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Arbitragem na América do Sul: Organização dos Estados Americanos (OEA)
Leon
Frejda Szklarowsky*
A ORGANIZAÇÃO DOS
ESTADOS AMERICANOS - OEA tem sua origem remota na União Internacional das
Repúblicas Americanas, criada para fazer frente aos Estados europeus
colonialistas. A Organização dos Estados Americanos é fruto da resolução da IX
Conferência sobre Problemas da Guerra e da Paz, realizada, no México,
constituindo-se em organismo regional dentro da ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS -
ONU. O Tratado foi assinado, em 30 de abril de 1948, no curso da IX Conferência
Interamericana de Bogotá. (01)
Rezam
os artigos 23 e 24 que as controvérsias internacionais, entre os
Estados-membros, deverão ser resolvidas pacificamente, de acordo com os
processos previstos, nesse Documento. Distinguem-se a negociação direta, os
bons ofícios, a mediação, a investigação e conciliação, o processo judicial e a
arbitragem.
A
nota relevante desse Tratado assenta-se na regra de que nenhuma divergência
entre os Estados da América poderá ficar sem solução definitiva.
MERCOSUL
Tratado
de Assunção
O
MERCOSUL foi constituído pelo Tratado de Assunção (02), com o
objetivo de constituir um mercado comum, cognominado Mercado Comum do Sul, fundado
na reciprocidade de direitos e obrigações recíprocos. (03)
Prevê
esse Documento Internacional que as controvérsias entre as partes, em virtude
da aplicação desse tratado, resolvem-se, mediante negociação direta. Em caso de
malogro, os Estados-partes poderão submeter o dissídio ao Grupo Mercado Comum –
GMC para, se for o caso, convocar painéis de especialistas ou peritos, com a
finalidade de prestar-lhe o assessoramento técnico. (04)
Estipula,
ainda, o comprometimento das partes em adotar um sistema de solução de
controvérsias para vigorar no período de transição.
Protocolo
de Brasília
O
Protocolo de Brasília, (05) para solução de controvérsias, previsto
no Anexo III, do citado Tratado, parte integrante deste Ajuste, determinava que
as controvérsias entre as partes podiam ser resolvidas, por negociação direta
ou por intervenção do Grupo Mercado Comum, se o dissídio não tivesse tido
solução ou apenas parte dele se resolveu.
Se,
entretanto, ainda assim, as partes não conviessem, qualquer delas podia
comunicar à Secretaria Administrativa seu desejo de recorrer à arbitragem,
minuciosamente disciplinada, no Protocolo citado.
Protocolo
de Ouro Preto
O
Protocolo de Ouro Preto (06) assinalava que se submeteriam aos
procedimentos traçados, no Protocolo de Brasília, as controvérsias, surgidas
entre os Estados participantes, sobre a aplicação ou o descumprimento do
Tratado de Assunção, dos acordos, das decisões do Conselho do Mercado Comum,
das resoluções desse Grupo e das diretrizes da Comissão de Comércio do
Mercosul.
Protocolo
de Olivos
O
Protocolo de Olivos (07) para solução de controvérsias, no Mercosul,
(08) derroga, a partir de sua entrada em vigor, o Protocolo de Brasília e
seu Regulamento, aprovado pela Decisão CMC 17/98. (09)
A
Argentina, o Brasil, o Paraguai e o Uruguai firmaram esse acordo, visando
aperfeiçoar, em caráter definitivo, o sistema de solução de controvérsias entre
os Estados participantes do MERCOSUL. Prevê a criação do Tribunal Permanente de
Revisão, composto de 5 árbitros titulares e 5 suplentes, para mandato de 2
anos, renovável, por no máximo, dois períodos consecutivos. O quinto árbitro
exercerá a função, por três anos, proibida a recondução, segundo procedimento
descrito no artigo 18.
Os
árbitros são juristas, de reconhecida competência, nas especialidades, sobre o
que terão que decidir, bem como acerca das normas do Mercosul.
O
Tribunal ad-hoc, composto de três árbitros, julga a discórdia entre as
partes, quando se tornou impossível a solução, através da negociação direta ou
da intervenção do GMC - Grupo Mercado Comum.
O
Protocolo e o Regulamento disciplinam, minuciosamente, o processo e as diversas
formas de solução da controvérsia, v.g.: a negociação direta, a intervenção do
Grupo Mercado Comum, o procedimento arbitral ad-hoc e o recurso ao
Tribunal Permanente de Revisão. (10), que funciona como segunda
instância permanente.
