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A cobrança da Declaração de Contribuições e Tributos Federais (DCTF) e seu lançamento na dívida ativa
Kleidson Assis Sandes Lima*
1-Introdução:
Este
texto trata de esclarecer algumas questões sobre crédito tributário, lançamento
e dívida ativa oriunda do não cumprimento da prestação decorrente da DCTF. A
primeira indagação é: Pode existir crédito tributário sem a realização do
correspondente lançamento?
Tenta-se
nortear, em seguida, esclarecimentos se pode a Fazenda Pública Federal
inscrever em dívida ativa os valores declarados e não pagos constantes na DCTF
conforme o art. 8º, §1º da IN – SRF –nº 255/02 antes de cumprir o disposto no
art. 142 do CTN.
A
norma contida naquele artigo é o seguinte:
Art. 8o Todos os valores
informados na DCTF serão objeto de procedimento de auditoria interna.
§ 1º Os saldos a pagar
relativos a cada imposto ou contribuição, informados na DCTF, serão enviados
para inscrição em Dívida Ativa da União após o término dos prazos fixados para
a entrega da DCTF.
...
Já
o Código Tributário Nacional determina em seu artigo 142:
Art. 142. Compete privativamente
à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento,
assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência
do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável,
calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo
caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Essas
dúvidas são oriundas principalmente por termos um ordenamento jurídico bastante
complexo, o que chega a levar-nos a sempre a questionar sobre a
constitucionalidade dos atos legislativos praticados no dia-a-dia em nosso país
chegando a deixar de lado o bom senso e aplicando sempre teorias dogmáticas.
2- O momento da formação do crédito
tributário:
Utilizando-se
do ensinamento do mestre Hugo de Brito, este leciona que "a obrigação
tributária é o vínculo jurídico por força do qual o particular sujeita-se a ter
contra ele feito um lançamento tributário" e termina seu raciocínio
lecionando que a obrigação tributária principal não cumprida ou acessória
descumprida - que por isso fez nascer uma obrigação principal -, far-se-á um
lançamento, constituindo assim um crédito tributário e que só então poderá
exigir o objeto da prestação obrigacional, isto é, o pagamento. Pois bem, leva-nos
a concluir que a existência do crédito tributário tem como pressuposto o
lançamento e concluímos que antes do lançamento existe a obrigação e que
somente após o lançamento teríamos o crédito tributário. Comprovando a
materialidade desta conclusão, ressaltamos que a anulação do lançamento –
quando não foi assegurado o direito de defesa do sujeito passivo por exemplo –
torna sem validade o crédito formado. Seria o lançamento ato administrativo
vinculado e obrigatório.
3- O art. 8º da IN nº 255/02 da Secretaria
da Receita da Fazenda
Bem,
pelo acima exposto, questiona-se se pode a Fazenda Pública Federal inscrever em
dívida ativa os valores declarados e não pagos constantes na DCTF conforme o
art. 8º, §1º da IN – SRF –nº 255/02 antes de cumprir o disposto no art. 142 do
CTN.
Dita
o art. 8º, §1º dessa IN que "os saldos a pagar relativos a cada imposto ou
contribuição, informados na DCTF, serão enviados para inscrição em Dívida Ativa
da União após o término dos prazos fixados para a entrega da DCTF."
Já
o CTN em seu art. 142 determina que "compete privativamente à autoridade
administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido
o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador
da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o
montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor
a aplicação da penalidade cabível."
Percebem-se
como os institutos não têm aplicabilidade harmônica se interpretados de forma
sistemática. Contudo, aparentemente a Instrução Normativa em questão suprimiu
uma fase procedimental indo de encontro ao que é determinado pelo CTN e nesse
ponto pode-se falar em inconstitucionalidade da aplicação de tal instrução
administrativa pois estaria usurpando do contribuinte direitos como o
contraditório e a ampla defesa, integrantes dos institutos do Direito
Tributário.
4- A questão da legalidade da
imposição da DCTF por Instrução Normativa.
A
DCTF nada mais é que uma obrigação acessória e, conforme o CTN, se não cumprida
terá mesma natureza de principal podendo transformar em crédito tributário.
