A JUSTIÇA DO TRABALHO DO ANO 2000:
AS LEIS 9.756/1998, 9.957 E 9.958/2000,
A EMENDA CONSTITUCIONAL 24/1999 E A REFORMA
DO JUDICIÁRIO
Ives Gandra
da Silva Martins Filho
ministro do Tribunal Superior do Trabalho,
ex-subprocurador-geral do Trabalho,
ex-assessor especial da Casa Civil da Presidência da República
INTRODUÇÃO
A Justiça do Trabalho sempre se caracterizou pela simplificação
e celeridade processual, responsável pela maior
procura do trabalhador pelos seus direitos,
sendo, dos ramos do Judiciário Brasileiro, aquele que representa
quase 1/3
de toda a demanda judicial (incluindo a Justiça
Federal, Militar, Eleitoral e dos Estados) – 2 milhões de reclamatórias
julgadas, dos mais de 7 milhões de
ações julgadas por todo o Poder Judiciário brasileiro
em 1998.
No entanto, nos últimos anos, a evolução do Processo
Civil não foi acompanhada pelo Processo do Trabalho,
fazendo com que aquele passasse à frente
deste, com inovações que modernizaram a Justiça Comum,
equipando-a com
procedimentos próprios da Justiça
do Trabalho (notificação postal e juizados especiais de pequenas
causas com busca
preponderante da conciliação)
e dotando-a de outros que não chegaram a ser aproveitados pela Justiça
Laboral e que a
fariam mais dinâmica (provimento por
despacho dos recursos em matérias pacificadas).
Essa paralisação evolutiva temporária do Processo
Laboral, fazendo com que o Processo Comum o alcançasse e
com ele se assemelhasse, foi uma das responsáveis
pela proposta, na Reforma do Judiciário, da extinção
da Justiça do
Trabalho, com sua assimilação
pela Justiça Federal (cfr. Relatório do Dep. ALOYSIO NUNES
FERREIRA).
Sustentou-se, no início de 1999, que a extinção da
representação classista e do poder normativo da Justiça
do
Trabalho retirariam desta as notas distintivas
próprias que justificassem sua existência como ramo especializado
e
autônomo do Poder Judiciário.
No entanto, o que se verificou, no debate parlamentar que ocasionou a extinção
dos
juízes classistas, foi a articulação
de um poderosíssimo lobby dos representantes classistas, que não
descartou esgrimir a
extinção da Justiça do
Trabalho se seus próprios interesses corporativos fossem contrariados:
après moi, le déluge!
No entanto, prevaleceu a razão frente à pressão, tendo
sido aprovada a Emenda Constitucional n. 24/99, que
extinguiu a representação classista,
sem que isso representasse a extinção da Justiça do
Trabalho, uma vez que esta foi
mantida na proposta de Reforma do Judiciário
que ora tramita na Câmara dos Deputados (cfr. Relatório da
Dep.
ZULAIÊ COBRA).
A batalha, porém, não está ganha, uma vez que apenas
a diferenciação efetiva de ambos os processos – Comum
e do Trabalho – poderá justificar racionalmente
a especialização das duas Justiças. E, para tanto,
o Processo do
Trabalho não pode deixar de aproveitar
as inovações modernizadoras do Processo Comum, a par de implementar
suas
próprias inovações, que
dinamizem, simplifiquem, barateiem e ampliem o acesso do trabalhador à
Justiça.
No presente estudo, procuraremos mostrar quais as inovações
que foram, serão ou necessitam ser introduzidas
no Processo Laboral, de modo a permitir que
a Justiça do Trabalho adentre pelos pórticos do Terceiro
Milênio
transfigurada: que possa continuar sendo,
como sempre foi, a Justiça mais célere, barata e efetiva
no Brasil.
EXTINÇÃO DA REPRESENTAÇÃO CLASSISTA
A grande mudança ocorrida com a Justiça do Trabalho nos últimos
dias de 1999 foi a extinção da representação
classista.
A necessidade de se terminar com a representação paritária
das categorias profissionais e econômicas na Justiça
do Trabalho, através de juízes
leigos, já era um consenso social, só não logrando
êxito antes, em face da pressão
extraordinária exercida pelos juízes
classistas sobre parlamentares, impedindo e retardando a votação
da matéria pelo
Congresso Nacional.
A instituição da representação classista, que
prestou seus serviços nos primórdios da Justiça do
Trabalho,
mostrou-se, ao longo do tempo, incapaz de
plasmar na realidade cotidiana das lides trabalhistas o ideal pelo qual
foi
instituída, permitindo que nela se
alojassem distorções que terminaram por desfigurá-la
e mostrar suas deficiências e
limitações:
O fato do juiz classista ser leigo, sem ter necessidade de formação
acadêmica jurídica, faz com que,
principalmente nos Tribunais, não tenha
os conhecimentos jurídicos necessários para enfrentar as
questões processuais,
antecedentes às questões de
direito material do trabalho, às quais estariam mais afeitos, ficando
à mercê de suas
assessorias, que lhes preparam os votos, dos
quais, salvo honrosas exceções, são apenas locutores
em sessão;
A propalada contribuição da experiência profissional
de seu ramo produtivo, que o classista traria para auxiliar na
conciliação e solução
dos conflitos trabalhistas, na verdade acaba sendo mínima, uma vez
que, em relação aos demais
setores produtivos, sua experiência
não difere da que o juiz togado possa ter adquirido ao longo de
sua carreira (Ex:
Qual o conhecimento prático e específico
que um comerciário poderá trazer para a solução
de questões próprias de
portuários, marítimos, aeronautas,
bancários, petroleiros, rurícolas ou metalúrgicos?).
A deficiência jurídica dos classistas, aliada à carência
de aportação prática específica, colocavam
em xeque a
manutenção de instituição
que representava um elevado custo para a Justiça do Trabalho, consumindo
mais de
R$200.000.000,00 por ano, o que não
se justificava, num contexto global de enxugamento da máquina estatal;
O atrativo dos cargos de juizes classistas, especialmente na 1ª instância,
pela elevada remuneração em face da
reduzida carga de trabalho e desnecessidade
de preparação técnica específica, levou à
proliferação de sindicatos
fantasmas, criados exclusivamente com o fito
de permitir a nomeação de representante classista dessas
agremiações, o
que veio a distorcer a realidade sindical
brasileira.
Por essas distorções e deficiências congênitas,
a representação classista foi reconhecida como indesejável
pela
Magistratura togada e pela sociedade, cujos
representantes no Senado Federal, sob a presidência do Senador
ANTÔNIO CARLOS MAGALHÃES, decretaram
o seu fim, aprovando a PEC n. 63/95, de autoria do Sen.
GILBERTO MIRANDA (O Presidente do Senado já
havia manifestado sua posição firme pela extinção
dos classistas,
ao negar-se a constituir comissão especial
para apreciar 4 indicações de Ministros classistas para o
TST, feitas pela
Presidência da República, no
final de 1998, para serem sabatinados pelo Senado).
Uma prévia da batalha titânica que seria travada no Congresso
Nacional pela extinção dos classistas foi a relativa
à fixação dos subsídios
da magistratura, após a aprovação da Reforma Administrativa
pela EC n. 19/98. A proposta
governamental, substitutiva das propostas
encaminhadas pelo STJ, TST e STM, era no sentido de reduzir de 10% para
5% a diferença entre os subsídios
dos ministros do STF e os dos demais tribunais superiores, o que provocaria
elevação
global de salários da magistratura,
desde que o aumento não se estendesse à gratificação
percebida pelos juizes
classistas de 1ª instância. Devido
à unificação das 3 propostas, os membros da Justiça
Federal e da Justiça Militar quase
deixaram de se beneficiar do aumento, tão
forte foi o lobby dos classistas para que o projeto não fosse aprovado.
