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A INCONSTITUCIONALIDADE DE
TRATADOS, ACORDOS E ATOS INTERNACIONAIS
Dr. Antônio Flávio de Oliveira
Advogado e
Assessor de Procurador de Justiça em Goiás
O tratado ou convenção
internacional ratificado pelo Congresso Nacional adentrará no universo jurídico
brasileiro somente através da sua ratificação por Decreto Legislativo do
Congresso. Desta maneira, a inconstitucionalidade que venha a se evidenciar em
relação ao tratado frente à Constituição Brasileira deverá atingir o Decreto
responsável pela sua inclusão no ordenamento jurídico nacional.
Entretanto,
contrariamente ao entendimento de alguns autores, o tratado ou convenção
internacional, mesmo que ratificado pelo Legislativo (Congresso) jamais
padecerá de inconstitucionalidade. Haverá sim, inconstitucionalidade do Decreto
Legislativo que ao ratificá-lo ou referendá-lo inseriu-o no ordenamento jurídico
brasileiro.
É necessário que se tenha
em conta que o fenômeno da inconstitucionalidade tem lugar no momento da
confecção do dispositivo gravado de tal eiva. Assim sendo, o diploma
internacional, no momento de sua confecção, por não se encontrar sujeito aos
limites da Constituição Brasileira não estava maculado por vício de origem.
A inconstitucionalidade é
fenômeno decorrente da supremacia constitucional, mas é antes disto originária
da soberania da nação brasileira, manifesta através da Constituição da
República.
Conforme lição de OSWALDO
LUIZ PALU: "A inconstitucionalidade é a incorreção da norma com o
parâmetro superior positivo, quer sob o aspecto da incorreção formal
(processo legislativo, órgão emissor competente), quer sob o aspecto da incorreção
material (conteúdo substancialmente incompatível), observada sempre
verticalmente." (Controle de Constitucionalidade, RT, 1998, p. 63).
Fica evidente que para a
existência da inconstitucionalidade é necessário que haja subordinação da norma
cuja constitucionalidade é questionada com aquela com a qual ela é confrontada.
JOSÉ AFONSO DA SILVA,
leciona: "Nossa Constituição é rígida. Em conseqüência, é a lei
fundamental e suprema do Estado brasileiro. Toda autoridade só nela encontra
fundamento e só ela confere poderes e competências governamentais. Nem o
governo federal, nem os governos dos Estados, nem os dos Municípios ou do
Distrito Federal são soberanos, porque todos são limitados, expressa ou
implicitamente, pelas normas positivas daquela lei fundamental. Exercem suas
atribuições nos termos nela estabelecidos.
Por outro lado, todas as
normas que integram a ordenação jurídica nacional só serão válidas se se
conformarem com as normas da Constituição Federal." (Curso de Direito
Constitucional, Malheiros, 16ª edição, 1999, p. 48).
Vejam que o ilustre
constitucionalista estabelece vínculo entre a constitucionalidade e o exercício
da soberania. Como também afirma que a validade da norma que "integram a
ordenação jurídica nacional" depende de conformação "com as normas da
Constituição Federal". Ora, o tratado ou convenção não integra o
ordenamento nacional quando de sua elaboração. Ele é trazido ao nosso
ordenamento por força de ato do Congresso Nacional, o qual tendo sua
inconstitucionalidade declarada não retira o tratado ou convenção do mundo
jurídico, mas o exclui da "ordenação jurídica nacional".
Portanto, os limites
estabelecidos ao exercício da soberania, decorrente da existência de outras
soberanias, impõem-se como fator impeditivo a que se tenha por inconstitucional
tratado, acordo ou ato internacional. Assim o é da mesma forma como não se pode
classificar de desumano (na acepção ética) a ação praticada por um animal.
O ato para ser declarado
inconstitucional necessita ter nascido sob a égide do ordenamento
constitucional com o qual se lhe confronta. Desta forma, todos os atos
internacionais, quanto ao momento de sua formação, são irrelevantes sob o
aspecto de sua constitucionalidade frente à Carta Constitucional Brasileira. No
entanto, no momento em que ele adentra em nosso território submete-se aos
nossos limites constitucionais, mas não em razão do seu nascimento, e sim
quando observado sob a ótica do ato que autorizou sua aplicação no Brasil.
