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A
inconstitucionalidade do ISS na hospedagem
Daniel Augusto
Hoffmann
Sumário:1. Intróito 2. Competência Tributária e a Determinação da
Regra-Matriz de Incidência dos Tributos 3. A Regra-Matriz de Incidência do ISS
Fornecida pela Constituição 3.1. O Conceito Constitucional (Jurídico) de
Prestação de Serviços 3.1.1. Diferença entre "Obrigação de Dar" e
"Obrigação de Fazer" 3.2. O Equívoco da Interpretação Econômica de
Prestação de Serviços 3.2.1. Interpretação do Direito Através de Conceitos
Econômicos 3.2.2. Aceitação da Definição Constitucional de Serviços pela Lei
Complementar 4. O Tratamento da Legislação Infraconstitucional acerca do ISS na
Hospedagem 5. A Atividade de Hospedagem 5.1. Necessidade de Esclarecimentos
acerca de Peculiaridades Inerentes à Atividade Apresentada 5.1.1. Fornecimento
de Mercadorias 5.1.2. Recepção 5.1.3. Limpeza 5.2. Conclusão 6. Considerações
Finais
1. INTRÓITO
Destina-se
o presente estudo à averiguação da validade da incidência do Imposto Sobre
Serviços (ISS) na atividade de hospedagem.
Não
obstante o fato desse tributo ser cobrado há mais de trinta anos, alhures já
destacamos (1) a importância de se investigar a legitimidade não só
dos tributos criados recentemente, mas também daqueles que já se tornaram
despesas habituais dos contribuintes.
Assim,
coloca-se em relevo que o trabalho em tela também tem por finalidade, como
diria Becker, promover uma reeducação dos reflexos condicionados na atitude
mental jurídica tributária (2) e, diante de uma fria análise do Direito
e do mundo fenomênico, efetuar uma mudança dos conceitos que nos foram impostos
no decorrer do tempo e costumamos simplesmente aceitar.
2. COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA E A
DETERMINAÇÃO DA REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA DOS TRIBUTOS
Entre
nós, a Lei Fundamental é que sustenta o complexo de normas que forma o
Ordenamento Jurídico. No Direito Tributário, ela é que determina as matérias
que serão legisladas e a forma com que o processo legislativo deverá
transcorrer – determina a competência tributária (3).
Quando
a Carta Excelsa tratou da competência tributária e dos tributos a serem
instituídos pelos Entes Federativos, ela procurou fornecer garantias aos
virtuais contribuintes tendo em mira as possíveis abusividades que poderiam ser
praticadas pelo Poder Legislativo.
Fitando
essa garantia, o Poder Constituinte delineou de forma precisa todos os
elementos necessários para que o legislador infraconstitucional criasse um
tributo (4).
Segundo
Geraldo Ataliba, "por ser extremamente exaustiva, a Constituição
brasileira não deixa margem de liberdade para o legislador ordinário, seja para
eleger a materialidade da h.i., seja para designar os sujeitos passivos."
(5)
Assim,
a própria Constituição fixou a regra-matriz de incidência possível dos
tributos a serem normatizados, com todos os critérios necessários para a sua
exigência (6).
3. A REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA DO ISS
FORNECIDA PELA CONSTITUIÇÃO
No
Imposto Sobre Serviços, o art. 156, inc. III, do Diploma Maior, limitou o
legislador municipal na edição de normas para a criação e cobrança desse
tributo.
Isso
porque o constituinte originário escolheu a prestação de serviços como
fato tributável. Por conseguinte, nada além desse conceito poderá figurar na
hipótese de incidência do imposto.
Em
síntese, calcado no art. 156, III, da CF/88, o legislador somente poderá
instituir o ISS com a seguinte regra-matriz de incidência: a) Aspecto material:
prestar serviços; (7) b) Aspecto pessoal: b1) sujeito ativo:
município; b2) sujeito passivo: quem prestar serviços; c) Aspecto quantitativo:
c1) base de cálculo: valor do serviço; c2) alíquota: parcela da base de cálculo
que não configure confisco; d) Aspecto espacial: dentro dos territórios
municipais; e) Aspecto temporal: momento da prática do aspecto material.
Destarte,
essa é a competência tributária que foi atribuída ao legislador municipal. É
somente através da utilização desses aspectos que poderá se criar uma norma que
terá a força de obrigar o cidadão a pagar ISS.
3.1.
O Conceito Constitucional (Jurídico) de Prestação de Serviços
Nesse
fio de raciocínio, mister se faz uma análise mais aprofundada do critério
material (8) da hipótese de incidência que o criador das leis
poderá elaborar para o ISS.
É
por entre o estudo desse critério que se poderá identificar possíveis
desconformidades da legislação infraconstitucional com as regras da competência
tributária demarcadas na Carta Magna.
A
ilustre Misabel Derzi, em nota clássica à obra de Aliomar Baleeiro, fornece-nos
com precisão o conceito de "prestação de serviços", vejamos:
"A
doutrina e a jurisprudência extraem da Constituição as seguintes características
da hipótese de incidência do tributo:
"1.
a prestação de serviços configura uma utilidade (material ou imaterial), como
execução de obrigação de fazer e não de dar coisa;
"2.
deve ser prestada a terceiro, excluindo-se os serviços que a pessoa executa em
seu próprio benefício, como o transporte de mercadoria de um estabelecimento a
outro da mesma pessoa;
"3.
executado sem vínculo de subordinação jurídica, mas em caráter independente,
razão pela qual excluem-se os serviços prestados pelos empregados a seus
empregadores e pelos servidores públicos;
"(...)
"5.
assim como ser objeto de circulação econômica, executado com objetivo de lucro,
excluindo-se os serviços gratuitos ou de cortesia, beneficentes ou a preços
baixos, como alimentação servida a empregados gratuitamente ou a preço de
custo;
"6.
finalmente, o serviço deve ser prestado em regime de direito privado (por
pessoa física ou jurídica, empresa pública ou sociedade de economia mista);
"(...)