Mas
acabou se transformando em lei, o que demonstrou
que tal lobby, sempre vencedor nas tentativas anteriores de extinção
(Constituinte de 1988 e Revisão de
1994), poderia, um dia, ser vencido.
A batalha final na Câmara dos Deputados para se conseguir o objetivo
da extinção dos classistas foi de extrema
dificuldade. O referido lobby buscou reinserir
a discussão no bojo da Reforma do Judiciário, o que teria
exigido a volta
da matéria para ser reexaminada pelo
Senado Federal. No entanto, conseguiu-se, graças ao empenho pessoal
do
Ministro do Trabalho FRANCISCO DORNELLES e
ao apoio das bancadas de oposição (que nessa matéria
comungavam do mesmo ponto de vista do governo
a respeito do anacronismo da representação classista), que
fosse
constituída Comissão Especial
para examinar a PEC n. 33/99, cujo relator foi o Dep. PAULO MAGALHÃES.
Desde o início de 1999, o Presidente FERNANDO HENRIQUE CARDOSO,
para enfraquecer esse lobby,
decidiu não nomear mais nenhum juiz
classista para os TRTs, nem indicar nenhum novo nome para o TST
(anteriormente, já havia sido editada
e aprovada pelo Congresso Nacional a Lei 9.528/97 (art. 5º), que acabava
com o
direito dos classistas se aposentarem com
5 anos de exercício de judicatura, com proventos integrais, o que
gerava uma
cobiçada procura pelos cargos).
No entanto, em relação aos juizes classistas das Juntas de
Conciliação e Julgamento, a sua nomeação cabia
aos
Presidentes dos TRTs, tendo-se notícia
de desmandos em determinados Regionais, que, nessa fase final de tramitação
da PEC n. 33/99, promoveram inumeráveis
nomeações, com o fito de garantir a colocação
de amigos e parentes pelos
próximos 3 anos.
Para coibir essas nomeações de última hora, que somente
iriam onerar os cofres públicos, o Ministro
URSULINO SANTOS FILHO, Corregedor-Geral da
Justiça do Trabalho, editou o Provimento no. 5/99,
posteriormente referendado pelo Plenário
da Corte, vedando qualquer nomeação ou posse de classistas
de 1ª instância
a partir da aprovação da PEC
n. 33/99, em 1º turno, na Câmara dos Deputados.
Assim, votada em 1º turno, no Plenário da Câmara dos
Deputados, em 17 de novembro, foi a PEC 33/99
aprovada em 2º turno no dia 1º de
dezembro, sendo promulgada como Emenda Constitucional n. 24/99 no dia 9
de
dezembro. No dia 10 de dezembro era publicada
a emenda e realizada a primeira sessão do Tribunal Pleno do TST,
na
qual se aprovou a Resolução
n. 665/99, disciplinando a atuação dos classistas remanescentes,
até sua completa
extinção, pelo término
dos mandatos em curso.
O problema que a EC n. 24/99 trouxe, pelo seu laconismo na regra de transição,
foi o de se saber como
funcionariam os órgãos da Justiça
do Trabalho durante o período em que os mandatos dos representantes
classistas
fossem se encerrando.
O art. 2º da EC 24/99, ao estabelecer que seriam garantidos, aos atuais
ministros e juizes classistas, o término de
seus mandatos, sem qualquer outra especificação
de forma ou modo, impôs a necessidade da interpretação
integrativa
do texto, para se verificar como proceder
à transição do sistema da representação
classista para uma Justiça do
Trabalho com feição inteiramente
técnica. Isto porque os mandatos, não sendo coincidentes
em suas datas de
conclusão, gerariam, fatalmente, quebra
da paridade pela conclusão de mandato de representante de empregador,
sem
a correspondente conclusão do mandato
do correspondente representante dos trabalhadores. As soluções
que se
propuseram para o problema, nos debates interna
corporis do TST, foram as mais variadas:
Colocar em imediata disponibilidade remunerada todos os representantes classistas com mandato a concluir;
Garantir jurisdição ampla aos classistas onde fosse possível
manter a paridade de representação, adotando a
jurisdição restrita, limitada
a matéria administrativa nos Tribunais e a atividade conciliatória
nas Juntas, quando quebrada
a paridade pelo término do mandato
do correspondente representante da categoria oposta;
Garantir jurisdição integral aos classistas, onde fosse possível
manter a paridade de representação, e colocar em
disponibilidade os classistas onde essa paridade
estivesse quebrada.
Na Revisão Constitucional de 1994, o parecer do relator (cfr. "Relatoria
da Revisão Constitucional", Senado
Federal – 1994 – Brasília, Tomo II,
pg. 43), o então Dep. NELSON JOBIM, contemplava a seguinte regra
de
transição:
"Art. 7º Fica mantida a investidura e o exercício dos atuais
ocupantes da
representação classista na Justiça
do Trabalho, até o seu termo final e prorrogado, quando
necessário, o mandato de classista
integrante dos órgãos judiciários, para preservação
da
paridade e coincidência de seu afastamento,
e preservadas, para esse fim, as atuais Juntas
de Conciliação e Julgamento".
Como a EC n. 24/99 não adotou regra de transição semelhante
à do supracitado parecer, que previa a
prorrogação de mandato de representante
de uma categoria, até o término do mandato do representante
da categoria
oposta, de forma a preservar a paridade de
representação, verificou-se, já no momento da promulgação
da emenda, a
disparidade em muitas Juntas, Tribunais Regionais
e no próprio TST, que só possuía 2 ministros classistas,
ambos
representantes dos empregados.
Se, por um lado, o art. 1º da EC n. 24/99, ao modificar os dispositivos
da Constituição de 1988, extinguindo a
representação classista e criando
as varas do trabalho como órgãos de primeira instância,
acabou com o conceito de
paridade nos órgãos judiciários
trabalhistas, por outro, não há como esquecer que a preservação
dos mandatos dos
atuais juizes classistas não os transformou,
por isso, em togados, remanescendo sua origem classista, cuja atuação
é,
naturalmente, parcial.
Assim, a solução adotada pelo TST, na supracitada resolução
administrativa, teve em conta a inviabilidade da
preservação da função
judicante do classista no órgão em que não pudesse
haver a paridade de representação. Nesses
casos, para evitar o desequilíbrio
que haveria nos órgãos judicantes trabalhistas, com a permanência
de um juiz já
tendencialmente favorável a uma das
partes, optou-se por considerar em disponibilidade remunerada os juízes
classistas
dos órgãos em que, pelo término
dos mandatos de parte dos representantes classistas, não fosse possível
restabelecer,
através de remanejamento, a paridade
de representação das categorias profissional e econômica.
Discutiu-se, na ocasião, se a disponibilidade seria com proventos
integrais ou proporcionais, tendo em vista que
EC n. 19/98 admite apenas a disponibilidade
com remuneração proporcional ao tempo de serviço.
Ocorre, no entanto,
que o § 3º do art. 41 da Constituição
Federal, quando fala em disponibilidade, admite-a apenas para as hipóteses
de
extinção do cargo ou declaração
de sua desnecessidade. Ora, a hipótese concreta da EC n. 24/99 não
era de extinção
imediata dos cargos, nem de declaração
de sua desnecessidade, o que afastava o enquadramento da hipótese
no
referido parágrafo. A situação
concreta é a da impossibilidade da atuação do classista
em regime não paritário, por
quebra da imparcialidade que deve nortear
a atuação do Poder Judiciário em todos os seus órgãos.
Assim, a
disponibilidade com proventos integrais, que
lhes foi assegurada pela Resolução n. 665/99 do TST (art.