Existe posicionamento de que não é legal a imposição da DCTF da forma que foi incluído
em nosso ordenamento jurídico utilizando-se dos seguintes argumentos: "a
imposição do Fisco em fazer com que os contribuintes entreguem a Declaração de
Contribuições e Tributos Federais – DCTF não merece acolhida diante de nosso
ordenamento jurídico, porquanto as instruções normativas que prevêem tal
obrigatoriedade não encontram fundamento de validade em normas compatíveis com
os princípios da legalidade (art. 5º, inciso II da CF/88), da separação dos
poderes (art. 2º da CF/88) e da indelegabilidade da competência tributária
(art. 7º do CTN)" como conclui FILIZOLA, Cinthia Filizola e Paula Vilela
em artigo publicado na internet.
Interessante
que esquecem de mencionar justamente o art. 142 do CTN, pois o art.8º da IN –
SRF nº255/02 determina a inscrição na divida ativa sem mencionar a
preexistência do lançamento por autoridade administrativa, logo essa inscrição
seria ilegal não só por argumentos utilizados acima mas por não poder se falar
em crédito tributário já que não existiu o pré-requisito do lançamento
tributário. Não comungo com a idéia que IN não pode instituir e regulamentar a
DCTF pois seria um absurdo esperar que o Poder Legislativo fosse encarregado
desta tarefa.
Esse
impulso de que em toda criação de norma deve-se questionar a sua
Constitucionalidade chega ao campo do absurdo quando se pregar que uma IN
oriunda de um Órgão Publico- esclarecendo como deve ser feito o preenchimento
de uma guia de declaração, determinando a obrigatoriedade de entrega de tal
guia, ditando as penalidades pelo não cumprimento dessa - seja inconstitucional
apenas por não ser determinado em lei; não deve ter acolhimento no ordenamento
jurídico e nem tão pouco pela doutrina esse posicionamento. Caberia o
legislador legislar até mesmo em procedimentos meramente administrativos? Isso
sobrecarregaria nossos legisladores e as conseqüências seriam imensuráveis já
que toda norma deveria ser cumprida somente se fosse determinada em lei.
A
Constituição em seu art. 5º não teve a intenção de determinar que "ninguém
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de
lei" utilizando "lei" em sentido strictu e sim a terminologia
"lei" como sendo aplicada em seu sentido amplo, caso contrário a
imposição de ordem social seria por demais complexa e uma simples IN obrigando
a entrega de uma declaração pelo contribuinte não teria valor por não passar
pelo crivo das Câmaras Legislativas (inconcebível essa idéia).
Ademais,
pelo raciocínio exposto no ponto dois deste texto, a Fazenda Pública Federal
não deveria inscrever em dívida ativa os valores declarados e não pagos
constantes na obrigação acessória pois o CTN além de ter natureza de Lei
Complementar – o que não poderia ser modificado por Instrução Normativa,
determina que a formação do crédito tributário dá-se pelo lançamento e, após
isso, poder-se-ia inscrever em dívida ativa conforme o artigo 142 transcrito no
texto.
5- Conclusão:
Por
tudo, fica esclarecido que a Instrução Normativa oriunda da Receita da Fazenda,
que foi publicada no DOU de 12 de dezembro de 2002 dispondo sobre a Declaração
de Débitos e Créditos Tributários, o seu art. 8º encontra-se desarmônico com o
CTN no ditame do art. 142 e logo deve ser revisto a inscrição da Dívida Ativa
conforme tal IN pois, sem que haja o devido lançamento, não há de se falar em
crédito tributário não podendo então, conseqüentemente, inscrever em Dívida
Ativa.
Bibliografia:
Brasil.
Código Tributário Nacional / obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com
colaboração de Antonio Luiz Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt
e Luiz Eduardo Alves de Siqueira. – 29 edição – São Paulo: Saraiva, 2000.
FILIZOLA,
Cinthia; VILELA, Paula. Declaração de Contribuições e Tributos Federais (DCTF).
Pode ser instituída por atos infra-legais? E quanto à penalidade pecuniária?. Jus
Navigandi, Teresina, a. 8, n. 234, 27 fev. 2004. Disponível em:
<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4893>. Acesso em: 20 de out.
2004.
MACHADO,
Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros Editores,
2003.
SILVA,
De Plácido e. Vocabulário Jurídico/ atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia
Carvalho – Rio de Janeiro: Forense, 2003
* Advogado e pós-graduado em Direito Tributário
Disponível em: http://jus2.uol.com.br/ Acesso em: 22 fev. 2007.