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Karla Cristina Barradas da Fonte*
João Hélio de Farias Moraes Coutinho**
SUMÁRIO:INTRODUÇÃO. 1 - A SOCIEDADE DE ADVOGADOS. 2 - HISTÓRICO DA RIBUTAÇÃO DAS
SOCIEDADES DE PROFISSIONAIS. 3 – A LEI COMPLEMENTAR Nº 116/2003. 3.1 – A nova
lista de serviços e outras inovações. 3.2 – A base de cálculo do ISS e a
cláusula de revogação (arts. 7º e 10 da LC nº 116/2003). 4 - TRIBUTAÇÃO
DIFERENCIADA DAS SOCIEDADES DE PROFISSIONAIS. 4.1 – Argumentos contrários: O
fim da tributação fixa. 4.2 – Argumentos favoráveis: a permanência da
tributação fixa. 4.3 – As posições dos Municípios. 5 – A LEGISLAÇÃO DO
MUNICÍPIO DO RECIFE: idas e vindas. 6 – CONCLUSÕES. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
A tributação das
sociedades de profissionais tem sido objeto de controvérsias, em virtude do
tratamento diferenciado instituído a partir da publicação da Lei nº 5.172, de
25 de outubro de 1966, e alterações, o Código Tributário Nacional – CTN.
Nessas
controvérsias encontram-se, em um pólo, os contribuintes que procuram
enquadrar-se nos requisitos legais para a aquisição do direito ao recolhimento
do Imposto sobre Serviços – ISS de forma diferenciada; noutro pólo, o fisco,
que busca restringir ao máximo o alcance da norma; e, no centro, os
doutrinadores que, na busca da interpretação mais adequada dos dispositivos
legais concernentes à matéria, tentam esclarecer os pontos obscuros.
Com o advento da
Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, que veicula normas gerais
relativas ao ISS, surgiu uma discussão doutrinária quanto ao término ou não do
tratamento diferenciado concedido às sociedades de profissionais. Esse é o
cerne deste artigo, no qual procuramos trazer à colação as teses contrárias,
bem como as favoráveis à permanência da tributação do ISS baseada no número de
profissionais habilitados. Ademais, expusemos o entendimento de alguns
municípios, em especial o de Recife, com a revogação do art. 117 da Lei
Municipal nº 15.563, de 27 de dezembro de 2003, e alterações, Código Tributário
Municipal, e a posterior inclusão, nessa Lei, do art. 117-A.
1 - A SOCIEDADE DE ADVOGADOS
Com o advento da
Lei nº 4.215, de 27 de abril de 1963, surgem, no espectro jurídico brasileiro,
as sociedades de advogados. Esse diploma legal, assim estabelecia:
Art. 77. Os
advogados poderão reunir-se, para colaboração profissional recíproca, em
sociedade civil de trabalho, destinada à disciplina do expediente e dos
resultados patrimoniais auferidos na prestação de serviços da advocacia (art.
1.371 do Código Civil; arts. 1º e 44, § 2º, da Lei nº 154, de 25 de novembro de
1947).
1º As atividades
profissionais que reúnem os sócios em sociedade se exercem individualmente,
quando se tratar de atos privativos de advogado, ainda que revertam ao
patrimônio social os honorários respectivos.
................................................................................................."
Em comentário a
esse dispositivo, Sérgio Ferraz assevera:
Surgem, pois, as
sociedades de advogados como sociedades civis dotadas de personalidade
jurídica. Não há como confundir as sociedades de advogados com as pessoas
individuais de seus integrantes. Daí se externarem, por exemplo, os regimes de
responsabilidade civil pertinentes a estes e àqueles. O próprio texto legal é
estonteantemente claro a propósito, quando, no § 1º do artigo 77 transcrito,
afirma que as atividades profissionais, numa sociedade de advogados, ´´se
exercem individualmente´´, repercutindo a estrutura societária antes nas
relações entre os sócios, que as relações entre o profissional advogado e os
clientes da sociedade.