2º e seu
parágrafo único), decorreu do
direito assegurado de forma simples e categórica aos juizes classistas,
de término de seus
mandatos, ainda que sem poder exercê-los,
por circunstâncias aleatórias, decorrentes da disparidade
cronológica na
conclusão do mandato dos vários
representantes classistas ainda em atividade.
Outra questão que se levantou, em face da reunião do Colégio
de Presidentes dos TRTs, em Belém, dias antes
da promulgação da EC n. 24/99,
foi a relativa à possibilidade de preenchimento das vagas dos classistas
por juizes
togados nos tribunais, reivindicação
incisiva dos Presidentes dos TRTs. Ora, a proposta inicial da emenda dos
classistas
previa, efetivamente, a extinção
pura e simples dos classistas nas Juntas e a sua substituição
por juizes togados nos
tribunais. No entanto, tal proposta acabou
sendo alterada quando aprovada pelo Senado Federal, estabelecendo-se a
pura e simples extinção dos
cargos de juizes classistas, sem substituição por togados,
como contributo para a redução
de despesas estatais.
Nesse sentido, sendo de clareza meridiana a EC N. 24/98, ao extinguir os
cargos de juizes classistas, não é
possível preencher com juizes togados
cargos que já não existirão, quando terminados os
mandatos de seus atuais
ocupantes. Trata-se de pretensão legítima,
diante do elevado número de processos que há para serem julgados
nos
TRTs e no TST, mas que só poderá
ser atendida pelo Congresso Nacional, através de leis específicas
que fixem as
novas composições dos diversos
Tribunais Regionais do Trabalho. Daí a deliberação
do TST, constante da Resolução
n. 665/98, de deixar claro que os cargos extintos
dos classistas não poderiam, automaticamente, ser preenchidos por
togados.
Assim, o novo perfil da Justiça do Trabalho, mais técnico
e jurídico, irá, aos poucos, se revelando, na medida em
que, nos próximos 2 ou 3 anos, forem
findando os mandatos dos remanescentes juízes classistas. Com isso,
haverá,
também, uma sobrecarga de trabalho
para os magistrados de 2ª e 3ª instância, até que
possam ser repostas por juizes
togados as vagas deixadas pelos classistas.
PROVIMENTO DE RECURSOS POR DESPACHO
No início de 1998, o governo havia enviado ao Congresso Nacional,
para apreciação, o Projeto de Lei n.
4.070/98, que agilizava a tramitação
dos processos nos tribunais superiores. O projeto previa a possibilidade
do
ministro-relator dar provimento por despacho
ao recurso extraordinário no STF, ao recurso especial no STJ, e
ao
recurso de revista no TST, decidindo de imediato
a questão quando a matéria já estivesse pacificada
nas Cortes
Superiores. Isso simplificaria sobremaneira
o julgamento das matérias repetitivas nos órgãos de
cúpula do Poder
Judiciário, desafogando a pauta das
sessões desses Tribunais.
Em relação ao recurso de revista, o projeto original enviado ao Congresso previa:
"Art. 896. (...)
§ 5º Estando a decisão recorrida em consonância
ou conflito com Súmula ou
jurisprudência dominante da Seção
Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal
Superior do Trabalho, poderá o Ministro
Relator, por despacho, segundo a hipótese, negar
ou dar provimento ao recurso de revista, aos
embargos ou ao agravo de instrumento.
§ 6º Será denegado seguimento ao recurso de revista, aos
embargos ou ao agravo de
instrumento, nas hipóteses de intempestividade,
deserção, falta de alçada, ilegitimidade
de representação, desfundamentação
ou manifesta inadmissibilidade.
§ 7º Nas hipóteses dos §§ 5º e 6º,
caberá agravo, no prazo de oito dias. Sendo
manifestamente infundado ou protelatório
o agravo, sujeitará o agravante à aplicação
de
multa não excedente a dez por cento
do valor corrigido da causa, a favor do agravado,
ficando a interposição de qualquer
recurso condicionado ao depósito do respectivo valor".
Ao mesmo tempo em que o Presidente do STJ, Min. ANTÔNIO DE PÁDUA
RIBEIRO, pedia que se
ampliasse a faculdade, para conferi-la também
aos juizes relatores nos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de
Justiça, o Presidente do TST, na época,
Min. ERMES PEDRASSANI, pedia justamente o contrário em relação
à
Justiça do Trabalho: que a faculdade
não fosse conferida aos ministros do TST, em face da existência
de classistas, que
poderiam abusar da faculdade, sem que houvesse
possibilidade de controle efetivo pelo colegiado.
Assim, atendendo às ponderações de ambos os Presidentes
dessas Cortes Superiores, o governo, através do
Dep. DJALMA DE ALMEIDA CÉSAR, relator
do Projeto, apresentou substitutivo ao texto original, ampliando a
faculdade em relação à
Justiça Comum e retirando da CLT o dispositivo que permitiria o
uso da faculdade no TST.
O Projeto foi aprovado no final de 1998, transformando-se na Lei 9.756/98,
que, seguindo a nova orientação
traçada pela Lei Complementar n. 95/98,
inseriu os novos dispositivos processuais no CPC e na CLT, em vez de ser
lei
extravagante.
Como o novo art. 557 do CPC, com seu § 1º-A, poderia ser utilizado
subsidiariamente no Processo do
Trabalho, uma vez que fala, genericamente,
em tribunais superiores, incluindo, obviamente, o TST, alguns ministros
dessa Corte passaram a fazer uso da faculdade
desde sua instituição, como foi o caso do Min. ARMANDO DE
BRITO.
Agora que a representação classista se encontra extinta e,
em relação ao TST, os únicos dois classistas foram
colocados em disponibilidade, por não
ser possível estabelecer a paridade de representação,
não há qualquer
justificativa para que a faculdade não
seja amplamente utilizada no âmbito do TST, desafogando as pautas
de
julgamento das sessões e dando celeridade
à solução das questões já pacificadas
nessa Corte. O que não se pode é
esperar por um novo projeto de lei específico,
que venha a incluir na CLT essa faculdade, já que a necessidade
de
simplificação é premente
e o art. 769 da CLT permite fazer a ponte integrativa entre o dispositivo
específico do CPC e
o Processo do Trabalho.
É necessário, no entanto, fazer as adequações
pertinentes entre o referido preceito do CPC e o Processo do
Trabalho. A primeira delas diz respeito ao
prazo para agravo do despacho que der provimento, de imediato, ao recurso.
O § 1º do art. 557 do CPC fala em
5 dias. No entanto, todos os prazos de recursos na Justiça do Trabalho
são de 8
dias (CLT, arts. 894-897). Apenas os embargos
declaratórios têm prazo de 5 dias na Justiça do Trabalho,
o que
poderia justificar um prazo também
distinto para o agravo no presente caso. Entretanto, como o despacho do
relator
pode ser tanto para trancar quanto para prover
de imediato o recurso, o prazo não pode ser distinto, conforme o
teor
da decisão. E como, em relação
à denegação de seguimento de recurso, a CLT tem dispositivo
específico (art. 896, §
5º), a conclusão necessária,
em termos de coerência do sistema, é reconhecer que o prazo
para o agravo deve ser de 8
dias.
Questão final que deve ser enfrentada é a relativa à
multa prevista no § 2º do art. 557 do CPC para as hipóteses
do agravo ser manifestamente inadmissível
ou infundado. Sem a multa, o art. 557 apenas criaria mais uma instância
decisória, de caráter monocrático,
já que a parte que tivesse intuito protelatório teria mais
um recurso na cadeia
interminável de apelos, para postergar
a solução final da causa.