"Portanto,
em linhas gerais, o fato gerador do ISS enquadra-se dentro do conceito de
serviço, prestado com autonomia, na mesma linha da definição do Código Civil,
que, no seu art. 1.216 (9), assim dispõe sobre locação de serviços:
‘toda a espécie de serviços ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser
contratada mediante retribuição’. O trabalho às vezes, é predominantemente
imaterial (do advogado, professor, cantor, et alii), na maioria das vezes,
porém, a prestação dos serviços se concretiza em bens materiais. O que é
fundamental é que o fazer haverá de prevalecer sobre o dar" (10)
Por
isso, o fato tributável que o legislador infraconstitucional poderá descrever
deve respeitar as características acima referidas, ou então maculará a norma
com a inconstitucionalidade.
Realçamos
que o apanágio elementar (11) para a caracterização da prestação de
serviços é que a atividade do possível contribuinte constitua uma utilidade como
execução de obrigação de fazer e não de dar coisa. (12)
Esse
posicionamento já é consolidado pela jurisprudência. Destaca-se o julgamento do
STF que decidiu não incidir o ISS sobre a locação de bens móveis visto que
nessa operação prevalece a obrigação de ceder coisa a terceira pessoa
(13).
Logo,
conforme visto, é inviável a tributação de atividades que destoem das
características apontadas pela Carta Política. Principalmente, é inadmissível a
tributação de atos que se desenvolvam através da obrigação de dar coisa, pois
prestação de serviços não é.
3.1.1.
Diferença entre "Obrigação de Dar" e "Obrigação de Fazer"
Pela
razão de existir a distinção entre as obrigações – assumidas nas ações
praticadas pelas pessoas – entre dar e fazer, sendo o elemento caracterizador
da prestação de serviços (objeto em estudo), vejamos brevemente, já que o tema
não necessita de maiores delongas, qual a distinção entre uma obrigação e outra
para podermos, ao final, completar o raciocínio.
Sílvio
Venosa, grande mestre do Direito Civil atual, fundado nas lições do augusto
Washington de Barros Monteiro, nos fornece subsídios para enxergar a linha
tênue que separa estas espécies de obrigações:
"A
obrigação de dar tem como conteúdo a entrega de uma coisa, em linhas gerais.
"(...)
"A
obrigação de dar é aquela em que o devedor compromete-se a entregar uma coisa
móvel ou imóvel ao credor, quer para constituir novo direito, quer para
restituir a mesma coisa ao seu titular.
"(...)
"O
conteúdo da obrigação de fazer é uma ‘atividade’ do devedor, no sentido mais
amplo: tanto pode ser a prestação de uma atividade física ou material (como por
exemplo, fazer um reparo em máquina, pintar casa, levantar muro), como uma
atividade intelectual, artística ou científica (como, por exemplo, escrever
obra literária, partitura musical, ou realizar experiência científica).
"(...)
"Washington
de Barros Monteiro (1979, v. 4:87), com a habitual propriedade, esclarece que o
ponto crucial da diferenciação está em verificar
"‘se
o dar ou entregar é ou não conseqüência do fazer. Assim, se o devedor tem de
dar ou entregar alguma coisa, não tendo, porém, de fazê-la previamente, a
obrigação é de dar; todavia, se, primeiramente, tem de realizar algum ato, do
qual será mero corolário o de dar, tecnicamente a obrigação é de fazer’."
(14)
Portanto,
repisando o que já foi afirmado pelos Tribunais e pela maioria dos
doutrinadores, somente os atos que são executados mediante a obrigação de fazer
é que são considerados serviços. Essa é a interpretação jurídica
(constitucional) que a Ordenação nos apresenta no momento em que a prestação de
serviços é incorporada ao Direito Positivo.
3.2.
O Equívoco da Interpretação Econômica de Prestação de Serviços
Entretanto,
há uma minoria doutrinária que, embriagada por conceitos pré-jurídicos
(conceitos econômicos e financeiros), interpreta a prestação de serviços
de modo divergente como o até aqui apresentado. Vejamos um exemplo dessa
interpretação através das palavras de Sérgio Pinto Martins:
"O
conceito de serviços adotado pela EC nº 18/65 deve ser examinado com base na
Lei Maior, que classifica os impostos dentro de uma nomenclatura econômica,
e não irmos buscar o conceito de serviços no Código Civil. A Lei Maior deve ser
interpretada com base nela, e não com base na lei ordinária. Os serviços a
serem tributados pelo ISS são, porém, os previstos em lei complementar. Serviço
não tem um conceito jurídico, mas econômico, para os efeitos do inciso III do
art. 156 da CF. Logo, não podemos conceituá-lo como obrigação de fazer (Ataliba
e Barreto, RDT 5/53-56) ou que não configure obrigação de dar. Serviço é um
bem incorpóreo (imaterial) na etapa da circulação econômica. Para haver serviço
é necessário que a atividade seja realizada para terceiro, não para si próprio.
Assim, não é qualquer transporte municipal que terá a incidência do ISS, mas o
transporte municipal prestado para terceiros, desde que haja sempre um
conteúdo econômico.
"O
ISS tributa serviço de qualquer natureza, os definido em lei
complementar. Locação de bens móveis, por exemplo, é serviço porque há
circulação de um bem incorpóreo, que está na etapa da circulação econômica,
sendo definido em lei complementar como serviço de qualquer natureza."
(15)
Destacamos
duas falhas gravíssimas dessa corrente doutrinária que são: 1) interpretação do
Direito através de conceitos econômicos; 2) Aceitação da definição
constitucional de serviços pela lei complementar.
Vejamos
item por item:
3.2.1.
