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Pagamento integral do tributo em atraso e a exigência da
multa de mora.
Hugo Brazioli Slivinskis.
Resumo.
A questão que se coloca é se a
multa moratória seria devida sobre débitos fiscais objeto de denúncia
espontânea, mesmo havendo o recolhimento do principal acrescidos dos juros
moratórios antes do início de qualquer procedimento administrativo fiscalizatório,
em virtude do que dispõe o art. 138 do CTN e o princípio do ne bis in idem.
Da sistemática vigente.
A sistemática vigente pode ser
divida por períodos, tendo como marcos divisórios a publicação das seguintes
leis: lei nº 8.383/91, art. 59; lei nº 8.981/95, art. 84 e lei nº 9.430/96,
art. 61. Respectivamente, a saber:
Art. 59. Os tributos e
contribuições administrados pelo Departamento da Receita Federal, que não forem
pagos até a data do vencimento, ficarão sujeitos à multa de mora de vinte por
cento e a juros de mora de um por cento ao mês-calendário ou fração, calculados
sobre o valor do tributo ou contribuição corrigido monetariamente.
§ 1° A multa de mora será
reduzida a dez por cento, quando o débito for pago até o último dia útil do mês
subseqüente ao do vencimento.
§ 2° A multa incidirá a partir do
primeiro dia após o vencimento do débito; os juros, a partir do primeiro dia do
mês subseqüente.
Art. 84. Os tributos e
contribuições sociais arrecadados pela Secretaria da Receita Federal, cujos
fatos geradores vierem a ocorrer a partir de 1º de janeiro de 1995, não pagos
nos prazos previstos na legislação tributária serão acrescidos de:
I - juros de mora, equivalentes à
taxa média mensal de captação do Tesouro Nacional relativa à Dívida Mobiliária
Federal Interna;
II - multa de mora aplicada da
seguinte forma:
a) dez por cento, se o pagamento
se verificar no próprio mês do vencimento;
b) vinte por cento, quando o
pagamento ocorrer no mês seguinte ao do vencimento;
c) trinta por cento, quando o
pagamento for efetuado a partir do segundo mês subseqüente ao do vencimento.
1º Os juros de mora incidirão a
partir do primeiro dia do mês subseqüente ao do vencimento, e a multa de mora,
a partir do primeiro dia após o vencimento do débito.
2º O percentual dos juros de mora
relativo ao mês em que o pagamento estiver sendo efetuado será de 1%.
3º Em nenhuma hipótese os juros
de mora previstos no inciso I, deste artigo, poderão ser inferiores à taxa de
juros estabelecida no art. 161, § 1º, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de
1966, no art. 59 da Lei nº 8.383, de 1991, e no art. 3º da Lei nº 8.620, de 5
de janeiro de 1993.
4º Os juros de mora de que trata
o inciso I, deste artigo, serão aplicados também às contribuições sociais
arrecadadas pelo INSS e aos débitos para com o patrimônio imobiliário, quando
não recolhidos nos prazos previstos na legislação específica.
5º Em relação aos débitos
referidos no art. 5º desta lei incidirão, a partir de 1º de janeiro de 1995,
juros de mora de um por cento ao mês-calendário ou fração.
6º O disposto no § 2º aplica-se,
inclusive, às hipóteses de pagamento parcelado de tributos e contribuições
sociais, previstos nesta lei.
Art. 61. Os débitos para com a
União, decorrentes de tributos e contribuições administrados pela Secretaria da
Receita Federal, cujos fatos geradores ocorrerem a partir de 1º de janeiro de
1997, não pagos nos prazos previstos na legislação específica, serão acrescidos
de multa de mora, calculada à taxa de trinta e três centésimos por cento, por
dia de atraso.
1º A multa de que trata este
artigo será calculada a partir do primeiro dia subseqüente ao do vencimento do
prazo previsto para o pagamento do tributo ou da contribuição até o dia em que
ocorrer o seu pagamento.
2º O percentual de multa a ser
aplicado fica limitado a vinte por cento.
3º Sobre os débitos a que se
refere este artigo incidirão juros de mora calculados à taxa a que se refere o
§ 3º do art. 5º, a partir do primeiro dia do mês subseqüente ao vencimento do
prazo até o mês anterior ao do pagamento e de um por cento no mês de pagamento.
