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O regime jurídico das
contribuições especiais no Direito brasileiro
Juraci
Altino de Souza*
SUMÁRIO:
1 introdução. 2 esboço histórico das contribuições especiais. 3 as
contribuições especiais no contexto jurídico-pátrio. 3.1 a sua natureza
jurídica: as várias classificações propostas pela doutrina. 3.2 o
reconhecimento da sua natureza jurídica tributária. 3.3 as contribuições
especiais como espécie tributária autônoma. 3.4 o seu conteúdo finalístico como
fator essencial. 3.5 a referibilidade da atividade estatal ao contribuinte das
contribuições especiais. 4 a competência constitucional das pessoas políticas
para instituir contribuições. 5 as espécies de contribuições especiais. 5.1 as
contribuições sociais. 5.1.1 as contribuições sociais gerais. 5.1.2 as
contribuições sociais de seguridade social. 5.2 as contribuições de interesse
de categorias profissionais ou econômicas. 5.3 as contribuições de intervenção
no domínio econômico. 5.4 a contribuição para o custeio do serviço de
iluminação pública. 6 princípios constitucionais aplicáveis à imposição das
contribuições especiais. 7 conclusão. Bibliografia.
1
INTRODUÇÃO
O
presente trabalho tem por escopo a análise do regime jurídico das chamadas
contribuições especiais no direito brasileiro. Em nossa abordagem, buscamos
levantar, preliminarmente, o histórico dessas contribuições, bem como os
motivos determinantes do seu surgimento, reportando-nos aos acontecimentos
econômicos e sociais que tiveram lugar em meados do século passado, no
pós-guerra, como decorrência do Estado social e interventor.
Buscamos,
na seqüência, posicionar as contribuições especiais no contexto jurídico
pátrio, enfrentando o problema da sua natureza jurídica, com a visita às várias
classificações propostas pela doutrina, concluindo pela sua natureza
indiscutivelmente tributária, com supedâneo no Texto Constitucional.
Explicitada
a natureza jurídica tributária das contribuições especiais, partimos para a
tarefa de situá-la no contexto tributário, enfrentando a questão da delimitação
acerca da espécie tributária na qual deve ser a mesma classificada, ou se, ao
contrário, deve ser ela catalogada como espécie tributária autônoma, diferente
das figuras clássicas a que alude o artigo 5.° do Código Tributário Nacional.
Ao
depois, destacamos o entendimento unânime da doutrina segundo o qual o conteúdo
finalístico das contribuições é fator indissociável da natureza destas,
circunstância que as diferencia dos impostos que, por expressa disposição
constitucional, têm vedada a vinculação de suas receitas a órgão, fundo ou
despesas específicos.
Foi
enfrentada, ainda, a questão da necessidade da existência de referibilidade ao
sujeito passivo das contribuições da atividade estatal que deu causa à sua
instituição.
Feitas
todas essas abordagens, voltamo-nos, finalmente, à análise das diversas
espécies de contribuições especiais: as contribuições sociais gerais, as
contribuições sociais de seguridade social, as contribuições de interesse de
categorias profissionais e econômicas, as contribuições de intervenção no
domínio econômico e, por fim, a contribuição para o custeio do serviço de
iluminação pública, com a busca das peculiaridades de cada uma desses grupos de
exações, bem como, com a identificação particular das várias imposições
existentes, atinentes à cada grupo, com a indicação das normas de direito
positivo que sobre elas versam.
No
desenvolvimento desta tarefa socorremo-nos das lições da doutrina e da
jurisprudência sobre o tema, trazendo à baila as diversas posições existentes
sobre um mesmo tema, filiando-nos, em várias oportunidades, a esta ou aquela
corrente de entendimento.
Nosso
objetivo, como se vê, não foi, e nem poderia ser, tentar dizer, taxativamente,
"o que é" ou "o que não é" a melhor forma do direito,
encastelando-nos em verdades incontestáveis, eis que, como se sabe, em ciência,
as perguntas são mais importantes que as respostas. Ou, se preferirmos, as
respostas são importantes, sim, mas só na medida em que abrem espaços a novas
perguntas.
2
ESBOÇO HISTÓRICO DAS CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS
No
início do século XX percebeu-se a existência e relevância de algumas questões
sociais, não conhecidas antes da Revolução Industrial, as quais se pode
denominar de "efeitos colaterais" dos regimes capitalistas.
Problemas
ligados ao conteúdo da relação de trabalho, à saúde e à educação pública
passaram a chamar a atenção da sociedade e, por conseqüência, do próprio
Estado.
As
atribuições do Estado, até então guiadas pelo pensamento de cunho absenteísta
liberal, alargaram-se, passando a merecer a atenção estatal além dos temas
sociais, aqueles relacionados com a economia e o meio- ambiente.
Na
segunda metade do século, no período do pós-guerra, houve uma intensificação da
atividade legislativa estatal voltada para a disciplina da economia, por meio
da intervenção estatal no domínio econômico, da criação de regras voltadas a
conter a formação de trustes etc.
Consolidava-se
a convicção de que não mais poderia prosperar a idéia liberal segundo a qual a
sociedade civil seria suficiente para realizar todos os objetivos por ela
pretendidos, sem a interferência do Estado, apenas com as regras
auto-reguladoras do mercado. Ganhava corpo a percepção nítida de que o alcance
de determinados objetivos só seria possível com a atuação positiva do Estado
pautada na noção de solidariedade. Nasce, então, o denominado Estado Social (Welfare
State).
Nesta
perspectiva, as normas estatais deixam de representar veículos que continham
somente limites dirigidos ao poder estatal, e passam a contemplar questões
outras, em consonância com a noção de solidariedade típica do denominado Estado
Social.
É
neste contexto que surge a figura da contribuição, como exação cobrada pelo
Estado.
As
contribuições são, portanto, fruto do Estado social e interventor.
Para
sua adequada compreensão impõe-se considerar as profundas alterações no papel
do Estado e da Administração decorrentes da passagem de um Estado Liberal para
um Estado Interventor nas ordens econômica e social.
No
liberalismo, partia-se de uma separação entre sociedade e Estado para se
defender a esfera jurídica individual dos cidadãos contra ingerências do Poder
Público, tidas como agressivas. O Estado era considerado um "mal
necessário", devendo cuidar estritamente das seguranças internas e externas,
à Justiça e alguns outros poucos serviços públicos.
Com
o advento do Estado Interventor restaram alteradas quantitativa e
qualitativamente as formas de atuação do Poder Público. O Estado passa a
intervir de forma mais freqüente na sociedade, tanto por meio da elaboração de
normas como também mediante políticas públicas destinadas a por fim à miséria
da classe operária, a fornecer prestações e utilidades materiais e a corrigir
as disfunções do mercado. Passa a orientar e a regular a atividade econômica e
mesmo a exercer atividades produtivas.
Os
cidadãos, por sua vez, passam a se tornar dependentes da atuação dos poderes
públicos. Aumenta a importância da atividade administrativa, uma vez que é por
meio dela que o Estado passa a satisfazer as necessidades dos cidadãos. Os atos
administrativos veiculam não mais apenas gravames, mas também vantagens para os
particulares. Os indivíduos passam a desejar que o Estado atue em seu favor,
concedendo-lhe uma licença, uma benefício previdenciário, uma subvenção. Estado
e sociedade entrelaçam-se ainda mais e não de forma esporádica ou pontual.
Novos
fins passaram a orientar a atuação estatal, dentre os quais se coloca a busca
do bem-estar. Para atingir tais fins, o Estado teve de lançar mão também de
novos meios.
A
tributação, nessa perspectiva, como instrumento de obtenção de recursos para
financiar as atividades do Poder Público, também sofreu modificações. As
contribuições se revelam um instrumento de intervenção do Estado na economia e
na ordem social.
Às
espécies tributárias tradicionais se acrescentaram exações especiais, "sui
generis", cuja inadequação aos esquemas tradicionais levou a que se
cunhasse a expressão "parafiscalidade", como forma de enquadrar sua
cobrança.
De
se perceber, pois, que a noção de parafiscalidade mostra-se excessivamente
marcada por componentes ideológicos típicos do Estado Liberal. A
"fiscalidade" propriamente dita, a cobrança de impostos e taxas,
destinava-se a atender necessidades e atividades típicas do Poder Público. As
novas tarefas que este passou a exercer foram colocadas "ao lado" de
referidas atividades tradicionais, como se não tivessem passado a constituir
também atribuições estatais. Estar-se-ia, nesta linha de raciocínio, diante de
necessidades "complementares", como a previdência social e os
interesses de categorias econômicas e profissionais.
Seja
como for, porém, resta clara a convicção de que o aparecimento das
contribuições é decorrência direta do intervencionismo que caracteriza o Estado
Moderno, particularmente como Welfare State, e a busca de um
enquadramento jurídico da arrecadação vertida para a organização
profissional, em moldes corporativistas, para a organização da economia e para
a Seguridade Social.
3 AS
CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS NO CONTEXTO JURÍDICO PÁTRIO
3.1
A SUA NATUREZA JURÍDICA : AS VÁRIAS CLASSIFICAÇÕES PROPOSTAS PELA DOUTRINA
A
doutrina pátria não tem um posicionamento unânime quanto a natureza jurídica
das contribuições especiais. Com efeito, embora a maior parte dos autores
enxergue nessa espécie de exação a natureza jurídica de tributo, parte dela tem
diversa opinião.
Leandro
Paulsen é daqueles estudiosos que entendem ter as contribuições especiais a
natureza jurídica tributária, afirmando ser possível vislumbrar na própria
Constituição Federal quais as características muito bem definidas comuns a
todas espécies tributárias:
a) obrigação
pecuniária voltada ao custeio das atividades dos entes políticos ou outras
atividades do interesse público; b) instituída por lei e independentemente da
vontade do sujeito passivo; c) que não constitui sanção de ato ilícito. Tal
decorre, segundo o autor, da circunstância de que em todas as normas existentes
no Capítulo "Do Sistema Tributário Nacional" inserto na Constituição
Federal, ser possível verificar-se que está a se cuidar de obrigações em
dinheiro, tanto que há diversas referências à base de cálculo e alíquota. Ademais,
tributa-se porque há a necessidade de recursos para manter as atividades a
cargo do Poder Público, ou, ao menos, atividades que são do interesse público,
ainda que desenvolvidas por outros entes. Também o caráter compulsório resta
evidente na medida em que a Constituição coloca a lei, que a todos obriga, como
fonte da obrigação tributária, tal como se vê do art. 150, I, do Texto
Constitucional, o que, ao mesmo tempo, evidencia a sua natureza compulsória de
obrigação "ex lege", marcada pela generalidade e cogência da lei,
independente da concorrência da vontade do sujeito passivo, como para
estabelecer o requisito formal para a instituição válida de tributos, qual
seja, que se dê mediante lei em sentido estrito. Vê-se, ainda, que as diversas
outorgas de competência se fazem em face de simples manifestações de riqueza do
contribuinte (no caso dos impostos), de serviços específicos e divisíveis
prestados pelos entes políticos, do exercício efetivo do poder de polícia, da
realização de obra que implique riqueza para os proprietários de imóveis ou,
ainda, em face da simples necessidade de buscar meios para custear determinadas
atividades vinculadas a finalidades previstas no texto constitucional, com ou
sem restituição. Em nenhum ponto, se tem a outorga de competência tributária em
face de um ilícito; não guardam, as diversas espécies tributárias, nenhuma
relação com o cometimento de ilícitos pelos contribuintes, decorrendo disso,
pois, a noção de que tributo não constitui sanção de ato ilícito.