Interpretação do Direito Através de Conceitos Econômicos
O
maior equívoco (16) cometido pela doutrina supramencionada é a
própria forma de interpretação das normas jurídicas. Aqueles que interpretam o
Direito através das ciências paralelas contaminam o direito com elementos
estranhos à Ciência Jurídica.
Kelsen
foi o primeiro a detectar a infecção do direito por elementos não-jurídicos.
Logo no início de sua principal obra ele expôs este contágio no objeto do
direito (17). E Becker, amparado nos ensinamentos da Teoria Pura do
Direito, transplantou para o Direito Tributário, especificamente, o raciocínio
de que as disciplinas extrajurídicas obscurecem a natureza do Direito. Com sua
persuasão singular criticou o maior equívoco do Direito Tributário, diagnosticando
a demência e expondo a terapêutica necessária:
"Há
juristas - adverte F. Carnelutti - que quase sempre cometem o erro de aceitar e
utilizar empiricamente os conceitos das ciências pré-jurídicas, sem cuidarem de
pesquisar o novo e diferente conteúdo (significado) que elas passam a vestir no
momento em que entram no mundo jurídico. Este mau costume - lamenta F.
Carnelutti - tem gerado dentro do direito dificuldades numerosas e graves.
"Ora,
em nenhum ramo do direito, estas dificuldades são tão numerosas e tão graves
quanto as que este mau hábito tem gerado dentro do Direito Tributário. O maior
equívoco no Direito Tributário é a contaminação entre princípios e conceitos
jurídicos e princípios e conceitos pré-jurídicos (econômicos, financeiros,
políticos, sociais, etc.).
"Esta
contaminação prostitui a atitude mental jurídica, fazendo com que o juiz, a
autoridade pública, o jurista, o advogado e o contribuinte desenvolvam (sem
disto se aperceberem) um raciocínio pseuso-jurídico. Deste raciocínio
pseudo-jurídico resulta, fatalmente, a conclusão invertebrada e de borracha que
se amolda e adapta ao caso concreto segundo o critério pessoal (arbítrio) do
intérprete do direito positivo (regra jurídica). Em síntese: aquele tipo de
raciocínio introduz a incerteza e a contradição para dentro do mundo
jurídico; incertezas e contradições que conduzem todos ao manicômio jurídico
tributário e à terapêutica e à cirurgia do desespero.
"(...)
"Portanto,
o único remédio - para curar a atual demência jurídica tributária e sair do
manicômio onde todos se encontram - é sujeitar-se ao trabalho de reeducar os
reflexos condicionados, na atitude mental jurídica tributária." (18)
Pelo
exposto, vislumbra-se que a interpretação econômica do Direito Tributário é tão
frágil quanto um enfeite de cristal. Nesse diapasão, a definição econômica de
serviços não é útil para caracterizar o campo de incidência do Imposto Sobre
Serviços. Portanto, a prestação de serviços deve se operar, como visto, por uma
execução de obrigação de fazer, não de dar coisa.
3.2.2.
Aceitação da Definição Constitucional de Serviços Pela Lei Complementar.
Ademais,
a interpretação econômica de serviços é herege porque admite que a lei
complementar pode definir o alcance de instituto utilizado na própria
Constituição Federal.
Como
é consabido, a Lei das Leis é soberana e imutável pelo legislador inferior.
Dentro desse raciocínio, a atribuição constitucional do poder de criar tributos
é inalterável, sendo que a própria Constituição impõe limites quanto ao
conteúdo que será legislado.
Assim,
acompanhados com Carrazza, entendemos que "a lei complementar não pode
considerar serviços, para fins de tributação por via de ISS, fatos que não o
sejam. Isto feriria, dentre outros, o direito subjetivo do contribuinte de só
ser tributado pela pessoa política competente e nos estritos termos da
Constituição.(...) nem mesmo a lei complementar nacional pode alterar o
precitado esquema constitucional." (19)
Por
isso, acertadamente julgou o STF ao declarar a inconstitucionalidade da
cobrança do ISS na locação de bens móveis. A Lei Complementar não pode alterar
os conceitos definidos pela Carta Excelsa, que veda a instituição do ISS nas
atividades que se operem pela obrigação de dar coisa.
4. O TRATAMENTO DA LEGISLAÇÃO
INFRACONSTITUCIONAL ACERCA DO ISS NA HOSPEDAGEM
Após
considerações imprescindíveis, adentrando em definitivo no tema proposto,
vejamos agora o tratamento da legislação infraconstitucional acerca do ISS na
hospedagem.
Em
conformidade com o exposto, a Lei Complementar deve ater-se à regra-matriz de
incidência fixada pela Norma Magna, respeitando o conceito jurídico de serviços
para dispor sobre o Sistema Tributário Nacional em caráter geral.
Até
o dia 31 de julho de 2003, o diploma normativo que foi recepcionado pela CF/88
e fazia as vezes da Lei Complementar do ISS era o decreto-lei nº 406/68 que, em
seu art. 8º, prescrevia: "Art. 8º. O imposto, de
competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer natureza, tem como fato
gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem
estabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa."
Com
o advento da Lei Complementar nº 116/2003, esse dispositivo foi expressamente
revogado (20), passando a ter vigência, em seu lugar, o art. 1º
da aludida Lei Complementar:
"Art.
1o O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos
Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços
constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade
preponderante do prestador."
"(...)
"§
4o A incidência do imposto não depende da denominação dada ao
serviço prestado."
Assim,
a legislação complementar nacional, no mesmo raciocínio que o Diploma
Fundamental, elegeu como "hipótese de incidência" (fato gerador) do
ISS a prestação de serviços. Fez ainda a ressalva de que a incidência do
imposto independe da denominação dada ao serviço. Ou seja, determinou que a
essência do ato desenvolvido pelo contribuinte é que caracterizará a prestação
de serviços, não importando a roupagem nele colocada: deve ser verificado no âmago
do fato imponível o conceito de "serviços" para haver a incidência da
norma.
