dispensa de cumprimento não exime o
empregador de pagar o respectivo valor, salvo comprovação de haver o prestador
dos serviços obtido novo emprego".
Acrescenta ainda o ilustre doutrinador Sérgio Pinto
Martins (2003: 78): "não se pode falar em transação quanto ao direito às
verbas rescisórias, que são, inclusive, irrenunciáveis pelo trabalhador. Nesse
caso, não há res dubia, pois as verbas rescisórias são devidas".
Enfim,
temos que o direito é uma faculdade desde que esta não seja limitada a um
direito indisponível ou irrenunciável, pois acima da vontade humana,
encontra-se aqueles direitos constitucionais de ordem pública que delimitam a
justiça e o bem comum da sociedade.
II
- Finalidade da sentença
A
finalidade da sentença segundo Manoel Antônio Teixeira Filho (1996: 291) "(...) decorre não só das posições jurídicas antagônicas que as
partes assumem na relação processual, mas da própria visão política que o
Estado tem do processo, como método oficial de solução de conflitos de
interesses.
Desse modo, se considerarmos o ponto de vista
exclusivo do autor, concluiremos que a sentença tem como finalidade
assegurar-lhe um bem ou uma utilidade da vida, ou seja, satisfazer-lhe uma
pretensão, a que o réu resiste (...)".
Já em
relação ao réu, o ilustre doutrinador salienta:
"(...) veremos que, para ele, o fim da sentença reside na declaração de
que não está obrigado a realizar o ato, ou a abster-se de praticá-lo, ou de
quem nem sequer houve, ou há, entre ele e o autor, uma relação jurídica (...)
Para o Estado-juiz, o escopo da sentença repousa,
certamente, na solução da lide, podendo-se afirmar, sob esse prisma, que a
sentença representa a resposta jurisdicional do Estado às pretensões
manifestadas pelas partes da causa, sem perder-se de vista o fato de a
jurisdição constituir, nos modernos sistemas legais, monopólio estatal".
Dizemos,
então, complementando o raciocínio do douto mestre que o objetivo da prestação
jurisdicional, através da sentença, varia de acordo com o efeito declaratório,
constitutivo e executivo da mesma, apresentando sensíveis variações de
finalidade, e que o Juiz é o representante estatal, donde o seu poder de
decisão não está delimitado somente as vontades dos litigantes, mas de fazer
valer a aplicabilidade da lei querida pelo Estado, isto quer dizer que nem
sempre é o pedido da parte o foco maior do ato decisório do Juiz, mas a
efetividade da norma, da justiça e do bem comum.
III
- Sentença ultra, extra e citra petita
Como
sabido, sentença é o pronunciamento jurisdicional decidido pelo juiz pondo fim
ao processo com ou sem julgamento do mérito.
As
decisões prolatadas pelo magistrado em regra não podem conhecer senão das
questões suscitadas e não podem decidir senão nos limites em que a ação foi
proposta. São o que defendem os artigos 128 e 460 de nossa lei instrumental
cível:
Art. 128 "O Juiz decidirá a lide
nos limites em que foi proposta sendo-lhe defeso conhecer de questões, não
suscitadas a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte."
Art. 460 "É defeso ao Juiz proferir
sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o
réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado."
Ao
contrariar-se as regras supramencionadas, teremos sentenças extra petita, ultra
petita e citra petita.
A
sentença extra petita segundo o nosso professor Paulo Alcântara (2004: 03)
"incide em nulidade porque soluciona causa diversa da que for proposta através
do pedido (...)".
Sentença
extra petita quer dizer decisão fora do que foi pedido.
Em
relação a sentença ultra petita, salienta, ainda, o ilustre mestre que
"(...) aqui, o juiz decide o pedido, mas vai além dele, dando ao autor
mais do que fora pleiteado (art. 460). A nulidade, então, é parcial, não indo
além do excesso praticado, de sorte que, ao julgar o recurso da parte
prejudicada, o Tribunal não anulará todo o decisório, mas apenas decotará
aquilo que ultrapassou o pedido".
E ainda
explica que, "a sentença, enfim, é citra petita quando não examina todas
as questões propostas pelas partes (...)
