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O terrorismo e o direito da guerra (jus in bello) dos EUA


Gisele Leite

  
  Hoje o terrorismo se encontra em evidência em particular depois dos atentados ocorridos em Washington e Nova York, é utilizado com técnica de grupos que contestam o sistema, reivindicando a mudança de governos e é usado para chamar a opinião pública sobre determinado fato, ou ainda, por aqueles que pretendem defender o sistema vigente. Bertrand de Jouvenel já fazia a apologia de ser nosso século, aquele da técnica terrorista.
  
  Para combatê-lo, é indispensável haver a cooperação internacional e corresponde a uma das grandes preocupações do Direito Internacional Penal. O Presidente dos EUA, George W. Bush segundo manchete de O Globo em 16.09.2001 declara: "Estamos em guerra" e deixa o mundo todo insone, preocupado com a já anunciada e deflagrada guerra. No dizer de Celso Duvivier de Albuquerque Mello "é extremamente difícil organizar a sua repressão, tendo em vista que ele deve sempre ter em vista os direitos do homem (de liberdade de expressão e etc...)" Indubitavelmente a ação terrorista acaba sempre por ter apoio de alguém (estado ou grupo político) dentro da sociedade internacional. Nem todos os atentados têm fins políticos e pode ser praticado por criminosos comuns (seqüestro).
  
  Não há dúvida quanto é reprovável o vandalismo, o terrorismo tanto como forma de protesto como meio político mas há de meditar até aonde poderá os EUA por ser alvo predileto de atentados terroristas ter direitos em propiciar uma guerra de dimensões e conseqüências inimagináveis para o mundo todo.
  
  O terrorismo foi utilizado como meio de conquista de poder pela primeira vez pela Pérsia (atual Irã), no século XI por Hassam Ben Sabbah fundador de uma sociedade secreta chamada hashinshins (seita dissidente dos ismailis) uma das maiores facções guerreiras do Islã.
  
  A origem etimológica da palavra terrorismo vem do latim terrere (tremer) e deterrere (amedrontar) e teve seu uso disseminado na França no período da Revolução, em particular na época de Robispierre e, daí passando para o inglês.
  
  Segundo o Dicionário Jurídico da Academia Brasileira de Letras Jurídicas organizado por J. M. Othon Sidou assim define terrorismo: Ação violenta de resistência ao poder estabelecido, visando a destabilizá-lo (subversão); ao inverso, repressão violenta por esse poder aplicada, mediante o emprego de tortura (terrorismo de Estado). Em observação ressalta que o vocábulo advém de Terror, ou do período da Revolução Francesa, de 1793-94.
  
  Raymond Aron em feliz definição pontifica que ação terrorista é aquela cujos efeitos psicológicos são desproporcionais ao seu resultado físico. O terrorismo apresenta-se de modo imprevisível, arbitrário, inevitável e imoral.
  
  Dúvidas não há sublinhar que os terroristas não atuam individualmente e, sim em grupos movidos por uma ideologia que pauta sua conduta. O terrorismo é eminentemente político.
  
  Distinguem-se terroristas de guerrilheiros, considerando-se estes últimos como combatentes em uma guerra, podendo inclusive a ser prisioneiro de guerra. Não contam os terroristas com a proteção internacional presente na Convenção de Genebra.
  
  De qualquer maneira, sendo a violência transitória ou não, indicadora de endemias no sistema, poder e violência se opõem, onde um deles domina completamente, o outro está ausente (Hannah Arendt). A violência pode destruir o poder, mas é totalmente incapaz de criá-lo.
  
  É praticado o terrorismo tanto por autoridades governamentais como também por minorias de revolucionários.
  
  A idéia de guerra divulgada por Bush traz a sensação que é justo que todo o mundo deve ser mobilizado, traz também em seu bojo a idéia de que todos os meios de combate são lícitos, seja a tortura, o assassinato, a delação, a guerra química, a biológica, a atômica e, etc...
  
  Mesmo numa guerra é importante ressaltar que o princípio de necessidade jamais pode afastar-se do princípio de humanidade.
  
  Quanto ao terrorismo governamental bem salienta Raymond Aron, a subversão e a repressão arriscam uma, e outra no círculo infernal do terror propriamente político, ou ainda, como descreve Jouvenel "levar as autoridades a bater em testemunhas inocentes é o ponto essencial da estratégica terrorista. Sua eficácia consiste principalmente em provocar cóleras cegas e respostas desastradas".
  
