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A livre negociação entre patrões e empregados

Sergio Pinto Martins

 

"Pode estar havendo mais negociação coletiva entre as partes do que a solução imposta pelos tribunais, que muitas vezes desagrada a ambos"

  Certos sindicatos, que são mais representativos, conseguem melhores condições de trabalho para a categoria // Até 1964, havia livre negociação de salários. Caso não existisse acordo, a matéria era submetida aos tribunais trabalhistas, mediante a propositura de dissídio coletivo. A partir de 1964, passamos a ter leis de política salarial, que estabeleciam a época e os índices de reajustes.

  Objetivava-se combater a inflação e, em tese, elevar os salários. Quase todo ano havia nova lei de política salarial. São exemplos a Lei nº 4.725/65, que trata de dissídios coletivos; os Decretos-leis nºs 15 e 17/66 e 229/67; as Leis nºs 5.451/68, 6.147/74, 6.708/79 e 7.238/84. Foi criado o Conselho Interministerial de Preços (CIP), que objetivava a análise dos pedidos de aumentos de preços. Os controles, muitas vezes, não davam resultados, pois trabalhadores e empregadores estabeleciam artifícios para burlar os controles.

  Veda, porém, o artigo 623 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que as convenções e acordos coletivos violem a orientação da política econômico-financeira do governo. Em decorrência de vários planos econômicos nos governos passados, foram discutidos na Justiça os expurgos inflacionários, como a URP de fevereiro de 1989 (Lei nº 7.730/89), o IPC de março de 1990 (Lei nº 8.030/90) etc., que traziam prejuízos reais aos trabalhadores.

  Prescreveu o artigo 3º da Lei nº 8.030, de 12 de abril de 1990, que estabelecia que os aumentos salariais, além do reajuste mínimo, poderiam ser livremente negociados entre as partes. Inicia essa disposição a fase da livre negociação coletiva. A Lei nº 8.880/94 dispôs sobre o programa de estabilização econômica e o sistema monetário nacional. O artigo 26 assegurou a livre negociação e a negociação coletiva dos salários.

  Estabeleceu a Lei nº 10.192/01 regras complementares ao Plano Real. O seu artigo 10 determinou que os salários e as demais condições referentes ao trabalho continuavam a ser fixados e revistos, na respectiva base-anual, por intermédio da livre negociação coletiva. Não há mais legislação de política salarial, como ocorreu até março de 1990. Proíbe o artigo 13 da Lei nº 10.192 que os acordos, convenções ou dissídios coletivos contenham cláusulas de reajuste ou correção automática vinculada a índices de preços. O aumento salarial a título de produtividade deve estar amparado em indicadores objetivos.

  Atualmente, não existe muito o que negociar em épocas de crise. Certas negociações têm sido feitas, por exemplo, estabelecendo-se índice inferior à inflação a título de reajuste, mas são criadas compensações como participação nos lucros ou resultados - pois para o empregador não há incidência de encargos sociais, nem repercussão sobre verbas de natureza salarial -, aumento do valor do vale-refeição ou da cesta básica etc.

  Certos sindicatos, que são mais representativos, conseguem melhores condições de trabalho para as pessoas que pertencem à sua categoria, inclusive com a reposição praticamente integral das perdas salariais. Outros sindicatos mais fracos nada conseguem negociar, pois não têm poder de pressão sobre o empregador. Esta é a razão para que haja pluralidade sindical, visando a que os próprios interessados se agrupem para formar sindicatos reivindicativos.

  Hodiernamente, já se fala na instituição de um gatilho toda vez que a inflação atingir 3% em determinado período. O governo é contra tal orientação, em razão de que ela implicaria a reindexação da economia e o aumento da inflação.

  Em contrapartida, o número de dissídios coletivos vem diminuindo. No Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região foram julgados, em 1991, 545 dissídios coletivos; em 1992, 425; em 1993, 491; em 1994, foram apresentados 768 dissídios coletivos e julgados 582; em 1995, foram ajuizados 672 e julgados 488; em 1996, 530 e 342, respectivamente; em 1997, 417 e 242; em 1998, 304 e 182; em 1999, foram ajuizados 266, sendo 167 de greve, e julgados 226; em 2000, foram julgados 189; em 2001, 166 e, em 2002, 125.

  Os dados acima mostram que pode estar havendo mais negociação coletiva entre as partes do que a solução imposta pelos tribunais, que muitas vezes desagrada a ambos. É a idéia do vencido, mas não convencido. Melhor, portanto, é a solução negociada para pôr fim ao litígio, mediante mecanismos de autocomposição. Nos procedimentos em que as partes se conciliam, há menor possibilidade de descumprimento do avençado do que quando existe imposição da solução pelo Estado.

 

 

 

Retirado de: www.espacovital.com.br