Em
resumo, temos que sentença extra petita é aquela que decide fora do que foi
pedido, a sentença ultra petita é aquela que vai além decidindo a mais do que foi
pedido e a sentença citra petita é aquela que apresenta-se incompleta, não
resolve todos os pedidos formulados, decidindo a menos do pleiteado.
Discorrendo
ainda em linhas gerais, dizemos que ocorrem sentenças extra e ultra petita no
Direito Processual Trabalhista, admissíveis por opiniões jurisprudenciais dos
nossos Tribunais como podemos exemplificar.
"A condenação em quantia superior à pedida
constitui decisão ultra petita, que não anula a sentença, pois admite a redução
aos limites do que foi pleiteado" (TFR, Ac. un, 3ª T., 10.12.82, AP
78.515-SE, rel. Min. Carlos Madeira, DJ de 3.3.83, p. 1884, apud Alexandre de
Paula, ob. cit., v. 2/604).
Em
relação ao julgamento ultra petita temos, como exemplo:
"Se o julgamento ultra petita se resolve em
excesso de valor, o Tribunal pode simplesmente reduzir o montante, em vez de
anular a sentença" (TJRJ, Ac. un., 5ª C, 17.882, Ap. 22. 616, rel. Des.
Barbosa Moreira, apud Alexandra de Paula, ob. cit., p. 604).
Observemos
então que no Direito Processual Trabalhista não é admissível as sentenças citra
petita, sendo irrecusável a nulidade, posto que defeso à instância recursal
decidir de matéria sem que a primeira instância haja antes apreciado. Nesse
caso, ter-se-ia a supressão de instância.
Podemos
destacar que há divergências doutrinárias sobre o assunto em tela. É que para
uma corrente é inadmissível aceitar sentença ultra petita. É o que aduz a
doutrina de Frederico Marques apud Francisco Antônio de Oliveira (1999:
573/74): "No direito brasileiro, o juiz não pode iniciar o processo ex
officio, conforme bem claro se encontra no art. 2º, in verbis: Nenhum juiz
prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a
requerer, nos casos e formas legais. É o princípio do nemo judex sine actore. Além
disso, outro princípio vigora, que é o de "sententia debet esse conformis
libelle", e o que o art. 128 assim expressa: O juiz decidirá a lide nos
limites em que foi proposta. Proibido está, assim, o julgamento ultra petita,
bem como o julgamento fundado na causa petendi diversa daquela, com que na
petição inicial se delimitou a área do litígio. Tanto isto é certo que o art.
264, parágrafo único, ao proibir a mutatio actionis depois do saneamento do
processo, faz referência ao pedido e à causa de pedir.
Dispõe Fadel
(Código de Processo Civil Comentado, Konfino, 1974, t. III/25 e 26): "O
julgamento extra ou ultra petitum (...) acarreta a nulidade da sentença".
Preleciona
Alexandre de Paula (CPC Anotado, Ed. RT, 1986, 3ª ed., v. II/597): "A
sentença pode apresentar-se incompleta, por não enfrentar e resolver todos os
pedidos formulados (citra petita); pode concluir selecionando coisa
inteiramente fora dos pedidos (extra petita); e pode, além de dar deslinde às
questões apresentadas, ir além e conceder mais do que foi pedido (ultra
petita). Nas duas primeiras hipóteses a sentença será nula, devendo outra ser
prolatada em conformidade aos libelos; no último caso, a nulidade atinge apenas
as parcelas transbordantes dos pedidos".
Moacyr
Amaral Santos, com respaldo em Gabriel Rezende Filho, afirma que: "Em
ambos os casos, quer no de sentença ultra petita, quer no de sentença extra
petita, será ela ineficaz e nula, ocorrendo que no primeiro caso possa ser
reduzida no juízo superior, "sempre que a coisa ou o valor sobre que recair
a redução estiver expressamente mencionado na sentença (...)". Igualmente,
ineficaz e nula é a sentença citra petita (Primeiras Linhas, Saraiva, v. 3º/
23).
Na mesma
esteira trilha Vicente Greco Filho (Direito Processual Brasileiro, Saraiva, v.