Verificados
tais traços, pondera Leandro Paulsen, estaremos, necessariamente, diante de um
tributo, o que atrai a incidência do regime jurídico-tributário, a começar
pelas limitações constitucionais ao poder de tributar e, no plano
infra-constitucional, pelas normas gerais de direito tributário. [1]
Hugo
de Brito Machado Segundo e Raquel Cavalcanti Ramos Machado, em escrito
conjunto, asseveram que ao outorgar competência tributária às três esferas de
poder político, a Constituição não define o que por tributo se deva entender, o
mesmo acontecendo, por outro lado, com vários outros conceitos presentes em seu
texto, a exemplo de soberania, Estado de Direito, povo, sociedade, entre muitos
outros, pois presume alguma inteligência em seus intérpretes. Assim, o conceito
de tributo pode ser extraído, dedutivamente, das demais disposições
constitucionais.
Destacam
citados autores, citando Geraldo Ataliba, que deparando-se o jurista com uma
situação em que alguém esteja colocado na contingência de ter o comportamento
específico de dar dinheiro ao estado (ou a entidade dele delegada por lei),
deverá inicialmente verificar se se trata de: a) multa; b) obrigação
convencional; c) indenização por dano; d) tributo. Assim, diante de
ordenamentos jurídicos como o brasileiro, não haveria espaço para uma quinta
classificação. Trata-se, destacam os autores nominados, de idéia já implícita
na Constituição, em face da qual e dos conceitos extraídos do Código Tributário
Nacional e do art. 9.° da Lei n.° 4.320/64, pode-se definir tributo como sendo
toda prestação pecuniária compulsória, que não constitua sanção de ato ilícito,
instituída em lei, cobrada mediante atividade administrativa plenamente
vinculada e cujo produto da arrecadação constitua receita pública derivada.
[2]
Instaladas
tais premissas e considerando que as contribuições se encaixam perfeitamente
nesse conceito, concluem os autores referidos que sua natureza é inegavelmente
tributária.
Hugo
de Brito Machado compartilha desse entendimento majoritário na doutrina pátria,
quando assevera:
É
induvidosa, hoje, a natureza tributária dessas contribuições. Aliás, a
identificação da natureza jurídica de qualquer imposição do Direito só tem
sentido prático porque define o seu regime jurídico, vale dizer, define quais
são as normas jurídicas aplicáveis. No caso de que se cuida, a Constituição
afastou as divergências doutrinárias afirmando serem aplicáveis às
contribuições em tela as normas gerais de Direito Tributário e os princípios da
legalidade e da anterioridade tributárias, [...]. [3]
Também
Paulo de Barros Carvalho não dissente deste entendimento, quando destaca que o
legislador constituinte prescreve manifestamente que as contribuições
são entidades tributárias, subordinando-se em tudo e por tudo às linhas
definitórias do regime constitucional peculiar aos tributos. [4]
Roque
Carrazza, se referindo ao artigo 149 da Constituição Federal, é categórico ao
afirmar que basta a sua leitura para percebermos que todas as têm natureza
nitidamente tributária, mesmo porque, com a expressa alusão aos arts. 146, III
e 150, I e III, ambos da CF, fica óbvio que deverão obedecer ao regime jurídico
tributário. [5]
Já
Marco Aurélio Greco destoa dessa linha de pensamento, sustentando que o texto
constitucional aponta para uma natureza não tributária das contribuições:
De
fato, se o art. 149 determina seja aplicada a disciplina típica do Direito
Tributário, se manda aplicar as normas gerais de Direito Tributário, se impõe
limitações da legalidade, anterioridade e irretroatividade para as
contribuições, é porque elas não estão dentro do âmbito tributário. Não
pertencem a este gênero. Se estivessem, não precisaria mandar observar tais ou
quais regras e critérios; se a intenção fosse dar-lhes a natureza tributária,
bastaria incluir um item IV ao art. 145 e toda a sistemática e regime
tributário seriam automaticamente de observância obrigatória. Ou então,
bastaria determinar a aplicação integral do regime tributário e prever as exceções
que julgasse pertinentes, como faz com os impostos. [6]
Trilhando
um raciocínio algo parecido com o de Marco Aurélio Greco, Marçal Justen Filho,
citado por José Eduardo Soares de Melo, afirma que ao prever, como regra geral,
a submissão das contribuições ao regime tributário, a Constituição confirmou a
inexistência de identidade total e rigorosa entre as duas figuras, eis que, se
assim fosse, não teriam sentido as regras dos arts. 149 e 154, sendo
suficientes a disciplina geral sobre tributos. Desta forma, conclui o autor,
"as contribuições especiais sujeitam-se ao regime tributário, mas com
determinados temperamentos, derivados de suas características". [7]
3.2. O
RECONHECIMENTO DA SUA NATUREZA JURÍDICA TRIBUTÁRIA.
Não
obstante as posições contrárias, que são minoritárias, não é possível deixar de
concluir pela natureza eminentemente tributária das contribuições especiais no
sistema constitucional brasileiro. As lições doutrinárias neste sentido,
expostas no subitem anterior falam por si próprias.
Ora,
afigura-se nos inescapável a conclusão de que tudo aquilo que está sujeito ao
regime jurídico tributário é tributo. Neste particular, de extrema felicidade a
conclusão de José Eduardo Soares de Melo:
De
tudo resulta que as contribuições tipificam-se como tributos, por traduzirem
receitas públicas derivadas, compulsórias, com afetação a órgão específico
(destinação constitucional) e por observarem regime jurídico pertinente ao
sistema tributário. [8]
Ademais,
o próprio Supremo Tribunal Federal já reconheceu a natureza jurídica tributária
das contribuições, quando, ao se manifestar sobre a Contribuição Social sobre o
Lucro, dispôs que "Não é inconstitucional a instituição da contribuição
social sobre o lucro das pessoas jurídicas, cuja natureza é tributária."
[9]
3.3
AS CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS COMO ESPÉCIE TRIBUTÁRIA AUTÔNOMA
Explicitada
a natureza jurídica tributária das contribuições especiais, resta ainda a
delimitação acerca da espécie tributária na qual seria a mesma classificada ou
se, ao contrário, estas devem ser catalogadas como espécie tributária autônoma,
diferente das figuras clássicas a que alude o artigo 5.° do Código Tributário
Nacional.
Sacha
Calmon Navarro Coêlho é daqueles que afirma categoricamente que as
contribuições são, em essência, impostos. Assevera que a Constituição de 1988
criou essas exações como "impostos afetados a finalidades específicas
dando-lhes o nome de contribuições." [10]
Destoando
desse entendimento, o notável Roque Antonio Carrazza ensina que as chamadas
contribuições sociais são verdadeiros tributos, embora qualificados pela
finalidade que devem alcançar, podendo, assim, revestir a natureza jurídica de
imposto, de taxa ou de contribuição de melhoria, conforme as hipóteses de
incidência e bases de cálculo que tiverem. Para explicitar essa afirmação,
Carrazza assevera que a contribuição social para a seguridade social é, para o
empregador, um imposto, cuja hipótese de incidência seria remunerar
pessoa que paga previdência social, enquanto que para o empregado não passa
de uma taxa de serviço, exigível porque os serviços previdenciários em geral
lhe são postos a disposição. [11]
Já
Luciano Amaro, após afirmar que o tratamento jurídico-constitucional
diferenciado que é dado às contribuições especiais como um todo (destinação
específica, a par de uma disciplina constitucional peculiar, no que respeita
aos seus fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes) dificulta a
afirmação singela de que essas contribuições são impostos, ou são taxas, ou ora
são uma coisa, ora outra, termina por concluir :
Uma
terceiro grupo de tributos é composto pelas exações cuja tônica não está nem no
objetivo de custear as funções gerais e indivisíveis do Estado (como
ocorre com os impostos) nem numa utilidade divisível produzida pelo
Estado e fruível pelo indivíduo (como ocorre com os tributos conhecidos
como taxa, pedágio e contribuição de melhoria, que reunimos no segundo grupo).
A característica peculiar do regime jurídico deste terceiro grupo de exações
está na destinação a determinada atividade, exercitável por entidade
estatal ou paraestatal, ou por entidade não estatal reconhecida pelo Estado
como necessária ou útil à realização de uma função de interesse público.
Nesse grupo se incluem as exações previstas no art. 149 da Constituição, ou
seja, as contribuições sociais, as contribuições de intervenção no domínio
econômico e as contribuições de interesse de categorias profissionais ou
econômicas, bem como a contribuição referida no art. 149-A da Constituição
(acrescido pela EC n. 39/2002), destinada ao custeio do serviço de iluminação
pública. [12]
Não
obstante o indiscutível brilho das lições retro-expostas, temos para nós que
quem melhor angularizou a questão foram Hugo de Brito Machado Segundo e Raquel
Cavalcanti Ramos Machado, que asseveram que a única utilidade prática de
se questionar a natureza jurídica específica de determinada exação é a de
determinar quais normas jurídicas lhe são pertinentes. Assim, se considerado
que a Constituição confere tratamento jurídico peculiar às contribuições e aos
empréstimos compulsórios, pode-se dizer que a Constituição já os definiu como
espécies distintas dos impostos, das taxas e das contribuições de melhoria, não
tendo sentido dizer que são impostos na medida em que o seu disciplinamento
jurídico é diferente. Terminam referidos juristas por concluir que uma
explicação razoável para a posição das contribuições no quadro de espécies
tributária é a oferecida por Hamilton Dias de Souza, que, na esteira de Geraldo
Ataliba e A. D. Gianinni, as classifica como tributos vinculados a uma
atividade estatal, situadas porém em posição intermediária entre impostos e
taxas, mais próximas dos impostos (completa desvinculação) que das taxas (total
vinculação), não pressupondo uma atuação estatal específica e divisível
relativa ao contribuinte (taxas), mas também não incidindo sobre um fato desvinculado
de qualquer atuação estatal relativa ao contribuinte (impostos). Existiria,
assim, uma referibilidade indireta, de uma atuação estatal relacionada a um
grupo determinado; o fato gerador pode até se assemelhar bastante ao dos
impostos, mas só estará completo diante de uma atuação estatal relativa ao
grupo no qual se situa o contribuinte, traço diferenciador das contribuições.