Em face do
exposto, inferimos que a tributação diferenciada das sociedades profissionais
não viola o postulado constitucional da isonomia, haja vista a natureza
singular dessas sociedades. Nesse passo, entendemos oportuno trazer à colação o
magistério de Misabel Abreu Machado Derzi, para quem:
[...] considerar
inconstitucional o tratamento diferenciado que a lei outorga às sociedades
profissionais é questão muito discutível, porque elas são efetivamente
especiais. Como se sabe, o trabalhador empregado, submetido às regras do regime
subordinado, embora preste serviços, não está sujeito ao pagamento do ISS. E
essa regra de exceção persiste ainda que o vínculo de subordinação esteja
atenuado (nos cargos de confiança e de executivos) e a remuneração auferida
seja muito elevada. Já os serviços empresariais de sociedades mercantis
(bancos, instituições financeiras, hotéis, motéis, diversões públicas,
laboratórios de análise, construção civil, escolas, etc.) sujeitam-se ao
pagamento do imposto, segundo o valor do serviço prestado.
Os profissionais,
ao integrarem uma sociedade dessa natureza, mesmo na qualidade de empregado,
conservam sempre a responsabilidade pessoal na prestação de serviço. Nesse
sentido, Paulo Luiz Netto Lôbo registra:
[...] a natureza
da sociedade de advogados como sociedade civil exclusivamente de pessoas e de
finalidades profissionais. É uma sociedade profissional sui generis, que não se confunde com as demais sociedades civis.
Rejeitou-se o modelo empresarial existente em vários países, para que não se
desfigurasse a atividade de advocacia.
A sociedade de
advogados desenvolve atividades-meio e não atividades-fim da advocacia. Por
esta razão, determina o art. 42 do Regulamento Geral que as sociedades de
advogados podem praticar qualquer ato indispensável às suas finalidades, com
uso da razão social, que não seja privativo de advogado.
É entidade
coletiva de organização, meios e racionalização, para permitir a atividade
associativa de profissionais, que distribuem e compartilham tarefas, receitas e
despesas, quando atingem um nível de complexidade que ultrapassa a atuação
individual.
2 - HISTÓRICO DA TRIBUTAÇÃO DAS SOCIEDADES DE PROFISSIONAIS
O Imposto sobre
Serviços foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela Emenda
Constitucional nº 18, de 1º de janeiro de 1965, que, no seu art. 15, remete
para lei complementar a função de estabelecer os campos de incidência do ISS e
do ICM.
1.Foi a Lei nº
5.172/66 (CTN) que cumpriu esse papel, e, além de estabelecer os critérios de
distinção das atividades tributáveis pelo ISS e pelo ICM, fixou o preço do
serviço como base de cálculo do ISS, excepcionando da regra geral os serviços
prestados sob forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, que eram
tributados de forma diferenciada, ou seja, com base em valores fixos.
2.Podemos então
concluir que, praticamente, desde a criação do imposto, já existia a clara
intenção em diferenciar a tributação para os profissionais autônomos, bem como
para as sociedades de profissionais.
O Decreto-Lei nº
406/68, com status de lei complementar, manteve a disposição prevista no CTN e,
em seu art. 9º, reafirmou o tratamento tributário diferenciado para o trabalho
pessoal, enumerando, para as sociedades de profissionais, os serviços que
estariam sujeitos à aplicação do critério de tributação especial. Vejamos:
3º. Quando os
serviços a que se referem os itens I, III, V (exceto os serviços de construção
de qualquer tipo por administração ou empreitada) e VII da lista anexa forem
prestados por sociedades, estas ficarão sujeitas ao imposto na forma do § 1º,
calculado em relação a cada profissional habilitado, sócio, empregado ou não,
que preste serviços em nome da sociedade, embora assumindo responsabilidade
pessoal, nos termos da lei aplicável.
O parágrafo
supracitado foi alterado pelo Decreto-Lei nº 834/69 e pela Lei Complementar nº
56/87, porém essas alterações modificaram a indicação de itens da lista, uma
vez que ambos os diplomas legais apenas aprovaram novas listas de serviços.
