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Tributação de empresas franqueadoras e franqueadas


Publicado no Valor em 15 de abril de 2004
Publicado na Gazeta Mercantil em 26 de março de 2004
Publicado no site da Associação Brasileira de Franchising

 

 

Cândida Ribeiro Caffé
Advogada
Dannemann, Siemsen, Bigler & Ipanema Moreira
Dannemann Siemsen Advogados

 

A Receita Federal disponibilizou recentemente, em seu site na Internet, uma listagem exemplificativa de atividades excluídas do Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte (SIMPLES), entre as quais incluiu a "administração de royalties e de franchising".

Com isso, o Fisco evidenciou o seu entendimento de que empresas franqueadoras estariam impedidas de optar pelo sistema SIMPLES.

Mais recentemente, a Secretaria da Receita Federal, em decisão à consulta 200, de 17 de novembro de 2003, estabeleceu posição contrária à opção pelo simples por empresas franqueadas, entendendo que "é vedada a opção pelo SIMPLES a empresas franqueadas, com exceção das que atuem como agências de correios."

Contudo, não há na Lei 9.317/96, nem em sua posterior alteração pela Lei 10.034/2000, qualquer vedação específica para atividades de franquia, esteja a empresa na posição de franqueadora ou franqueada.

A própria Receita Federal, ao regulamentar a matéria em diversos Atos Declaratórios e na Instrução Normativa 355, de 29 de agosto de 2003, não estabeleceu qualquer vedação à opção pelo SIMPLES para empresas franqueadoras ou franqueadas.

Portanto, não pode a Receita Federal proibir microempresas e empresas de pequeno porte que não estejam expressamente vedadas por força do artigo 9º da Lei 9.317/96 de optar pelo SIMPLES.

Conforme disposto no artigo 3º da referida lei, a pessoa jurídica enquadrada na condição de microempresa e de empresa de pequeno porte poderá optar pela inscrição no SIMPLES, desde que não esteja inserida nas vedações dispostas no artigo 9º da mesma lei.

Cumpre lembrar que se considera microempresa a pessoa jurídica que tenha auferido, no ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 244.000,00 (duzentos e quarenta e quatro mil reais) e empresa de pequeno porte aquela que tenha auferido receita bruta superior a R$ 244.000,00 (duzentos e quarenta e quatro mil reais) e igual ou inferior a R$ 1.200.000,00 (um milhão e duzentos mil reais). No caso de início de atividade no próprio ano-calendário, os referidos limites serão proporcionais ao número de meses em que a empresa houver exercido atividade, desconsideradas as frações de meses.

Dessa forma, enquadrando-se no conceito de microempresa ou de empresa de pequeno porte e não estando inserida nas vedações constantes do artigo 9º, a empresa poderá em princípio optar pelo SIMPLES.

O entendimento da Receita Federal para vedar tal opção a empresas franqueadoras e franqueadas baseia-se no inciso XIII do artigo 9º da Lei 9.317/96 e no inciso XII do artigo 20 da Instrução Normativa 355/2003. Tais dispositivos vedam a opção ao SIMPLES por pessoas jurídicas que prestem serviços profissionais de representante comercial ou administrador, entre outros, bem como assemelhados, e de qualquer outra profissão cujo exercício dependa de habilitação profissional legalmente exigida.

A interpretação analógica do Fisco a serviços de "administração e assemelhados" (no caso de empresas franqueadoras) ou "representação comercial" (na hipótese de franqueadas) para impedir a opção pelo simples por microempresas e empresas de pequeno porte é ilegal, por carecer de qualquer respaldo jurídico, violando frontalmente os princípios da legalidade e da segurança jurídica.

Não pode a Receita Federal sustentar que a expressão "administração e assemelhados" inclui a administração de toda e qualquer atividade econômica, para alcançar a "administração de royalties e franchising", principalmente quando se infere do dispositivo legal acima que o legislador procurou proibir a opção pelo simples apenas a empresas que prestem serviços profissionais "cujo exercício dependa de habilitação profissional legalmente exigida", o que não é o caso da franquia, que sequer é atividade profissional.

Da mesma forma, não se pode aceitar que a Receita Federal estenda o conceito de "representante comercial" a franqueados, alegando que ambos atuam em uma espécie de mediação e que portanto empresas franqueadas também não podem se enquadrar no SIMPLES.

Primeiramente, cumpre lembrar que a atividade de representação comercial encontra-se regulada na Lei 4.886/65, cujo artigo 1º estabelece que "exerce representação comercial autônoma a pessoa jurídica ou física, sem relação de emprego, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para a realização de negócios mercantis, agenciando propostas ou pedidos, para transmiti-los aos representados, praticando ou não atos relacionados com a execução dos negócios."

Portanto, franquia e representação comercial são atividades típicas, absolutamente distintas e regulamentadas por lei próprias (Lei 8.955/94, no caso da primeira, e Lei 4.886/65, no caso da segunda), dependendo o representante comercial de habilitação profissional e registro perante os Conselhos Regionais dos Representantes Comerciais, o que definitivamente não é o caso das empresas franqueadas.

Ao analisarmos cada uma das atividades listadas no inciso XIII do artigo 9º da Lei 9.317/96 e no inciso XII do artigo 20 da Instrução Normativa 355/2003, verificamos que o exercício de todas elas depende de habilitação profissional legalmente exigida. Logicamente, o termo "assemelhados" deve ser interpretado dentro deste contexto, sem qualquer ampliação que importe em vedação e conseqüente onerosidade ao contribuinte.

O próprio Superior Tribunal de Justiça (STJ) já reconheceu, em decisão de 05 de agosto de 2003, que "o inciso XIII, do art. 9º, da Lei 9.317/96, ao relacionar as pessoas jurídicas impedidas de aderir ao SIMPLES, somente alcança aquelas atividades cujo exercício dependa de habilitação profissional legalmente exigida".

O Supremo Tribunal Federal (STF) também já reconheceu, ainda que de forma indireta, que o inciso III do artigo 9º abrange atividades cujo exercício dependa de habilitação profissional específica, no julgamento da ADIN 1643, de 05 de dezembro de 2003.

Dessa forma, a listagem de atividades vedadas ao SIMPLES emitida pela Receita Federal e disponibilizada em seu site na Internet não possui qualquer embasamento jurídico, pois extrapolou significativamente as vedações impostas na lei e o próprio entendimento de que o inciso III do artigo 9º veda apenas aquelas atividades cujo exercício dependa de habilitação profissional. O mesmo comentário se aplica à recente decisão emitida pela Receita Federal em relação às empresas franqueadas, conforme disposto acima.

Finalmente, resta lembrar que a Receita Federal não possui competência para ampliar o rol de vedações especificamente definido na Lei 9.317/96, cabendo-lhe apenas instituir as normas e procedimentos administrativos cabíveis para que os contribuintes possam usufruir do sistema SIMPLES.

 

Disponível em: < http://www.dannemann.com.br/site.cfm?app=show&dsp=crc&pos=5.10&lng=pt >

Acesso: 27/07/06