Contudo,
tanto a lei revogada quanto a revogadora delegaram à lista anexa a
tipicidade de cada serviço tributável (21).
Na
norma anterior, o item da lista que amparava a cobrança do ISS na hospedagem
era o 99: "99. hospedagem em hotéis, motéis, pensões e
congêneres."
Hoje,
com a Vigência da LC 116/03, o item da lista que fornece um fundamento à
instituição do ISS é o 9.01: "9.01 – Hospedagem de qualquer natureza em
hotéis, apart-service condominiais, flat, apart-hotéis, hotéis residência,
residence-service, suite service, hotelaria marítima, motéis, pensões e
congêneres; ocupação por temporada com fornecimento de serviço."
Isto
é, através de vocábulos diferentes, permaneceu a mesma determinação em relação
às empresas que praticam a hospedagem: "poderá incidir ISS na atividade de
hospedagem de qualquer natureza."
Mas
a Lei Complementar, assim como a Constituição Federal, não tem potência para
subsumir às prestações de serviços e desencadear o vínculo jurídico entre o
prestador e o Município. Somente e tão-somente com a edição da lei municipal é
que o indivíduo terá que pagar ISS aos cofres públicos.
Comumente
os municípios seguem rigorosamente os dizeres da Lei Complementar para
instituir o imposto sobre serviços. Em certos casos há inclusive a cópia do
diploma nacional na criação do ISS.
Nesse
caso, com base no conjunto de normas (Constituição Federal, Lei Complementar e
Lei Municipal), os municípios poderão cobrar o ISS nas atividades de
hospedagem.
Todavia,
essa é uma afirmação inicial que se faz quando é feita uma leitura apressada
dos dispositivos em comento. Em análise mais apurada, através de interpretação
sistemática, cabe ao cientista do Direito averiguar se as normas estão
dispostas de forma harmônica no Ordenamento Jurídico.
Compete
ao jurista a apuração da observância ou inobservância, pelo legislador
infraconstitucional, dos limites (quanto ao conteúdo e quanto à forma) com que
o poder superior autorizou o poder inferior a legislar.
Passaremos
a analisar, deste modo, a inteligência da atividade de hospedagem para que
possamos efetuar a apuração exegética da: 1) coadunação das normas citadas com
o Ordenamento Jurídico, ou 2) expulsão das aludidas prescrições do Sistema
Jurídico Nacional.
5. A ATIVIDADE DE HOSPEDAGEM
Deixemos
por ora em nossas mentes os conceitos constitucionais e legais expostos nos
tópicos anteriores para, agora, nos atermos à realidade obrigacional que liga
um cliente a uma empresa que pratica a hospedagem (hotel, motel, pensão etc.).
Habitualmente
no exercício da atividade sub examine existe a seguinte relação cliente-empresa:
1.
Determinado indivíduo, sentindo a necessidade de um imóvel para permanência
temporária (geralmente por algumas horas ou por uma ou mais noites), procura
uma empresa de hospedagem.
2.
Ao chegar nesse estabelecimento, a empresa (na fase pré-contratual) sugere os
imóveis que estão disponíveis (Unidades Habitacionais), esclarece as
características do bem (com os móveis que o acompanham) e o custo do seu uso
temporário.
3.
Caso o indivíduo aceite as condições propostas pela empresa de hospedagem, ele
firma o contrato (que geralmente não é documentado, mas verbal) com o
estabelecimento empresarial.
4.
Assim, o indivíduo (que passa a ser consumidor (22)) recebe da
empresa de hospedagem um imóvel em perfeito estado de uso e tem a posse desse
bem por um determinado tempo.
5.
Encerrado o uso do imóvel, o cliente deve restituir a posse do bem à empresa de
hospedagem e pagar o preço contratado.
Dessa
maneira, as obrigações assumidas pelas partes que participam da relação são as
seguintes:
1)
A empresa de hospedagem: deve ceder temporariamente a posse de uma
Unidade Habitacional – em perfeito estado de limpeza, higiene, segurança etc. –
ao consumidor;
2)
O consumidor: deve pagar o preço ajustado e restituir o bem, sem tê-lo
danificado.
É
importante destacar que a empresa de hospedagem não deve fazer (elaborar,
construir, montar) o bem que vai ser cedido ao cliente. O imóvel, com os móveis
que nele estão contidos, já estão prontos. O que ocorre é a simples
transferência temporária da posse de um bem pronto, mediante remuneração.
Diante
desse fato, verifica-se a precisão da descrição dos vocábulos motel, pensão
e hotel no Dicionário Aurélio: "Motel: Hotel para encontros
amorosos.", "Pensão: Pequeno hotel de caráter familiar."
"Hotel: Estabelecimento onde se alugam quartos e apartamentos
mobiliados". (23)
Ou
seja, os contratos firmados pela empresa de hospedagem, apesar de não serem
regidos pela lei especial (24), são considerados locações sui
generis (25) de bem imóvel; nunca uma prestação de
serviços.
Isso
se dá em virtude da prevalência da cessão de um bem (obrigação de dar) sobre a
execução de um serviço (obrigação de fazer).
Vejamos
o que o Código Civil Vigente preceitua:
"Art.
565. Na locação de coisas, uma parte se obriga a ceder à outra, por tempo
determinado ou não, o uso e o gozo de coisa não fungível, mediante certa
retribuição."
"Art.
593. A prestação de serviços, que não estiver sujeita às leis trabalhistas ou a
lei especial, reger-se-á pelas disposições deste capítulo."
"Art.
594. Toda a espécie de serviços ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode
ser contratada mediante retribuição."
Esclarecendo:
Na locação predomina a cessão (obrigação de dar) do uso e gozo de coisa não
fungível. Já na prestação de serviços, o que se sobressai é a obrigação de um
trabalho humano (manual, intelectual, artístico, científico – material ou
imaterial) que não esteja sobre o manto da relação empregado-empregador
(obrigação de fazer).
