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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

PÓS-GRADUAÇÃO LATU SENSU

ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO EMPRESARIAL

 

 

 

 

 

TRIBUTAÇÃO AOS PROVEDORES DE ACESSO À INTERNET

 

 

 

 

PAULO MACIEL GONZAGA ROVERSI GENOVEZ

 

 

 

 

 

SÃO PAULO

2002


SUMÁRIO

 

1          INTRODUÇÃO ...................................................................................        2

2          O FATO COMO PRODUÇÃO NORMATIVA .....................................     5

2.1       A INFORMÁTICA COMO FATO JURÍDICO ...........................    6

2.2       OS PROVEDORES DE ACESSO À INTERNET .....................      7

3          A PROBLEMÁTICA ACERCA DA TRIBUTAÇÃO AOS PRODUTOS    DE INFORMÁTICA .............................................................................     11

3.1       COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA ................................................     12

3.2       POSSIBILIDADE DE TRIBUTAÇÃO PELO ICMS ..................     13

3.2.1    SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO ....................................   15

3.2.2    O   PROVIMENTO   DE   ACESSO   À   INTERNET   É   “SERVIÇO   DE   COMUNICAÇÃO”  PARA  A  TRIBUTAÇÃO                   PELO ICMS? ............................................................................      19

3.3       TRIBUTAÇÃO PELO ISS .........................................................      29

3.4       POSIÇÃO DOS PROVEDORES DE ACESSO À INTERNET ..    32

3.5       ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ..   32

4          CONCLUSÕES ....................................................................................      37

5          BIBLIOGRAFIA ...................................................................................       39

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1 – INTRODUÇÃO

 

 

A delimitação dos períodos históricos é caracterizada pela modificação profunda da estrutura social existente na época, decorrente de fato que, dada sua relevância, impõe seu estudo e permanente referência histórica.

 

As grandes revoluções nos meios de produção são especialmente lembradas e analisadas face as enormes mudanças nas relações sociais que proporcionam. Nenhum outro fato social foi tão marcante do ponto de vista dos meios de produção, do que a revolução industrial.

 

Devido as mudanças nos meios de produção, que passaram da manufatura artesanal para a produção industrial em larga escala, a sociedade experimentou os avanços do aparecimento da tecnologia e dos bens de consumo, bem como amargou a opressão da massa de trabalhadores que serviram de instrumento de produção. Costuma-se dizer que nas revoluções aparecem as oportunidades de riqueza e prosperidade àqueles que tem a possibilidade de se integrar ao novo sistema em implantação, de outra banda, aqueles que permanecem alheios a transformação e não se adequam ao “novo modelo” fatalmente são postos de lado às suas benesses.

 

Atualmente a humanidade está experimentando os efeitos da chamada “revolução da informática”, que, em poucos anos, se impôs presente na maioria das relações de produção e comunicação.

 

Se na revolução industrial houve uma profunda alteração nos meios de produção, com o advento da informática esses meios de produção foram dinamizados, mapeados, analisados, pesados e otimizados, tudo graças a possibilidade de armazenamento e manuseio do maior número de informações em menor tempo. Há quem diga que a informática foi concebida para facilitar a realização do trabalho, no entanto, verifica-se que sua implementação decorre, na verdade, da maior produtividade que o novo sistema proporciona. O cerne da questão, portanto, é o aumento da produtividade e não a facilidade para a realização do trabalho.

 

Com o aumento da produtividade, como não poderia deixar de ser, houve também o maior investimento de capital nas atividades relacionadas a informática, gerando para as empresas reserva específica de capital direcionada à implantação, manutenção e constante modernização dos sistemas de tecnologia da informação e processamento de dados.