[13]
3.4. O SEU
CONTEÚDO FINALÍSTICO COMO FATOR ESSENCIAL
É
praticamente unânime na doutrina o entendimento segundo o qual o conteúdo
finalístico das contribuições é fator indissociável da natureza destas,
diferenciando-as, por isso mesmo, dos impostos que, por expressa disposição
constitucional (art. 167, IV), têm vedada a vinculação de suas receitas a
órgão, fundo ou despesas específicos. São, portanto, as contribuições, tributo
que se caracteriza pela respectiva finalidade. Representam, por isso mesmo,
exceção ao art. 4.°, II, do Código Tributário Nacional, eis que o destino do
produto de sua arrecadação é fundamental para caracterizá-la como tal e,
sobretudo, emprestar juridicidade à sua exigência.
Para
Zelmo Denari para a adequada identificação da natureza jurídica das
contribuições especiais deve-se ter presente que somente podem estas ser
instituídas "quando motivadas por qualquer forma de intervenção no domínio
econômico, bem como no interesse das categorias profissionais ou econômicas, e
mesmo no plano da seguridade dos trabalhadores urbanos e rurais".
Assevera, ainda, que para distinguí-las das taxas e das contribuições de
melhoria - também tributos vinculados -, basta considerar dois elementos
fundamentais, se destacando entre estes o sentido finalístico, pelo que
as contribuições da espécie vinculam o ente público a atuar, de uma forma
interventiva, no domínio econômico, ou a prestar serviços de previdência ou
assistência social aos trabalhadores e demais. [14]
Desta
forma, a validade jurídica da norma instituidora da contribuição especial só
pode ser reconhecida se efetivamente cumprida a finalidade prevista
constitucionalmente, que determinou a sua criação. Assim, a correta destinação
da respectiva receita assume relevância não só tributária como constitucional e
legitimadora da competência. Se inexistente o órgão, a despesa ou a pessoa que fundamentou
o exercício dessa competência, este será ilegítimo.
E
nem se argumente que o art. 4.°, II, do Código Tributário Nacional baniu o
critério da destinação do tributo como relevante juridicamente no cenário
tributário pátrio. Luciano Amaro é contundente ao ensinar que nos dias atuais o
critério do art. 4.°, II, do CTN não mais se mostra como parâmetro idôneo à
determinação da natureza jurídica específica do tributo. Nesta linha, assevera
Amaro, a propósito do tema:
Ou
seja, nem se pode ignorar a destinação (como se se tratasse, sempre e apenas,
de uma questão meramente financeira), nem se pode cercar o direito
tributário com fronteiras tão estreitas que não permitem indagar do destino do
tributo mesmo nos casos em que esse destino condiciona o próprio exercício
da competência tributária. [15]
Sendo
a contribuição um tributo que se identifica a partir da finalidade indicada na
Constituição, a lei não pode criar uma contribuição e possibilitar que seus
recursos sejam destinados para um fim distinto daquele que justificou essa
exigência, sob pena de inconstitucionalidade.
Neste
sentido o escólio do Ministro Carlos Velloso, do Supremo Tribunal Federal,
citado por Hugo de Brito Machado:
Uma
ressalva é preciso ser feita. É que caso há, no sistema tributário brasileiro,
em que a destinação do tributo diz com a legitimidade deste e, por isso, não
ocorrendo a destinação constitucional do mesmo, surge para o contribuinte o
direito de não pagá-lo. Refiro-me às contribuições parafiscais - sociais, de
intervenção no domínio econômico e de interesse de categorias profissionais ou
econômicas, CF, art. 149 - e aos empréstimos compulsórios (CF, art. 148).
Leciona Misabel Abreu Derzi que a ‘Constituição de 1988, pela primeira vez,
cria tributos finalisticamente afetados, que são as contribuições e os
empréstimos compulsórios, dando à destinação que lhe é própria relevância não
apenas do ponto de vista do Direito Financeiro e Administrativo, mas igualmente
de Direito Tributário’. E acrescenta a ilustre professora da UFMG, que ‘o
contribuinte pode opor-se à cobrança de contribuição que não esteja afetada aos
fins, constitucionalmente admitidos; igualmente poderá reclamar a repetição do
tributo pago, se, apesar da lei, houver desvio quanto à aplicação dos recursos
arrecadados. É que, diferentemente da solidariedade difusa ao pagamento de
impostos, a Constituição prevê a solidariedade do contribuinte no pagamento de
contribuições e empréstimos compulsórios e a conseqüente faculdade outorgada à
União de instituí-los, de forma direcionada e vinculada a certos gastos.
Inexistente o gasto ou desviado o produto arrecadado para outras finalidades
não autorizadas na Constituição, cai a competência do ente tributante para
legislar e arrecadar. (Misabel Abreu Machado Derzi, notas atualizadoras de Limitações
Constitucionais ao Poder de Tributar, 7.ª edição, de Aliomar Baleeiro,
Forense, 1977, pp. 598-599) [16]
Parece
induvidosa, pois, a conclusão de que segundo se extrai do regime constitucional
das contribuições, existem dois elementos condicionantes fundamentais que devem
ser atendidos na instituição dessa espécie tributária: 1.) o atendimento às
finalidades fixadas previamente no texto constitucional (sociais, interventivas
e corporativas) e, 2) a destinação do produto da arrecadação à realização dos
citados fins constitucionais. Faltando algum dos requisitos citados haverá
vício que poderá determinar a inconstitucionalidade da exigência e, por
conseqüência, o correlato direito à restituição das quantias pagas
indevidamente.
A
doutrina brasileira parece trilhar firmemente esse caminho, Na obra coletiva
"As contribuições no Sistema Tributário Brasileiro", apresentada a
indagação de qual seria a conseqüência de eventual desvio na destinação de
contribuições, a maioria dos autores distinguiu o desvio jurídico, assim
entendido aquele autorizado ou determinado em lei, do desvio de fato, que se dá
em contrariedade ao dispositivo de lei que determina a destinação. Comentando
especificamente essa questão na sua apresentação da obra, Hugo de Brito
Machado, seu coordenador, destaca uma súmula das diversas posições expostas no
livro, não se furtando de, ao final, expor o seu pensamento:
No
desvio jurídico, a própria contribuição seria inconstitucional, porquanto
transformada em imposto. Já no desvio simplesmente de fato não haveria
mácula na relação jurídica, cabendo ao Ministério Público, aos cidadãos através
da ação popular, etc., obter a correção do destino dos recursos.
Um
dos autores escreveu:
"Não
há, neste último caso (de desvio de fato), como pretender invalidar as relações
tributárias e dizer da inconstitucionalidade das leis em razão de ilícito
administrativo posterior e cuja correção pode ser buscada.
Entendêssemos
de modo diverso, teríamos, ainda, dificuldades importantes. Senão vejamos:
supondo eventual desvio, quais as contribuições inválidas e sujeitas à
devolução? Qual o montante desviado? Quais as competências passíveis de
restituição? Como estabelecer a relação entre as competências e os desvios.
Pagamentos posteriores à correção dos desvios, mas relativos a competências
entendidas como afetadas, seriam ainda devidos? Como ficaria, neste caso, o
tratamento isonômico aos contribuintes? A repetição dependeria do insucesso das
tentativas do Ministério Público de reverter a aplicação equivocada dos
recursos e destiná-los à sua finalidade legal? A recuperação e correta
destinação de eventual montante desviado tornaria novamente exigível o tributo?
Tais questões bem revelam que não se pode confundir o plano do exercício da
competência tributária com o da execução do orçamento."
Alguns
autores distinguiram ainda, dentro do desvio de direito, o desvio quantificável
(que invalida o montante cujo desvio é autorizado), do desvio de impossível
quantificação (que invalida a contribuição como um todo).
Outros,
finalmente, invocaram a "autonomia da relação tributária", afirmando
ser a questão da destinação um "problema de direito financeiro" que
não invalida a obrigação tributária...
A
nosso ver a tese destes últimos não é procedente, porque em se tratando de
contribuições a destinação é essencial. Às contribuições não se aplica a norma
do art. 4.° do Código Tributário Nacional.
Realmente,
as contribuições sociais de que trata o art. 149, bem como os empréstimos
compulsórios, têm destinação constitucionalmente determinada. [17]
3.5. A
REFERIBILIDADE DA ATIVIDADE ESTATAL AO CONTRIBUINTE DAS CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS
Sempre
se constituiu em matéria de intensas discussões a relativa à determinação da
necessidade da existência de referibilidade ao contribuinte da atividade
estatal que deu causa à instituição da contribuição especial.
Ou
seja, objetivamente, a questão que se coloca é se a atividade a cuja execução
se destina a receita arrecadada com as contribuições especiais é ou não
necessariamente referível ao contribuinte, atualmente ou no futuro, efetiva ou
eventualmente. A resposta à essa questão é de fundamental importância, na
medida em que vai se definir, através dela, quais as pessoas que podem ser
colocadas, pela lei, na condição de sujeitos passivos dessa espécie tributária.
Para
Luciano Amaro, a atividade estatal a cuja execução se destina a receita
arrecadada nas contribuições não é necessariamente referível ao contribuinte,
embora possa sê-lo, em maior ou menor grau, atualmente ou no futuro, efetiva ou
eventualmente. Segundo Amaro, a existência ou não dessa referibilidade é um
dado meramente acidental (que pode ou não estar presente) e não essencial.
[18]
Já
Sacha Calmon Navarro Coelho é daqueles juristas que tem entendimento contrário.
Para ele, para que haja uma contribuição especial verdadeira, é necessário que
a atuação estatal eleita como fato gerador seja um atuar mediato ou imediato do
Poder Público, específico e relativo à pessoa do contribuinte, alertando,
ainda, que essa atuação não pode ser obra pública (pressuposto da contribuição
de melhoria), nem serviço de utilidade pública (pressuposto da taxa de
serviço), nem ato do poder de polícia (pressuposto da taxa de polícia). [19]
No
mesmo sentido a doutrina de Geraldo Ataliba, que ensina que se o imposto é
informado pelo princípio da capacidade contributiva e a taxa informada pelo
princípio da remuneração, as contribuições são informadas por princípio
diverso, qual seja, os seus sujeitos passivos serão pessoas cuja situação
jurídica tenha relação, direta ou indireta, com uma despesa especial, a elas
respeitante, ou alguém que receba da ação estatal um reflexo que possa ser
qualificado como "especial". [20]
Já
Leandro Paulsen afirma que nas contribuições, onde a autorização constitucional
é para que sejam instituídos tributos voltados a atuações em áreas específicas,
o pressuposto é que sejam chamados a contribuir pessoas relacionadas a tal
atuação, advertindo, entretanto, nos seguintes termos:
Cabe
destacar, aqui, que não se trata, necessariamente, de pessoas propriamente
beneficiadas pela atuação do poder público, podendo, e.g., ser um grupo
cuja existência provoque determinada atuação do Estado, ainda que,
eventualmente, de controle, como no caso da contribuição cobrada das entidades
potencialmente poluidoras destinada a financiar o controle e monitoramento das
condições ambientais, de que trata a Lei 10.165/2000 [...].
