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Alemanha Dividida
Por Márcio C. Coimbra
marcio.coimbra@uol.com.br

A eleição alemã ocorreu sob forte tensão, como já era esperado. A terceira maior economia do mundo e sede Banco Central Europeu viveu um final de semana atípico, pois há tempos as eleições germânicas não eram tão disputadas. A coalizão social-democrata e sua adversária conservadora lutaram até o fim pelos poucos votos que as poderiam levar a conduzir a Alemanha pelos próximos anos. A vitória apertada do atual Chanceler, entretanto, nos direciona a várias e importantes leituras sobre as nuances da política alemã após a democrática disputa do último domingo.

Dizem que um bom político, além de possuir competência, deve ter sorte. Neste ponto de vista, Schröder foi abençoado. O povo alemão estava decepcionado com as políticas desenvolvidas pelo Chanceler que em 1998 venceu os conservadores com uma campanha pela redução do enorme contingente de desempregados. Depois de 4 anos, contudo, a situação é ainda pior, pois o número de pessoas sem emprego atingiu a incrível marca de 4 milhões, ou seja, uma taxa de 9,9%. Para piorar a situação, os opositores, responsáveis pela aliança CDU/CSU, lançaram o conservador líder bávaro Edmund Stoiber, responsável por políticas que jogaram as taxas de desemprego no chão onde foi governante, na Baviera.

A sorte, entretanto, acompanhava o atual Chanceler. Enquanto Stoiber pairava cerca de 10 pontos à frente, uma violenta enchente atingiu a Alemanha. O atual Chanceler Schröder se dirigiu às áreas atingidas, como Dresden, e liberou inúmeros euros para as famílias que necessitavam de ajuda imediata, além de direcionar vários outros para a reconstrução das áreas atingidas. Nestes lugares e frente ao resto do país, o governante passou a ser visto com bons olhos em razão da ajuda financeira dispensada naquele momento de necessidade. Como Stoiber não contava com as finanças do governo para oferecer ajuda, não obteve este impulso eleitoral para sua campanha. Neste momento os números de Schröder encostaram nos de Stoiber, gerando empate técnico. Seguiu-se a retórica sobre a entrada da Alemanha na aliança contra Saddam Hussein ao lado dos Estados Unidos. Entretanto, acredito que neste ponto não houve ganho eleitoral tanto para um lado, quanto para o outro, ao menos na medida que está sendo divulgado. Para os alemães, o que realmente fez a diferença final foi a ajuda no caso das inundações. A preocupação com a situação interna foi a tônica destas eleições.

O resultado mostrou uma Alemanha dividida. No que tange estritamente aos partidos, os conservadores bateram os social-democratas. A representação da social-democracia no Bundestag recuou e a dos conservadores subiu. Em números absolutos, o CDU/CSU de Stoiber obteve mais votos do que o SPD de Schröder. A diferença, porém, foi alterada por dois partidos que faziam parte, cada um, de uma das coligações. Os Verdes, da aliança governista, tiveram mais votos do que o esperado (8,6%), enquanto os liberais, apesar do crescimento em relação a eleição de 98, não obtiveram o êxito aguardado (7,5%). Isto leva os verdes, liderados pelo atual ministro de Relações Exteriores, Joschka Fischer, a assumir uma posição de destaque na próxima administração. Assim, a Alemanha se direciona no sentido de sepultar a ampliação do programa de energia nuclear, continuando a ser dependente de energia externa, principalmente advinda da vizinha França.
A eleição na Alemanha nos mostra que a preocupação com temas urgentes, como neste caso, as inundações, tende a diminuir a importância de propostas reais de governo. No que tange as políticas propostas, Stoiber foi vencedor. Não há dúvida de que enquanto foram discutidos programas, a vantagem conservadora era ampla. Suas propostas residiam na diminuição de impostos e benefícios sociais no intuito de o próprio povo alemão gerar os empregos de que tanto necessita. Enquanto isto, o slogan da campanha de Schröder era tão somente: "Um chanceler moderno para um país moderno". Entretanto, as chuvas mudaram o curso da campanha. Em um universo de 607 cadeiras no Bundestag, a vantagem que levou Schröder ao segundo termo é de apenas 9 representantes. Isto mostra o grau de divisão da Alemanha neste momento. O resultado evidencia algo mais, especialmente aos críticos de um mundo unipolar. Talvez o surgimento de uma outra grande superpotência, condutora da Europa, possa ter sido adiado por alguns anos.

Artigo redigido em 23.09.2002,
Em Brasília, DF.

* Márcio Chalegre Coimbra, é advogado na área de Direito Internacional. Habilitado em Direito Mercantil pela Unisinos. Professor dos Departamentos de Direito e Relações Internacionais da Universidade Católica de Brasília e UniCEUB – Centro Universitário de Brasília. PIL pela Harvard Law School. MBA em Direito Econômico pela Fundação Getúlio Vargas. Especialista em Direito Internacional pela UFRGS. Mestrando em Relações Internacionais pela UnB.
Vice-Presidente do Conil-Conselho Nacional dos Institutos Liberais pelo Distrito Federal. Sócio do IEE - Instituto de Estudos Empresariais. É articulista semanal do site www.direito.com.br. Tem artigos e entrevistas publicadas em diversos sites nacionais e estrangeiros (www.urgente24.tv) e jornais brasileiros como Jornal do Brasil, Gazeta Mercantil, Zero Hora, Jornal de Brasília, Correio Braziliense, O Estado do Maranhão, Diário Catarinense, Gazeta do Paraná, O Tempo (MG), Hoje em Dia, Jornal do Tocantins, Correio da Paraíba e A Gazeta do Acre. É autor do livro “A Recuperação da Empresa: Regimes Jurídicos brasileiro e norte-americano”, Ed. Síntese (www.sintese.com).

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