Assim, a multa não pode deixar de ser aplicada no Processo do Trabalho,
por se tratar de elemento indispensável
ao não desvirtuamento do recurso. No
entanto, como a Justiça do Trabalho atende a pólos economicamente
díspares na
demanda judicial, deve-se estar atento para
essa discrepância, sabendo-se que, em geral, é a empresa que
manifesta o
intuito protelatório. Mas também
pode haver insistência desarrazoada por parte do empregado. Assim,
já que o § 2º do
art. 557 do CPC dá ao juiz a possibilidade
de dosar o valor da multa, entre 1% e 10% do valor corrigido da causa,
pode-se adotar como parâmetro genérico
que, em relação ao empregado, a inadmissibilidade do agravo
deve ser
gritante, e a multa não pode exceder
de 1% do valor da causa.
É, pois, de fundamental importância que o uso da faculdade
conferida pelo art. 557 do CPC seja generalizado no
âmbito da Justiça do Trabalho,
como um dos instrumentos de modernização e simplificação
do processo do Trabalho,
dando-lhe maior celeridade: a celeridade que
a Justiça Comum vem alcançando à frente da Justiça
do Trabalho e que
não deve ser apanágio exclusivo
daquela.
RITO SUMARÍSSIMO
Importante conquista para a modernização do Processo do Trabalho
foi a aprovação, no final de 1999, do PL
4.693/98 (PLC 28/99 no Senado), relativo à
instituição do procedimento sumaríssimo para as pequenas
causas
trabalhistas. O projeto, de autoria do Tribunal
Superior do Trabalho, foi encampado pelo governo, que se empenhou
para sua aprovação, como contribuição
concreta para a modernização da Justiça do Trabalho.
A nova Lei 9.957, de 12 de janeiro de 2000, representa elemento de suma
importância para o desafogamento
dos Tribunais do Trabalho e a simplificação
procedimental na 1ª instância, diminuindo o formalismo e imprimindo
celeridade aos julgamentos.
Com efeito, pela nova lei, as causas de valor até 40 salários
mínimos terão tratamento procedimental mais célere,
através do rito sumaríssimo
(CLT, art. 852-A), que corresponde aos juizados de pequenas causas na Justiça
Comum.
Com ela, teremos:
Solução das demandas trabalhistas em audiência única
(CLT, art. 852-C), no prazo máximo de 15 dias (CLT,
art. 852-B, III), podendo dilatar-se para
no máximo 45 dias (CLT, art. 852-H, § 7º), em caso de
haver necessidade da
produção de prova pericial (CLT,
art. 852-H, § 4º);
Possibilidade da lavratura dos acórdãos nos tribunais pela
simples certidão de julgamento, consignando-se que a
sentença foi mantida pelos seus próprios
fundamentos, quando confirmada pelo Tribunal (CLT, art. 895, § 1º,
IV);
Limitação do recurso de revista, nas causas sujeitas ao rito
sumaríssimo, às hipóteses de violação
à Constituição
ou contrariedade a súmula do TST (CLT,
art. 896, § 6º).
O projeto previa ainda, para o recurso ordinário, a mesma feição
do recurso de revista, limitando às questões
jurídicas sua abrangência. No
entanto, por acordo com a CNI, cuja bancada na Câmara dos Deputados
não admitia a
aprovação do projeto sem a possibilidade
de revisão da matéria fática em 2ª instância,
o inciso I do § 1º do art. 895 da
CLT, acrescentado pelo projeto, acabou sendo
vetado, de modo a garantir o duplo grau de jurisdição em
questões de
fato.
Também restaram vetados os §§ 2º do art. 852-I e
5º do art. 852-H: o primeiro em razão da impossibilidade do
juiz verificar os cálculos no momento
da audiência, para prolatar sentença líqüida na
própria audiência única; e o
segundo, pelo possível cerceamento
ao direito de ampla defesa que poderia ocorrer no afastamento rotundo da
indicação de assistente técnico
para elaboração da perícia.
Tais vetos decorreram do acordo firmado no Senado Federal, com o Senador
MOREIRA MENDES, relator do
projeto, para sua aprovação
imediata, sem que houvesse necessidade de alterações de redação
que, mesmo que
pudessem supor um aperfeiçoamento do
texto original, comprometeriam sua pronta entrada em vigor, por carecer
de
reexame das modificações pela
Câmara dos Deputados.
Assim, com período de vacância de 60 dias, necessários
para que as novas Varas Trabalhistas possam se
preparar para adotá-lo de imediato
quando entrar em vigor, o novo rito sumaríssimo no Processo do Trabalho
representará um significativo avanço
na pronta solução das pequenas causas laborais, ofertando
ao trabalhador um
instrumento célere e efetivo de obtenção
do respeito aos seus direitos fundamentais no campo trabalhista.
O receio que o setor patronal demonstrou, durante a tramitação
do projeto no Congresso Nacional, no sentido
de que o atrativo de um processo célere
poderia estimular a corrida à Justiça do Trabalho, com a
propositura de ações
temerárias, mas com boas perspectivas
de sucesso, em face do desaparelhamento da 1ª instância para
fazer frente ao
propalado aumento de 80% nas reclamatórias
trabalhistas, não tem razão de ser, uma vez que o projeto
em tela foi
encaminhado, discutido e aprovado concomitantemente
com o projeto de lei que institui as comissões de conciliação
prévia no âmbito das empresas
e dos sindicatos, como instância prévia de composição
dos conflitos laborais, o que
contribuirá para desafogar a 1ª
instância, como um dique de contenção dos dissídios
individuais, que permitirá uma
análise consciente e ponderada das
demandas que escaparem à conciliação voluntária
das partes.
COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA
O PL 4.694/98, enviado pelo governo e também elaborado originariamente
pelo TST, concernente às comissões
de conciliação prévia,
foi alvo de acentuados debates, sendo consideravelmente alterado até
a sua aprovação final, para
se transformar na Lei 9.958, de 12 de janeiro
de 2000.
A idéia original era a de que as referidas comissões fossem
obrigatoriamente instituídas nas empresas com mais
de 50 empregados, como forma de se obter,
impositivamente, a adoção do modelo de composição
autônoma dos
conflitos individuais de trabalho.
Nas reuniões promovidas pelo Min. FRANCISCO DORNELLES no Ministério
do Trabalho para discutir o
projeto com as 4 Centrais Sindicais (CUT,
CGT, Força Sindical e SDS) e nas consultas formuladas informalmente
a 4
das principais Confederações
Patronais (CNI, CNC, CNA e FENABAN), dois pontos se destacaram como pomos
de
discórdia entre patrões e empregados:
O setor obreiro insistia na garantia de estabilidade aos empregados que
fossem eleitos para as comissões de
conciliação prévia, como
forma de assegurar sua atuação imparcial e autônoma
(o projeto original não contemplava a
estabilidade);
O setor patronal rejeitava o modelo impositivo das comissões nas
fábricas, mormente em face da criação de mais
uma modalidade de estabilidade.
Solução alternativa, ventilada nas discussões, foi
a de ancorar as comissões no art. 11 da Constituição
Federal,
uma vez que a estabilidade estaria assegurada
constitucionalmente para os representantes dos empregados eleitos nas
empresas com mais de 200 empregados. No entanto,
nem essa alternativa era aceita pelo setor patronal, especialmente
pela CNI, que não desejava de forma
alguma que o referido dispositivo constitucional fosse regulamentado.
Assim, o impasse só foi superado e o projeto de lei pôde ser
votado e aprovado pela Câmara dos Deputados,
quando foi reformulado, tornando facultativa
a criação das comissões, tanto nas empresas quanto
nos sindicatos (CLT,
art. 625-A), mas assegurando a estabilidade
de seus membros (CLT, art. 625-B, § 1º).
O modelo facultativo tem, contra si, a fragilidade que traz ao sistema,
pois se não houver uma generalização na
instituição espontânea
das comissões de conciliação prévia, o desafogamento
do Judiciário Laboral não poderá ocorrer,
o que comprometerá a eficácia
do recém-aprovado rito sumaríssimo para as pequenas causas
trabalhistas.