Tal
aspecto, de pertinência a um grupo, distingue as contribuições inclusive dos
impostos de escopo (extraordinários de guerra ou calamidade – art. 154,II) e
dos empréstimos compulsórios (art.148).
A
imprescindibilidade da delimitação dos contribuintes pela identificação do
grupo precisa ser destacada, bem como o fato de que a solidariedade que se
destaca como traço das contribuições diz respeito aos integrantes do grupo, não
justificando a sujeição passiva de terceiros. [21]
Entretanto,
ressalva Leandro Paulsen que, diferentemente das demais contribuições
especiais, as contribuições sociais destinadas à Seguridade Social, por força
do "caput" do art. 195 do texto constitucional - que prescreve que a
Seguridade Social será financiada por toda a sociedade - ostentam uma
característica peculiar, qual seja, a de que todos poderão ser chamados a
contribuir, independentemente de pertencerem a determinado grupo diretamente
relacionado com a atuação estatal, o que positivaria o princípio da
Solidariedade Social em matéria de custeio da Seguridade Social. [22]
Parece-nos
que a doutrina citada de Leandro Paulsen, notadamente com a ressalva última no
concernente às contribuições à Seguridade Social, melhor angularizou, sob o
prima jurídico-científico, a questão da necessidade ou não da referibilidade da
atividade estatal ao contribuinte das contribuições especiais, razão pela qual
entendemos deva ser adotada em detrimento das demais citadas.
4. A
COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL DAS PESSOAS POLÍTICAS PARA INSTITUIR CONTRIBUIÇÕES
O
art. 149, caput, da Constituição Federal prescreve a possibilidade da
União instituir contribuições como instrumento de sua atuação no âmbito social,
na intervenção no domínio econômico e no interesse das categorias profissionais
ou econômicas. Três, portanto, são as espécies de contribuição: (I) social,
(II) interventiva e (III) corporativa, tendo o constituinte empregado, como
critério classificatório, a finalidade de cada uma delas, representada pela
destinação legal do produto arrecadado. As contribuições sociais, por sua vez,
são subdivididas em duas categorias: (i) genéricas, voltadas aos diversos
setores compreendidos no conjunto da ordem social, como educação, habitação
etc. (art. 149, caput); e (ii) destinadas ao custeio da seguridade
social, compreendendo a saúde, previdência e assistência social (art. 149, caput,
e § 1.°, conjugados com o art. 195).
No
§ 1.° do citado art. 149 da Constituição Federal, conferem-se poderes aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para criarem contribuições,
cobradas de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, de sistemas de
previdência e assistência social.
Além
das citadas competências citadas, atribuídas às três esferas de poder,
observa-se, também, no sistema constitucional tributário vigente, a
possibilidade de essa espécie de tributo ser instituída pelos Municípios e
Distrito Federal com o objetivo de custear os serviços de iluminação pública.
Trata-se da contribuição para o custeio de iluminação pública, a que se refere
o art. 149-A da Carta Magna, introduzida pela Emenda Constitucional n.°
39/2002. O constituinte derivado ampliou o rol de competências tributárias,
criando nova modalidade de contribuição.
5 AS
ESPÉCIES DE CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS
5.1
AS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS
5.1.1 As Contribuições Sociais Gerais
São
denominadas contribuições sociais gerais aquelas contribuições sociais, de
competência da União, que não se destinam a custear a Seguridade Social. São
reguladas pelo artigo 149 da Constituição Federal e custeiam a atuação do
Estado em outros campos sociais, como Salário-Educação (art. 212, § 5.°) e o
PIS-PASEP e não são objeto de qualquer exceção, sujeitando-se de formal
integral ao regime constitucional tributário, mormente ao princípio da
anterioridade.
Tem
sido alvo de intensa controvérsia na doutrina a questão relativa ao campo
residual para a criação de novas figuras voltadas ao custeio de outros fins
sociais distintos dos inerentes à Seguridade Social, em contraposição ao
entendimento de que somente seriam legítimas, nesta área social não compreendia
na Seguridade Social, as contribuições expressamente previstas pelo
constituinte originário. Em outras palavras: o legislador infraconstitucional
disporia de competência para criar novas contribuições sociais que não as
nominalmente aludidas no texto constitucional (artigos 212, § 5.°, 239 e 240)?
Respondendo
à questão A Constituição Federal admite a instituição de contribuições
sociais gerais, ou seja, outras além das expressamente previstas nos seus arts.
149, 195, 212, § 5.°, 239 e 240? elaborada pelo coordenador da obra
coletiva As Contribuições no Sistema Tributário Brasileiro, José Eduardo
Soares de Melo é peremptório ao reconhecer essa possibilidade, desde que haja
observância aos elementos básicos, como, receita pública derivada,
compulsoriedade, parafiscalidade, destinação específica dos seus recursos, e
vinculação a determinado grupo, citando, a final, como exemplos a contribuição
ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (art. 7.°, III), e a CPMF (EC n.°s
21-99 e37-02). [23]
Na
mesma linha, Leandro Paulsen assegura ser possível a instituição de outras
contribuições sociais gerais, além daquelas previstas originariamente no texto
constitucional, asseverando prestar-se, pois, tal subespécie tributária, como
fonte de custeio para a atuação da União na área social, que é definida e
delimitada pelos deveres e objetivos apontados pela Carta Magna ao cuidar da
Ordem Social, dentre as quais destaca, exemplificativamente: garantir o acesso
às fontes da cultura nacional e incentivar a difusão das manifestações
culturais, fomentar práticas desportivas, promover e incentivar o
desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas, promover a
educação ambiental e proteger a fauna e a flora, demarcar as terras e proteger
os bens indígenas, terminando por concluir que a referência expressa, no texto
constitucional, às contribuições de Seguridade Social (art. 195) e aquelas
referidas nos arts. 212, § 5.°, 239 e 240 não impede a instituição de novas
contribuições sociais. [24]
Já
Hugo de Brito Machado Segundo e Raquel Cavalcanti Ramos Machado respondem
negativamente à essa questão, argumentando que a interpretação do art. 149 da
Constituição Federal permite essa conclusão, complementando que, ademais, a
admissão de tal possibilidade implicaria no fenecimento definitivo da
racionalidade do nosso Sistema Tributário, além de causar profundo
desequilíbrio na partilha de competências tributárias realizadas pela
Constituição. [25]
Também
respondendo a essa questão pela negativa apresenta-se o Professor Ives Gandra
da Silva Martins, para quem, sendo rígido o sistema tributário e regulado pela
estrita legalidade, assim como, estando entre as limitações constitucionais ao
poder de tributar, o da estrita legalidade, não haveria espaço para a criação
de contribuições fora das hipóteses constitucionais, o que representaria - se
se reconhecesse essa possibilidade - tornar-se desnecessário o capítulo do
sistema tributário na Constituição Federal. [26]
Na
apresentação da referida obra coletiva As Contribuições no Sistema
Tributário Brasileiro, Hugo de Brito Machado, o seu coordenador,
debruçando-se sobre a referida questão da possibilidade de instituição de
outras contribuições sociais gerais, além daquelas previstas no texto
constitucional, faz uma síntese dos vários posicionamentos doutrinários
expostos na obra e, ao depois, expressa o seu pensar a respeito:
Entre
os autores dos estudos que integram esta coletânea alguns a respondem
afirmativamente, à consideração de que tais contribuições são necessárias para
o custeio de atividades de cunho "social" da União. Afirmam que isso
pode ser extraído da literalidade do art. 149, e que, caso não existissem tais
contribuições gerais, a parte inicial do citado artigo não teria sentido algum.
Outros
afirmam que não, sustentando que em face da amplitude das atividades de cunho
social, admitir tais contribuições implicaria admitir desmedida elasticidade na
competência tributária da União, deixando sem sentido os artigos 154, I e 195,
§ 4.°, que tratam de competências residuais para impostos e contribuições de
seguridade.
Não
obstante já tenha o Supremo Tribunal Federal, a propósito das contribuições
instituídas pela Lei Complementar 110, admitido a validade da instituição de
contribuições sociais gerais, pensamos que a razão está com os que negam essa
possibilidade.
A
final o próprio Estado tem função social. Tudo o que o Estado realiza, pelo
menos no plano do dever ser volta-se para o social. Assim, é
extremamente fácil para o governo justificar qualquer ação estatal com o
argumento de que elas são desenvolvidas no interesse social. Em conseqüência, é
extremamente fácil para o governo instituir as mais diversas contribuições
sociais, passando a tê-las como fonte de custeio de quase todas as atividades
estatais, de sorte a tornar praticamente prescindíveis os impostos.
[
... ]
Com
a hipertrofia das contribuições, de cuja arrecadação não participam os estados
nem os municípios, tende-se a abolir a Federação. E se caminha no sentido de
tornar inútil o sistema de garantias constitucionais tributárias.
Por
isto pensamos que a Constituição Federal deve ser interpretada sem
desconsideração para os elementos sistêmico e teleológico, atribuindo-se a seus
dispositivos significados e alcance que não possibilitem tornar inúteis alguns
deles. Em outras palavras, não devemos atribuir ao artigo 149 da Constituição
Federal sentido e alcance capaz de permitir a inutilização de diversos dos mais
importantes dispositivos dessa mesma Constituição.
Aliás,
quem examinar a evolução dos tributos no Brasil nos últimos anos verá que já
experimentamos um considerável aumento da quantidade de contribuições. E essa
tendência, se admitirmos a possibilidade das contribuições sociais gerais, com
certeza vai resultar na atrofia dos impostos federais, com a conseqüente
impossibilidade de manutenção de grande parte dos municípios brasileiros, na
quebra do próprio princípio federativo na medida em que os estados, ou a
maioria deles, não poderão manter a autonomia que caracteriza a Federação. [27]
O
posicionamento retro, de lavra do Professor Hugo de Brito Machado, nos parece
inatacável sob qualquer ponto de vista, a despeito do brilho das lições
expostas em sentido contrário, bem como da manifestação na mesma linha do
Supremo Tribunal Federal, que entendeu constitucional a contribuição instituída
pela Lei Complementar 110, de 29 de junho de 2001, considerando ter aquela
exação a natureza jurídica de contribuição social geral, com fundamento de
validade no art. 149, 1.ª parte, da CF. [28]
A
doutrina aponta como exemplo de contribuição social geral a contribuição do
Salário-Educação, criada pelo artigo 178 da Emenda Constitucional 1/1969 e
confirmada na atual Carta Política pelo § 5.° do seu artigo 212, destinada a
financiar, como fonte adicional, o ensino fundamental público.
Da
mesma forma, inclui-se como contribuições da espécie as contribuições para o
Programa de Integração Social (PIS), criado pela Lei Complementar n.° 7, de
07-09-1970 e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público
(PASEP), criado pela Lei Complementar n.° 8, de 3-12-1970, destinados a
financiar o programa do seguro-desemprego e o abono de que trata o § 3.° do
artigo 239 da CF, previstas no "caput" do artigo 239 da Constituição
Federal.