2º/226): "A sentença que julga além do pedido se diz ultra petita, a que
julga fora do pedido se diz extra petita. Tais sentenças são nulas, como nula é
a sentença citra petita, qual seja a que deixa de apreciar pedido expressamente
formulado. Esta última viola o princípio da indeclinabilidade da
jurisdição"".
Existem
algumas jurisprudências dos nossos Tribunais corroborando com tais opiniões. Senão
vejamos.
"Julgamento extra petita. Em ocorrendo, deverá
parte usar do remédio próprio (art. 464, CPC) para questionar a matéria em
futuro recurso. Não o fazendo, incorre na preclusão, não podendo a jurisdição
recursal conhecer da matéria originariamente, pena de supressão de instância. (TRT/SP 02890082703, Ac. 4ª
T. 16.198/90, rel. Francisco Antônio de Oliveira, DJ 31.8.90,
Boletim do TRT, 2ª R., n. 13/90, p. 182)".
"Julgamento extra petita. O poder do magistrado
de apreciar o pedido sob todos os ângulos, não lhe confere, todavia, a
possibilidade de julgar extra ou ultra petita. A sentença há de ater-se aos
limites firmados pelo libelo. Ao Juiz é defeso ir além do postulado (TRT/SP
02880036911, Ac. 4ª T., 9.8490/89, rel. Francisco Antônio de Oliveira, DJ
5.6.90, Boletim do TRT, 2ª R., 90, p. 25)".
"Origem Tribunal: Tst Acórdão Num: 1245 Decisão:
19 05 1987 Proc: Rr Num: 5988 Ano: 1986 Região: 01 Uf: Rj
Recurso De Revista Orgão Julgador - Segunda Turma
Turma: 02
Fonte Dj Data: 12 06 1987 Pg: 11951
Relator Ministro Prates De Macedo
Ementa É Defeso ao Juiz proferir sentença em objeto
diverso do que lhe foi demandado, em favor de qualquer das partes. A Sentença
'''' Extra Petita '''' é nula porque decide causa diferente da que foi posta em
juizo, na inicial ou em recurso. Revista conhecida e provida. Indexação
Julgamento '''' Extra Petita ''''.
Catálogo Aa0807 Julgamento Extra Petita Aa0903
Nulidade".
Nesse
primeiro ponto vimos a corrente que é contra as sentenças ultra, citra e extra
petita. Vejamos agora a corrente que admite esta prerrogativa.
Assim a
doutrina de Francisco Antônio de Oliveira (1999: 573): "temos para nós que
o julgamento ultra petita e o extra petita não desafia a nulidade da sentença. Em
casos tais, pode a instância recursal eliminar o excesso, reformando o
decisório naquela parte. Todavia, em se cuidando de julgamento citra petita,
irrecusável a nulidade, posto que defeso à instância recursal decidir de
matéria sem que a primeira instância haja antes apreciado. Nesse caso ter-se-ia
a supressão de instância, o que não ocorreria com o julgamento ultra petita e
extra petita. Suponhamos, entretanto, que a sentença tenha solucionado coisa
diversa do pedido; se também solucionou o pedido, temos a nulidade, não por
haver decidido extra petita, vez que esta parte poderá ser extirpada pela
instância recursal, mas pelo julgamento citra petita".
Amauri
Mascaro Nascimento chama esse ato decisório sentença ultra e extra petita como
"um direito processual social, destinado, principalmente, à tutela
jurisdicional de grupos ou coletividades e não um direito processual
individual), dão margem à sentença trabalhista nítida natureza ultra
peticional, como proclama Nelson Niciliello.
Para
Amador Paes de Almeida( 1999:210/11), " sustentamos mais, para afirmar,
sem receio de dúvidas, que a sentença trabalhista pode e deve ser, em
determinadas circunstâncias, extra petita, notadamente quando o julgador, na
decisão, adapta a pretensão à hipótese legal, o que pode ocorrer, inclusive, na
seguinte oportunidade:
" Um empregado ingressa em juízo com uma ação
trabalhista utilizando-se do jus postulandi, portanto, sem assistência de advogado.
Pretende, na inicial, entre outras postulações, o aviso prévio, sob a alegação
de despedida injusta.