Segundo
Orlando Gomes, "o característico da locação é o regresso da coisa
locada ao seu dono, ao passo que o serviço prestado fica pertencendo a quem
pagou e não é suscetível de restituição". (26)
Enfim,
as empresas de hospedagem operam suas atividades através da cessão do uso e
gozo de um bem imóvel (locação sui generis), mediante certa retribuição,
a um consumidor.
5.1.
Necessidade de Esclarecimentos Acerca de Peculiaridades Inerentes à Atividade
Apresentada
Para
espancar eventuais dúvidas infundadas acerca da predominância da obrigação dar
sobre a obrigação de fazer na atividade apresentada, mister se fazem os
esclarecimentos de alguns pontos.
5.1.1.
Fornecimento de mercadorias
Certamente,
além da cessão temporária do uso e gozo de um bem imóvel, as empresas de
hospedagem colocam à disposição de seus clientes o fornecimento de mercadorias
que poderão ser adquiridas do estabelecimento – como alimentos, bebidas,
preservativos etc.
A
aquisição e revenda de bens móveis são uma atividade secundária desenvolvida
pelos estabelecimentos examinados. Esse atrativo opera-se sob o manto das leis
comerciais e é tributado pelo imposto estadual incidente sobre operações
relativas à circulação de mercadorias (ICMS).
De
fato, nenhum cliente de empresa de hospedagem iria nesse estabelecimento,
pagaria uma diária, somente para adquirir os bens que são colocados à
sua venda. Caso ele necessitasse de uma bebida, compraria em um bar ou mercado;
uma comida, em um restaurante; um preservativo, na farmácia etc.
Por
isso, esse acessório não desnatura o conteúdo da atividade de hospedagem. Além
do mais, essa questão não faz parte do objeto em comento, visto que é atividade
sujeita à tributação estadual.
Outrossim,
outros atrativos que acompanham a cessão do uso e gozo do bem imóvel (o
principal) na hospedagem são: a recepção e a limpeza.
5.1.2.
Recepção
Em
relação à recepção, verifica-se que ela é desenvolvida através de uma atividade
humana. Ela se faz necessária para o contato humano entre o cliente e o
estabelecimento hospedeiro.
No
entanto, como é notório, em praticamente todo o fornecimento de produtos haverá
uma prestação de serviços e, em quase toda a prestação de serviços, haverá o
fornecimento de produto (27).
Um
advogado, por exemplo, quando presta um parecer, fornece ao seu cliente o papel
onde foi elaborado o estudo. Por outro lado, numa venda de mercadorias, existe
a apresentação dos produtos através de um atendente (serviço humano).
Essa
é uma realidade dominante no mundo empresarial. Todavia, sempre uma atividade
será caracterizada pela prevalência de um bem ou de um serviço.
Nos exemplos citados, o que domina na atividade do advogado é o conteúdo
que existe no papel, que foi desenvolvido através de um serviço intelectual (dar
o papel é mera conseqüência do fazer o parecer); já na venda de mercadorias, o
que conta é o produto (fazer a apresentação é mera conseqüência do dar a
mercadoria). É por isso que os serviços advocatícios são tributados
exclusivamente pelo ISS e a venda de mercadorias pelo ICMS.
Sendo
assim, considera-se a recepção de uma empresa de hospedagem somente um
acessório necessário à atividade. Caso inexistisse esse item numa empresa dessa
espécie não haveria meios de efetuar a cobrança, o controle de hóspedes etc.
O
que prevalece é a cessão do uso e gozo da Unidade Habitacional!
5.1.3.
Limpeza
Outro
elemento indispensável na atividade de hospedagem é a limpeza.
Verdade
seja, com a constante circulação de clientes nas Unidades Habitacionais desses
estabelecimentos é forçoso que a empresa de hospedagem mantenha profissionais
destinados a fazer a manutenção, limpeza e higienização dos imóveis.
Essa
é mais uma atividade que, pela natureza do negócio, é imprescindível à
existência do estabelecimento.
No
entanto, convém frisar que não há nesse labor uma prestação de serviços ao
cliente do estabelecimento. A limpeza não é prestada a terceiro. A conservação
elaborada no interior dos imóveis locados é efetuada em momento anterior
ao do uso do imóvel (28).
Utilizando
novamente o método da comparação, é tão necessária a limpeza em uma empresa de
hospedagem quanto a lavação de roupas na locação de trajes. Nenhum consumidor
se hospedará em um lugar sujo e tampouco um indivíduo alugará um traje sórdido.
Logo,
nas empresas de hospedagem, a limpeza não se opera mediante a obrigação de
fazer (limpar) algo para terceiro. A obrigação que prevalece é a de ceder um
imóvel (limpo) ao cliente (29).
5.2.
Conclusão
Diante
do exposto, tem-se que a atividade de hospedagem opera-se pela a cessão do uso
e gozo de um bem imóvel, mediante certa retribuição, a um consumidor.
Além
da cessão existem operações inerentes ao desenvolvimento da atividade
praticada, como o fornecimento de mercadorias, a recepção e a limpeza.
Entretanto,
essas práticas, necessárias e acessórias, não desnaturam a qualidade do principal
desenvolvido por empresas que efetuam a hospedagem (30).
Nenhum
hóspede contrataria com um hotel, motel etc. somente para consumir os produtos
fornecidos; somente para consumir os serviços da recepção; ou, somente para ver
a limpeza de um imóvel.
É
certo que o cliente tem por escopo a posse temporária do imóvel e, para isso,
pagará o preço acordado.
Fitando
sob o mesmo prisma uma situação semelhante, analisemos uma locadora de
veículos:
Quando
um indivíduo vai locar determinado veículo, existe um profissional destinado a
fazer a apresentação dos automóveis e a cobrança do preço acordado (como opera
uma recepção de hotel); os veículos são locados limpos, encerados, polidos e
com a mecânica em perfeito estado (como a conservação e a limpeza em um motel);
e, certas vezes, também existe o fornecimento do combustível ao locatário (como
o fornecimento de mercadorias numa pensão).