 

Mais recentemente um novo nicho de atividade ligada a informática surgiu, trata-se da possibilidade de consecução de “informações de fácil acesso” através da Internet. Originariamente a Internet foi concebida pelos militares norte americanos com o escopo de que, através de uma rede de computadores os diversos órgãos de informação se interligassem, trocando informações e possibilitando a manutenção do sistema em caso de ataque a uma parte dele. Dada as inquestionáveis facilidades verificadas no novo sistema, este foi expandido às universidades que o utilizavam para a troca de informações acadêmicas. Gradativamente a Internet foi sendo popularizada através a inserção de serviços disponíveis a usuários fora dos ciclos militares e acadêmicos, até que sua popularização chegou a patamares em que o usuário pode acessá-la através de suas casas, celulares, terminais públicos ou os denominados ciber-cafés.

 

Inevitavelmente, a massificação do acesso à Internet gerou a proliferação dos chamados provedores de acesso, os quais são responsáveis pela interligação entre o usuário e os serviços disponíveis na rede, fato que gerou grande interesse dos poderes públicos na tributação de tal atividade. É tentando esclarecer as implicações da tributação ao provimento de acesso à Internet, que se produz o presente trabalho.

 

Tendendo a demonstrar as relações tributárias acerca do tema, o trabalho em voga se iniciará na análise da origem das normas, passará pela natureza do serviço prestado pelos provedores de acesso, traçará parâmetros acerca da instituição dos tributos e demonstrará o atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca do tema.

 


 

 

 

 

 

 

2 - O FATO COMO FONTE DA PRODUÇÃO NORMATIVA

 

 

Por vezes a norma nasce no mundo jurídico causando grande transformação na ordem social então existente, entretanto, é certo afirmar que a produção normativa deflui de fato preexistente juridicamente relevante, que impõe a produção da norma.

 

Sob este prisma, temos que, em que pese a nova norma trazer inovações sociais, não há a inovação normativa sem que a mesma tenha sido originada de fato preexistente. O direito, segundo a escola romana, nasce do fato: Ex facto oritur jus.

 

Os fatos, no entanto, somente podem ser considerados jurídicos, se os mesmos forem observados dentro de uma estrutura normativa. Sem o condão de juridicidade, caracterizada pela aplicabilidade das normas jurídicas e o interesse humano, o fato não é considerado como jurídico.

 

Esquadrinhando o assunto, temos os brilhantes ensinamentos de Miguel Reale, que, explanando acerca de sua teoria da estrutura tridimensional do direito, conclui que “uma análise em profundidade dos diversos sentidos da palavra Direito veio demonstrar que eles correspondem a três aspectos básicos, discerníveis em todo e qualquer momento da vida jurídica: um aspecto normativo (o Direito como ordenamento e sua respectiva ciência); um aspecto fático (o Direito como fato, ou em sua efetividade social e histórica) e um aspecto axiológico (o Direito como valor de justiça).” [1]

 

 

2.1 - A INFORMÁTICA COMO FATO JURÍDICO

 

 

Com o advento da informática, novos meios de comunicação, produção e entretenimento foram sendo velozmente criados. Hodiernamente não há como negar relevância às enormes modificações que a informática têm empreendido em todos os aspectos da vida social.

 

Em toda a história da humanidade, desde a invenção da imprensa, não se viu tamanha revolução nos meios de comunicação, e por via de conseqüência, de produção. Não é por outro motivo, senão pelas facilidades de troca de informações via Internet, que tantas vezes tem se ouvido falar na chamada “Era da Informação”. Com a redução dos custos para a aquisição de equipamentos de informática, cada vez mais pessoas tem tido acesso ao chamado “mundo digital”, ampliando e modificando todas as relações interpessoais.

 

Em que pese a grande relevância que tais inovações têm atingido no meio social, a estrutura normativa vigente por vezes não está sendo capaz de acompanhar toda nova gama de inovações e transformações, impondo sérias dificuldades aos operadores do direito. Verifica-se, que determinadas relações advindas do aparecimento da informática ou não podem ser norteadas a partir da legislação vigente, ou, se podem, sua interpretação está longe de ser pacífica.