No decorrer da instrução se verifica que o reclamante,
quando de sua admissão, assinara um contrato de experiência, pelo prazo de 90
dias, tendo a sua dispensa ocorrido antes do término do contrato em apreço.
O contrato de experiência, contudo, não possui
cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão antes de expirado o
termo ajustado ( quando só então o aviso prévio seria devido, na forma do que
dispõe o art. 481 da CLT). Apurada a despedida imotivada ao julgador é dado
aplicar a regra contida no art. 479 da CLT, condenando o empregador, a pagar no
lugar do aviso prévio a indenização por metade, da remuneração que seria devida
ao reclamante até ao término do contrato de experiência".
Tal
decisão, inegavelmente extra petita ( fora do pedido do autor ), não poderia
ser, a nosso ver encarada como nula ( o que fatalmente ocorreria no cível),
mas, ao revés, como forma plena de justiça social adequada à natureza do
processo do trabalho e ao caráter protecionista do direito material do
trabalho.
Absurdo
seria julgar improcedente a postulação obrigando o trabalhador ( após exaustiva
espera) a propor nova ação para buscar um direito que a sentença extra petita
poderia, desde logo, conceder-lhe.
Esses
fatores dão à sentença trabalhista uma dimensão que está a indicar a
necessidade de estudos mais profundos, e despidos dos formalismos do direito
processual comum, da efetiva natureza jurídica da sentença em apresso, para pôr
em destaque na expressão de Amauri Mascaro Nascimento, " A maior liberdade
íntima e criativa do Juiz".
Admitindo-se,
ao revés a observância do limites traçados pelo art. 460 do Código de Processo
Civil que veda a sentença ultra ou extra petita, a rigor não há falar em
nulidade do julgado, pois tal sentença pode ser reformada mediante recurso como
bem ressalta Eduardo Gabriel Saad :
" São reformáveis mediante recurso, sentença que
julgue extra petita "fora do pedido do autor" e ultra petita ( mas do
que já foi pedido)"".
Em
relação a opinião jurisprudencial, temos:
" Julgamento extra petita. O julgamento ultra
petita e extra petita não se traduz em vício capaz de determinar a nulidade do
julgado, posto que imperfeições de julgamento ultra e extra petita poderão ser
sanadas pela instância ad quem. Tão somente o julgamento citra petita fere de
nulidade o julgado, vez que determina a supressão de instância( TRT/ SP
02890016590, Ac. 4ª T. 8. 955/90, relator Francisco Antônio de Oliveira DJ
25/05/90, boletim do TRT, 2ª R., n. 9/90, p. 141)".
"Enunciado 211. O juros de mora e a correção
monetária incluem-se na liquidação ainda que omisso o pedido inicial ou
condenação."
"O art. 467 da CLT autoriza julgamento ultra
petita, pois a parte pede salário e a junta determina o pagamento em 50% a mais
desses salários incontroversos, que não foram pagos na primeira audiência em
que o reclamado compareceu em juízo.
O art. 496 da CLT permite o julgamento extra petita
quando determina o pagamento de indenização em dobro, em vez de condenar a
empresa a reintegrar o empregado estável. Os dois dispositivos legais são,
entretanto, dirigidos ao Juiz, que os deverá aplicar independente de pedido.
Caso a sentença não venha a resolver todo o conflito,
a decisão será considerada infra petita. A parte deverá interpor embargos de
declaração para que a decisão possa ser complementada. A sentença que não
examina toda a postulação dos autos é porém, nula". ( MARTINS, 2000: 317).
Vimos
então que doutrina e jurisprudência divergem sobre o assunto, é aplicável no
direito processual do trabalho as sentenças extra e ultra petita objetivando a
justiça social e a proteção da parte mais fraca, o empregado. Mas infelizmente
há uma confusão por parte dos doutrinadores, quando exemplificativamente,
desnorteiam o sentido da norma trabalhista aplicável ao caso concreto. Uma
dessas aberrações podemos deslumbrar da justificativa dada ao art. 467 supra,
como julgamento ultra petita permitida por esse dispositivo legal. Isso não é
verdade, pois o sentido daquele artigo é de valoração punitiva, sancionatória,
quando permite pagamento em dobro de salários incontroversos, quando não pagos
na primeira audiência. Ora, data máxima vênia, o instituto legal quis dizer que
caso não se cumpra com o estabelecido na audiência inaugural, daquilo que se é
incontestável, caberá ao infrator pagar indenização em dobro como uma forma de
se punir pelo descumprimento expresso naquela norma jurídica, sendo assim, não
há que se falar em julgamento ultra petita mas julgamento punitivo,
sancionatório.