Classificam-se,
ainda, como contribuições da espécie aquelas aludidas no artigo 240 da
Constituição Federal, que estabelece ressalvou a cobrança, a par do disposto no
artigo 195 da CF, das então existentes contribuições compulsórias dos
empregadores sobre a folha de salários, destinadas às entidades privadas de
serviço social e de formação profissional vinculadas ao sistema sindical. São
as chamadas contribuições destinadas a entidades privadas (Sistema
"S"). Trata-se de tributo exigido de pessoas privadas (empregadores)
relativamente a fatos distintos de atividade estatal, destinados a entidades
privadas (SENAI, SESI, SESC, SENAC, etc).
5.1.2. As Contribuições Sociais de Seguridade Social
As
contribuições sociais destinadas ao custeio da Seguridade Social encontram-se regradas
no artigo 195 da Constituição Federal:
Artigo
195 – A Seguridade Social será financiada por toda a sociedade, de forma direta
e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes
contribuições sociais:
I
– do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei,
incidentes sobre:
a. a
folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a
qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo
empregatício;
b. a
receita ou o faturamento;
c. o
lucro;
II
– do trabalhador e dos demais segurados da Previdência Social, não incidindo a
contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral da
Previdência Social de que trata o art. 201;
III
– sobre a receita de concursos de prognósticos.;
IV
– do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele
equiparar.
Desde
logo a leitura do dispositivo constitucional citado deixa perceber a
preocupação do legislador constituinte em estabelecer aquilo que alguns
doutrinadores convencionaram chamar de princípio da solidariedade em matéria de
custeio da Seguridade Social. Com efeito, o "caput" do art. 195, já
de início, prescreve que a seguridade social será financiada por toda a
sociedade. Tal previsão, na arguta observação de Leandro Paulsen, confere uma
característica peculiar para esta espécie de contribuição, não encontrada nas demais,
qual seja, a de que todos poderão ser chamados a contribuir, independentemente
de pertencerem a determinado grupo diretamente relacionado com a atuação
estatal. [29]
Na
mesma linha de entendimento, Evandro Costa Gama, respeitável procurador da
Fazenda Nacional, esclarece que o referido princípio da solidariedade no
custeio da Seguridade Social, emergente do texto do art. 195, caput, da
Constituição Federal, exerce, como característica peculiar de todo princípio,
um papel fundamental na interpretação e aplicação das regras constitucionais e
infraconstitucionais relacionadas com a cobrança das contribuições da
seguridade social, estabelecendo o dever de solidariedade de todos os
integrantes da sociedade no financiamento da Seguridade Social no Brasil. [30]
Todavia,
expressiva doutrina prefere o raciocínio segundo o qual não se afigura razoável
que a lei eleja como sujeito passivo de qualquer contribuição aqueles a quem
não esteja referida a atuação estatal, ainda que indiretamente. [31]
Neste
sentido a lição de Marçal Justen Filho, citado por José Eduardo Soares de Melo,
para quem " [ ... ]. Não é possível a exigência de contribuição daquele
que não possua vantagem (mesmo potencial) da atividade estatal." [32]
Admite-se,
consoante a doutrina dominante, que na contribuição possa haver, ao invés de
uma referibilidade direta da atuação estatal com o contribuinte, uma
referibilidade mediata e indireta, mediante o liame oblíquo, com a presença de
uma circunstância intermediária que, de través, de permeio, se coloca entre a
atuação estatal e o obrigado. [33]
De
igual pensar o ensinamento de Ives Gandra da Silva Martins, citado por José
Eduardo Soares de Melo, para quem, quando uma empresa recolhe a parcela correspondente
à folha salarial, embora não seja beneficiária direta do recolhimento, tem nos
seus empregados o benefício indireto, eis que estes serão os destinatários da
atuação da Seguridade Social, consistindo, a falta dessa vantagem, em
circunstância que tem o condão de desnaturar por inteiro a imposição, com
afronta ao estabelecido no artigo 195 da Constituição Federal. [34]
De
qualquer forma, porém, o que é possível destacar é que nesta espécie de
contribuição a referibilidade da atuação estatal com a pessoa do obrigado é
bastante tênue, eis que o grupo em relação ao qual é prestada a atividade é
constituído de toda a sociedade, circunstância que, de certa forma, aproxima as
posições doutrinárias expostas, eis que, nesta linha de raciocínio, não é possível
deixar de reconhecer que, porque toda a sociedade experimenta, ainda que
potencialmente, a vantagem da atuação estatal, todos ostentariam condições
jurídicas de figurarem como sujeitos passivos dessa exação.
Voltando
agora os nossos olhos para outros ângulos, é oportuno o destaque de que as
contribuições sociais de seguridade social também se submetem parcialmente às
regras do art. 149 da Constituição Federal, porém ganham especificidade ao se
encontrarem inseridas no capítulo da Seguridade Social, com regras e princípios
próprios, como se depreende dos arts. 194 e 195.
Sendo
uma subespécie da espécie contribuições sociais a que alude o art. 149 do texto
constitucional, as contribuições sociais de seguridade social sujeitam-se às
normas gerais de direito tributário previstas no art. 146, III, bem como só
podem ser exigidas ou majoradas por meio de lei (art. 150, I) e não podem ser
cobradas em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da
lei que as houver instituído ou aumentado (art. 150, III, "a").
Entretanto, o regramento comum não vai além da aplicação dos referidos
dispositivos constitucionais.
A
primeira distinção visível na leitura do artigo 149 entre os regimes jurídicos
das contribuições sociais que encontram lastro naquele dispositivo e daquelas
instituídas com base no artigo 195, refere-se a não sujeição destas últimas ao
chamado princípio constitucional da anterioridade (art. 150, III,
"b"), a teor do que proclama o § 6.° do artigo 195, que estabelece
regramento específico a respeito, no sentido de que só poderão ser exigidas
após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver
instituído ou modificado.
Outra
característica peculiar do regime jurídico das contribuições sociais de
seguridade social é a descrição da materialidade dos fatos geradores de cada
uma das contribuições previstas nos incisos I, II e III do artigo 195, ao
contrário do que ocorre com as contribuições sociais autorizadas pelo artigo
149, daí a razão de existir do § 4.° do artigo 195, inexistente para as
hipóteses do artigo 149, que estabelece a competência residual da União com
relação às contribuições destinadas ao custeio da seguridade social.
Como
decorrência da fixação das materialidades de cada fato gerador das
contribuições sociais de seguridade social na forma assentada no artigo 195,
surge, na lição de Evandro Costa Gama, uma importante distinção destas com
relação ao regime jurídico das contribuições sociais gerais (art.149, 1.ª
parte), consistente na possibilidade de cobrança de contribuições sociais de
seguridade social de uma mesma empresa sobre diversas bases econômicas, mas com
uma única finalidade: a seguridade social, eis que, enquanto as contribuições
sociais gerais do artigo 149 só podem incidir sobre uma única base econômica,
por contribuinte, para cada objetivo da Ordem Social (excluída a Seguridade
Social), as contribuições de seguridade social do artigo 195, I, podem ser cobradas
do mesmo contribuinte sobre bases econômicas diversas (folha de salários,
receita ou faturamento e lucro), porém para uma única finalidade (seguridade
social). [35]
Na
já citada obra coletiva As Contribuições no Sistema Tributário Brasileiro,
indaga-se: Por que o art. 195 da Constituição delimita o âmbito de
incidência das contribuições de custeio da Seguridade Social? Isso as faz
distintas das demais contribuições, instituídas com arrimo no art. 149 da mesma
Carta?
Respondendo
a esta indagação, a jurista Angela Maria da Motta Pacheco faz interessante
síntese do assunto quando assevera:
As
contribuições de custeio da Seguridade Social são as mais relevantes pois
tratam de todo o universo dos cidadãos brasileiros. As demais referem-se a
categorias profissionais ou setores econômicos em particular.
A
Seguridade Social está intimamente ligada à segurança de cada indivíduo nas
condições básicas para a sua sobrevivência: saúde, previdência e assistência
social. Eis o porquê da sua importância. A solidariedade é o grande princípio
que informa a Seguridade Social, compreensiva de um conjunto integrado de ações
de iniciativa dos Poderes Públicos e da Sociedade. Confira-se:
Art.
194. [ ... ]
Todos
contribuem para a Seguridade Social. Os recursos provém do Orçamento da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e das contribuições do
empregador e do empregado. É o que diz o art. 195.
Art.
195. [ ... ]
Assim,
entende-se o cuidado do Constituinte em traçar, em completude, a sua
regra-matriz de incidência tributária. Não há falhas. Não há dúvidas.
Realmente
isto as distingue das demais contribuições. As outras, de intervenção no
domínio econômico e do interesse das categorias profissionais não têm
norma-matriz delineada na Constituição. Mas só se legitimarão se cumprirem o
seu destino constitucional: realmente serem criadas de forma a realizar a
intervenção naquele setor da economia ou se tratarem do interesse de categorias
profissionais. [36]
Nessa
questão sobressai lúcido o argumento de que, sendo esta uma contribuição que
está relacionada com uma atividade estatal que alcança toda a sociedade, o
constituinte, para dar segurança e impedir abusos na sua instituição, preferiu
definir certas bases para a incidência das mesas, o que não é suficiente,
entretanto, para dar-lhe natureza jurídica diversa das demais contribuições do
artigo 149 da CF. [37]
A
primeira e mais importante contribuição dessa espécie é aquela incidente sobre
a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a
qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo
empregatício (CF, art. 195, I, "a").
Destaca-se,
ainda, como espécie dessa contribuição a Contribuição para Financiamento da
Seguridade Social (COFINS), calculada sobre a receita ou o faturamento das
empresas e das entidades a ela equiparadas na forma da lei (CF, art. 195, I,
"b").
Temos
ainda, nesse mesmo rol, a Contribuição Social sobre Lucro, exigida das pessoas
jurídicas e das pessoas que lhes são equiparadas (CF, art. 195, I,
"c").
Estabelece,
por outro lado, o artigo 195, II, da Constituição Federal, a competência da
União para instituir a contribuição para a seguridade social do trabalhador e
dos demais segurados da previdência social, a qual não incidirá sobre
aposentadorias e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de
que trata o artigo 201 do Texto Maior.
Prevê,
ainda, a Constituição, as contribuições sociais destinadas a financiar a
seguridade social, incidente sobre a receita de concursos de prognósticos e do
importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar
(CF, art. 195, III e IV).
Estabelece
ainda o § 8.° do artigo 195 da Constituição Federal a contribuição social para
a seguridade social, chamada de contribuição ao Funrural, devida pelo produtor,
parceiro, meeiro ou arrendatário rural, bem como o pescador artesanal e
respectivos cônjuges, que exerçam suas atividades em regime de economia
familiar, sem empregados permanentes, cobrada mediante a aplicação de uma
alíquota sobre o resultado da comercialização da respectiva produção.