Assim, pela presente legislação
exige-se o pagamento da multa moratória e os juros de mora em caso de pagamento
integral do tributo, mesmo que realizado anteriormente a qualquer procedimento
fiscalizatório (denúncia espontânea).
Da discussão.
A discussão desenvolve-se sob o âmbito se a exigência da
multa moratória não seria ilegal frente o que dispõe o art. 138 do CTN, in
verbis:
"Art. 138. A
responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada,
se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do
depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o
montante do tributo dependa de apuração.
Parágrafo único. Não se considera
espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento
administrativo ou medida de fiscalização, relacionada com a infração."
Dentre as alegações suscitadas
em nossos tribunais, pode-se destacar algumas.
Como primeiro exemplo temos a
fundamentação de que incidindo a multa moratória e os juros de mora sobre o
valor do tributo em atraso haveria um verdadeiro bis in idem, em decorrência da
aplicação da mesma penalidade duas vezes, já que possuem ambas as sanções
natureza ressarcitória, devendo ser excluída a aplicação da multa moratória,
sendo subsistente apenas a aplicação dos juros, devidos em virtude do atraso no
adimplemento. Este tipo de alegação, a meu ver, constitui mero exercício de
retórica, já que a multa e os juros têm finalidades diversas, aliás como bem
coloca o Prof. Paulo de Barros Carvalho, in verbis:
"Entendemos, outrossim, que
as duas medidas - juros de mora e multa de mora - por não se excluírem
mutuamente, podem ser exigidas de modo simultâneo - uma e outra." (in
Curso de Direito Tributário).
Outra posição que tenta ilidir a
cobrança da multa moratória, certamente de maior destaque que a primeira, tem
como fundamento que a multa moratória, ao contrário de que o nome sugere, tem
natureza de punição administrativa (súmula nº 565/STF), estando portanto
alijada sua aplicação se recolhido o principal, mais os juros de natureza
compensatória.
Súmula 565/STF.
"A multa fiscal moratória
constitui pena administrativa, não se incluindo no crédito habilitado em
falência."
Duas argumentações opõe-se a este
último entendimento, a primeira impugna a natureza penal administrativa da
multa moratória, outra trata com indiferença este item, pois correta seria
exegese do CTN que restringe o alcance do art. 138 em excluir a
responsabilidade penal e não administrativa.
Passo, pela relevância e
acertamento, a analisar a segunda posição.
Ou seja, em uma interpretação
sistemática, obtém-se a ilação de que pelo art. 138 estar inserido na seção IV,
do capítulo V, sob a rubrica "responsabilidade tributária", há a
nítida volunta legis de somente excluir a responsabilidade penal, não afastando
a multa de mora, fosse ela de caráter penal-administrativa ou indenizatória,
decorrente da impontualidade do devedor no recolhimento do tributo. Corrobora
esta posição o art. 136, que inaugura a seção, que faz inequívoca referência à
ilícitos penais.
"Art. 136. Salvo disposição
de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária
independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e
extensão dos efeitos do ato."
A Lei Complementar nº 104/21, que
acrescentou o art.155-A ao CTN, de maneira reflexa, aclarou essa questão, pois
ao estabelecer a inequívoca aplicação da multa moratória em parcelamento de
tributos federais ressaltou a natureza e o alcance da disposição do art. 138, a
saber, somente aplicável em matéria penal. Ademais, essa disposição normativa,
abaixo citada, tornou mais ainda infrutífera a alegação de existência de bis in
idem.
"Art. 155-A. O parcelamento
será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica
§ 1º. Salvo disposição de lei em
contrário, o parcelamento do crédito tributário não exclui a incidência de
juros e multas.
§ 2º Aplicam-se, subsidiariamente,
ao parcelamento as disposições desta Lei, relativas à moratória"
Em conclusão.
Isto posto, as correntes em
nossos tribunais que entendiam pela afastabilidade da multa moratória em caso
de pagamento de tributo em atraso, antes de qualquer procedimento
administrativo relacionado com a exação tendem, diante da nova sistemática,
mudar a exegese e o alcance do art. 138 do CTN, bem como considerar inexistente
a hipótese de bis in idem.
Retirado de: http://www.slivinskis.net/artigos/art138ctnintegral.htm