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Quem é Bustani, o brasileiro cotado para o Nobel da Paz?
Diplomata José
Maurício Bustani, que inspecionou armas químicas e foi derrubado pelos EUA,
pode ganhar o Nobel da Paz
Carlos Hugo Studart
As primeiras informações
surgiram em Oslo, Noruega, onde fica a comissão que concede o Nobel da Paz.
Logo chegou a Londres, e daí voou para Genebra, de onde foi disseminada para o
mundo. O personagem da notícia, o diplomata José Maurício Bustani, soube que
entrara na lista dos candidatos ao prêmio mais importante da atualidade através
de um conhecido inglês. “Essa indicação tem um sabor todo especial”, comentou
Bustani com este articulista. Afinal, nunca se vira antes, no jogo das grandes
nações, uma volta por cima de tal magnitude protagonizada por um brasileiro.
Em abril de 2002, Bustani foi expulso do cargo de diretor-geral da
Organização para a Proscrição das Armas Químicas (Opaq), da ONU, por pressão
dos EUA. Ele insistia em inspecionar as armas americanas e, pior, em levar o
Iraque para a organização. “Eu não fiz nada além de aplicar a convenção
oficial, que não discrimina os EUA do Iraque”, explica. “Mas atravessamos um
momento histórico em que os EUA se acham no direito de conduzir o destino da
humanidade.” O Itamaraty do ex-chanceler Celso Lafer lavou as mãos e o deixou
sem função ou residência, a perambular por 11 meses entre hotéis e casas de
amigos.
A história mudou radicalmente assim que Bustani assumiu seu posto
de embaixador no Reino Unido, em fins de março. Lá, está sendo tratado pela
corte britânica como grande personalidade internacional. Com duas semanas no
cargo, José Maurício Bustani já foi recebido por Sir Edward George, presidente
do Bank of England, jantou com Patricia Hewitt, ministra da Indústria e do
Comércio, e discutiu como aumentar o comércio bilateral com Clare Chort,
ministra do Desenvolvimento Internacional. Também recebeu para almoço, na
própria embaixada, um dos patriarcas mais ricos do mundo, Sir Evelyn de
Rothschild, da N.M. Rothschild & Sons. “Estamos acertando uma visita dele
ao Brasil para breve”, revela Bustani.
Se não bastasse, o novo embaixador brasileiro ainda conseguiu
trocar idéias sobre o fluxo de capitais para o Brasil com três banqueiros peso
global, Lord Walker of Worcester, do Dresdner Kleinwort Wasserstein, David
Mulford, do Credit Suisse First Boston, e Peter Sutherland, da Goldman Sachs
International. “Foram conversas substantivas”, explica. “A City londrina
catalisa hoje toda a elite bancária internacional”, lembra. “Há 463 bancos
estrangeiros na cidade, o que faz de Londres é uma torre de observação e
contatos ainda melhor do que Wall Street”. Ele manteve ainda conversas com
editores do Financial Times e da The Economist. “Já conseguimos que o Financial
publicasse um editorial sobre os 100 primeiros dias de Lula extremamente
favorável ao Brasil”, entusiasma-se.
O grande momento José Maurício Bustani na corte britânica ainda
está por vir. A rainha Elizabeth II mandou uma carruagem, com cavalos brancos e
guardas em uniforme de gala, pegá-lo na embaixada e levá-lo ao Palácio de
Burkingham. O encontro está marcado para o dia 30 de abril. É obrigatório aos
novos embaixadores se apresentarem de fraque e cartola à Sua Majestade, mas
raramente alguém é recebido com rapidez. Geralmente demora três meses, por
vezes seis. O chanceler Celso Amorim, por exemplo, antecessor de Bustani no
posto, teve que esperar três meses. No caso de Bustani, vale lembrar que a
rainha está de férias, recuperando-se de uma cirurgia no joelho. Volta a
trabalhar no próximo dia 30. O embaixador do Brasil será o primeiro da fila na
agenda real. “Sempre fui tratado com deferência pessoal pela diplomacia
britânica”, lembra o embaixador. “Essa recepção só está sendo surpresa no
Brasil, não aqui”.
Especialista em questões multilaterais, a principal missão de José
Maurício Bustani em Londres é participar das articulações para a reconstrução
da ONU e do sistema econômico mundial, esfacelados com a invasão do Iraque.
Como se sabe, o governo de Tony Blair tem se posicionado como principal
intermediário entre os Estados Unidos e a União Européia durante o conflito.
Aos 57 anos, com a fama de rabugento entre os colegas de Brasília e
de intransigente entre os falcões de Washington, Bustani chega à corte
britânica com prestígio crescente entre as autoridades internacionais que se
opõem à política externa americana. “Impressiona sua notoriedade na imprensa
européia”, diz Paulo Kramer, professor de Relações Internacionais da
Universidade de Brasília. “Ele deve o sabor dessa vendeta a George Bush”.
Antes de viajar, o diplomata teve um longo encontro privado com o
presidente Lula. Não se conheciam. Lula quis saber sua opinião sobre como
deverá ser o mundo depois da guerra no Iraque. “O impacto deverá ser
traumático”, analisou o diplomata. Maurício Bustani é um exímio pianista;
chegou a gravar CD com um concerto de Mouzart. Agora prepara-se para mudar
radicalmente de ramo, virar mascate diplomático e usar de seu atual prestígio
para abrir mercados aos produtos nacionais. “Meu papel na Opaq, assim como a
indicação para o Nobel, conta como um double plus a favor do Brasil”, prevê.
Carlos Hugo Studart, jornalista e historiador, é editor do site
Direito.com.br
Retirado de: http://www.direito.com.br/Doutrina.ASP?O=1&T=3226