No
campo da seguridade social não é possível deixar de destacar, ainda, como mais
uma contribuição destinada ao seu custeio, a polêmica Contribuição Provisória
sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de
Natureza Financeira – CPMF, instituída pelo artigo 74 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, cuja arrecadação destina-se ao financiamento das
ações e serviços da saúde, cuja vigência tem sido objeto de sucessivas
prorrogações, estando ainda hoje em vigor.
Interessante,
ainda, neste ponto, destacar que, a despeito do entendimento doutrinário - não
consensual, é bem verdade - de que as contribuições para o Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço ostentam natureza tributária, já decidiu o Supremo Tribunal
Federal, pelo seu Plenário, que tal exação nunca tivera natureza tributária,
eis que não exige o Estado, na espécie, para si, a contribuição (RE 100.249,
Rel. Min. Néri da Silveira, DJ 01.07.88).
Estabelece,
por fim, o § 4.° do artigo 195 da Constituição Federal, a competência residual
da União para instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou
expansão da Seguridade Social, desde que obedecido o disposto no seu artigo
154.
E,
à guisa de conclusão, oportuno, ainda, o destaque de que, a teor do que soa o §
1.° do artigo 149 do Texto Constitucional, cabe aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios a instituição de contribuição, cobrada de seus
servidores, para o custeio, em benefício destes, do regime previdenciário,
caracterizando-se tal exação como autêntica contribuição social destinada à
seguridade social.
5.2. AS
CONTRIBUIÇÕES DE INTERESSE DE CATEGORIAS PROFISSIONAIS E ECONÔMICAS
As
contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas, também
denominadas de contribuições corporativas, destinam-se a custear
as pessoas jurídicas de direito público ou privado que têm por escopo
fiscalizar e regular o exercício de determinadas atividades, bem como
representar, coletiva ou individualmente, categorias profissionais, defendendo
seus interesses. São exemplos destas espécies as contribuições que os advogados
pagam à Ordem dos Advogados do Brasil, as contribuições que os médicos pagam ao
Conselho Regional de Medicina, as contribuições que os contabilistas pagam ao
Conselho Regional de Contabilidade, além de outras com iguais características.
[38]
Tais
contribuições, que dizem de perto com o interesse de determinados grupos
econômicos ou profissionais, não foram objeto de uma disciplina muito pródiga
por parte do constituinte, que limitou-se a indicar o pressuposto para a sua
criação: atuação em específicas áreas que denotem interesse de categorias
econômicas ou profissionais. [39]
Também
aqui ganha relevo, a exemplo do que ocorre com as outras espécies de contribuições,
a questão que se relaciona com a eleição dos seus sujeitos passivos. Se inclina
a doutrina ao entendimento de que não se requer, para a cobrança dessa
contribuição, que elas gerem benefícios individuais diretos e imediatos aos
específicos contribuintes. Como destaca Marco Aurélio Greco [40], "existe
apenas um grupo institucionalizado que exerce certa profissão ou integra a
categoria econômica e uma entidade com atribuições no respectivo âmbito ",
para concluir que só de forma muito difusa e etérea é que se pode dizer existir
uma vantagem relacionada ao pagamento da contribuição.
A
exemplo das demais espécies de contribuição, as contribuições corporativas não
estão imunes à discussões doutrinárias quanto à sua adequada configuração
jurídica. Com efeito, a par daqueles juristas que a consideram autênticas
contribuições, existem aqueles que enxergam nessa exação verdadeiras taxas de
polícia. Neste sentido é interessante destacar a posição de Américo Lacombe,
citado por José Maurício Conti, segundo a qual os Conselhos e Ordens
fiscalizadoras do exercício das diversas profissões, nada mais são do que
autarquias criadas pela União, com a finalidade precípua de exercer poder de
polícia mediante a fiscalização das diversas profissões, concluindo-se, daí,
que os valores das anuidades exigidas pelas mencionadas autarquias nada mais
são do que taxas de polícia. [41] Entendimento semelhante esposa Roque
Carrazza, citado por José Eduardo Soares de Melo, que observa que os Conselhos
profissionais praticam atos de polícia, já que deliberam sobre inscrições em
seus quadros, decidem sobre assuntos relacionados à ética profissional, aplicam
penalidades, aferem a habilitação profissional, todas estas atividades
caracterizadoras de autêntico poder estatal de polícia, razão pela qual teriam
ditas contribuições a natureza de taxa de polícia. [42]
É
elemento essencial, nesta espécie de contribuição, identificar a existência de
um grupo profissional ou econômico em relação ao qual a finalidade
constitucional autorizadora da instituição da contribuição se relaciona. Se não
há um grupo profissional ou econômico ao qual a finalidade se refira, faltará
um elemento do modelo constitucional das contribuições. O sujeito passivo deve
participar efetivamente de uma categoria profissional ou grupo econômico para o
qual a contribuição especial é destinada. A contribuição é exigida porque o
contribuinte é parte de algum grupo, de alguma classe ou de alguma categoria
identificada a partir de certa finalidade qualificada constitucionalmente.
Por
último, apenas convém salientar que o Supremo Tribunal Federal, em mais de uma
oportunidade (RE n.° 198.092-3 e RE n.° 191.022-4), já decidiu que a
contribuição sindical cobrada no interesse de categorias profissionais é tributo
que se ajusta ao disposto no artigo 149 da CF, catalogando-se como contribuição
corporativa, diferentemente do que se dá com a contribuição confederativa de
que trata o artigo 8.º, inciso IV, do Texto Constitucional, que não possui
idêntica natureza tributária, eis que não é dotada de compulsoriedade, sendo
obrigatória apenas para os filiados ao respectivo sindicato, ao qual ninguém é
obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado, a teor do que proclama o inciso V
do citado artigo 8.° da Constituição Federal.
5.3
AS CONTRIBUIÇÕES DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO
As
contribuições de intervenção no domínio econômico, chamadas de CIDEs ou
contribuições interventivas, estão previstas no artigo 149 da Constituição
Federal, que estabelece a competência exclusiva da União para instituir as
contribuições da espécie, como instrumento de sua atuação na área.
Sem
estabelecer as respectivas hipóteses de incidência possíveis e, bem assim, os
aspectos a elas inerentes, o mencionado dispositivo deixa "em aberto"
ao legislador infraconstitucional a possibilidade de estabelecer o aspecto
material das CIDEs que vierem a ser criadas, estabelecendo restrição apenas
quanto à observância do disposto nos artigos 146, III e 150, I e III, da Magna
Carta. Apenas o § 2.º do referido dispositivo, introduzido pela Emenda
Constitucional 33/2001, restringiu em certa medida a esfera de alcance para a
instituição dessa exação pela União, eis que, antes de seu advento detinha a
União, nesse campo, verdadeira "carta em branco", com possibilidades
quase ilimitadas para a criação das CIDEs, a vista da textura aberta dos termos
e expressões encontrados no referido artigo 149 da CF.
Na
tarefa de bem compreender essa figura jurídica, de pronto se impõe a necessidade
de definir-se o alcance e o sentido da expressão "domínio econômico",
encontrada no texto do artigo 149 da CF, bem como, a de determinar em que
medida pode o Estado nele intervir através da cobrança da contribuição em
causa.
No
entanto, uma conclusão é certa: o caráter finalístico das referidas exações,
pois que de maneira taxativa o texto constitucional impõe como condição
inafastável a de que a cobrança da CIDE seja utilizada como instrumento da
atuação da União nas áreas eleitas como objeto de incidência.
Em
obra específica sobre o tema, Hamilton Dias de Souza e Tercio Sampaio Ferraz
Júnior lecionam que domínio econômico é aquele reservado à iniciativa privada e
que a intervenção no domínio econômico pode dar-se com fundamento no
"caput" do artigo 173, no seu § 4.° e com base no artigo 174 da
CF/88. [43] Com efeito, o termo "intervenção" já indica uma atuação
em setor que lhe é estranho
A
intervenção se dá quando o Estado atua no campo da atividade econômica que é
garantida à exploração dos particulares nos termos do artigo 170 da
Constituição Federal. O Estado ingressa nesta esfera apenas para atender os
interesses coletivos.
Os
princípios norteadores da Ordem Econômica estão relacionados no artigo 170 da
Constituição Federal. As atividades econômicas, como regra geral, são livres e
a intervenção do Estado só poderá ocorrer excepcionalmente para assegurar os
princípios enumerados nos incisos desse artigo. A intervenção estatal terá por
objetivo corrigir ou estimular comportamentos econômicos visando a proteção dos
fins relacionados nos citados incisos do artigo 170 do Texto Constitucional, se
constituindo, pois, em ato excepcional, já que a Ordem Econômica diz respeito
ao setor privado.
Assim,
quando a atividade privada, pressionada pelas forças de mercado próprias dos
regimes capitalistas, atua em aberto confronto com postulados constitucionais,
visando, por exemplo, a eliminação da concorrência ou o aumento arbitrário dos
lucros, reconhece-se o cabimento da intervenção estatal, a teor do que proclama
o § 4.° do artigo 173 do Texto Constitucional.
Da
mesma forma, atento aos princípios garantidos nos incisos do artigo 173 da CF,
o Estado poderá intervir na ordem econômica como agente normativo e regulador
da atividade econômica, exercendo as funções de fiscalização, incentivo e
planejamento, tudo como previsto no artigo 174 da Carta Política.
Em
estreita síntese, esclarecem Hamilton Dias de Souza e Tercio Sampaio Ferraz
Júnior:
[
... ] a instituição de contribuição de intervenção é possível quando haja (i)
efetiva intervenção do Estado no domínio econômico, nos limites das
possibilidades constitucionalmente previstas para tanto, (ii) em atividade
originariamente reservada ao setor privado ou que tenha a este sido transferida
por autorização, concessão ou permissão, (iii) e que cause um gasto excepcional
do Estado ou benefício especial a determinado grupo de indivíduos, componentes
do setor objeto da intervenção efetuada. [44]
No
mesmo sentido, a posição de André Luiz Fonseca Fernandes, para quem a
intervenção no domínio econômico que dá ensejo à instituição desta contribuição
é aquela que o Estado realiza sobre atividades econômicas em sentido estrito,
isto é, sobre aquelas atividades reservadas à iniciativa privada e
excepcionalmente sujeitas à participação estatal (art.173 da CF/88), vinculadas
a um regime jurídico de direito privado, fundadas na livre iniciativa e na
busca do lucro, incluindo-se neste conceito as concessionárias, permissionárias
e as autorizadas de serviços públicos. [45]
A
seu turno, Marco Aurélio Greco, citado por André Luiz Fonseca Fernandes,
sintetiza o assunto ensinando que a intervenção admitida pela Constituição é a
que tem por objeto assumido neutralizar distorções que, sob a ótica econômica
ou social, podem surgir no campo da iniciativa privada, para ao depois concluir
que a contribuição de intervenção pode assumir a feição de instrumento de
custeio de despesas para que a intervenção se viabilize, ou ela própria pode
ser o instrumento da intervenção, como por exemplo, funcionando como
equalizadora de preços ou custos. [46] Desta forma, coerente com o discurso do
artigo 170 da CF, que nomina princípios gerais da atividade econômica, se a
ordem econômica deve observar os ditames da justiça social, resulta claro que o
Estado pode intervir na economia para corrigir distorções econômicas ou sociais
criadas pela iniciativa privada, o que implica a instituição de CIDEs não só
para custear uma atuação do Estado, mas também para servir de instrumento de
correção de tais distorções.