IV - Por
uma opinião final: os direitos irrenunciáveis no direito laboral e a
problemática das sentenças ultra e extra petita
Vimos que
no direito processual trabalhista, há divergências doutrinárias e jurisprudenciais
sobre o tema em comento, como nos foi possível detectar em estudos anteriores. No
entanto, parece-nos de maior aplicabilidade a corrente doutrinária e
jurisprudencial que filiou-se na concordância das decisões ultra e extra
petita, visando a justiça social.
Ao nosso
ver, a aplicabilidade de sentenças ultra e extra petita no processo do trabalho
deveria ocorrer de uma forma excepcional, como naqueles casos de direitos
irrenunciáveis do empregado, direitos estes considerados constitucionais de
ordem pública, onde o que prevalece nessa ocasião é o interesse público e não o
particular, a vontade do litigante é menor que o interesse coletivo. Para
melhor explicitarmos, esta terceira corrente doutrinária, a qual optamos e
criamos, esta numa assertiva da aplicabilidade das decisões ultra e extra
petita de uma forma mais restritiva que é somente aplicável nos casos de
direitos indisponíveis e irrenunciáveis, para que haja o equilíbrio do vínculo
empregatício e o bem estar dos direitos sociais do trabalhador.
Vejamos
diante desta assertiva um exemplo:
Proclama
o Enunciado 276 do TST: "O direito ao aviso prévio é irrenunciável
pelo empregado. O pedido de dispensa de cumprimento não exime o
empregador de pagar o respectivo valor, salvo comprovação de haver o prestador
dos serviços obtido novo emprego"(grifo nosso).
No
exemplo dado sobre a irrenunciabilidade, vemos que nesse caso, exemplificativa
e excepcionalmente, o juiz poderá decidir ultra ou extra petita quando não
alegado e não pedido pelas partes, pelo motivo de que trata-se de um direito
involuntário, independente da vontade do litigante.
Vimos
também, anteriormente, que há direitos irrenunciáveis, propensos ao instituto
da transação, vide tópico 1º, neste caso, o juiz não há o que se falar em
decisão, ultra ou extra petita, pois a partir do momento em que as partes
transacionam sobre aqueles direitos em juízo, entra-se no mérito, e com certeza
será detectável pelo juiz se aquela transação interessará ou não aos litigantes
como parte do pedido.
Fazendo-se
então parte do pedido, transacionados pelos litigantes, não haverá decisão
ultra ou extra petita, mas uma homologação deferida pelo Juiz do que se foi
acordado em audiência.
A nossa
terceira corrente, então, defende que a decisão ultra e extra petita, só será
admissível em casos excepcionais, já elencados in supra, frise-se, daqueles
direitos irrenunciáveis do empregado e insuscetíveis de transação pelos
litigantes.
Desta
forma, teríamos mais segurança tanto para as partes como para o juízo nas
decisões prolatadas nos litígios trabalhistas, pois direito indisponível
significa dizer, direito involuntário, independente da vontade alheia, para se
atingir um bem maior, o direito social, de uma coletividade, de ordem
constitucional e pública.
Para
finalizarmos estes estudo, dizemos, ainda, que as decisões ultra e extra petita
não feririam o princípio do contraditório e da ampla defesa, pela mesma
logicidade que aponta Eduardo Gabriel Saad: "São reformáveis mediante
recurso, sentença que julgue "extra petita"(fora do pedido do autor)
e "ultra petita"(mais do que foi pedido".
Nessa
caso, é dado a parte interessada e que sentir-se prejudicada recorrer daquela
decisão ultra ou extra petita, porém lembrando-se a importância de que não
podem haver decisões arbitrárias, sentenças prolatadas fora ou além do pedido
de qualquer forma, mas somente aqueles como já sabemos, de direitos
indisponíveis e irrenunciáveis.