Recentemente, a
Lei Complementar nº 116/03, traçando normas gerais em matéria de tributação do
ISS, determinou, em seu art. 7º, a base de cálculo desse imposto, reafirmando o
preço do serviço como regra geral; porém não contemplou, em seus incisos, a
tributação diferenciada para os profissionais autônomos, nem para a sociedade
de profissionais. Por outro lado, não revogou expressamente, no seu art. 10, o
art. 9º do Decreto-Lei nº 406/68, como o fez com todos os outros artigos
relativos ao ISS no citado Decreto-Lei, como podemos ver abaixo:
Art. 10. Ficam
revogados os arts. 8º, 10, 11 e 12 do Decreto-lei 406, de 31 de dezembro de
1968; os incisos III, IV, V e VII do art. 3º do Decreto-lei 834, de 8 de
setembro de 1969; a Lei Complementar 22, de 9 de dezembro de 1974; a Lei 7.912
de 5 de junho de 1984; a Lei Complementar 56, de 15 de dezembro de 1987, e a
Lei Complementar 100, de 22 de dezembro de 1999.
Do exposto,
podemos compreender a confusão que se estabeleceu após a publicação da Lei
Complementar nº 116/03. Alguns questionamentos surgiram e passaram a ser
discutidos pela doutrina, tais como:
1.O art. 9º foi
revogado tacitamente em razão das novas regras gerais sobre a base de cálculo e
o fato gerador do ISS?
2.Se o objetivo
era revogar o art. 9º, por que não o fez expressamente?
3.A revogação do
Decreto-Lei nº 834/69 e da Lei Complementar nº 56/87 implicam a revogação do
§3º do art. 9º do Decreto-Lei nº 406/68?
4.Esses são pontos fundamentais a serem
desenvolvidos e discutidos neste trabalho, para que possamos apresentar nosso
entendimento acerca da tributação das sociedades de profissionais. Antes,
porém, faz-se necessária a análise de alguns aspectos da Lei Complementar nº
116/03.
3 - A LEI COMPLEMENTAR 116/03
3.1 – Nova lista de serviços e outras inovações
A Constituição
Federal de 1988, em seu art. 156, III, atribui aos municípios a competência
para instituir o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) definidos em
lei complementar.
Até 31 de julho de
2003, o Decreto-Lei nº 406/68 exercia a função de lei complementar, fixando uma
lista de serviços tributáveis pelo ISS, lista esta que foi, ao longo do tempo,
objeto de discussões acerca de seu caráter exemplificativo ou taxativo. Este
tema, porém, não será objeto de nossa análise.
Não é difícil
compreendermos a necessidade de existência de uma nova regulamentação para o
ISS, contemplando os novos serviços que foram surgindo com o progresso
tecnológico, e que fosse capaz de dirimir os conflitos de competência que
vinham sendo travados entre os municípios, e entre estes e os Estados.
Infelizmente a
discussão demorou quase uma década no Congresso Nacional e, como conseqüência,
pontos importantes deixaram de ser contemplados. Apesar disto, não podemos
deixar de reconhecer a importância da Lei Complementar nº 116, que introduziu
algumas alterações necessárias para a tributação dos municípios, dentre as
quais a lista de serviços, que passou a ter uma apresentação mais detalhada,
com subdivisões que, além de especificar serviços já tributados anteriormente,
incluíram novos serviços.
Alguns
doutrinadores aproveitaram a oportunidade para ressaltar o aumento da carga
tributária com a ampliação da lista de serviços:
A Lei Complementar
116, de 31 de julho de 2003, publicada no DOU em 1º. 8. 2003, ampliou
significativamente o campo de incidência do ISS, editando nova e ampliativa
lista de serviços tributáveis, com a inclusão de diversas atividades que não
constavam na lista anterior.
É notório que
houve ampliação do campo de incidência do imposto, o que se explica pelo
surgimento de novos serviços, em virtude do rápido desenvolvimento tecnológico
e do progresso e inovação dos serviços prestados. E mais, a alteração promoveu:
[...] a descrição
didática do elenco de serviços tributáveis, aprimorando a versão anterior da
Lei, a qual inspirava discussões sobre o enquadramento, ou não, em espécie, de
circulações econômicas praticadas em meio à sociedade empresarial.