 

Sob este aspecto, como fatos juridicamente relevantes, as inovações sociais advindas do uso da informática, tem merecido grande discussões no meio jurídico, por vezes impondo a releitura antigos conceitos ou até determinando a criação de novas normas. Não se pode negar, contudo, que a produção normativa, sempre é precedida pelos fatos que velozmente surgem, causando, via de regra, uma lacuna entre a norma posta e a dinâmica dos fatos, mormente considerando a progressão geométrica com que a informática evolui.

 

 

2.2 - OS PROVEDORES DE ACESSO A INTERNET

 

 

O presente trabalho visa demonstrar a problemática acerca da tributação imposta aos provedores de acesso à Internet.

 

Para que alguém possa ter acesso a Internet é necessária a utilização dos serviços prestados por um provedor de acesso à Internet, o qual faz a comunicação entre o terminal do usuário e toda a sorte de serviços e páginas existentes na “rede”.

 

Para que a intermediação desenvolvida pelos provedores de acesso seja possível, é necessária a existência de linhas de comunicação entre o usuário, o provedor e o serviço a ser utilizado. Normalmente essa comunicação é feita através de linhas telefônicas, sendo possível também via cabo e rádio, ou até de todas as formas simultaneamente, sendo certo que, de uma forma ou de outra, mister se faz a utilização dos serviços prestados por um provedor de acesso, que fará a intermediação das comunicações.

 

Mais do que uma comunicação física, a transmissão de dados via Internet é feita através de todo um aparato tecnológico, onde as informações, sejam elas gráficas, textuais ou sonoras, são convertidos em “bits”[2], que depois de transmitidos através das linhas de comunicação citadas anteriormente, são decodificadas pelo equipamento do receptor dos dados.

 

Aparentemente trata-se de um mecanismo simples, contudo, a transmissão de tais informações convertidas é feita por várias vias simultaneamente, em sistema de blocos, os quais são logicamente organizados nos equipamentos emissores, transportadores e receptores.

 

Sobre o transporte de dados via Internet Marco Aurélio Greco faz brilhante explanação demonstrando a existência de três camadas de comunicação envolvendo o sistema de provimento de acesso: a primeira, correspondente a ligação física entre os equipamentos; a segunda, correspondente a “conexão lógica” entre os computadores, possibilitando a transmissão de informações; e a terceira, que se refere aos aplicativos instalados nos computadores do emissor e receptor, que possibilitam a codificação e decodificação das informações transformadas em “bits”[3].

 

A remuneração dos provedores pode ser efetuada de maneira direta ou indireta. Direta quando o pagamento pelo serviço é feito diretamente pelo usuário que contrata os serviços, e indireta, quando os serviços são disponibilizados pelo provedor gratuitamente aos usuários e o pagamento é feito pelos patrocinadores, que divulgam seus produtos na rede, através da página de acesso do provedor. Desta feita, temos que a atividade desenvolvida pelo provedor de acesso à Internet é sempre remunerada, pouco importando se o pagamento foi feito pelo usuário ou pelo divulgador ou distribuidor de produtos.

 

Com o crescimento do número de pessoas que têm acesso à  Internet, bem como com a incrementação dos serviços disponíveis nos sites, a relevância econômica dos provedores de acesso se acentuou, ampliando o interesse do poder público pela tributação do serviço de acesso.

 

Na disputa pelo tributo entraram em cena o Município, pleiteando o pagamento de ISSQN, e o Estado buscando a incidência do ICMS. Em meio a discussão, a seu turno, os provedores de acesso buscam a inaplicação de tributação aos seus serviços, ou a tributação ao órgão que demanda a menor alíquota.

 

Toda a discussão reside na existência ou não de legislação que encampe o serviço de acesso à Internet, e se a mesma é de ordem municipal ou estadual.

 

 


 

 

 

 

 

 

3 - A PROBLEMÁTICA ACERCA DA TRIBUTAÇÃO AOS PRODUTOS DE INFORMÁTICA

 

 

Dentro da problemática acerca da existência de legislação aplicável as inovações da informática, especial relevância deve-se aos seus aspectos tributários.