Contudo,
apesar da existência de todos esses acessórios, a atividade principal é a
locação de veículos – que, conforme posicionamento do STF, não é prestação de
serviços por prevalecer a obrigação de dar em detrimento da obrigação de fazer.
Do
mesmo modo, hospedagem também não é prestação de serviço e não pode ser
passível de cobrança do imposto previsto no art. 156, III, da Constituição
Federal (ISS).
Assim
sendo, Aires F. Barreto, em lições que como uma luva se amoldam neste trabalho,
conclui por nós pela não incidência do ISS na atividade de hospedagem com os
seguintes dizeres:
"Se,
como acabamos de ver, a locação de bens móveis é intributável, por via de ISS,
com maior razão será a singela cessão de espaço em bem imóvel.
"Anote-se,
de imediato, que cessão de espaço em bem imóvel é o contrato pelo qual, uma
pessoa, titular de bem imóvel, mediante remuneração, cede a outra o direito de
uso desse espaço. (...)
"Trata
de contrato que tem por essência a obrigação de dar. Resulta do acordo de vontades pelo qual
o cedente (titular do imóvel) cede a terceiros (o cessionário) o direito de uso
(e, eventualmente, de gozo) de certo espaço em bem imóvel, mediante remuneração
(aluguel).
"Sendo
a cessão de espaço em bem imóvel negócio jurídico que, diante da nossa ordem
jurídica, configura obrigação de dar, segue-se, necessariamente, que jamais
pode refletir ‘prestação de serviços’ (que só pode alcançar obrigações de
fazer).
"(...)
"Comparativamente,
não se desnatura o contrato - que prossegue sendo de locação de imóvel - pela
circunstância de o imóvel ser entregue mobiliado ou com alguns serviçais. Mesmo
nessas hipóteses, não há falar em prestação de serviços, uma vez que trata
de mero acessório (tarefa-meio, atividade-meio) do fim visado: a cessão de
espaço em bem imóvel.
"É
incogitável a incidência do ISS diante da hipótese na qual há mero requinte de
sofisticação dispensável. Deveras, a cessão de espaço em bem imóvel (fim
perseguido) não se transmuda em serviço pelo simples fato de, para viabilizar
ou facilitar essa cessão, vir-se a fornecer determinada infra-estrutura, com ou
sem recursos humanos. A obrigação segue sendo de dar e não de fazer. O
eventual fornecimento desses recursos, materiais ou humanos, não altera o fim
colimado: cessão de espaço em bem imóvel. E somente podem ser tomadas, para
sujeição ao ISS, as atividades entendidas como fim, correspondente à prestação
de um serviço integralmente considerado." (31)
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS:
A
Constituição, ao conferir a competência tributária, fixa todos os critérios da
norma-padrão de incidência dos tributos a serem instituídos por lei,
rigorosamente e exaustivamente, sem deixar margem de liberdade para o
legislador ordinário.
No
que concerne ao ISS, extrai-se do art. 156, III, da Constituição, os seguintes
aspectos da norma que instituirá o imposto: a) Aspecto material: prestar
serviços; b) Aspecto espacial: dentro dos territórios municipais; c) Aspecto
temporal: momento da prática do aspecto material. d) Aspecto pessoal: d1)
sujeito ativo: município; d2) sujeito passivo: quem prestar serviços; e)
Aspecto quantitativo: e1) base de cálculo: valor do serviço; e2) alíquota:
parcela da base de cálculo que não configure confisco.
Portanto,
a prestação de serviços é a única matéria que, com supedâneo no dispositivo
constitucional aludido, pode ser tributada a título de ISS pelos municípios.
Para
configurar a "prestação de serviços" a atividade desenvolvida deve
ser realizada por intermédio de uma obrigação de fazer e não de dar
coisa. Esse é, inclusive, o posicionamento do STF (RE 116.121).
Outrossim,
convém frisar que a corrente teórica que admite que a prestação de serviços
pode ser visualizada quando prevalece a obrigação de dar é falha porque
interpreta o direito através de conceitos econômicos e aceita a definição
constitucional de serviços pela lei complementar.
Em
relação à diferenciação entre as duas espécies de obrigações (dar e fazer),
segundo Washington de Barros Monteiro, o ponto fundamental está em verificar "se
o dar ou entregar é ou não conseqüência do fazer. Assim, se o devedor tem de
dar ou entregar alguma coisa, não tendo, porém, de fazê-la previamente, a
obrigação é de dar; todavia, se, primeiramente, tem de realizar algum ato, do
qual será mero corolário o de dar, tecnicamente a obrigação é de fazer’."
(32)
No
tocante à hospedagem, prevista na legislação nacional (LC 116/03) e nas leis
municipais, o intérprete deve se ater à essência dos atos praticados nessa
espécie de atividade para observar se é válida a tributação pelo ISS.
Tem-se
que, quando um cliente procura um estabelecimento de hospedagem (hotel, motel,
pensão), o seu fim precípuo é o de ocupar um imóvel (unidade habitacional) por
determinado período. Em contrapartida, o estabelecimento tem por obrigação
ceder o uso e o gozo deste imóvel pelo prazo acordado, mediante remuneração.
Assim,
não há a necessidade de previamente fazer o imóvel para posteriormente
entregá-lo ao hóspede. O imóvel com os seus acessórios já está pronto. Logo, a
obrigação principal do hotel, do motel etc. é a de dar.
Por
outro vértice, o eventual fornecimento de mercadorias (alimentos, por exemplo)
e de recursos humanos (recepção e limpeza) para viabilizar o negócio não
desnatura o principal, a essência, a atividade-fim, que continua sendo a cessão
do espaço em bem imóvel.