Ciente das implicações do insucesso do modelo, a CNI, principal
responsável pela mitigação do projeto,
comprometeu-se com o governo a envidar todos
os esforços para, num prazo de 6 meses da publicação
da lei,
conseguir que as comissões de conciliação
prévia sejam criadas de forma generalizada em todos os setores produtivos,
quer no âmbito das empresas, quer nos
sindicatos ou mediante acordos intersindicais. Em caso de não obtenção
desse
objetivo, o governo adotaria, por medida provisória,
a fórmula impositiva das comissões de conciliação
prévia, de modo
a desafogar a Justiça do Trabalho,
que ficaria impossibilitada de dar vazão, no procedimento sumaríssimo,
ao volume
desproporcionado de reclamatórias que
lhe chegam anualmente (mais de 2 milhões e meio).
A grande vantagem para os empregadores com a adoção das comissões
de conciliação prévia nas empresas é a
de não serem surpreendidos na Justiça,
com a propositura de reclamação trabalhista, cuja citação
postal, às vezes
deficiente, pode gerar revelia em matéria
fática, de difícil reparação. Além disso,
a nova lei prevê que pelo acordo, o
empregado dará quitação
geral sobre a demanda que tiver (podendo, no entanto, fazer ressalvas específicas
sobre
títulos não conciliados – CLT,
art.625-E, parágrafo único), o que evitará futuras
ações sobre questões já discutidas no
momento da dispensa ou da solução
da pendência na vigência do contrato.
A vantagem para os empregados é a solução mais rápida
e satisfatória de suas pendências trabalhistas, com
recebimento imediato das parcelas que lhe
são devidas. A lei estabelece que o termo de conciliação
firmado perante as
comissões de conciliação
prévia valem como título executivo extrajudicial, podendo
o empregado, caso não receba a
parcela que lhe foi reconhecida como devida
no prazo fixado no termo, promover a imediata execução do
termo. O
dispositivo incluiu também, de forma
expressa, os termos de ajuste de conduta firmados perante o Ministério
Público do
Trabalho como títulos executivos extrajudiciais
a serem executados perante a Justiça do Trabalho, findando, assim,
com
a controvérsia sobre a competência
para a execução de tais termos de compromisso (CLT, art.
876).
A pretensa inconstitucionalidade, vislumbrada por alguns, na obrigatoriedade
da passagem prévia da demanda
perante a comissão de conciliação,
não tem qualquer procedência. As comissões de conciliação
prévia não constituem
óbice ao acesso ao Judiciário,
assegurado pelo art. 5º, XXXV, da Constituição Federal,
na medida em que são apenas
instância prévia conciliatória,
em que a comissão deve dar resposta à demanda em 10 dias
(CLT, art. 625-F), o que, de
forma alguma, representa óbice ao acesso
ao Judiciário.
O próprio Supremo Tribunal Federal, em questão análoga,
referente à imposição, por lei, da necessidade do
postulante de benefício comunicar ao
INSS a ocorrência do acidente, como condição da ação
indenizatória, com vistas
a uma possível solução
administrativa da pendência, entendeu que não há inconstitucionalidade
na criação da condição
(cfr. RE 144.840-SP, Rel. Min. MOREIRA ALVES,
julgado em 2/4/96, Informativo n. 25 do STF). Assim, não há
que
se pretender seja inconstitucional a passagem
obrigatória dos litigantes na comissão conciliatória
prévia.
Assim, a nova lei exige que, nas localidades ou empresas onde houver comissão
de conciliação prévia instituída, o
empregado apresente sua demanda à comissão,
para apreciação prévia (CLT, art. 625-D), constituindo
a exigência
pressuposto processual para o ajuizamento
de ação trabalhista, caso não seja bem sucedida a
conciliação. A
negociação prévia passará
a ser exigida tanto para os dissídios coletivos quanto para os dissídios
individuais, como
forma de se prestigiar as soluções
autônomas dos conflitos trabalhistas.
Com a extinção da representação classista,
a tão propalada vocação conciliatória natural
dos vogais poderá ser
satisfatoriamente canalizada para a atuação
nas comissões de conciliação prévia, onde exercerão
função conciliatória de
conflitos do setor específico a que
estão ligados e, por isso, com conhecimento preciso dos problemas
próprios do
setor. Serão bancários compondo
conflitos de bancários e portuários resolvendo questões
portuárias, com soluções
mais satisfatórias do que aquelas passíveis
de imposição pela Justiça do Trabalho.
Assim, espera-se que, na esteira da terceira onda de reformas no processo,
tão propalada por MAURO
CAPELLETTI, que prestigia especialmente as
formas alternativas de composição dos conflitos em sociedade,
possam
as comissões de conciliação
prévia representar um elemento de pacificação dos
confrontos entre patrões e empregados,
a par de desafogar o Judiciário Trabalhista
da quantidade sobre-humana de processos que deve resolver diuturnamente.
PODER NORMATIVO E AÇÕES COLETIVAS
Se, do ponto de vista dos projetos de lei recém-aprovados, o perfil
da Justiça do Trabalho vai mudar
substancialmente a partir do ano 2000, já
sob o prisma do que vem pela frente em termos de Reforma do Judiciário,
há
alguns pontos que exigem reflexão.
Desde a proposta de revisão constitucional de 1994, tem-se discutido
sobre a conveniência de se manter o poder
normativo da Justiça do Trabalho. O
relator da revisão, Min. NELSON JOBIM, calcado na experiência
do Direito
Comparado, defendeu a extinção
do Poder Normativo, como forma de se prestigiar a negociação
coletiva e acabar
com o paternalismo estatal, do qual as partes
em litígio esperavam a solução de todos os conflitos
e a concessão de
benefícios não previstos em
lei (cfr. op. cit., pgs. 48-55).
A questão veio à tona novamente com a Reforma do Judiciário,
tendo o Dep. ALOYSIO NUNES, em seu
parecer, proposto a extinção
do Poder Normativo, enquanto o parecer da Dep. ZULAIÊ COBRA, que
ora se discute
na Câmara dos Deputados, apresenta solução
menos drástica, admitindo o exercício de poder normativo
apenas nas
hipóteses de greve em serviços
essenciais, devendo ser proposto apenas pelo Ministério Público
do Trabalho.
A relatora atual da Reforma do Judiciário teve o discernimento de
perceber duas realidades que se contrapõem
no campo dos dissídios coletivos de
trabalho:
A possibilidade de recurso fácil ao Poder Judiciário, quando
as negociações diretas entre as partes não evoluem,
ou mesmo quando uma delas não está
disposta a negociar, constitui um desestímulo a que os agentes sociais
resolvam
diretamente suas controvérsias coletivas,
fazendo com que o país tenha sempre um sindicalismo fraco e um setor
empresarial avesso ao diálogo; e
A extinção pura e simples do poder normativo da Justiça
do Trabalho deixaria a sociedade sem um meio de
solução para os impasses na
negociação, quando deflagradas greves em serviços
essenciais, em relação aos quais o
interesse público na manutenção
dos serviços exigiria uma intervenção estatal.
Nesse sentido, pode-se reduzir o poder normativo da Justiça do Trabalho
às hipóteses em que greve em serviço
essencial começa a afetar diretamente
o atendimento às necessidades inadiáveis da população.
A intransigência das
partes em litígio – empresa e sindicato
– não pode transformar a população em refém,
pela carência dos serviços
básicos (energia, transporte, saúde,
comunicação, etc). A intervenção estatal, através
do Ministério Público, para
postular em juízo a composição
do litígio ou, ao menos, a garantia do atendimento mínimo
às necessidades inadiáveis da
população durante a greve, faz-se
necessária. Daí a previsão dos dissídios coletivos
de greve como matéria de
competência da Justiça do Trabalho.
