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Nicole Barão Raffs*
O crédito – prêmio do
IPI foi instituído em 1969, ano em que o Brasil encontrava-se em estágio
econômico subdesenvolvido, não possuindo condições de competir em igualdade com
os demais países no comércio exterior. Em razão disso, visando privilegiar a
economia nacional no exterior, o governo, através da edição do Decreto-Lei
491/69, diminuiu a carga tributária das empresas nacionais, tornando os
produtos brasileiro mais competitivos no mercado externo.
Dentro
deste contexto e visando premiar as empresas nacionais que promovem exportação
e elevam positivamente a balança comercial brasileira, após 10 anos de vigência
mansa e pacífica, o crédito-prêmio do IPI sofreu uma abrupta e arbitrária
tentativa de supressão do cenário jurídico.
O
Governo Federal, através da edição de diversos decretos-lei, flagrantemente
ilegais e inconstitucionais, dos quais surgiram portarias e instruções
normativas de âmbito administrativo, dentre outros atos, tentou extinguir o
benefício.
Após
o julgamento do pleno do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria em destaque,
reconhecendo o direito das exportadoras ao crédito-prêmio do IPI, as empresas
sentiram-se mais seguras para reaver o direito que lhes cabe. Devido ao grande
número de empresas que decidiram buscar o seu direito judicialmente, várias
notícias e reportagens tendenciosas – afirmando que o crédito-prêmio do IPI
trata-se, na verdade, de um "roubo" planejado entre empresários e
setores do governo - foram publicadas nos principais jornais brasileiros a
respeito do assunto.
Ocorre
que a opinião pública, por não conhecer o histórico da legislação que instituiu
o crédito-prêmio do IPI e ainda, por ignorar o controle de constitucionalidade
das leis, toma a informação veiculada como referência.
Todavia,
a favor das exportações, e porque não dizer do Brasil, ainda se pode contar com
a prodigiosidade do governo brasileiro em criar armadilhas jurídicas para ele
mesmo - armando bombas de efeito retardo por não prestar a atenção devida ao
editar leis ou revogá-las, passando por cima de tudo quanto é direito, na ânsia
de aumentar e aumentar a arrecadação pública - e com a existência de
verdadeiros estudiosos do direito, como o Sr.. Dr Ministro José Delgado, que
afirmou não ceder à pressão do governo e ao " terrorismo financeiro da
PGFN" (1).
Além
do que foi tratado, cabe esclarecer que, as "razões econômicas" que
são apresentadas como a justificativa do atual governo para que o
crédito-prêrmio do IPI não seja concedido às exportadoras, são descabidas,
visto que o crédito-prêmio do IPI pode ser utilizado, de acordo com os §§ 1º 2
º do Decreto-Lei 491/69, não apenas na dedução do valor do imposto de produtos
industrializados incidentes sobre as operações do mercado interno, mas também,
havendo excedente de crédito, na compensação de pagamento de outros impostos federais,
ou no aproveitamento de outras formas indicadas no seu regulamento, Decreto
64.833/69.
Isto
significa que o Crédito Prêmio do IPI vem promover indiretamente um crescimento
das exportações, a medida que desonera a carga tributária delas. E,
consequentemente, favorece o crescimento econômico do país, a geração de
empregos, a circulação da moeda, (informações não veiculadas pelos meios de
comunicação).
A
necessidade de tornar os produtos brasileiros mais competitivos no mercado externo
dispensa maiores comentários. Acompanhando o desenvolvimento econômico e
financeiro de outros países e analisando o quadro mundial da formação e
desenvolvimento dos grandes blocos econômicos, conclui-se que a exportação
competitiva torna-se peça indispensável ao crescimento e sobrevivência do
Brasil. Daí a necessidade de o governo desonerar a cadeia tributária que incide
sobre a produção brasileira com o intuito de incentivar as exportações.
Como
se pode notar, o crédito-prêmio do IPI consiste na alavanca da economia
brasileira. Por óbvio que o pagamento integral do crédito aos empresários
brasileiros não poderá ser efetuado de uma vez em sua integralidade. Contudo, o
Governo Federal pode estudar formas de pagamento para que os empresários não
tenham um direito seu violado e para que a Constituição Nacional seja
respeitada.
Ainda
é relevante comentar que os ministros da primeira turma do STJ
que julgaram, em maio deste ano, o polêmico Resp 591708, votaram favorável ao
incentivo fiscal crédito-prêrmio do IPI, no RESP 576873, publicado no DJ em
16/02/2004, afirmando:
" A Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido
que o benefício denominado Crédito-Prêmio do IPI não foi abolido do nosso
ordenamento jurídico tributário.
Precedentes: RE186.359/RS, STF, Min. Arco aurélio, DJ de 10/05/2002, AGA
398.267 /DF 1ª Turma, DJU 20/10/2000, AGA 422627,/DF, 2ª Turma, STJ, DJU
23/09/20003, entre outros."
Como
compreender a mudança repentina de entendimento de alguns dos Ministros da
Primeira Turma do STJ, se os Ministros da Primeira Turma, inclusive e
especialmente, os Ministros que votaram contra o aproveitamento das empresas ao
incentivo fiscal crédito-prêmio do IPI, reconhecem em outras decisões, que o
benefício denominado Crédito-Prêmio do IPI não foi abolido do nosso ordenamento
jurídico tributário.