Além de alterar a
lista de serviços, a Lei Complementar nº 116/03 promoveu, ainda, as seguintes
inovações: a) tributação de serviços provenientes do exterior, ou cuja
prestação tenha-se iniciado no exterior; b) definição de alíquota máxima de
5%(cinco por cento) para todos os serviços; c) ampliação das situações nas
quais se considera devido o imposto no local da prestação do serviço.
Teríamos muitas
outras considerações a fazer sobre a mencionada Lei Complementar, porém, em
razão do tema escolhido, passaremos a analisar o tratamento conferido, no novo
ordenamento jurídico, às sociedades de profissionais.
3.2 - A base de cálculo do ISS e a cláusula de revogação (arts. 7º e 10
da LC nº 116/03)
Ao tratar da base
de cálculo do ISS, essa Lei dispõe:
Art. 7º. A base de
cálculo do imposto é o preço do serviço.
1º Quando os
serviços descritos pelo subitem 3.04 da lista anexa forem prestados no
território de mais de um Município, a base de cálculo será proporcional,
conforme o caso, à extensão da ferrovia, rodovia, dutos e condutos de qualquer
natureza, cabos de qualquer natureza, ou ao número de postes, existentes em
cada Município.
2º Não se incluem
na base de cálculo do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza:
I - o valor dos
materiais fornecidos pelo prestador dos serviços previstos nos itens 7.02 e
7.05 da lista de serviços anexa a esta Lei Complementar;
II- (VETADO)
.................................................................................................
3º (VETADO)
A análise do
artigo supracitado pode levar a crer que o legislador regulamentou totalmente a
matéria concernente à base de cálculo do imposto, e, sob este ponto de vista,
não estaria contemplada a tributação diferenciada que antes era aplicada aos
autônomos e às sociedades de profissionais. Esta seria a conclusão a que
chegaríamos, caso nossa leitura ficasse limitada a esse artigo, porém, ao
prosseguir com a análise, verificamos que o art. 10 não revogou expressamente o
art. 9º do Decreto-Lei nº 406/68, senão vejamos:
Art. 10. Ficam
revogados os arts. 8º, 10, 11 e 12 do Dec.-lei 406, de 31.12.1968; os incs.
III, IV, V e VII do art. 3º do Dec.-lei 834, de 08.09.1969; a Lei Complementar
22, de 09.12.1987; e a Lei Complementar 100, de 22.12.1999.
Para o estudo que
ora pretendemos desenvolver, é importante atentarmos para os seguintes pontos:
1.Não houve
revogação expressa do art. 9º do Decreto-Lei nº 406/68.
2. Houve revogação
expressa do art. 3º do Decreto-Lei nº 834/69 e da Lei Complementar nº 56/87.
3.Tanto o art. 3º
do Decreto-Lei nº 834/69 quanto a Lei Complementar nº 56/87 alteraram o art. 9º
do Decreto-Lei nº 406/68.
Vale lembrar que o
art. 9º do Decreto-Lei nº 406/68 dispunha sobre a base de cálculo do ISS, e que
o seu § 3º determinava um tratamento diferenciado para as sociedades de
profissionais. Vejamos a redação do citado parágrafo com as alterações
promovidas pela Lei Complementar nº 56/87:
Art. 9º. A base de
cálculo do imposto é o preço do serviço.
.................................................................................................
3º Quando os
serviços a que se referem os itens 1, 4, 8, 25, 52, 88, 89, 90, 91, e 92 da
lista anexa forem prestados por sociedades, estas ficarão sujeitas ao imposto
na forma do §1º, calculado em relação a cada profissional habilitado, sócio,
empregado ou não, que preste serviços em nome da sociedade, embora assumindo
responsabilidade pessoal, nos termos da lei aplicável.
As modificações
introduzidas nesse parágrafo, tanto pelo Decreto-Lei nº 864/69 quanto pela LC
nº 56/87, apenas alteraram as referências aos itens da lista de serviços,
conferindo nova redação, sem, contudo, alterar a norma nele contida. Manteve-se
a tributação diferenciada para as sociedades de profissionais.