  Para Tourraine, terrorismo é expressão de um movimento social quando este não pode se exprimir em seu nível próprio, o da luta de classes para a dominação da sociedade, e pode tomar a forma de uma ruptura e de uma crise.
  
  Talvez nos países onde aflora o terrorismo sejam aqueles em que o governo bloqueia todas as saídas políticas e pacíficas. O terrorismo é a reação de animal encurralado. O terrorismo visa vedetizar um determinado fato, chamando a atenção da opinião pública internacional para aquilo que ele defende.
  
  Mas, perguntas não querem calar: qual é o mais perigoso grupo terrorista do mundo? O extremista saudita Osama Bin Laden? O al-Qaeda? Saddam Husseim? O grupo Abu Sayyaf? Jihad islâmica egípcia? Os hamas? O hesbolah? Quais são as características das relações internacionais após Guerra Fria?
  
  Acreditava-se que a única grande potência não teria com quem duelar, e nisto repousaria a paz mundial... Ledo engano, sua vulnerabilidade nem mesmo era conhecida por seus cidadãos.Com o abrandamento da guerra fria, todo o arsenal de espionagem e de armas foram pouco a pouco ficando demodèe e decadente.
  
  O terrorismo contemporâneo é uma explosiva mistura de tecnologia com psicologia, in casu, apenas facas e canivetes foram suficientes e utilizados para tomar aviões e fazer reféns, e fazê-los colidir com o World Trade Center e com o Pentágono.
  
  Não há como proteger todos os prédios, todos os símbolos, monumentos, usinas, e repelir o terrorismo só com o equipamento de segurança. Somente a cooperação internacional e a conscientização do perigo que representa são capazes de alguma eficácia no combate aos atentados terroristas.
  
  Pela primeira vez os EUA, Europa, Rússia, China entre outros países estão juntos trocando informações sobre o terrorismo.
  
  O terror visa à indiferença, à resignação e à apatia, visa tirar das massas de sua cômoda apatia e as lançar na resistência. Há quem cogite ser o terrorismo uma forma de comunicação de massa (D. Fromkin).
  
  A justiça política é tremendamente parcial e comprometida, pois visa a atingir fins políticos.Submeter os crimes políticos a um tribunal é dar uma aparência de legalidade e imparcialidade, o que gera para a população um sentimento de segurança.
  
  O Estado em todo seu direito positivo não reconhece o direito de revolução muito embora se reconheça o direito a guerra. A repressão é meio legal instituída para combater o chamado extremismo subversivo e passou a ser feita a partir de 1933 (da queda da República de Weimar).
  
  O assassinato do Rei Alexandre da Iugoslava e de Luís Barthou (Ministro das Relações Exteriores da França) em 1934, em Marselha fez que a ordem internacional se preocupasse com o terrorismo político e propiciou a criação de uma Corte Internacional Criminal que acabou por concluir a redação da Convenção de Genebra de 1937 para a prevenção e a repressão do terrorismo.
  
  Tal convenção define o crime e cria a obrigação de extraditar o criminoso, e se ela for impossível, instaura o compromisso do Estado em punir o criminoso.
  
  O terrorismo consistente no seqüestro e morte de autoridades diplomáticas e de chefes de governos e no apoderamento ilícito de aeronaves não é considerado crimes políticos, portanto, tais criminosos não possuem direito de asilo.
  
  É considerado pela OEA como crime de interesse internacional sendo irrelevante seus objetivos. O estado deve punir o crime praticado no seu território em navios e aeronaves nele registrados, ou que têm a sua nacionalidade. O antídoto contra o terrorismo é a democracia plena e o respeito aos direitos do homem.
  
  As convenções internacionais significam importante passo para a efetiva repressão e combate ao terrorismo embora seja um passo limitado vez que só são obrigatórias paras as nações que as ratificam.
  
  Os recentes acontecimentos em solo americano significam graves violações ao Título IV, arts. 13 e 14 do Protocolo Adicional às Convenções de Genebra, de 12 de agosto de 1949, relativo à proteção das vítimas dos conflitos armados sem caráter internacional (protocolo II).
  
  Logo após os skyjackers (HI, Jack! Olá, Jack!) palavra oriunda de um cumprimento proferido pelos vagabundos no momento do assalto, dirigido às suas vítimas, as aeronaves, foram dirigidas em direção a ícones americanos, fazendo muitas vítimas, a maioria destas civis, sem nenhuma prévia declaração de motivos.
  