Essa foi a solução adotada no último parecer da Reforma
do Judiciário, aprovado
na comissão especial da Câmara
dos Deputados:
"Art. 115. (...)
§ 2º Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade
de lesão do interesse
público, o Ministério Público
do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo
à
Justiça do Trabalho decidir o conflito".
No entanto, isso ainda é pouco. Se, até o momento, a Justiça
do Trabalho prestou relevantes serviços à
sociedade, resolvendo, através de seu
poder normativo, os conflitos coletivos de trabalho, fixando condições
e normas
de trabalho consentâneas com a realidade
de cada setor produtivo, não se deve desprezar esse arcabouço
judicial de
composição dos dissídios
coletivos. Se o intuito maior da extinção do poder normativo
é o de estimular as formas
alternativas de composição de
conflitos, entre as quais se destacam a negociação coletiva,
a mediação e a arbitragem,
parece conveniente aproveitar a experiência
da Justiça do Trabalho na apreciação dessas questões,
fazendo com que
sua estrutura possa ser utilizada para a arbitragem
dos dissídios coletivos.
Assim, os dissídios coletivos de natureza econômica poderiam
continuar a ser apreciados pela Justiça do
Trabalho, mas apenas em duas hipóteses:
- dissídio coletivo de greve, quando afetado o interesse público,
pela falta de atendimento às necessidades
inadiáveis da população
quanto aos serviços essenciais definidos em lei, facultando-se a
propositura do dissídio não
apenas ao Ministério Público,
mas também às partes em litígio; e
- dissídio coletivo de mútuo acordo, quando ambas as partes
concordam em submeter à Justiça do Trabalho a
solução da questão, caso
em que o Judiciário Laboral atuaria como juízo arbitral.
Ademais dos dissídios coletivos de natureza econômica, não
se deve esquecer que os dissídios coletivos de
natureza jurídica, onde não
há exercício de poder normativo, mas de típica jurisdição,
com interpretação do
ordenamento jurídico vigente, devem
ser contemplados especificamente na Emenda Constitucional que aprovar a
Reforma do Judiciário, pois constituem
elemento de aglutinação de ações individuais,
permitindo a redução de
demandas judiciais, pela concentração
das questões similares num único processo exegético.
Nesse sentido, mereceriam ser incluídos, no parecer da relatora
da reforma do judiciário, relativo à competência
da Justiça do Trabalho, mais dois incisos,
do seguinte teor:
"Art. 115. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
(...)
X – os dissídios coletivos de natureza econômica, quando ambas
as partes concordarem
em submeter o conflito à Justiça
do Trabalho, podendo esta fixar normas e condições de
trabalho;
XI – os dissídios coletivos de natureza jurídica".
A limitação do poder normativo da Justiça do Trabalho,
diminuindo o volume de processos a serem apreciados
pela SDC do TST e pelos Grupos Normativos
dos TRTs, poderá ser compensada pela elevação da competência
originária para apreciação
das ações civis públicas.
De fato, o futuro aponta para a coletivização do processo,
pela concentração de ações semelhantes em
processos únicos, em que a solução,
que deve ser a mesma para todos os afetados, fica garantida pelo julgamento
por
órgão judicial com jurisdição
sobre todo o território em que se estende a lesão ao direito.
A Reforma do Judiciário não pode olvidar a fixação
da competência originária dos Tribunais para a apreciação
das ações civis públicas
relativas a lesões cuja abrangência ultrapasse a base territorial
dos órgãos de 1ª instância.
Em matéria de competência hierárquica para apreciação
das ações civis públicas, a jurisprudência do
TST
oscilou, desde o reconhecimento da competência
originária do TST para ações de âmbito nacional
(TST-ACP
92.867/93, Rel. Min. MANOEL MENDES DE FREITAS,
in LTr 58-05/564, decisão proferida pela SDC), até a
atribuição de competência
às Juntas de Conciliação e Julgamento (TST-ACP 154.931/94,
Rel. Min. RONALDO
LOPES LEAL, julgada em 24/9/96 pela SDI).
Após esta última decisão, não houve alteração
na orientação do TST,
conforme bem reportado pelo Ministro RONALDO
LEAL nos debates que se seguiram à sua conferência no 4o.
Ciclo
de Estudos de Direito do Trabalho, realizado
em Comandatuba, sob os auspícios da Escola Nacional da Magistratura,
e
recolhido no artigo "Competência do
Ministério Público do Trabalho - Ações Civis
Públicas, com Ênfase na Segurança
Bancária e na Segurança e Saúde
do Trabalhador" (in "Revista do Tribunal Superior do Trabalho", n. 1 da
nova série,
Síntese - dezembro/1999 - Brasília,
pgs. 64-68).
Ora, a edição da Lei 9.494/97, que alterou a redação
do art. 16 da Lei 7.347/85, limitando a eficácia das
sentenças prolatadas em ações
civis públicas à competência territorial do órgão
prolator, veio a trazer novamente à tona
o debate a respeito da competência originária
para a apreciação das ações civis públicas.
A Lei 9.494/97 resultou da conversão da Medida Provisória
1.570-4/97 que, conforme reconheceu o Min.
RONALDO LEAL nos debates acima referidos,
importaria numa alteração no ordenamento jurídico,
capaz de ensejar
a revisão da orientação
atual do TST.
Quando sustentamos, em nosso "Processo Coletivo do Trabalho", que a competência
originária das ações civis
públicas de âmbito nacional seria
do TST, fizemo-lo por considerar que a natureza da ação civil
pública é a mesma do
dissídio coletivo de natureza jurídica,
ou seja, a aplicação de norma jurídica existente para
toda a categoria representada
na ação (LTr – 1996 – São
Paulo, pgs. 219-221).
Ainda que o objetivo da Lei 9.494/97 tenha sido o de restringir os efeitos
das sentenças em ações civis públicas,
de modo a evitar que abraçassem a todos
os lesados no território nacional, pode-se concluir que permite
sustentar a
competência originária dos Tribunais,
quando se tratar de lesão de âmbito regional ou nacional.
Isto porque a
indivisibilidade do objeto da ação
civil pública, ao defender interesses difusos ou coletivos (Lei
8.078/90, art. 81,
parágrafo único, I e II), faz
com que não se possam dar provimentos jurisdicionais distintos para
integrantes do mesmo
grupo ou categoria. E o art. 16 da Lei 7.347/85,
ao falar em "competência territorial do órgão prolator"
da sentença,
sem definir qual seja, permite a conclusão
de que seja um tribunal.
Convém recordar que o parecer do Min. NELSON JOBIM, na relatoria
da revisão constitucional de 1994,
contemplava a competência originária
dos tribunais para a apreciação das ações civis
públicas também para a Justiça
Federal (cfr. op. cit., pg. 8).
De qualquer forma, seria muito importante, num contexto global de redução
do poder normativo, a valorização
das ações civis públicas
como elemento de composição ampla das grandes questões
trabalhistas, enobrecendo sua
feição com a atribuição
da cognição originária a um órgão colegiado,
dada a extrema relevância que as questões
jurídicas adquirem quando veiculadas
através da ação civil pública, pois uma solução
equivocada, por se estender a
toda a categoria representada pelo sindicato
ou defendida pelo Ministério Público, pode comprometer
irremediavelmente a viabilidade econômica
da empresa acionada.
SÚMULAS VINCULANTES
O TST, como também o STF e o STJ, têm quebrado, a cada ano,
seus próprios recordes em matéria de número
de julgamentos realizados. Em 1999, o TST
julgou mais de 121.000 processos, numa média de 3.270 processos
julgados por ministro (considerando-se 17
ministros togados, 10 ministros classistas e 10 juízes convocados).