4 - TRIBUTAÇÃO DIFERENCIADA DAS SOCIEDADES DE PROFISSIONAIS
4.1 - Argumentos contrários – o término da tributação fixa
Em nossas
pesquisas, encontramos alguns doutrinadores que defendem o término do
tratamento tributário diferenciado para as sociedades de profissionais, com o
advento da Lei Complementar nº 116/03, sob o argumento de que o art. 7º da
referida Lei dispõe sobre base de cálculo do imposto de forma completa,
estabelecendo o preço do serviço como regra geral, não contemplando as exceções
anteriormente previstas para o profissional autônomo e para as sociedades de
profissionais. Nesse sentido, consideram que a tributação fixa para as
sociedades de profissionais é incompatível com a nova ordem jurídica, em razão
de sua revogação tácita.
Além desse
argumento, afirmam, ainda, alguns doutrinadores que, quando o art. 10 da Lei
Complementar nº 116/03 revogou expressamente o inciso V do art. 3º do
Decreto-Lei nº 834/69, bem como a Lei Complementar nº 56/87, que, como já
dissemos, alteraram a redação do § 3º, art. 9º, do Decreto-Lei nº 406/68,
estaria revogando, de forma indireta, o parágrafo modificado, pois, do
contrário, estaríamos diante da repristinação que, como sabemos, não é aceita
em nosso ordenamento jurídico, salvo em casos expressos.
Segundo essa tese,
se o §3º, art.9º, do Decreto-Lei nº 406/68 foi modificado pelos diplomas legais
elencados, sendo estes revogados, não poderia voltar a vigorar a redação
originária. Esta estaria também revogada. Esses são os argumentos mais
freqüentes para defender o fim da tributação fixa para as sociedades de
profissionais, recebendo o apoio de alguns municípios que esperavam, há muito,
uma oportunidade para pôr fim ao tratamento diferenciado.Vejamos, abaixo, os
argumentos de alguns defensores dessa tese:
Com a nova
legislação só existirá uma única base de cálculo para todos os prestadores de
serviços: o preço do serviço. [...] Ao revogar expressamente as várias
legislações que tratam do ISS, deixa o dispositivo, propositadamente, de
mencionar o art. 9º do Decreto-lei 406/68, passando a idéia de que permanece
vigente tal norma. Com relação aos §§ 2º, 3º, 4º, 5º, e 6º, do DL nº 406/68,
não vejo maiores problemas de interpretação, já que eles foram introduzidos
naquele diploma, ou mesmo alterados, por meio do Decreto-lei 834/1969 e das LC
nº 56/1987 e 100/1999, expressamente revogados pela nova LC.
No mesmo sentido,
a opinião de Domingos Travaglia:
Embora saibamos
que a maioria dos Municípios de cujas legislações temos notícias permaneceu com
tal critério, a nosso ver a existência de uma norma completa, detalhada, como é
o art. 7º da LC 116/2003, dispondo sobre base de cálculo, sem repetir dito
tratamento e, por outro lado, com preceito para abrigar outras situações
especiais (construção civil, pedágio) fundamenta esse nosso entendimento- mesmo
se levarmos em conta a não-revogação expressa do art. 9º do Decreto-lei
406/1968, dispositivo que continha aquela prescrição.
E ainda:
Ora, tratou o
legislador complementar de fato gerador, não-incidência, competência
tributária, sujeito passivo e ativo, substituição tributária, base de cálculo e
alíquota, ou seja, regulou inteiramente a matéria relativa ao ISS na Lei
Complementar nº 116/03, configurando a hipótese descrita na terceira parte do §
1º do art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil, e dando ensejo à revogação
de toda a matéria sobre o ISS no Decreto-lei nº 406/68, sem que se possa alegar
a preservação do art. 9º pela falta de sua revogação expressa.
Eis alguns dos
argumentos defendidos pelos que acreditam no término do tratamento privilegiado
conferido às sociedades de profissionais.