  A Convenção de Tóquio de 1963 já previa o crime de apoderamento ilícito de aeronave, ratificado plenamente e minuciado pela Convenção de Haia de 1970 que possui uma conceituação simples e ampla em seu artigo primeiro.
  
  Pela Convenção de Haia, o apoderamento de aeronave não é um delito internacional e é punido com severas penas (art.2); portanto, é crime comum e extraditável o agente criminoso.
  
  Estabeleceu-se também pela Organização de Aviação Civil Internacional em 1971 que os estados devem cooperar entre si para repressão e julgamento desse crime que pode ser equiparado ao terrorismo, evidenciada a finalidade política e ao atingir terceiros inocentes.
  
  Quanto o direito à guerra e, em particular a guerra aérea, não é regulamentada por normas quer de direito interno, quer por direito internacional embora haja algumas disposições resultantes da Segunda Conferência de Haia que são vagas e longe de significar uma regulamentação adequada e segura da guerra aérea.Vige a restrição imposta aos aparelhos de aviação civil participem de hostilidades militares.
  
  Em paralelo ao terrorismo, devemos também analisar os meios de condução de guerra.
  
  Aliás, guerra para o Direito Internacional significa conflito armado entre sujeitos do Direito Internacional com a intenção clara de submeter o outro à sua vontade.
  
  Guerra é conceito distinto de retorsão e da represália não armada. O conflito militar é condição sine qua non para que se forme uma guerra internacional, é necessária ainda a intenção de guerra (o animus bellandus) que a princípio de ser explícita e divulgada previamente.
  
  Retorsão é a aplicação de medidas coercitivas pelo Estado ofendido ao Estado ofensor com relação e atos legais e inamistosos, consistindo estas nas mesmas medidas legais e inamistosas.
  
  Represálias são medidas ilegais empregadas por um Estado em relação ao outro que tenha violado seus direitos por ato ilegal.
  
  Guerra segundo o Dicionário Jurídico da Academia Brasileira de Letras Jurídicas, é:manifestação ostensiva que um Estado dá ao outro, por diferentes formas, quanto a que situação de paz até então existente entre ambos se transforma em situação de guerra e, cujo principal objetivo é a fixação do instante (dia e hora) em que tal estado se modificou, sob pena de qualquer ato hostil de sua parte constituir agressão internacional.
  
  As hostilidades devem começar mediante aviso prévio, inequívoco e sincero. Aliás, os norte-americanos foram pela segunda vez "pegos" de surpresa, também o ataque a Pearl Habour começou sem qualquer aviso por parte do Japão em 1942. Que apesar de ter se rendido e humilhado, lançou os kamikazes (os condutores dos deuses) com bombas de 250 kg sobre alvos americanos.
  
  No Direito Internacional existem dezenas de convenções sobre normas relacionadas ao direito da guerra (ius in bello).
  
  No entanto, o direito a guerra não é mais um direito do Estado, constando mesmo proibição da guerra na Carta da ONU sendo apenas permitidos os conflitos armados para legítima defesa e libertação de colônia.
  
  Os beligerantes devem observar vários procedimentos e há mesmo um sistema internacional que regula a responsabilidade penal dos indivíduos responsáveis pela guerra e pelos crimes de guerra, daí o direito da guerra perde assim sua eficácia e inteireza.
  
  Originalmente o direito da guerra foi previsto pelo direito costumeiro e foi compilado por GROTIUS no século XII em seu livro "De Jure Belli ac pacis". Surgiu também a teoria da guerra justa como critério provável de defesa de interesses vitais dos países beligerantes.
  
  Durante os séculos XVIII e XIX, à medida que o Direito Internacional começou a abandonar as restrições ao direito dos Estados de recorrer à guerra, aumentam significativamente as guerras e as regras sobre a condução das hostilidades. De fato, a guerra não atingia profundamente a vida do povo e, uma modificação da soberania territorial pouco efeito sobre o modo de vida da população.
  
  O próprio sistema de equilíbrio de poder europeu contribuiu em muito para diminuir a briga para expansão territorial e os conflitos ideológicos.As guerras se tornaram mais conflito entre forças armadas do que entre povos. Daí a importância das regras a regular à conduta dos beligerantes tanto no âmbito militar como no internacional.
  
  Esperemos que a próxima guerra seja breve e, realmente consiga deter o terrorismo insano bem como a selvagem exploração e intervenção econômica, política e religiosa entre os países e que logre em instaurar a paz e o respeito internacional entre todos os povos do mundo.







Retirado de: www.direito.com.br