O art. 106, § 1º, da LOMAN permite a proposta de majoração
do número de membros de um tribunal quando o
número total de processos distribuídos
e julgados, durante o ano anterior, superar o índice de 300 feitos
por juiz. Ora, o
TST já ultrapassou mais de 10 vezes
esse limite, o que mostra a carga sobre-humana de processos que pesa sobre
seus
integrantes.
A prática tem demonstrado que a simples elevação do
número de julgadores (com a convocação permanente
de
10 juizes de TRTs) não tem servido
para debelar a massa de recursos que chegam diariamente ao TST. Não
obstante
todo o esforço realizado no ano de
1999, o Tribunal terminou o ano com um saldo de mais de 105.000 processos
aguardando distribuição, além
dos quase 5.000 processos aguardando autuação.
A verificação de que quase 90% das questões são
repetitivas, com recursos discutindo matérias já pacificadas,
conduz à conclusão de que a
solução para o problema da sobrecarga de processos nos Tribunais
Superiores não é a de
elevar o número de seus membros, mas
a de restringir a subida de recursos, através da adoção
da súmula vinculante, a
ser observada pelas instâncias inferiores,
sob pena de aplicação de medidas correicionais aos juizes
renitentes.
Sem a súmula vinculante, a realidade vivenciada na prática
pelos tribunais superiores é a da inobservância de dois
pilares básicos sobre os quais se fundamenta
o duplo grau de jurisdição:
Princípio da indelegabilidade da jurisdição – O sistema
confere apenas ao juiz o exercício da jurisdição,
devendo
examinar com cuidado e consciência todas
as questões que lhe são trazidas. Ora, levando-se em conta
o número de
processos julgados pelo TST em 1999, em 40
semanas úteis de trabalho (descontadas as férias e recesso
forense),
temos uma média de mais de 80 processos
examinados por ministro como relator por semana, além de mais de
40
como revisor, num total de mais de 120 processos
semanais (24 processos a serem examinados por dia útil, além
de 3
dias de sessão por semana). É
humanamente impossível para um único juiz dar vazão
a essa carga de processos. Assim,
a assessoria de cada gabinete prepara as minutas
de votos e despachos, mas a revisão final deve ser do ministro,
o que
é difícil diante desse volume
de processos. Verifica-se, então, que o exame efetivo de muitos
processos acaba sendo da
assessoria e não do ministro: pessoas,
em muitos casos, recém-formadas e que não têm a experiência
necessária para
decidir em última instância sobre
as questões que chegam até o TST.
Princípio da colegialidade – A revisão da decisão
monocrática ou colegiada da instância inferior se dá
por um
colegiado, o que, em tese, propiciaria maior
probabilidade de acerto. No entanto, a prática tem sido bem distinta:
os
121.000 processos julgados num total de 361
sessões do TST resulta numa média de 335 processos julgados
por
sessão; durando em média 4 horas
cada sessão, temos a média de 42 segundos por processo, o
que mostra que há um
arremedo de julgamento. Assim, para determinados
tipos de processos (agravos de instrumento e embargos
declaratórios) ou para matérias
repetitivas (planos econômicos), os processos são julgados
por lote: o secretário da
seção ou turma enumera os processos
e o relator limita-se a dizer que, em relação a todos eles,
está, ou não,
conhecendo do recurso e negando ou dando provimento.
E, no final, o presidente da seção ou turma pergunta aos
membros do órgão: "Há
divergência?". Ora, como se pode divergir do que não se conhece
o teor? O julgamento acaba
sendo, efetivamente, monocrático.
Nesse sentido, o volume extraordinário de recursos nos tribunais
superiores acaba gerando a necessidade de que
seus membros tenham que confiar inteiramente
em suas assessorias e nos seus colegas, pois não conseguirão
examinar
com rigor todos os processos, nem terão
ciência efetiva das questões que estão sendo esgrimidas
em todos os
processos que se incluem nas pautas de julgamento.
Assim, sem a atribuição de efeito vinculante às súmulas,
estas serão fruto da análise da questão escoteira
que vem
ao Tribunal, sendo depois aplicada essa jurisprudência
aos demais casos semelhantes, mas com o perigo de, na pressa,
se enquadrar equivocadamente um determinado
caso em hipótese padrão para a qual ele não se amolda
perfeitamente.
Com isso, o julgamento dos casos seguintes
será uma verdadeira loteria, sem a certeza do que se está
julgando, pois o
enquadramento da hipótese em matérias
repetitivas acaba sendo feito pelas assessorias dos ministros, sem que
este
possa verificar, efetivamente, com acurada
análise dos autos, se a hipótese era aquela.
Esse sistema massacrante da atividade judicante tem levado, também
em relação aos processos pioneiros, que
mereceriam análise e debate mais acurado,
a que o órgão judicante, no afã de dar vazão
ao volume crescente de
recursos, se apresse em decidir sem maiores
delongas: o importante são as estatísticas e não o
produto final de soluções
mais justas para as questões.
Ora, o defeito que leva a essa realidade está na necessidade de
que os tribunais superiores tenham que rever uma
série de decisões nas quais
se insiste em julgar em desacordo com a jurisprudência pacificada
das Cortes Superiores. A
súmula vinculante, ao exigir que as
instâncias inferiores apliquem as soluções que se tornaram
jurisprudência pacifica nas
instâncias superiores, traz duplo benefício
para o jurisdicionado:
Democratização do acesso à Justiça – uma vez
que estende, de forma imediata, a todos os cidadãos que tenham
casos judiciais semelhantes, a solução
adotada pela Corte Superior, desonerando-os de terem que enfrentar os custos
e
delongas de recursos intermináveis
para obter o que já sabem que será a decisão final
para suas demandas;
Maior perfeição técnica das decisões – uma
vez que os tribunais superiores, tendo menor número de processos
para julgar, poderão fazê-lo
com maior consciência, enfrentando e debatendo de forma mais efetiva
as questões novas
com as quais vão se deparar.
Nesse sentido, a adoção da súmula vinculante, especialmente
em matéria trabalhista, é de suma importância para
que tanto empregados como patrões possam
contar com maior estabilidade, segurança e celeridade na solução
dos
conflitos que têm entre si, diminuindo
também o custo das demandas judiciais nas quais se envolvam.
CRITÉRIO DE RELEVÂNCIA NO RECURSO DE REVISTA
A par da súmula vinculante, outra técnica a ser adotada para
o desafogamento dos Tribunais Superiores,
simplificação dos recursos e
caracterização dessas Cortes como instâncias extraordinárias
é a da demonstração da
relevância federal ou transcendência
política, social, econômica ou jurídica das causas
que merecerão a apreciação
pelos Tribunais Superiores.
A Suprema Corte Americana adota tal técnica, ao escolher os processos
que irá julgar, conforme sua relevância.
Uma vez decidida a questão, com a formação
do precedente, a jurisprudência formada passa a ser aplicada pelos
juizes
e cortes inferiores, podendo ser revista apenas
se a Suprema Corte considerar que surgiram novos argumentos que
justifiquem uma revisão de sua decisão
originária.
Sob o império da Carta Política de 1967/1969, o Supremo Tribunal
Federal, como instância uniformizadora da
jurisprudência em torno da interpretação
da Constituição e da lei federal, funcionou com técnica
semelhante, consistente
na argüição de relevância
da questão federal, que deveria ser demonstrada no recurso extraordinário,
para que este
pudesse transitar pelo STF (CF 67/69, art.
119, III e § 1º).