Destarte, somente será
inconstitucional o Decreto Legislativo que referendou ou autorizou sua
aplicação, com o que o ato internacional retorna à sua condição de irrelevância
frente ao ordenamento constitucional brasileiro.
Como resultado prático
disto, o direito fundamentado no ordenamento internacional, cujos fatos
constituintes tenham ocorrido no estrangeiro, sob o pálio daquela norma
jurídica, poderão ser postulados em território brasileiro, exceto quando
confrontarem materialmente com o ordenamento constitucional, como se deflui do
teor do art. 337, do CPC, pois a comprovação de vigência ali exigida é aquela
aferível no local da realização do ato. Por exemplo o seguinte julgado do STF,
sobre Convenção n.º 159/OIT:
Relator: Min. CELSO DE MELLO
(Presidente) ADIn 1.480-DF*
E
M E N T A: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - CONVENÇÃO Nº 158/OIT -
PROTEÇÃO DO TRABALHADOR CONTRA A DESPEDIDA ARBITRÁRIA OU SEM JUSTA CAUSA -
ARGÜIÇÃO DE ILEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DOS ATOS QUE INCORPORARAM ESSA
CONVENÇÃO INTERNACIONAL AO DIREITO POSITIVO INTERNO DO BRASIL (DECRETO
LEGISLATIVO Nº 68/92 E DECRETO Nº 1.855/96) - POSSIBILIDADE DE CONTROLE ABSTRATO DE
CONSTITUCIONALIDADE DE TRATADOS OU CONVENÇÕES INTERNACIONAIS EM FACE DA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA - ALEGADA TRANSGRESSÃO AO ART. 7º, I, DA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AO ART. 10, I DO ADCT/88 - REGULAMENTAÇÃO
NORMATIVA DA PROTEÇÃO CONTRA A DESPEDIDA ARBITRÁRIA OU SEM JUSTA CAUSA, POSTA
SOB RESERVA CONSTITUCIONAL DE LEI COMPLEMENTAR - CONSEQÜENTE IMPOSSIBILIDADE
JURÍDICA DE TRATADO OU CONVENÇÃO INTERNACIONAL ATUAR COMO SUCEDÂNEO DA LEI
COMPLEMENTAR EXIGIDA PELA CONSTITUIÇÃO (CF, ART. 7º, I) -
CONSAGRAÇÃO CONSTITUCIONAL DA GARANTIA DE INDENIZAÇÃO COMPENSATÓRIA COMO
EXPRESSÃO DA REAÇÃO ESTATAL À DEMISSÃO ARBITRÁRIA DO TRABALHADOR (CF, ART. 7º, I, C/C O
ART. 10, I DO ADCT/88) - CONTEÚDO PROGRAMÁTICO DA CONVENÇÃO Nº 158/OIT,
CUJA APLICABILIDADE DEPENDE DA AÇÃO NORMATIVA DO LEGISLADOR INTERNO DE CADA
PAÍS - POSSIBILIDADE DE ADEQUAÇÃO DAS DIRETRIZES CONSTANTES DA CONVENÇÃO Nº 158/OIT ÀS
EXIGÊNCIAS FORMAIS E MATERIAIS DO ESTATUTO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO - PEDIDO
DE MEDIDA CAUTELAR DEFERIDO, EM PARTE, MEDIANTE INTERPRETAÇÃO CONFORME À
CONSTITUIÇÃO. (extraído do informativo n. 135 do STF)
O vício ali apontado é de
natureza apenas formal, de maneira que não haverá, em se resumindo a isto,
empecilho à sua observância para a solução judicial no Brasil de situação
ocorrida em País onde se demonstre a sua vigência.
Por isto, nota-se
claramente que a inconstitucionalidade não pode ser da norma internacional, mas
tão-somente do Decreto Legislativo que a fez aportar em nosso universo
jurídico.
19/03/2000
Retirado de: http://www.jusristantum.adv.br