Por
todo exposto, denota-se a inconstitucionalidade da cobrança do ISS na hospedagem,
visto que prevalece nesse exercício a obrigação de dar. Logo, é situação
fora da competência tributária imposta pela Carta Magna.
NOTAS
1 Na oportunidade ressaltamos que
"verificada a invalidade do ISS incidente nas atividades de locação de
bens móveis – imposto existente há mais de trinta anos – é de extrema
importância frisarmos a necessidade de estudar não só as novidades no Direito
Tributário, mas também a antiga tributação, aquela que o cidadão já vem
contribuindo há anos, evitando, assim, que tributos sejam pagos indevidamente
por um período ainda maior" (HOFFMANN, Daniel Augusto, ISS sobre locação
de bens móveis: inconstitucionalidade de tributo municipal existente há mais de
trinta anos, Jus Navigandi nº 65, mai. 2003.)
2 BECKER, Alfredo Augusto, Teoria Geral
do Direito Tributário, Lejus, pp. 39, 40 e 41.
3 Competência tributária é a atribuição
constitucional do poder de criar tributos in abstracto.
4 Nas palavras de Carrazza: "A
Constituição, ao discriminar as competências tributárias, estabeleceu – ainda
que, por vezes, de modo implícito e com uma certa margem de liberdade para o
legislador – a norma-padrão de incidência (o arquétipo genérico, a
regra-matriz) de cada exação. Noutros termos, ela apontou a hipótese de
incidência possível, o sujeito ativo possível, o sujeito passivo possível, a base
de cálculo possível e a alíquota possível, das várias espécies e subespécies de
tributos. Em síntese, o legislador, ao exercitar a competência tributária,
deverá ser fiel à norma-padrão de incidência do tributo, pré-traçada na
Constituição. O legislador (federal, estadual, municipal ou distrital),
enquanto cria o tributo, não pode fugir deste arquétipo constitucional."
(CARRAZZA, Roque Antônio, Curso de Direito Constitucional Tributário,Malheiros,
pp. 311, 312 e 313.)
5 ATALIBA, Geraldo, Hipótese de
Incidência Tributária, Malheiros, p. 81.
6 Paulo de Barros Carvalho agrupa todos os
elementos do tributo no que ele intitula de Regra-Matriz de Incidência
(CARVALHO, Paulo de Barros, Curso de Direito Tributário, Saraiva,
Capítulo X). Assim, pode-se observar a existência dos critérios: material,
pessoal (sujeito ativo e passivo), quantitativo (base de cálculo e alíquota),
espacial e temporal.
7 Desde que não sejam os serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicações (arts. 156, III e
155, II da Constituição).
8 O direito, abstrato por natureza,
descreve possíveis condutas humanas. Quando as condutas hipotéticas previstas
ocorrem no mundo dos fatos (fato gerador, ou, fato imponível), há a incidência
(subsunção) da norma e a aplicação de um mandamento (um comando), também
previsto na norma. O critério material da hipótese de incidência diz respeito à
descrição de um ato, fato, ou estado de fato que poderá ser realizado no mundo
real. É o espelho, o desenho, o reflexo daquilo que pode ser verificado na
prática da vida.
9 Atual artigo 594 do novo Código Civil.
10 DERZI, Misabel Abreu Machado, Direito
Tributário Brasileiro, Forense, p. 491 – itálico acrescido.
11 Todos os atributos são indispensáveis,
porém, este é o que se destaca no cerne da atividade.
12 Também neste sentido: COÊLHO, Sacha
Calmon Navarro, Curso de Direito Tributário,Forense, p. 363 e 364.
13 "TRIBUTO - FIGURINO CONSTITUCIONAL.
A supremacia da Carta Federal é conducente a glosar-se a cobrança de tributo
discrepante daqueles nela previstos. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS - CONTRATO DE
LOCAÇÃO. A terminologia constitucional do Imposto sobre Serviços revela o
objeto da tributação. Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o
tributo considerado contrato de locação de bem móvel. Em Direito, os
institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprio, descabendo
confundir a locação de serviços com a de móveis, práticas diversas regidas pelo
Código Civil, cujas definições são de observância inafastável - artigo 110 do
Código Tributário Nacional." (Recurso Extraordinário - RE - 116121/SP)
14 VENOSA, Sílvio de Salvo, Teoria Geral
das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, Atlas, pp. 80, 81, 100 e 101.
15 MARTINS, Sérgio Pinto, Manual do
Imposto Sobre Serviços, Cejup, pp. 35 e 36 – destaque acrescido.
16 "O Maior Equívoco" é o título
do item 10 do Capítulo I (Diagnóstico da Demência) da obra de Becker: BECKER,
Alfredo Augusto, Teoria Geral do Direito Tributário.
17 "...um relance de olhos sobre a
ciência jurídica tradicional, tal como se desenvolveu no decurso dos sécs. XIX
e XX, mostra claramente quão longe ela está de satisfazer à exigência da
pureza. De um modo inteiramente acrítico, a jurisprudência tem-se confundido
com a psicologia e a sociologia, com a ética e a teoria política. Esta confusão
pode porventura explicar-se pelo facto (sic) de estas ciências se referirem a
objectos (sic) que indubitavelmente têm uma estreita conexão com o Direito.
Quando a Teoria Pura empreende delimitar o conhecimento do Direito em face
destas disciplinas, fá-lo, não por ignorar ou, muito menos, por negar esta
conexão, mas porque intenta evitar um sincretismo metodológico que obscurece a
essência da ciência jurídica e dilui os limites que lhe são impostos pela
natureza do seu objecto (sic)." (KELSEN, Hans, Teoria Pura do Direito,
Tipografia Guerra, p. 17 e 18)
18 BECKER, Alfredo Augusto, Teoria Geral
do Direito Tributário, pp. 39, 40 e 41.
19 CARRAZZA, Roque Antônio, Curso de
Direito Constitucional Tributário, pp. 544 e 545.
