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ALCA e TCL: uma contradição continental?

 

René Berardi

 

 

Para os Estados Unidos, a assinatura do Tratado de Livre Comercio, TCL, com o Chile é uma alavanca que faltava para lograr a Alca em 2004. No entanto, existe uma série de problemas no horizonte que põem em perigo as intenções americanas.

 

A ALCA nasceu como iniciativa do ex-presidente Bill Clinton e foi apresentada como um grande projeto que contempla a formação de um mega mercado de livre comércio com uma população de 800 milhões de habitantes, um PIB de US$ 9 bilhões e que cobre desde Alaska até Terra Del Fuego, visando uma integração real de economias, maior crescimento, melhores condições de trabalho, estabilidade política regional. No entanto, tem aparecido uma série de problemas entre os 34 países da região, que colocam em dúvida se realmente a ALCA vai se iniciar o 31 de dezembro de 2004.

 

Para os EUA, o principal problema é o Brasil, pois está existindo uma falta de acomodação provocada pelas reclamações sobre as alíquotas das exportações, em que os EUA aplicam, em media, 45% de impostos para as exportações do Brasil, principalmente sobre o suco de laranja, açúcar, soja e o trigo, enquanto que o Brasil aplica impostos médios de 15% às exportações dos EUA. Como conseqüência deste conflito, o Brasil se tem mostrado reticente a acelerar as negociações para cumprir o prazo fixado, priorizando a negociação em bloco do Mercosul com a ALCA.

 

O mais grave é que os EUA não estão muitos dispostos a fazer concessões, pois já aumentou os subsídios agrícolas e aplicou restrições às importações do aço e caso se interesse em eliminá-las geraria um alto custo político. Além do fato de que há no próximo ano eleição presidencial, contexto em que os EUA está deixando fora da discussão estes temas complexos para serem discutidos na Organização Mundial do Comercio, OMC, antes do 2005. As expectativas são de que o acordo possa ter um atraso para 2007 ou que seja assinado na data fixada, mas sem incluir os assuntos sensíveis, como os agrícolas que continuariam em negociação.

 

A Venezuela ainda não mostrou interesse em participar das negociações. O México não tem criticado a Alça, mas também não tem mostrado uma atitude pró-ativa para com EUA. A razão principal é o TCL assinado com EUA, que permite um acesso preferencial ao mercado americano desde 1994, e o fato do México ter acordos de livre comércio com toda a região, apresentando um baixo entusiasmo que se reflete num baixo nível de discussão interna entre as organizações sociais do país. O mesmo pode acontecer com os países da América Central que atualmente estão negociando TCL com EUA, podendo perder o interesse na ALCA.

 

A assinatura do TCL entre o Chile e os EUA também complica as futuras negociações, pois o Chile observa com preocupação a liderança regional que está assumindo o presidente Lula, principalmente após as conversações pessoais realizadas com os presidentes da Venezuela, Colômbia, Equador e Peru, no sentido de ver sua incorporação ao Mercosul. A posição do Chile é desconfortável, pois de um lado, é importante construir eixos de poder com Brasil, Argentina e México, mas não pode incomodar os EUA, pois após rejeitar a guerra contra o Iraque, os EUA já não consideram o Chile um aliado ideal.

 

A sintonia Brasileira-Argentina, que está sendo desenvolvida atualmente, está fundamentada na coordenação nas negociações com a Alca, em que os dois têm interesse em ter acesso ao mercado americano para a produção agrícola, especialmente.

Esta aliança também pode se transformar numa alternativa política regional em que os conceitos de pan-americanismo começam a aparecer como forma de conter a doutrina Bush, a social-democracia como forma de limitar as políticas geradas pelo Consenso de Washington, a autonomia para opor à dependência e a assertividade para opôr aos desacordos. Este novo eixo pode transformar-se, no médio prazo, numa referência continental, em que a liderança seja a do Brasil, como líder dos países pobres e de um grande Mercado Comum do Sul.

 

 

 

Retirado de: http://www.consultores.com.br/artigos.asp?cod_artigo=210