O insucesso do sistema da argüição de relevância
no Supremo Tribunal Federal deveu-se à necessidade do STF
justificar motivadamente a não apreciação
meritória de todos os processos que deixassem de ser julgados. Assim,
não
havia efetiva diminuição de
processos, continuando o STF com a sobrecarga inviabilizadora de uma apreciação
mais
acurada dos processos que efetivamente fossem
julgados, pela sua relevância.
O parecer da relatora da Reforma do Judiciário, Dep. ZULAIÊ
COBRA, contempla um certo retorno do
sistema, pela inclusão de pressuposto
de admissibilidade para o recurso extraordinário, recurso especial
e recurso de
revista, consistente na necessidade de se
demonstrar a repercussão geral das questões tratadas, para
que mereçam ser
apreciadas. A novidade ficou por conta da
extensão do requisito para os recursos especial e de revista, que
nunca
contaram com tal orientação.
Assim consta do relatório:
"Art. 102. (...)
§ 4º No recurso extraordinário, o recorrente deverá
demonstrar a repercussão geral
das questões constitucionais discutidas
no caso, a fim de que o Tribunal examine a
admissão do recurso, somente podendo
recusá-lo pela manifestação de dois terços
de seus
membros".
"Art. 105. (...)
§ 2º No recurso especial, o recorrente deverá demonstrar
a repercussão geral das
questões federais discutidas no caso,
a fim de que o Tribunal examine o seu cabimento,
somente podendo recusá-lo pela manifestação
de dois terços de seus membros".
"Art. 112. (...)
§ 3º No recurso de revista, o recorrente deverá demonstrar
a repercussão geral das
questões federais discutidas no caso,
a fim de que o Tribunal examine o seu cabimento,
somente podendo recusá-lo pela manifestação
de dois terços de seus membros" (grifos nossos).
A inserção de tal requisito para a admissibilidade dos recursos
de natureza extraordinária é de suma importância
para não vulgarizar os tribunais superiores.
Se todos os processos acabarem desembocando nas Cortes Superiores, o
que era extraordinário passa a ser
o ordinário, com a desenganada intenção das partes
de rediscutir indefinidamente as
questões nas quais litigam.
No entanto, a proposta do parecer da relatora peca por incidir no mesmo
defeito do sistema anterior,
agravando-o inclusive. Prevê que o STF,
STJ e TST somente possam recusar a apreciação de recurso,
por ausência de
demonstração da repercussão
geral das questões, quando o façam por maioria de 2/3 de
seus membros. Ou seja, é
mais fácil julgar o processo do que
deixar de apreciá-lo. E mais. Os recursos em tela são de
competência originária das
turmas, órgãos fracionários
do tribunal, e a não apreciação do apelo teria que
ser discutida no plenário das Cortes
Superiores, o que é completamente descabido.
Assim, se permanecer o quorum qualificado, apenas se terá criado
mais
um elemento sobre o qual as partes deverão
gastar seu tempo sustentando a importância da questão, quando
o Tribunal
não gastará o seu em refutá-lo,
preferindo julgar logo o feito.
Nesse sentido, caso venha a ser adotada essa nova fórmula de argüição
de relevância, deve ser expungida a parte
final dos dispositivos, relativa ao quorum
mínimo para recusa de julgamento. Teríamos, então,
a possibilidade de se
utilizar o novo critério de relevância
como elemento de discricionariedade para que os tribunais superiores possam
escolher as causas que vão julgar,
em face da repercussão geral que teriam na sociedade e na economia,
sem
necessidade de justificar o motivo pelo qual
não apreciarão as demais causas.
Consideramos, no entanto, que uma fórmula mais coerente de se atribuir
poder discricionário para os tribunais
superiores escolherem as causas que julgarão
seria a de lhes permitir estabelecer critérios de transcendência
política,
social, econômica ou jurídica
para a apreciação das causas que lhes subam para análise.
E por quê "critérios de transcendência"? Porque, em
nosso sistema jurídico, o duplo grau de jurisdição
já
assegura às partes a revisão,
por um colegiado, da decisão proferida pelo juiz singular, obtendo-se
rejulgamento integral
da causa, com reexame de fatos e provas e
do direito aplicável à hipótese. Os tribunais superiores
não têm a missão de
fazer justiça, no sentido de reexaminar
a causa, mas de garantir a aplicação uniforme do direito
federal em todo o
território nacional. Assim, sua missão
transcende o interesse das partes, ligando-se à defesa dos interesses
do Estado
Federado, de que suas normas não sejam
inobservadas por alguma das unidades que compõem a Federação.
Daí que apenas as questões que transcenderem o interesse
das partes, para afetar o próprio interesse da
sociedade organizada em Estado Federal, é
que merecerão ser julgadas pelas Cortes Superiores. E caberá
a essas
Cortes, com seu poder discricionário,
estabelecer esses critérios de transcendência e aplicá-los
aos casos concretos. Do
contrário, continuarão os tribunais
superiores a funcionar como 3ª ou 4ª instância ordinária,
julgando de forma sumária
os processos que lhes chegam, em sistema que
apresenta maior discricionariedade do que o que se adotaria
explicitamente.
Uma sugestão que fazemos, em termos de redação de
dispositivo para a Emenda Constitucional veiculadora da
Reforma do Judiciário seria a seguinte:
"Art. 96. (da Constituição Federal)
§ 1o A lei estabelecerá, em relação ao Supremo
Tribunal Federal e aos tribunais
superiores:
a) os pressupostos de admissibilidade dos recursos de sua competência,
admitindo-se
seleção das causas a serem decididas,
segundo critério de transcendência social,
econômica, política ou jurídica;
b) os casos de edição de súmulas vinculantes e o procedimento
a ser observado para
sua edição, revisão e
cancelamento.
§ 2o Ao Supremo Tribunal Federal e aos tribunais superiores é
facultada a iniciativa
de lei de que trata o parágrafo anterior".
"Art. 76. (do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias)
Enquanto não editada
a lei a que se refere o § 1º do
art. 96, caberá aos regimentos internos do Supremo
Tribunal Federal e dos tribunais superiores
a regulamentação dos requisitos e procedimento
para a edição, revisão
e cancelamento das súmulas com efeito vinculante, bem como o
estabelecimento dos pressupostos de admissibilidade
dos recursos de suas respectivas
competências".
Com a adoção do critério de relevância ou de
transcendência das questões federais, poderão os tribunais
superiores ter condições de
apreciar com tranqüilidade, segurança, consciência e
precisão as causas que lhes forem
dirigidas, dedicando seu escasso tempo àquelas
que, efetivamente, terão repercussão tal na comunidade, que
exigem
detida análise de todos os aspectos
que a envolvam, de modo a que a solução seja a que melhor
atenda aos interesses
da sociedade.
CONCLUSÃO
A Justiça do Trabalho entra no ano 2000 com nova cara, mais técnica,
célere e barata, com o que sai ganhando o
jurisdicionado. A extinção da
representação classista constitui marco histórico
do aperfeiçoamento deste ramo
especializado do Judiciário brasileiro.
As novas leis que instituíram o rito sumaríssimo, as comissões
de conciliação
prévia e o provimento de recurso por
despacho vieram a dinamizar e dar rapidez à solução
dos conflitos individuais de
trabalho.
No entanto, essa modernização ainda não é suficiente.
A adoção das súmulas vinculantes e dos critérios
de
transcendência para apreciação
do recurso de revista, a limitação do poder normativo em
dissídios coletivos de natureza
econômica e a valorização
das ações civis públicas no âmbito trabalhista
são medidas que merecem imediata
concretização, através
de sua inclusão entre os tópicos a serem aprovados na Reforma
do Judiciário. Só assim
poderemos adentrar no Terceiro Milênio
com uma Justiça do Trabalho capaz de atender aos reclamos de pacificação
dos conflitos laborais numa sociedade globalizada.
retirado de: http://www.jus.com.br/doutrina/jtrab2000.html