 

No ordenamento jurídico pátrio, a tributação, por ser atividade estritamente desenvolvida pelos pelas pessoas jurídicas de direito público interno, está sob a égide do princípio da legalidade, onde o poder público não pode instituir tributos sem prévia lei que o determine, (art. 150,I da CF/88 e 97 do CTN).

 

Dadas as novas situações jurídicas, que via de regra estão amplamente vinculadas a atividade produtiva, o estado vem procurando meios de lançar sobre elas a tributação. Ocorre que essa tarefa não se mostra simples, na medida em que a informática criou novos conceitos, paradigmas e situações antes inimagináveis. Na verdade, tamanha é a expansão e criação de ambientes cibernéticos que a legislação existente não foi capaz de acompanhar todas as inovações.

 

A título de exemplo temos que não se sabe se a página da Internet é extensão do estabelecimento comercial; se os softwares adquiridos via download são mercadorias; se os negócios entabulados nas páginas da Internet devem ser considerados firmados na cidade de hospedagem da página, na sede da empresa, ou na cidade onde reside o comprador. Esses novos conceitos têm sido tema de grande discussão no mundo jurídico, em especial entre os entes da federação que se julgam competentes para tributar as novas situações. 

 

 

3.1 - COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

 

 

A República Federativa do Brasil, como meio de instaurar a ordem nacional, adotou o sistema constitucional, que tem como base Constituição, célula mater, a qual impõe a observância de seus preceitos, seja para a produção normativa, para o ordenamento institucional e toda a sorte de relações internas e externas. É certo afirmar que a Constituição, em seu texto, não disciplina especificamente todas as relações jurídicas possíveis. Entretanto, a mesma traça preceitos que informam como as situações jurídicas devem ser interpretadas e disciplinadas.

 

No que tange a instituição de tributos, a Constituição vigente, promulgada em 05 de outubro de 1988, disciplinou de forma pormenorizada as implicações tributárias, delimitando a competência tributária dos entes da federação. Segundo Luciana Angeiras “O Sistema jurídico tributário está todo ele, minuciosamente e exaustivamente, colocado no texto constitucional. O legislador constitucional foi extremamente cauteloso e rígido ao estabelecer as competências tributárias impositivas, valendo-se do critério material da hipótese de incidência das diversas espécies tributárias para proceder a sua repartição entre cada uma das pessoas políticas – União, Estados, Distrito Federal e Municípios.”[4].

 

Por ser a Constituição o grande arcabouço do ordenamento jurídico tributário, é a partir dela que se inicia a verificação da possibilidade de tributação dos serviços de provimento ao acesso à Internet.

 

 

3.2 - POSSIBILIDADE DE TRIBUTAÇÃO PELO ICMS

 

 

Especificamente quanto aos provedores de acesso, temos que a hipótese de tributação pelo Estado é pautada no ICMS.

 

No sistema tributário brasileiro é de competência dos Estados e Distrito Federal exercer a tributação referente a circulação de mercadorias e sobre o serviço de comunicação. A competência ora suscitada foi delimitada pela Constituição Federal de 1988 em seu art. 155, II:

 

“Art.155 ‑ Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

II ‑ operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;”

 

“A Constituição não cria tributo. Atribui competência as pessoas jurídicas de Direito Público interno para fazê-lo”[5]. Nesse passo, buscando a fonte instituidora do ICMS, temos a Lei Complementar n.º 87, a qual não cria o tributo, que é instituído pela legislação ordinária estadual[6], mas indica em seu art. 2.º as os fatos jurídicos que poderão ser base para a estipulação de hipóteses de incidência pelo Estado.

 

Para o tema em estudo, a tributação relativa ao ICMS somente nos interessa quanto aos serviços de comunicação previsto no citado inciso II do art. 155 da CF/88, e no inciso III do art. 2.º da Lei Complementar n.º 87, que dispõe:

 

“Art. 2.º O imposto incide sobre:

...