20 Consoante art. 10 da LC 116/03:
"Ficam revogados os arts. 8o, 10, 11 e 12 do Decreto-Lei
no 406, de 31 de dezembro de 1968; os incisos III, IV, V e
VII do art. 3o do Decreto-Lei no 834, de 8
de setembro de 1969; a Lei Complementar no 22, de 9 de
dezembro de 1974; a Lei no 7.192, de 5 de junho de 1984; a
Lei Complementar no 56, de 15 de dezembro de 1987; e a Lei
Complementar no 100, de 22 de dezembro de 1999.
21 Não vai ser discutido neste estudo a
taxatividade ou não da lista de serviços da Lei Complementar do ISS. Somente
como esclarecimento, é suficiente expor que alguns doutrinadores pensam que os
legisladores municipais não podem instituir imposto sobre serviços que não
estejam constantes na lista de serviços ditada pela LC (Hugo de Brito Machado,
por exemplo); outros entendem que é de competência exclusiva dos Municípios
estabelecer os serviços que serão tributados (Roque Antônio Carrazza, p.ex.),
não devendo, a lei municipal, subordinação senão à Constituição Federal.
22 Lei 8.078/90. "Art. 2º.
Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto
ou serviço como destinatário final" "Art. 3º. (...) § 1º
Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial."
23 Mini Aurélio, Editora Nova Fronteira,
pp. 369, 473 e 525.
24 Lei 8.245, de 18 de outubro de 1991:
Dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas
pertinentes.
25 HOTELARIA – ESPÉCIE DO GÊNERO LOCAÇÃO
Recurso não conhecido com remessa dos autos ao tribunal de alçada (TJPR – ApCiv
0118428-5 – (33) – Curitiba – 7ª C.Cív. – Relª Desª Denise Martins Arruda –
DJPR 15.04.2002 - destacamos).
26 GOMES, Orlando, Contratos, Forense,
p. 264.
27 Aires F. Barreto faz a classificação dos
serviços em "a) serviços puros; b) serviços com emprego de
instrumentos; c) serviços com a aplicação de materiais; e d) serviços com
emprego de instrumentos e aplicação de materiais.". Para maior
aprofundamento acerca desta distinção: BARRETO, Aires F., ISS na
Constituição e na Lei, Dialética, pp. 45 a 51.
28 Nos hotéis, a contratação do uso
temporário é feita "por dia" (pagando-se as "diárias"), por
isso, sempre no instante anterior ao do começo da vigência de cada contrato (de
cada diária) é feita a limpeza do imóvel. Já nos motéis, pelo fato de o cliente
utilizar as Unidades Habitacionais desses estabelecimentos para encontros
amorosos (na maioria das vezes) da mesma forma a limpeza será efetuada, sempre,
em momento anterior às ocupações. Nos demais estabelecimentos congêneres, é
utilizado o mesmo método para a realização da limpeza.
29 Consoante citação anterior da ilustre
Misabel Derzi, uma das características da prestação de serviços é que ela
"deve ser prestada a terceiro, excluindo-se os serviços que a pessoa
executa em seu próprio benefício" ( DERZI, Misabel Abreu Machado,
Direito Tributário Brasileiro, p. 491).
30 Para verificar a atividade principal
da hospedagem, utilizaremos o método da exemplificação e da comparação para
clarear o raciocínio. Imaginemos o que acontece em um restaurante: Há,
nessa atividade, o serviço de recepção, parqueamento de veículos,
preparação dos alimentos e das bebidas, atendimento especializado por um garçom
e cobrança dos valores pelo caixa. Todas estas atividades desenvolvem-se
através de um facere (esforço humano). No entanto, a atividade
preponderante é a cessão dos alimentos e das bebidas. Por isso que o
tributo devido, nesse caso, é o ICMS.
Logo,
questionamos:
Quem
iria a um restaurante sem comida e sem bebida?
Por
outra banda, conforme as assertivas deste capítulo, o principal na hospedagem é
a cessão do espaço em bem imóvel:
Quem
iria a um hotel sem quartos?
É
até interessante imaginar diversos cidadãos se dirigindo a um restaurante,
recebendo o serviço de parqueamento de seus veículos, sendo gentilmente
recepcionados por um garçom, sentando ao redor das mesas com o fim de: simplesmente
receber este cordial atendimento. Ou então, um casal apaixonado, procurando
um motel para fins libidinosos e, já na recepção, a atendente informando:
"Infelizmente nós não cedemos a ocupação de imóveis!! Porém, isso não é
necessário. Dispomos do principal! Daquilo que realmente vocês querem nesse
momento, que é uma excelente recepção, telefones com ótima comunicação e,
apesar de não existirem quartos, nossa limpeza é excelente!"
Assim,
a essência, o principal, sempre será a atividade preponderante. No restaurante,
o principal é o fornecimento de alimentos e bebidas; na hospedagem, a cessão do
imóvel.
Nesta
linha de entendimento, Aires F. Barreto ainda complementa nossa teoria expondo
que: "Não se pode decompor a atividade-fim, consistente na cessão de
espaço em bem imóvel - que serviço não é - para sujeitar ao ISS as várias
ações-meio que a possibilitam. Não é possível porque ilegal e inconstitucional,
pretender tributar atividades-meio, separando-as do fim perseguido, para
considerá-las separadamente, isoladamente, como se cada uma delas
correspondesse a um serviço autônomo, independente. Isso seria uma aberração
jurídica, além de constituir-se em desconsideração à hipótese de incidência
desse imposto."(BARRETO, Aires F., ISS na Constituição e na Lei,
pp. 45 a 51.)
31 BARRETO, Aires F., ISS na
Constituição e na Lei, pp. 131 e 133 (grifamos).
32Apud: VENOSA, Sílvio de Salvo, Teoria Geral das Obrigações e
Teoria Geral dos Contratos, p. 101.
http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6553