A
mudança repentina de entendimento, não apenas intriga os jurisdicionados, mas
também, fere um dos pilares do Sistema Jurídico Constitucional Brasileiro: a
segurança jurídica!
Tema
extremamente caro a qualquer País de índole democrática é o da segurança
jurídica, eis que representa a estabilidade das relações sociais.
Na
precisa lição de Paulo de Barros Carvalho, a segurança jurídica corresponde a
um valor que tem o " sentido de propagar no seio da comunidade
social o sentimento de previsibilidade quanto aos efeitos jurídicos da
regulação da conduta. Tal sentimento tranqüiliza os cidadãos, abrindo espaço
para o planejamento de ações futuras, cuja disciplina jurídica conhecem,
confiantes que estão no modo pelo qual a aplicação das normas do direito se
realiza" (2)
O
Superior Tribunal de Justiça exerce papel fundamental para se alcançar a
segurança jurídica, pois, a partir da interpretação que ele faz da Constituição
e das leis, em situações de conflito entre as pessoas em geral (naturais ou
jurídicas, de direito público ou privado), é que poderemos ter certos
referenciais de conduta e de ação.
O
que está ocorrendo na Corte Superior vai de encontro às expectativas dos
cidadãos brasileiros. O Superior Tribunal de Justiça passa anos e anos
declarando a legalidade e a vigência de um incentivo fiscal à exportação,
confirmando o direito das exportadoras brasileiras de se beneficiarem deste
crédito. As exportadoras programam-se e fazem seus projetos de viabilidade
econômica confiando na Corte Superior, nas decisões sucessivas por ela
emanadas. De repente, esta mesma Corte muda seu entendimento já pacificado há
anos.
O
Decreto-Lei 491/69 continua em vigor! Tanto é verdade que, não apenas o judiciário
em suas jurisprudências, mas também, o próprio Poder Executivo, através do
Ministério da Fazenda, ratificou a vigência do crédito-prêmio do IPI ao editar
portarias, atos declaratórios, instruções normativas, regulamentando o
incentivo fiscal em comento, inclusive, após o ano de 1981. Vide Portaria MF nº
176 de 1984, Instrução Normativa 226/2002, Ato Declaratório 31/99, entre
outras.
Se o próprio Poder Executivo, ao longo dos anos, inclusive após o ano de
1983, continuou regulamentando o crédito-prêmio do IPI, certamente é porque
este incentivo fiscal, para o Executivo, ainda vige, restando derrogados os
Decretos-Leis 1.658/79 e 1.722/79. Acredita-se que o Ministério da Fazenda
jamais perderia seu tempo regulamentando matéria inexistente, incapaz de
efetuar mudanças no mundo jurídico, não é mesmo? Qualquer resposta em
contrário, certificaria que o Ministério da Fazenda, ao editar as normas
infralegais regulamentando o crédito-prêmio do IPI, após o ano de 1983, estaria
agindo fora da legalidade estabelecida.
Ainda
cabe ressaltar que, não apenas o Poder Judiciário e o Poder Executivo
ratificaram a vigência do crédito-prêmio do IPI, mas também o Poder
Legislativo. Em 1.989, após a nova Constituição Federal, foi editada a Lei
7.739 que, entre outras coisas, referiu-se ao crédito-prêmio do IPI,
considerando-o como incentivo fiscal vigente, em seu artigo 18.
Dentro
de todo este contexto, não há como negar a vigência do Decreto-Lei 491/69,
principalmente se a tese que defende a extinção do mesmo estiver galgada em
argumentos que defendem a vigência dos Decretos-Leis 1.658/79 e 1.722/79. Caso
contrário, todos os posicionamentos aqui comentados dos Poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário poderiam ser considerados ilegais e inconsequentes,
situação inadmissível em um Estado de Direito.
Seguindo
o mesmo raciocínio, cabe a seguinte indagação: considerando que o Governo
Federal e o Poder Judiciário, há mais de dez anos, recebem pedidos
administrativos e judiciais de reconhecimentos do direito ao crédito-prêmio do
IPI e, considerando que o Governo Federal entende que o benefício fiscal foi
extinto em 1983,. por qual razão não houve a edição de uma norma compatível
extinguindo expressamente e em definitivo o crédito-prêmio do IPI,
simplificando assim a atuação dos demais Poderes e dos próprios cidadãos
brasileiros?
Todos
os questionamentos aqui expostos levam a crer que, qualquer saída legal não é
bem vista pelo Governo Federal, pois ela depende dos votos dos representantes
populares, os quais têm a responsabilidade de representar o povo brasileiro na
edição de normas jurídicas legais. Conflitos de interesses poderiam ser
abertos!
Notas
1 Gazeta Mercantil, 10/05/2004, STJ
pode poupar 10 bilhões para..., continuação da pág. A-1.
2 in Curso de Direito Tributário,
Saraiva, 2002, p. 146).
*Advogada,
pós-graduada em Direito Tributário no Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos
em Curitiba – PR
Disponível em: http://jus2.uol.com.br/
Acesso em: 27 fev. 2007.