III – prestações onerosas de serviços de comunicação , por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza; “

 

Tendendo a enquadrar os serviços prestados pelos provedores de acesso à Internet como serviços de comunicação, os Estados e o Distrito Federal têm empenhado seus maiores esforços, utilizando, para tanto, forte argumentação e exercício de interpretação da legislação aplicável a espécie. Para um melhor deslinde da temática abordada, mister se faz a análise da estrutura normativa que regula a cobrança do ICMS.

 

 

3.2.1 - SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO

 

 

Nesse passo é necessária a análise da legislação especificamente no que pertine ao sentido empregado a expressão “serviço de comunicação” para efeitos de tributação.

 

Lexicológicamente, comunicação, ao teor do que se verifica no dicionário Michaelis, significa:

 

“1. Ação, efeito ou meio de comunicar(-se). 2. Aviso, informação, esclarecimento. 3. Mec. Transmissão. 4. Relação, correspondência fácil; trato, amizade. 5. Acesso, passagem.”

 

Já o dicionário Aurélio Eletrônico V.2.0, esclarece que comunicação tem significado mais amplo:

 

“1. Ato ou efeito de comunicar(-se). 2. Ato ou efeito de emitir, transmitir e receber mensagens por meio de métodos e/ ou processos convencionados, quer através da linguagem falada ou escrita, quer de outros sinais, signos ou símbolos, quer de aparelhamento técnico especializado, sonoro e/ou visual. 3. P. ext. A ação de utilizar os meios necessários para realizar tal comunicação. 4. P. ext. A mensagem recebida por esses meios. 5. O conjunto de conhecimentos relativos à comunicação (2), ou que tem implicações com ela, ministrado nas respectivas faculdades. 6. A capacidade de trocar ou discutir idéias, de dialogar, de conversar, com vista ao bom entendimento entre pessoas. 7. Exposição oral ou escrita sobre determinado assunto. 8. Participação ou aviso de fato ocorrido ou por ocorrer. 9. Convivência, trato, convívio. 10. Caminho de acesso ou de ligação; passagem; passadouro. 11. Eng. Eletrôn. Transmissão de informação de um ponto a outro por meio de sinais em fios, ou de ondas eletromagnéticas. 12. Teor. Inf. Transmissão de mensagem entre uma fonte e um destinatário, distintos no tempo e/ou no espaço, utilizando um código comum. [Cf. sistema de comunicação.]. “

 

Analisando-se os ditames constitucionais e infra constitucionais, em confronto com o significado lexicológico da expressão comunicação, verifica-se, em tese, que os toda a prestação de serviços onerosa, cujo escopo seja a transmissão de informações entre emissor e receptor seria passível de tributação pelo ICMS. Cabe verificar, no entanto, o efetivo sentido empregado pelo legislador a expressão “serviço de comunicação”.

 

No caso, não se trata de tributação pela comunicação, mas sim pelo serviço prestado por alguém que transmite mensagem ao destinatário. Ou seja a tributação decorre da prestação do serviço oneroso, que possibilita a comunicação, e não da comunicação propriamente dita. Desta feita, deve-se aliar o prestador de serviço a finalidade do mesmo, que seria a comunicação. Sobre o assunto ensina Roque Antônio Carraza:

 

“... a regra matriz deste ICMS é, pois, prestar serviços de comunicação. Não é simplesmente realizar a comunicação. (...) o ICMS não incide sobre a comunicação propriamente dita, mas sobre a ‘relação comunicativa’, isto é, a atividade de, em caráter negocial, alguém fornecer, a terceiro, condições para que a comunicação ocorra.”[7]

 

Ainda nesse passo, temos que nem todos os serviços que visem a comunicação podem ser considerados tributáveis para efeitos de ICMS. Inicialmente, a própria Constituição trata de serviços que, prima facie, poderiam ser considerados como de comunicação, contudo, por terem disciplina jurídica distinta, há entendimento de que não seriam tributados pelo ICMS. Tratam-se dos serviços postais e de radiodifusão.