4.2 – Argumentos favoráveis: a permanência da tributação fixa
Apesar da
importância dos argumentos apresentados, parece-nos que a maior parte da
doutrina especializada defende a permanência da tributação fixa para as
sociedades de profissionais. Em síntese, os argumentos mais fortes para essa
defesa baseiam-se na não-revogação expressa do § 3º, art. 9º, do Decreto-Lei nº
406/68 e na compatibilidade da tributação fixa com o ordenamento
jurídico-tributário do ISS, com a publicação da nova Lei.
Vejamos alguns
excertos extraídos da literatura especializada, que nos auxiliará em nossas
conclusões:
Desde o início
posicionamo-nos pela preservação da chamada tributação fixa, porque os
dispositivos revogados - art. 3º, V do DL nº 834/69 e art. 2º da LC 56/87 –
haviam se limitado a conferir nova redação ao §3º do art. 9º do DL 406/68, isto
é, eram normas de efeito concreto, de caráter instantâneo. Ao vir a luz ao
mundo jurídico, cumpriram a sua única função de derrogar a redação anterior,
substituindo-apela nova, tornando-se, por essa razão, imune à derrogação. Uma
coisa é revogar a norma que recebeu nova redação, possível a qualquer tempo,
respeitados o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
outra coisa bem diversa é revogar a norma que alterou a redação original,
juridicamente impossível.
No mesmo sentido,
Hugo de Brito Machado assim se posiciona:
Quando uma lei
altera lei anterior mediante a técnica de substituição, no próprio texto da lei
anterior, do dispositivo alterado,dando ao antigo dispositivo nova redação,
como ocorreu no caso de que se cuida, sua eficácia se exaure imediatamente. Sua
missão fora dar ao dispositivo da lei anterior nova redação. E somente isso. O
dispositivo que subsiste, o veículo da norma, continua sendo o dispositivo da
lei anterior.
Assim, a revogação
da Lei Complementar 56/87, depois que esta produziu o efeito de alterar o §3º,
do art. 9º, do Decreto-lei 406/68, preservando-o como expressão formal do
Direito, como veículo de norma, não revoga aquele dispositivo.
No que diz
respeito à revogação tácita por incompatibilidade, o autor, na obra
supracitada, afirma não haver incompatibilidade entre os dispositivos da LC nº
116/03 e os §§1º e 3º, art 9º, do Decreto-Lei nº 406/68.
O art. 7º da Lei
Complementar nº 116/03 estabelece a regra geral para a base de cálculo do ISS.
É norma geral que convive perfeitamente com a norma albergada pelos §§ 1º e 3º,
art. 9º, do Decreto-Lei nº 406/68, os quais estabelecem exceções. Para que
houvesse revogação da lei anterior, seria necessário que a incompatibilidade
fosse absoluta, o que não é o caso.
Ainda em relação à
revogação tácita, a tese de que esta seria resultante da exaustão da matéria
pela nova lei complementar não pode prosperar. Vejamos a argumentação de
Santiago:
Se não é
diferente, como acima demonstrado, tampouco é completo o sistema instituído
pela Lei Complementar 116/03. A uma porque não define a alíquota mínima do
imposto, como lhe faculta o art. 156,§3º,I da Constituição, ficando mantida a
disposição transitória da Constituição que fixa em 2%. A duas porque, não fosse
basrtante tudo o que já se expôs, a verdade é que o legislador optou deliberadamente
por manter em vigor o art. 9º do Decreto-lei 406/68[...].
Segundo o
magistério de Sacha Calmon Navarro Coelho, tanto a interpretação
gramatical e a sistemática, quanto a teleológica, leva-nos à conclusão de que o
art. 9º do Decreto-Lei nº 406/68 continua a viger. Houve revogação expressa de
todos os outros artigos referentes ao ISS, exceto o art. 9º. Não se pode
desconsiderar esta omissão. Trata-se do silêncio eloqüente do legislador, como
afirma Hugo de Brito Machado.
Do exposto, outra
não pode ser a nossa posição, a não ser a de que permanece a tributação fixa
das sociedades de profissionais. Os argumentos apresentados pela corrente
doutrinária contrária à tributação fixa, com a devida vênia, são frágeis; não
resistem ao estudo mais aprofundado.