Como
exemplo de contribuição de intervenção no domínio econômico temos o Adicional
ao Frete para Renovação da Marinha Mercante, que tem como normas básicas que
estabelecem regras a respeito os Decretos-leis 2.404, de 23-12-87, e 2.414, de
12-02-88 e a Lei 10.206, de 23-03-2001. Referida exação teve reconhecida a sua
natureza de contribuição interventiva pelo Supremo Tribunal Federal, no
julgamento Plenário do RE 177.137-2-RS, relator o Ministro Carlos Velloso, j.
de 25-05-1995. O acórdão manifestou o entendimento de que não importa o nome
dado ao Adicional em apreço, sendo certo, apenas, que tem ele caráter
tributário, sendo uma contribuição especial da espécie contribuição de
intervenção no domínio econômico e, ainda, que guarda conformação com a Carta
Constitucional de 1988.
Da
mesma forma temos ainda, como espécie de CIDE, a Contribuição ao IAA –
Instituto do Açúcar e do Álcool, regulada pelos Decretos-leis 308/1967,
1.712/1979 e 1.952/1982, que estabeleceram a obrigação de seu recolhimento
pelos produtores de açúcar e de álcool, para custeio da intervenção da União na
economia canavieira nacional. O Supremo Tribunal Federal, pondo fim à controvérsias,
decidiu, em julgamento Plenário, que tal contribuição é compatível com a CF de
1988 (RE 214.206-9-AL, relator o Ministro Nélson Jobim, j. em 15-10-1997).
De
outro lado, a Contribuição ao IBC – Instituto Brasileiro do Café, disciplinada
pelo Decreto-lei n.° 2.295, de 21-11-1986, destinada ao financiamento,
modernização, incentivo à produtividade da cafeicultura, da indústria do café e
da exportação, bem como, ao desenvolvimento de pesquisas, dos meios e vias de
transporte, dos portos, da defesa do preço e do mercado, interno e externo, bem
como, ainda, das condições de vida do trabalhador rural, também catalogada, sob
a égide da Constituição anterior, como contribuição de intervenção no domínio
econômico, não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, conforme
decidiu o Pleno do Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 198.554-2-SP,
Relator o Ministro Carlos Velloso, j. em 19-09-1997).
Outra
espécie de CIDE é a denominada Contribuição ao Fundo de Universalização dos
Serviços de Telecomunicações – FUST, que tem por finalidade proporcionar
recursos destinados a cobrir parcela do custo de cumprimento das obrigações de
universalização de serviços de telecomunicações que não possa ser recuperada
com a exploração eficiente do serviço, criada pela Lei n.° 9.998, de
17-08-2000, da qual são contribuintes todas as prestadoras de serviços de
telecomunicações, sob regime público ou privado.
Engrossa,
ainda, o rol de contribuições da espécie, a Contribuição ao Fundo para o Desenvolvimento
Tecnológico das Telecomunicações – FUNTTEL, com o objetivo de estimular o
processo de inovação tecnológica, incentivar a capacitação de recursos humanos,
fomentar a geração de empregos e promover o acesso de pequenas e médias
empresas a recursos de capital, de modo a ampliar a competitividade da
indústria brasileira de telecomunicações, criada pela Lei n.° 10.952, de
28-11-2000, cobrada sobre a receita bruta das prestadoras de serviços de
telecomunicações, nos regimes públicos e privados.
Na
mesma linha, temos ainda a Contribuição para Financiamento ao Programa de
Estímulo à Interação Universidade/Empresa para Apoio à Inovação, criada pela
Lei n.° 10.168, de 29-12-2000, destinada a estimular o desenvolvimento tecnológico
brasileiro, mediante programas de pesquisa científica e tecnológica cooperativa
entre universidades, centros de pesquisa e o setor produtivo e cobrada das
pessoas jurídicas detentoras de licença de uso ou adquirente de conhecimentos
tecnológicos, bem como das signatárias de contratos que impliquem transferência
de tecnologia, firmados com residentes ou domiciliados no Exterior, relativos à
exploração de patentes ou de uso de marcas e os de fornecimento de tecnologia e
prestação de assistência técnica., incidindo sobre os valores pagos,
creditados, entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no
Exterior a título de remuneração decorrente das mencionadas obrigações.
Mais
recentemente, a Lei n.° 10.336, de 19-12-2001, com lastro nas disposições da
Emenda Constitucional 33/2001, instituiu a Contribuição de Intervenção no
Domínio Econômico incidente sobre a Importação e a Comercialização de Petróleo
e seus Derivados, Gás Natural e seus Derivados, e Álcool Etílico Combustível –
CIDE, cobrada do produtor, do formulador, do importador, pessoa física ou
jurídica, dos combustíveis mencionados. Referida contribuição tem a finalidade
declarada de pagamento de subsídios a preços ou transporte de álcool
combustível, de gás natural e seus derivados e de derivados de petróleo, de
financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e
do gás, bem como, de programas de infra-estrutura de transportes.
Existe,
ainda, a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica –
CONDECINE, instituída pela Medida Provisória 2.228-1, de 06-09-2000 e Lei
10.454, de 13-05-2002, que tem como fato gerador a veiculação, a produção, o
licenciamento e a distribuição de obras cinematográficas e videofonográficas,
com fins comerciais, devida pelo detentor dos direitos de exploração comercial
da obra ou de seus direitos de licenciamento no país, destinada ao custeio da
atividade interventiva de incentivo a indústria cinematográfica e
videofonográfica.
Por
fim, merece destaque a obrigação criada pela Lei 9.991, de 24-07-2000, alterada
pela Lei 10.438, de 26-04-2002, que tem como sujeitos passivos as empresas
concessionárias e permissionárias de serviços públicos de distribuição de
energia elétrica, as concessionárias de geração e as empresas autorizadas à
produção independente de energia elétrica e as concessionárias de serviços
públicos de transmissão de energia elétrica, que ficam obrigadas a aplicar
anualmente determinadas percentagens de sua receita operacional líquida em
pesquisa e desenvolvimento do setor elétrico e programas de eficiência
energética no uso final. Trata-se de contribuição de intervenção no domínio
econômico, determinando-se a prática de comportamento compulsório, embasada nos
artigos 170, VII e 218 da CF/88.
5.4. A
CONTRIBUIÇÃO PARA O CUSTEIO DO SERVIÇO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA
A
Emenda Constitucional n.° 39/2002 acrescentou ao já complexo quadro de
contribuições mais uma figura, qual seja, a da Contribuição para Custeio do Serviço
de Iluminação Pública, adicionada à competência dos Municípios e do Distrito
Federal (CF, art. 149-A, introduzido pela citada Emenda).
Referida
contribuição tem sido alvo de intensos debates doutrinários, merecendo
destaque, neste particular, a tormentosa questão da correta delimitação do
universo de contribuintes dessa exação, com observância dos princípios
constitucionais da impessoalidade e da igualdade.
Discute
ainda a doutrina se tal exação guardaria a conformação jurídica de genuína
contribuição ou se, ao revés, de autêntica taxa de serviço, devendo sua
cobrança, se prevalecida esta última hipótese, observar o pressuposto de o
serviço prestado ostentar as características da especificidade e
divisibilidade, a teor do que exige o artigo 145, II, da Constituição Federal,
atributos estes que parece não exibir aludida exação.
De
qualquer forma, trata-se de exação nova, que tudo indica ter a natureza
jurídica tributária e que está a merecer, ainda, tanto por parte da doutrina
quanto da jurisprudência, uma maior reflexão sobre os seus contornos fáticos e
jurídicos.
6.
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS APLICÁVEIS À IMPOSIÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS
Reconhecida
a natureza jurídica tributária das contribuições especiais, imperioso é
concluir que estas se submetem aos comandos constitucionais, erigidos em
princípios, aplicáveis às demais espécies tributárias, salvo as exceções que
destacamos abaixo.
Por
força do comando expresso do § 6.° do artigo 195 da Constituição Federal, as
contribuições sociais de seguridade social podem ser exigidas após decorridos
noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou
modificado, não se lhes aplicando, portanto, as regras emergentes do princípio
da anterioridade tributária insculpidos no artigo 150, III, "b" da
CF. As demais espécies de contribuições submetem-se integralmente ao aludido
princípio, além de submeterem-se, também, aos comandos do princípio da
anterioridade nonagesimal previsto na alínea "c" do mesmo inciso III
do artigo 150 da nossa Carta Política.
Não
resta qualquer dúvida que todas as espécies de contribuições, em exceção,
submetem-se, ainda, ao princípio da legalidade tributária estrita, contemplado
no inciso I do artigo 150 da CF, em razão do que só podem ser instituídas ou
majoradas através de lei, sujeitando-se, ainda, à todas as regras do artigo 97
do Código Tributário Nacional, que se constituem em desdobramento do aludido
primado constitucional.
É
indiscutível que se aplicam também às contribuições especiais a regra do inciso
II do artigo 150 da CF, que veda a instituição de tratamento desigual entre
contribuintes que se encontrem em situações equivalentes.
Da
mesma forma, absolutamente pertinente e aplicável às várias contribuições
especiais a regra estampada na alínea "a" do inciso III do artigo 150
da CF, que veda cobrar tributos em relação a fatos geradores ocorridos antes da
vigência da lei que os houver instituído ou aumentado. Trata-se de regra que
consagra a irretroatividade da norma jurídico-tributária e que se constitui em
desdobramento do primado da segurança jurídica encontrado nas dobras do texto
constitucional, sendo portanto de indiscutível aplicação a todos os tributos.
Indiscutível,
ainda, a aplicação às espécies tributárias aqui tratadas da regra
constitucional encontrada no inciso IV da Carta Magna, que veda a utilização de
tributo com efeito de confisco. Com efeito, no julgamento, pelo Plenário do
Supremo Tribunal Federal, do pedido de liminar apresentado na Ação Direta de
Inconstitucionalidade n.° 2.010, relatada pelo Ministro Celso de Mello, decidiu
aquela Corte suspender a eficácia do artigo 2.° e parágrafo único da Lei n.º
9.783/99, que introduziu alíquotas progressivas, majorando a contribuição de
seguridade social devida pelos servidores civis da União Federal, ativos e
inativos e pelos pensionistas. O Tribunal, na decisão em questão, considerou
relevante a tese da ofensa ao princípio que veda a utilização de tributo com
efeito de confisco.
Por
fim, como espécie tributária que é, submete-se a contribuição especial à regra
do inciso V do artigo 150 da Constituição Federal, que veda que se estabeleça
limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais
ou intermunicipais.
7.