 

No entender de Hugo de Brito Machado:

 

“Não obstante os serviços postais, o transporte de correspondência, e os de radiodifusão possam ser considerados de comunicação, em sentido amplo, a referencia específica àqueles, ao lado da referência de telecomunicações, em normas da Constituição, mostra que o constituinte fez uma distinção no da Lei Maior, entre uns e outros, não considerando o serviço postal nem o de radiodifusão, como espécies de serviços de comunicação, ou de telecomunicação.” [8]

 

Considera-se, portanto, de comunicação, o serviço oneroso, que disponibiliza o envio ou recepção de mensagem, não compreendidos aqueles serviços com tratamento diferenciado pela Constituição.

 

Em sua festejada obra Internet e Direito, Marco Aurélio Greco define que:

 

“Prestador de serviço de comunicação é aquele que fornece os respectivos meios para a comunicação, assim entendidos não apenas aqueles necessários ao transporte das mensagens, mas também aqueles que tornam possível a instauração de uma relação comunicativa, tais como interfaces, dispositivos,  equipamentos etc.”

 

E completa:

 

“Assim, em função da diversidade de meios, podem existir distintos tipos de serviço de comunicação” [9]

 

 

3.2.2 - O PROVIMENTO DE ACESSO À INTERNET É “SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO” PARA A TRIBUTAÇÃO PELO ICMS?

 

 

Como fora salientado anteriormente, os provedores de acesso à Internet realizam a ligação entre o emissor e receptor, disponibilizando meios para a transmissão da mensagem. Foi esclarecido, também, que tal serviço e devidamente remunerado diretamente pelo usuário ou por patrocinadores que fazem a divulgação de seus produtos nos sites dos provedores.

 

Em um primeiro momento parece que todos os requisitos para a caracterização de um serviço tributado pelo ICMS estão presentes. No entanto, a discussão se propaga na medida em que demais normas tendentes a conceituar a expressão comunicação, tipicamente desenvolvida pelos provedores de acesso.

 

Nesse campo, é de se levar em conta que a Lei Geral de Telecomunicações  (LGT) ao definir o que é telecomunicação, faz menção a atividades correlatas, que não caracterizam o serviço de comunicação propriamente dito.

 

Com o escopo de sustentar a aplicabilidade da utilização da lei de comunicação para conceituar o serviço de comunicação prestado pelo provimento de acesso, mister se faz a observância do art. 110 do CTN que dispõe:

 

“Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados expressa ou implicitamente pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.”

 

Entendendo que a Lei Geral de Telecomunicações estabeleceu e delimitou o conceito de telecomunicação e seus valores agregados, não poderia a norma tributária alterá-la, sob o argumento de possibilitar a tributação.

 

Sustentando a aplicabilidade da Lei de Telecomunicação, trazemos a baila os dizeres de Newton de Lucca:

 

“A questão não se resolve, contudo, com essa radical singeleza. Valer-se somente da lei complementar tributária para afirmar qual a abrangência da locução “serviço de comunicação” seria deveras temerário, principalmente quando se leva em conta a disposição constante do art. 110 do CTN...”[10] 

 

Em comentário referente ao art. 110 do CTN, Aliomar Baleeiro, ensina que:

 

“O legislador não poderá, por exemplo, definir coisa móvel, como navio, como bem imóvel, para sobre a alienação fazer incidir imposto de transmissão inter vivos. Isso porque a Constituição, quando se refere aos atos de transmissão de bens imóveis, fixa rígidos limites e tais atos são exclusivamente os assim considerados pelo direito privado...”[11].

 

Nesse passo a Lei 9.472/97 definiria o termo telecomunicação em seu art. 60, o qual seria aplicável também às relações tributárias:

 

“Art. 60. Serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação.

§ 1º Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza.”