Vejamos
um exemplo outrora citado e que para nós não poderia ter sido decidida da forma
como o foi:
" Um empregado ingressa em juízo com uma ação
trabalhista utilizando-se do jus postulandi, portanto, sem assistência de
advogado. Pretende, na inicial, entre outras postulações, o aviso prévio, sob a
alegação de despedida injusta.
No decorrer da instrução se verifica que o reclamante,
quando de sua admissão, assinara um contrato de experiência, pelo prazo de 90
dias, tendo a sua dispensa ocorrido antes do término do contrato em apreço.
O contrato de experiência, contudo, não possui
cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão antes de expirado o
termo ajustado ( quando só então o aviso prévio seria devido, na forma do que
dispõe o art. 481 da CLT). Apurada a despedida imotivada ao julgador é dado
aplicar a regra contida no art. 479 da CLT, condenando o empregador, a pagar no
lugar do aviso prévio a indenização por metade, da remuneração que seria devida
ao reclamante até ao término do contrato de experiência".
Nesse
caso in supra, o juiz decidiu arbitrariamente, pois já que não existia o
direito ao aviso prévio para o empregado, devido ao contrato de experiência
apresentado pela empresa, deveria o julgador decidir somente pela improcedência
do pedido.
A
indenização do art. 479 da CLT pela despedida imotivada, é um direito como
qualquer outro elencado pela Consolidação, não deverá o juiz ater-se a
substituição de direitos no processo; nesse caso deverá o empregado propor nova
ação.
São por
esses e outros motivos que há um perigo na liberação de decisões extra e ultra
petita, trazendo insegurança para os litigantes e para o juízo.
Ao
julgador é lícito ater-se a imparcialidade, porém, como operador e fiscalizador
do direito limitar-se-á em suas decisões aos pedidos e, excepcionalmente,
decidirá além ou fora do requerido por um objetivo mor, assegurar os direitos
constitucionais, aqueles que cerceiam a vontade alheia, do querer ou não
querer, do pedir ou não pedir, porque acima disto, está o direito público, o
bem-estar social.
V
- Jurisprudência selecionada
"ORIGEM TRIBUNAL: TST DECISÃO: 02 10 2001 PROC: ROAR NUM: 655995 ANO: 2000
REGIÃO: 03
RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA TURMA: D2 ÓRGÃO
JULGADOR - SUBSEÇÃO II ESPECIALIZADA EM DISSÍDIOS INDIVIDUAIS
FONTE DJ
DATA: 09-11-2001 PG: 651
PARTES
RECORRENTE: BANCO DO BRASIL S/A. RECORRIDO: GERALDO STARLING DINIZ LEROY.
RELATOR
MINISTRO JOÃO ORESTE DALAZEN
EMENTA
AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO LITERAL DE LEI. ARTIGOS 128 E 460 DO CPC. SENTENÇA
"EXTRA PETITA". 1. Ação rescisória contra sentença que condena o
então Reclamado à devolução de parcelas descontadas de benefício de aposentadoria
a título de Contribuição Pessoal Mensal - PREVI. 2. Infringe os arts. 128 e 460
do CPC sentença que determina a devolução de descontos anteriormente efetuados,
quando da leitura da petição inicial do processo principal não resulta
inequívoca a intenção do Reclamante em obter também a restituição dos valores
já descontados pelo Banco. 3. Recurso ordinário a que se dá parcial provimento
para desconstituir, em parte, a sentença de fls. 198/209, e, em juízo
rescisório, determinar que se exclua da condenação a obrigação de o Banco ora
Requerente proceder à devolução dos descontos já efetivados.
SÍNTESE
Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de deserção argüida em
contra-razões - ação rescisória - depósito recursal. - Preliminar rejeitada. II
- Prejudicial de decadência argüida em contra-razões - ação rescisória -
decadência - marco inicial - contagem do prazo - interposição de recurso
ordinário deserto - trânsito em julgado - data da última decisão proferida na
causa - acórdão proferido no agravo de instrumento. - Prejudicial rejeitada. III
- Ação rescisória - violação a literal disposição de lei - julgamento
"extra petita" - descontos para entidade de previdência privada -
devolução - inexistência de pedido expresso na petição inicial. - Conhecido. -
Mérito - provido. IV - Ação rescisória - violação a literal disposição de lei -
decisão rescindenda que determina a suspensão de descontos para entidade de
previdência privada - previsão do desconto no contrato de trabalho -
prequestionamento. - Conhecido. - Mérito - negado provimento.
