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Perigo em Bagdá
Por Márcio C. Coimbra*
marcio.coimbra@uol.com.br
Há poucos dias iniciaram-se as primeiras movimentações militares de
norte-americanos e britânicos no Iraque. As razões, alegadas por alguns falcões
do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, baseiam-se no perigo que Saddam
representa, não somente em razão de abrigar e fornecer suporte para grupos
terroristas, mas também em função do petróleo que se encontra em toda a região
do Golfo Pérsico. É muito provável que um ditador que se torne senhor do óleo
na região, transforme-se em uma ameaça, talvez incontrolável, no futuro.
Os Estados Unidos pensam em depor o ditador do Iraque desde a Guerra do Golfo,
em 1991. Naquela época, uma forte coalizão internacional, liderada pelos
americanos, se deslocou para o Golfo Pérsico com vistas a livrar o Kuwait da
invasão do país vizinho, o Iraque. Entretanto, sabemos que os reais motivos que
ensejaram a operação Tempestade no Deserto eram outros, entre eles, principalmente
defender as valiosas reservas de petróleo da família Saud, que domina a Arábia
Saudita. Saddam, após invadir o Kuwait, seguiria para lá. Temendo a sanha
irracional de Saddam, a comunidade internacional mobilizou suas forças e
protegeu as reservas sauditas.
A coalizão internacional cometeu um grande erro. Não seguiu até Bagdá para
depor Saddam. Alguns líderes, de maneira vacilante, deram-se por satisfeitos
quando o Kuwait foi libertado. Assim, previam que o ditador iraquiano havia
sentido que a comunidade internacional não aceitaria qualquer eventual avanço
sobre os valiosos poços de petróleo da Arábia Saudita. Assim foram determinadas
medidas como o embargo econômico e as zonas de exclusão aérea. Porém, Saddam
não se intimidou. Continuou a exportar petróleo de maneira ilegal,
transgredindo as orientações da ONU, expulsou seus observadores desta
instituição e seguiu no desenvolvimento de armas de destruição em massa usando
os recursos advindos do petróleo. A comunidade internacional teve a oportunidade
de detê-lo. Faltou um líder com disposição de bancar esta operação
independentemente de seus custos políticos.
Logo, a mobilização dos serviços de inteligência se tornou a principal arma
para deter Saddam. Entretanto, os sistemas de defesa e inteligência
norte-americanos sofreram uma brutal diminuição de verbas durante os anos da
administração Clinton, logo após a Guerra do Golfo. Talvez o ex-Presidente
acreditasse que o mundo, após a queda da União Soviética, entrava em um período
de paz unipolar. Assim, deslocou recursos das áreas de defesa para programas
assistencialistas. Foi duramente criticado pelos republicanos. Já nesta época,
Donald Rumsfeld, atual Secretário de Defesa, alertava para os perigos desta
atitude da administração democrata. Segundo ele, Clinton estava sendo omisso em
relação ao crescimento de redes de terrorismo mundiais, bem como quanto ao
potencial e as estratégias de destruição e dominação desenvolvidas em países
como o Iraque. Assim, a primeira providência da administração Bush foi
redirecionar recursos para estes setores estratégicos. Uma decisão acertada,
porém o câncer terrorista já havia tomado dimensões maiores do que se poderia
imaginar.
Não há dúvida de que Saddam representa um perigo, e o que mais preocupa é
passividade de organismos como a ONU, especialmente nas questões relativas à
segurança. Atitudes como esta, aos poucos, pode levar este órgão a perder sua
força e legitimidade. No passado, este tipo de posição ajudou a fortalecer
figuras como Adolf Hitler. Grandes líderes são aqueles que tem coragem de
enfrentar problemas graves, colocando em risco sua imagem, mesmo quando o senso
comum do “politicamente correto” é a posição mais confortável e popular.
Lembremos de Churchill e sua posição isolada contrária ao nazismo.
Washington prepara um ataque. Possui uma reserva de 700 milhões de barris de
petróleo, dez vezes a demanda mundial durante um dia. Talvez a única
alternativa neste momento seja uma operação por meio de um ataque cirúrgico,
aliando-se o serviço de inteligência e forças especiais. A deposição ocorreria
em horas. Contudo, este tipo de ação não admite fracasso, mas grandes líderes
surgem de decisões difíceis e, muitas vezes, impopulares. Tudo indica que tais
deliberações partirão simultaneamente de Downing Street e do Salão Oval.
Artigo redigido em 07.09.2002,
Em Brasília, DF.
* Márcio Chalegre Coimbra, é advogado na área de Direito Internacional.
Habilitado em Direito Mercantil pela Unisinos. Professor dos Departamentos de
Direito e Relações Internacionais da Universidade Católica de Brasília e
UniCEUB – Centro Universitário de Brasília. PIL pela Harvard Law School. MBA em Direito Econômico pela
Fundação Getúlio Vargas. Especialista em Direito Internacional pela UFRGS.
Mestrando em Relações Internacionais pela UnB.
Vice-Presidente do Conil-Conselho Nacional dos Institutos Liberais pelo
Distrito Federal. Sócio do IEE - Instituto de Estudos Empresariais. É
articulista semanal do site www.direito.com.br. Tem artigos e entrevistas
publicadas em diversos sites nacionais e estrangeiros (www.urgente24.tv) e
jornais brasileiros como Jornal do Brasil, Gazeta Mercantil, Zero Hora, Jornal
de Brasília, Correio Braziliense, O Estado do Maranhão, Diário Catarinense,
Gazeta do Paraná, O Tempo (MG), Hoje em Dia, Jornal do Tocantins, Correio da
Paraíba e A Gazeta do Acre. É autor do livro “A Recuperação da Empresa: Regimes
Jurídicos brasileiro e norte-americano”, Ed. Síntese (www.sintese.com).
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Retirado de: www.argumentum.com.br