A análise
histórica da legislação do ISS leva-nos a concluir que esteve sempre presente,
no ordenamento jurídico, o tratamento diferenciado para os profissionais
autônomos e as sociedades de profissionais.
A Lei Complementar
nº 116/03 não revogou expressamente o art. 9º do Decreto-Lei nº 406/68, e não o
fez também quando revogou o Decreto-Lei nº 834/69 e a Lei Complementar nº
56/87, já que a revogação desses diplomas legais não implicou a revogação do
artigo por eles modificado.
O fato de não
haver incompatibilidade entre a nova Lei Complementar e os dispositivos não
revogados do Decreto-Lei nº 406/68, bem como a constatação de que aquela não
trata a matéria de forma exaustiva, corrobora a tese de que não houve revogação
tácita.
Outro elemento
favorável ao nosso entendimento é que, ao analisarmos a tramitação do projeto
de lei que deu origem à Lei Complementar nº 116, verificamos que houve, de
início, a intenção de extinguir o tratamento diferenciado, com a inclusão, no
art.10, da revogação expressa do art. 9º do Decreto-Lei nº 406/68; porém, o
projeto de lei sofreu alterações no Senado, sendo suprimida a expressão
"9º" do art. 10 da Lei Complementar nº 116/03.
Vê-se, pois, que a
permanência da tributação fixa para as sociedades de profissionais foi fruto de
ato consciente, discutido e aprovado. Não pode subsistir o entendimento do
término do tratamento tributário diferenciado conferido às sociedades de
profissionais. Não há fundamentação legal para esse intento.
4.3 – O entendimento dos municípios
Apesar de alguns
municípios terem defendido, logo após a publicação da nova Lei Complementar, o
término da tributação fixa, percebemos que houve um recuo antes mesmo da
publicação de suas leis tributárias. Acreditamos que o estudo mais aprofundado
da questão, os pareceres de renomados tributaristas e, até mesmo, a pressão das
sociedades de profissionais, contribuíram para que as leis publicadas por
grande parte dos municípios continuassem a contemplar a tributação
diferenciada.
Municípios como
São Paulo, Porto Alegre, Curitiba, Fortaleza, Belo Horizonte, Salvador,
Aracaju, Teresina, Recife, entre outros, mantiveram a tributação fixa para as
sociedades de profissionais. Já outros, como Belém, Vitória, Palmas, Natal e
Rio de Janeiro preferiram apoiar-se na corrente doutrinária contrária,
extinguindo o tratamento diferenciado e tributando as sociedades de
profissionais com base na receita de serviços, desrespeitando, portanto, a
mencionada Lei Complementar.
5 - A LEGISLAÇÃO DO MUNICÍPIO DO RECIFE – IDAS E VINDAS
Inicialmente, o
Município do Recife, com a publicação da Lei Complementar nº 116/03, adotou a
tese do término da tributação fixa para as sociedades de profissionais e, em 30
de dezembro de 2003, publicou a Lei nº 16.933, que revogou o art. 117 da Lei nº
15.563/91 (Código Tributário Municipal) cujo teor era o seguinte:
Art. 117 Quando os
serviços referidos nos itens 1,4, 7, 24, 51, 87, 88, 89, 90 e 91 da lista
constante do artigo 102 desta Lei, forem prestados por sociedades civis de
profissionais, o imposto será devido pela sociedade, por mês, em relação a cada
profissional habilitado, seja sócio, empregado ou não, que preste serviço em
nome da sociedade, embora assumindo responsabilidade pessoal nos termos da lei
que rege a profissão.
1º O imposto será
calculado por meio de percentuais sobre a UFIR, por profissional habilitado,
seja sócio, empregado ou não, que preste serviço em nome da sociedade, à razão
de:
I - até 03 (por
profissional e por mês) 162,9 (cento e sessenta e dois vírgula nove) UFIR’s;
II - de 04 a 06
(por profissional e por mês) 190,1 (cento e noventa vírgula um ) UFIR’s;
III - de 07 a 09
(por profissional e por mês) 217,2 (duzentos e dezessete vírgula dois) UFIR’s;
IV - de 10 em
diante (por profissional e por mês) 271,5 (duzentos e setenta e um vírgula
cinco) UFIR’s.