CONCLUSÃO
Em
face de tudo o que expusemos no presente ensaio, verificamos que, na segunda
metade do século XX consolidou-se a convicção de que não poderia mais prosperar
a idéia liberal segundo a qual a sociedade civil seria suficiente para realizar
todos os objetivos por ela pretendidos, sem a interferência do Estado, apenas
com as regras auto-reguladoras do mercado. Ganhava corpo, então, a percepção de
que o alcance de determinados objetivos só seria possível com a atuação
positiva do Estado pautada na noção de solidariedade. Nasce, então, o
denominado Estado Social (Welfare State). É neste contexto que surge a
figura da contribuição, como exação cobrada pelo Estado. As contribuições são,
portanto, fruto do Estado social e interventor. Novos fins passam a orientar a
atuação estatal, dentre os quais se coloca a busca do bem-estar. Para atingir
tais fins, o Estado teve de lançar mão também de novos meios. A tributação,
nessa perspectiva, como instrumento de obtenção de recursos para financiar as
atividades do Poder Público, também sofreu modificações. As contribuições se
revelam um instrumento de intervenção do Estado na economia e na ordem social.
Verificamos,
ainda, que a doutrina pátria não tem um posicionamento unânime quanto a
natureza jurídica das contribuições especiais, embora a maioria dos autores
considere tributária a sua natureza, já que, em tudo e por tudo, submetem-se,
salvo algumas exceções às regras aplicáveis aos tributos em geral.
Verificamos,
ainda, que a maioria da doutrina reconhece na contribuição uma espécie
tributária autônoma , diferente das figuras clássicas a que alude o artigo 5.°
do CódigoTributário Nacional.
Destacou-se,
também, o conteúdo finalístico das contribuições como fator essencial e
indissociável da natureza destas, diferenciando-as, por isso mesmo, dos
impostos que, por expressa disposição constitucional, têm vedada a vinculação
de suas receitas a órgão, fundo ou despesas específicos. São, portanto, as contribuições,
tributo que se caracteriza pela respectiva finalidade, representando, por isso,
exceção à regra estabelecida no artigo 4.°, II, do CTN.
Foi
possível concluir, ainda, que a doutrina não tem posição pacífica acerca da
questão se a atividade estatal a cuja execução se destina a receita arrecadada
nas contribuições deve ser necessariamente referível ao sujeito passivo dessa
exação, embora a maioria dos estudiosos entenda deva existir, necessariamente,
essa referibilidade, ainda que indireta ou mediata.
Verificamos,
ainda, que a exemplo das demais áreas, os doutrinadores também não têm
entendimento unânime quanto à possibilidade, com lastro na competência
constitucional prevista na primeira parte do artigo 149 da CF, da instituição
de outras contribuições sociais, além das já previstas no texto constitucional.
Não obstante isso, nos posicionamos ao lado do Professor Hugo de Brito Machado,
para quem o reconhecimento dessa possibilidade resultará na atrofia dos impostos
federais, com repercussão negativa nos demais entes federativos, partícipes
dessa arrecadação, com a quebra do próprio princípio federativo.
Vimos
também que as contribuições sociais de seguridade social são regidas pelo
princípio da solidariedade em matéria de custeio, o que as diferencia das
demais espécies de contribuição, tendo essa peculiaridade repercussão direta no
que se refere à referibilidade da atuação estatal ao sujeito passivo dessa
exação, cujo espectro, por isso mesmo, se revela mais amplo, abrangendo toda a
sociedade.
Vimos,
por fim, que o legislador federal foi pródigo na instituição de diversas
espécies de contribuições, destacando, a final, a aplicação às diversas
espécies aqui tratadas dos princípios constitucionais tributários que
estabelecem limitações ao poder de tributar.
NOTAS
1.
PAULSEN, Leandro. Contribuições no Sistema Tributário
Brasileiro. In: Hugo de Brito Machado (Coord.), As Contribuições no
Sistema Tributário Brasileiro, São Paulo: Dialética/Fortaleza: Instituto
Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2003, p. 366-367.
2.
MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito; MACHADO, Raquel
Cavalcanti Ramos. As Contribuições no Sistema Tributário Brasileiro. In:
Hugo de Brito Machado (Coord.), As Contribuições no Sistema Tributário
Brasileiro, São Paulo: Dialética/Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos
Tributários – ICET, 2003, p. 275-277.
3.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário,
27.ª ed., São Paulo: Malheiros, 2006, p. 419.
4.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito
Tributário, 17.ª ed., São Paulo: Saraiva, 2005, p. 43.
5.
CARRAZZA,
Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário, 18.ª
ed., São Paulo: RT, p. 513.
6.
GRECO, Marco Aurélio. Contribuições (uma Figura
"sui generis"). São Paulo: Dialética, 2000, p. 80-81.
7.
MELO, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais
no Sistema Tributário, 4.ª ed., São Paulo: Malheiros, 2003, p. 80.
8.
MELO, José Eduardo Soares de. Op. Cit., p. 92.
9.
STF,
RE 146.733-SP, in RTJ 143/684.
10. COÊLHO,
Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro, 5.ª ed.,
Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 402.
11. CARRAZZA, Roque Antonio. Curso
de Direito Constitucional Tributário, 3.ª ed., São Paulo: RT, 1991, p. 304.
12. AMARO,
Luciano. Direito Tributário Brasileiro, 11.ª ed., São Paulo: Saraiva,
2005, p. 62 e 84.
13.
MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito; MACHADO, Raquel
Cavalcanti Ramos . Op. Cit., p. 277-278.
14. DENARI,
Zelmo. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Atlas, 2002, p. 121-122.
15. AMARO,
Luciano. Op. Cit., p. 77
16. MACHADO,
Hugo de Brito. Apresentação. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). As
Contribuições no Sistema Tributário Brasileiro, São Paulo: Dialética/Fortaleza:
Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2003, p.22.
17. MACHADO,
Hugo de Brito. Apresentação. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). As
Contribuições no Sistema Tributário Brasileiro, São Paulo: Dialética/Fortaleza:
Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2003, p.20-21.
18. AMARO,
Luciano. Op. Cit., p.84.
19. COÊLHO,
Sacha Calmon Navarro. Op. Cit., p.405.
20. ATALIBA,
Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária, 5.ª ed., Malheiros, 1980, p.
171.
21.
PAULSEN,
Leandro. Op. Cit. p. 376.
22.
PAULSEN,
Leandro. Op. Cit, p. 382.
23.
MELO, José Eduardo Soares de. Op. Cit., p. 356
24. PAULSEN,
Leandro. Op. Cit., p. 369-370.
25.
MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito; MACHADO, Raquel
Cavalcanti Ramos . Op. Cit., p. 301.
26. MARTINS,
Ives Gandra da Silva. As Contribuições no Sistema Tributário Brasileiro. In:
Hugo de Brito Machado (Coord.), As Contribuições no Sistema Tributário Brasileiro,
São Paulo: Dialética/Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários –
ICET, 2003, p. 341.
27. MACHADO,
Hugo de Brito. Apresentação. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). As
Contribuições no Sistema Tributário Brasileiro, São Paulo: Dialética/Fortaleza:
Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2003, p.09-10.
28. STF:
ADI-MC 2.556-DF e ADI-MC 2.568-DF, Relator Min. Moreira Alves, julgadas em
09.10.2002. Informativo STF n.° 285, de 07.10.2002.
29.
PAULSEN, Leandro. Contribuições no Sistema
Tributário Brasileiro. Op.
Cit., p. 382.
30.
GAMA, Evandro Costa. As Contribuições Sociais
de Seguridade Social e a Imunidade do art. 149, § 2.°, I, da Constituição
Federal. Disponível na Internet via WWW. URL:
http://www.sinprofaz.org.br/CEJ/Trabalhos/EvandroCostaGama.htm
31. SOUZA,
Hamilton Dias de; FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Contribuições de
Intervenção no Domínio Econômico e a Federação. In: Ives Gandra da Silva
Martins (Coord.), Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico, São Paulo:
Ed. RT, 2002, p. 100.
32.
MELO, José Eduardo Soares de. Op. Cit., p. 150.
33. BARRETO,
Aires . Base de Cálculo, Alíquota e Princípios Constitucionais, 2.ª ed.
rev., São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 38.
34.
MELO, José Eduardo Soares de. Op. Cit., p. 138.
35. GAMA,
Evandro Costa. Loc. cit.
36. PACHECO,
Angela Maria da Motta. As Contribuições no Sistema Tributário Brasileiro.
In: Hugo de Brito Machado (Coord.), As Contribuições no Sistema Tributário
Brasileiro, São Paulo: Dialética/Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos
Tributários-ICET, p. 82-83.
37. MACHADO,
Hugo de Brito. Apresentação. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). As
Contribuições no Sistema Tributário Brasileiro, São Paulo: Dialética/Fortaleza:
Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2003, p. 15.
38.
MELO, José Eduardo Soares de. Op. Cit., p. 270.
39. CINTRA,
Carlos César Sousa; LOPES FILHO Juraci Mourão. As Contribuições no Sistema
Tributário Brasileiro. In: Hugo de Brito Machado (Coord.), As Contribuições
no Sistema Tributário Brasileiro, São Paulo: Dialética/Fortaleza: Instituto
Cearense de Estudos Tributários-ICET, 2003, p. 140.
40. GRECO,
Marco Aurélio. Op. Cit., p. 237.
41. CONTI,
José Maurício. Sistema Constitucional Tributário Interpretado pelos
Tribunais. 1.ª ed., São Paulo: Editora Oliveira Mendes, 1997, p. 65.
42.
MELO, José Eduardo Soares de. Op. Cit., p. 270.
43.
SOUZA, Hamilton Dias de; FERRAZ JÚNIOR, Tércio
Sampaio. Op. Cit., p. 69.
44.
SOUZA, Hamilton Dias de; FERRAZ JÚNIOR, Tércio
Sampaio. Op. Cit., p. 71.
45. FERNANDES,
André Luiz Fonseca. Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico. In:
Ives Gandra da Silva Martins (Coord.), Contribuições de Intervenção no Domínio
Econômico, São Paulo: Ed. RT, 2002, p. 349.
46.
FERNANDES, André Luiz Fonseca. Op.Cit., p. 351.
BIBLIOGRAFIA
AMARO,
Luciano. Direito Tributário Brasileiro, 11.ed., São Paulo: Saraiva,
2005.
ATALIBA,
Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária, 5.ed., São Paulo: Malheiros,
1980.
BARRETO,
Aires. Base de Cálculo, Alíquota e Princípios Constitucionais, 2.ed.
rev., São Paulo: Max Limonad, 1998.
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso
de Direito Constitucional Tributário, 3.ed., São Paulo: Ed. RT. 1991.
______.
Curso de Direito Constitucional Tributário, 18.ed., São Paulo: Ed. RT.
CARVALHO,
Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, 17.ed., São Paulo:
Saraiva, 2005.
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* professor de Direito Tributário nos cursos de graduação e pós-graduação no Centro de Ensino Superior de Dracena (CESD), bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Alta Paulista (FADAP), bacharel em Ciências Contábeis, pós-graduado em Direito Tributário e Direito Processual Tributário
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