João
Grandino Rodas assinala que, a continuar o Mercosul, no ritmo atual, a médio e
longo prazo, haverá, sem dúvida, a institucionalização dos órgãos julgadores.
(11)
Os
laudos do Tribunal Arbitral Ad-Hoc e do Tribunal Permanente de Revisão serão
adotados por maioria e deverão conter a fundamentação e ser assinados pelo
presidente e pelos demais árbitros. Os árbitros deverão manter sigilo sobre
seus votos e sobre as deliberações tomadas. Os votos dissidentes não poderão
ser fundamentados. A arbitragem é de natureza confidencial. (12)
Alejandro
Daniel Perotti faz um interessante estudo sobre o terceiro laudo do Mercosul,
referente à aplicação de medidas de salvaguarda sobre produtos têxteis
(Resolução 861/99). O Brasil alicerçou sua posição em várias disposições do
Tratado de Assunção. (13)
COMUNIDADE
ANDINA DE NAÇÕES
Guilherme
Chahin Lizcano tece comentário, de invulgar interesse, sobre o novo Tribunal de
Justiça da Comunidade Andina, antes denominado Tribunal Andino de Justicia del
Acuerdo de Cartagena, o qual passara a ter novas funções, em vista das
profundas reformas introduzidas, dentre as quais se distingue a função
arbitral, não judicial, para solucionar conflitos, em virtude da aplicação ou
interpretação de contratos, convênios ou acordos firmados entre os órgãos e
instituições do sistema andino de integração, entre estes e terceiros, desde
que as partes assim convierem. Também poderão utilizar-se da arbitragem os
particulares, para dirimir os conflitos derivados dos contratos privados
regidos por normas do ordenamento jurídico andino.
JURISPRUDÊNCIA
DO MERCOSUL
**
Para dirimir o conflito entre a República do Paraguai e a República Oriental do
Uruguai, sobre a aplicação do IMESI (imposto específico interno para a
comercialização de cigarros), foi constituído o Tribunal Arbitral Ad-Hoc,
Mercosur, 2002/05/2002.
Decidiu
o Tribunal, por unanimidade, que o Uruguai cesse a discriminação contra os
cigarros paraguaios, tendo em vista tratar-se de país fronteiriço. Por maioria,
mandou cessar os demais efeitos discriminatórios, no âmbito administrativo.
Ainda, por unanimidade, estabeleceu o prazo de seis meses para o Uruguai
cumprir a decisão arbitral. Funcionou como membro da Secretaria Administrativa
o brasileiro Luiz Olavo Batista. (14)
**
Em 19 de abril de 2002, constituiu-se, a pedido da Argentina, o Tribunal
Arbitral Ad-Hoc, para resolver o conflito entre esse país e o Brasil, acerca
dos obstáculos opostos para o ingresso, no nosso país, de produtos
fito-sanitários argentinos, em vista da não incorporação no direito interno
brasileiro das Resoluções GMC 48, 87, 149 e 156, de 1996, e 71/98.
Decidiu
o Tribunal, por unanimidade, invocando o Protocolo de Brasília e de Ouro Preto,
que existe realmente omissão do Brasil, no que diz respeito à obrigação imposta
pelos artigos 38 e 40 do Protocolo de Ouro Preto, no sentido de incorporar no
ordenamento jurídico interno as citadas Resoluções, e ainda dispôs que, no
prazo de 120 dias, a partir da data da notificação do presente laudo, o Brasil
faça a incorporação das citadas Resoluções ao Direito interno. (15)
De
passagem por SP 5/8/2004 11:12:24
Notas
1
Cf. Vicente Marotta Rangel, in op. cit.
2Consulte-se
o Tratado, na íntegra, in Direito e Relações Internacionais cit., de Vicente
Marotta Rangel. Este tratado foi firmado em 26 de março de 1990 e aprovado pelo
Congresso Nacional, em 25 de setembro de 1991. Consulte-se também o Tratado da
Associação Latino-americana de Integração - Tratado de Montevidéu (in op,.
cit.).
3
Consulte-se, de Sálvio de Figueiredo, A arbitragem como meio de solução dos
conflitos no âmbito do Mercosul e a imprescindibilidade da Corte Comunitária,
in RJ 236/15. Consulte-se também, de Daniel H. Rosano, Arbitraje y Mercosur:
una rápida e introductoria mirada, in. Revista de Derecho Internacional y del
Mercosur, Síntese Editora, nº 4, impressa na Argentina, La Ley Sociedad Anônima
Editora e Impresora Buenos Aires, nº 2, pp. 148 e segs. Consulte-se ainda de
Werter R. Faria, As medidas provisionais no sistema de solução de controvérsias
no Mercosul, in Revista de Derecho Internacional y del Mercosur, Síntese Editora,
nº 2, impressa na Argentina, La Ley Sociedad Anônima Editora e Impresora Buenos
Aires, pp. 180 e segs.