2º - omissis;
3º- omissis;
4º - omissis.
Acontece que,
antes mesmo que a alteração passasse a produzir efeitos, foi publicada a Emenda
Constitucional nº 42/03, que criou a anterioridade qualificada ou a noventena,
vedando aos entes tributantes exigir tributos no mesmo exercício em que a lei
que os instituiu ou majorou tenha sido publicada, observando-se o prazo de,
pelo menos, noventa dias de sua publicação.
Assim, tendo sido
publicada em 30 de dezembro de 2003, as alterações introduzidas pela Lei nº
16.933/03 só passariam a produzir efeitos a partir de 29 de março de 2004.
Logo, enquanto não escoado esse prazo, as sociedades de profissionais
continuariam a recolher o ISS na forma prevista no mencionado art. 117.
Nesse ínterim, a
tese da não-revogação do §3º, art. 9º, do Decreto-Lei nº 406/68 alcançou maior
repercussão nos artigos, textos, pareceres de tributaristas renomados e, além
disso, verificou-se a tendência dos grandes municípios de manter a tributação
diferenciada.
Ora, o Município
do Recife estava caminhando em sentido contrário, o que poderia dar ensejo a
muitas demandas judiciais. Considerando todos esses aspectos, a legislação foi
revista e, em 3 de abril de 2004, foi publicada a Lei nº 16.967, que introduziu
o art. 117-A à Lei nº 15.563/91(CTM), resgatando o texto da lei que conferia o
tratamento tributário diferenciado às sociedades de profissionais.
A nosso ver, agiu
acertadamente o Município do Recife ao rever sua posição, resgatando a
tributação fixa. Tudo em respeito ao que determina a Constituição Federal e a
Lei Complementar nº 116/03, que manteve, como pudemos amplamente discutir neste
trabalho, o tratamento tributário diferenciado conferido às sociedades de
profissionais.
CONCLUSÕES
a)A Lei
Complementar nº 116/03 não revogou expressamente o §3º, art. 9º, do Decreto-lei
nº 406/68, que determina tratamento tributário diferenciado para as sociedades
de profissionais, e também não o fez de forma indireta quando revogou o art.
3º, V, do Decreto-Lei nº 834/69 e a Lei Complementar nº 56/87. Esses diplomas
continham normas de efeito concreto, que se limitavam a dar nova redação ao
§3º, art.9º, do Decreto-Lei nº 406/68, e sua revogação, de forma alguma, implica
a revogação do dispositivo modificado.
b)Não há
incompatibilidade entre a norma prevista no art. 7º da Lei Complementar nº
116/03, que trata da base de cálculo do ISS, e a norma albergada nos §§ 1º e
3º, art. 9º, do Decreto-Lei nº 406/68. A norma contida no art. 7º é de caráter
geral, que convive perfeitamente com as exceções previstas no art. 9º do
referido Decreto-Lei. Afasta-se a revogação tácita.
c)Não houve também
a revogação tácita decorrente da exaustão da matéria pela lei nova, visto que o
sistema instituído pela Lei Complementar nº 116/03 não é completo.
d)Permanecem em
vigor os §§1º e 3º, art. 9º, do Decreto-Lei nº 406/68, devendo as sociedades de
profissionais, cujas atividades estejam elencadas no §3º, ter direito ao
tratamento diferenciado, ou seja, a tributação fixa.
e)Apesar das idas
e vindas, o Município do Recife, rendendo-se aos argumentos de renomados
tributaristas e, também, à pressão das sociedades de profissionais, manteve, em
respeito ao que determina a Constituição Federal, a Lei Complementar nº 116/03
e os §§1º e 3º do Decreto-Lei nº 406/68, a tributação diferenciada para as
sociedades de profissionais.
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* Auditora fiscal do Tesouro Municipal,
especialista em Direito Público pela Escola Superior da Magistratura do Estado
de Pernambuco e Faculdade Maurício de Nassau.
** Auditor fiscal do Tesouro Estadual, professor
da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), mestre em Direito pela
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