DECISÃO Por
unanimidade, dar provimento parcial ao Recurso Ordinário para, julgando
parcialmente procedente a Ação Rescisória, desconstituir em parte a sentença
rescindenda de folhas 198-209 e, em juízo rescisório, determinar que se exclua
da condenação a obrigação de o Requerente proceder à devolução dos descontos já
efetivados.
Leg.
Federal (CPC-1973) LEI:5869 ano:1973 art.128 art.460 CATÁLOGO
AA0028 Ação rescisória AA1046 Violação a dispositivo legal AA0807 Julgamento
"extra petita"".
"TRT 22ª Região
1. ADITAMENTO À INICIAL
2. SENTENÇA "EXTRA PETITA"
1. A oportunidade para aditar reclamação trabalhista
esgota-se na audiência inaugural.
2. Constitui julgamento "extra petita"
sentença que defere pleitos formulados somente nas razões finais. Sentença que
se anula.
Ac. nº 682/93 Julg.: 14.jul.93
Proc. RO-REO 999/93 Publ. DJ: 06.ago.93
Rel. Juiz: Francisco Meton Marques de Lima
Decisão: Por unanimidade".
"TRT 4ª REGIÃO
JORNADA COMPENSATÓRIA. DECISÃO EXTRA
PETITA. Hipótese em que o pedido de diferenças de horas
extras diz respeito ao trabalho prestado além do horário previsto no contrato. Não
ultrapassa os limites da lide, portanto, a sentença que defere o pagamento de
adicional de horas extras, assim consideradas aquelas laboradas após o referido
limite, e destinadas à compensação. O fato impeditivo do direito (compensação
horária regular) é matéria de defesa, e como tal, deve ser demonstrada pelo
demandado (art. 333, II, do CPC).
Ac. 00272.411/96-5 RO
Paulo Caruso - Juiz-Relator
1ª Turma - Julg.: 19.01.2000
Publ. DOE-RS: 21.02.2000".
"JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO CONFIGURAÇÃO.
Diante da alegação do reclamante de despedida sem justa causa, não configura
julgamento extra petita o entendimento de que o contrato de trabalho temporário
transformou-se em contrato de trabalho a prazo indeterminado, em virtude da
continuidade da prestação de trabalho além do termo preestabelecido.
Ac. 00265.512/98-0 RO
Ione Salin Gonçalves - Juíza-Relatora
2ª Turma - Julg.: 18.1199".
"ACÓRDÃO - 96.019057-0 RERO
EMENTA: SENTENÇA "EXTRA PETITA". Extrapola
os limites da lide a sentença que reconhece a relação de emprego e seus
consecutários com a primeira reclamada (COOTRAVIPA), quando deduzida pretensão
declaratória da existência de vínculo empregatício somente quanto ao segundo
reclamado (DMLU), com quem expressamente afasta a existência de contrato de
trabalho pela MM JCJ de origem. A Afronta ao princípio da adstrição do Juízo
não leva necessariamente à nulidade da sentença se passível esta, como in casu,
de adequação pelo juízo ad quem, tornando insubsistente a condenação..
."1a. Turma do TRT da 4a. Região em 10 de dez/97".
VI
- Bibliografia
ALMEIDA,
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Processual do Trabalho, São Paulo: LTr, 1997, 631 p.
GIGLIO,
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Sérgio Pinto, Direito do Trabalho, 18 Ed., São Paulo: Atlas 2003, 863 p.
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Francisco Antônio de, O processo na justiça do trabalho, 4 Ed., São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1999: 770 p.
SAAD,
Eduardo Gabriel, Direito Processual do Trabalho, 2 Ed., São Paulo: LTr, 1998:
1061 p.
TEIXEIRA
FILHO, Manoel Antônio, A sentença no Processo do Trabalho, 2 Ed., São Paulo:
Ltr, 1996: 446 p.
Retirado:
http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5870