4
Cf. Anexo 3 ao Tratado.
5
Aprovado pelo Decreto-legislativo 88, de 1º de dezembro de 1992. Promulgado, em
10 de setembro de 1993, pelo Decreto 922.
Consulte-se,
de Alejandro Daniel Peroti, Proyecto de Reforma ao Protocolo de Brasília, in.
Revista de Derecho del Mercosur, Síntese Editora, nº 2, impressa na Argentina,
La Ley Sociedad Anônima Editora e Impresora Buenos Aires, pp. 135 e segs.
6
Protocolo adicional ao Tratado de Montevidéu, assinado em Ouro Preto, MG,
Brasil, em 17 de dezembro de 1994, aprovado pelo Congresso Nacional, em 18 de
dezembro de 1995, pelo Decreto legislativo 188, e promulgado em 9 de maio do
ano seguinte, pelo Decreto 1901(apud op. de Marotta Rangel cit.). Consulte-se
ainda de Adriana N. Pucci a obra citada.
7
O Protocolo de Olivos foi regulamentado pelo Regulamento do Protocolo de Olivos
12/15/2003, em atenção ao artigo 47, para assegurar a efetividade de seus
mecanismos e a maior segurança jurídica do processo de integração.
8
O Protocolo foi assinado, em 18 de fevereiro de 2002, na cidade Olivos,
Província de Buenos Aires, Argentina.
9
Cf. site mercosul.gov.Br/textos/defalt.asp?Key 182, em 21 de maio de 2004.
10
Leia-se a obra Mecanismo de Solução de Conflito, de Nádia de Araújo, in A
Agenda Política Institucional do Mercosul, Fundação Konrad Adenauer, 14, 1997,
p. 153. Consultem-se também, de Melissa Carvalho Kano, A arbitragem nos países
do Mercosul, in Mercosul Justiça Regional e Globalização, e, de Paulo B.
Casella, Renovar, Rio, 2000, p. 481, João Bosco Lee, Arbitragem Comercial e
Internacional nos países do Mercosul, Juruá, Curitiba, 2002.
11
Cf. entrevista concedida à Revista Jurídica Consulex 179, de 30 de junho de
2004. O Professor João Grandino Rodas foi indicado, pelo Governo brasileiro,
para o Tribunal Permanente de Revisão.
12
Cf. Capítulo VIII do Protocolo de 0livos cit. Consulte-se, de Maria do Carmo P.
Caminha, Os laudos do Mercosul e a jurisprudência das Comunidades Européias, in
Revista de Derecho del Mercosur, Síntese Editora, nº 5, impressa na Argentina,
La Ley Sociedad Anônima Editora e Impresora Buenos Aires, pp. 168 e segs.
13 Cf. Tercer Laudo del Mercosur. La
buena excusa para hablar de salvaguardias y del Derecho Regional, in Revista de
Derecho del Mercosur, Síntese Editora, nº 5, impressa na Argentina, La Ley
Sociedad Anónima Editora e Impresora Buenos Aires, pp. 201 e segs.
14 Cf. Revista de Derecho del
Mercosur, Síntese Editora, nº 4, impressa na Argentina, La Ley Sociedad Anónima
Editora e Impresora Buenos Aires, pp. 125 e segs. V. neste número a
íntegra do laudo arbitral.
15
Cf. Revista de Derecho del Mercosur cit. n° 3, pp. 145 e segs. Nesta revista,
encontra-se transcrito o inteiro teor do laudo, contendo notável estudo a
respeito da matéria. Consultem-se também neste número os eruditos trabalhos:
"Comentario al laudo arbitral sobre fitosanitários: nuevo aporte al
‘acervo jurídico’ de Mercosur, de Emilio J. Cardenas e Guillermo Tempesta, e El
Septimo Tribunal de Mercosur y la decisión sobre la falta de incorporación al
derecho interno de normas del bloque, de Alejandro Daniel Perotti.
*
Advogado e consultor jurídico em
Brasília (DF), subprocurador-geral da Fazenda Nacional aposentado, editor da
Revista Jurídica "Consulex".
Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6838
>. Acesso em: 01/11/06.