 

Analisando-se isoladamente o que dispõe o mencionado artigo, restaria claro que o serviço de telecomunicação, o qual é tributado pelo ICMS abrangeria a atividade de provimento à Internet. Entretanto, o art. 61 da referida lei, disciplina o que é o denominado serviço de valor adicionado, que não corresponde efetivamente a telecomunicação:

 

“Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações.”

 

O art. 61 em destaque, parece fazer justa referência a atividade de provimento ao acesso à Internet, na medida que não há comunicação de dados sem a utilização dos serviços de telecomunicação disponibilizado pelas empresas de telefonia, serviço este que já é tributado pelo ICMS.

 

Partindo-se do disposto nos artigos acima citados, verifica-se que a as empresas de telecomunicação são responsáveis pelo serviço de comunicação, enquanto que os provedores de acesso à Internet somente desenvolvem atividades de valor adicionado, alterando a maneira como a comunicação é efetuada. Aplicando-se a legislação em tela, denota-se que o trabalho dos provedores nada mais é do que agregar novas formas de apresentação e movimentação de informações, as quais são transmitidas pelas empresas de telecomunicação. Da abordagem ora exposta, conclui-se que por se tratar de serviço de valor adicionado, o provimento de acesso à Internet não está sujeito a tributação pelo ICMS.

 

Tal entendimento é acompanhado por Ives Gandra da Silva Martins:

 

“Ocorre que a lei de telecomunicações claramente exclui os serviços prestados pelos provedores como serviço de telecomunicação, em seu art. 61,  § 1.º, retrotranscrito.

São serviços adicionais, auxiliares, mas não são serviços de telecomunicação, como não o seriam todos aqueles prestados como suporte às telecomunicações, desde a limpeza desses estabelecimentos, quando terceirizados, até aqueles enunciados no dispositivo acima.” [12].

 

Citando José Maria de Oliveira, Hugo de Brito Machado reforça o entendimento anterior:

 

“Em face dos conceitos de comunicação adrede oferecidos e das definições adotadas pelos veículos normativos, entende-se que o provimento de acesso à Internet deve ser assim considerado como ‘uma prestação de serviço que utiliza necessariamente uma base de comunicação preexistente e que viabiliza o acesso aos serviços prestados na rede mundial, por meio de sistemas específicos de tratamento de informações.’

O referido provimento de acesso não pode ser enquadrado, assim, como serviço de comunicação, pois atende aos requisitos mínimos que, técnica e legalmente, são exigidos para tanto, ou seja, o serviço de conexão à Internet não pode executar as atividades necessárias e suficientes para resultarem na emissão, na transmissão, ou na recepção de sinais de telecomunicação. Nos moldes regulamentares, é um serviço de valor adicionado, pois aproveita uma rede de comunicação em funcionamento e agrega mecanismos adequados ao trato do armazenamento, movimentação e recuperação de informações.” [13].

 

Nas considerações transcritas por Hugo de Brito, denota-se clara a preocupação não só com os valores que são agregados, mas também com a inexistência de auto-suficiência no sistema utilizado pelos provedores, pelo que conclui:

 

“Ao se afirmar que o provimento de acesso não é condição necessária e suficiente à realização do fenômeno comunicacional, quer-se informar que os mecanismos tecnológicos do provimento de acesso não viabilizam, por si sós, a comunicação (suficiência), bem como não são indispensáveis para que a comunicação se efetive (necessidade)”. [14]

 

Entendendo de maneira semelhante, respaldando seu entendimento também em resolução da ANATEL[15], Sacha Calmon Navarro Coêlho discorre sobre o assunto:

 

“Devemos entender que o serviço prestado pelos provedores de acesso à Internet é um Serviço de Valor Adicionado, não se enquadrando como serviço de comunicação, tampouco serviço de telecomunicação. Este serviço apenas oferece aos Provedores de Acesso à Internet o suporte para que o Serviço de Valor Adicionado seja prestado, ou seja, o primeiro é um dos componentes no processo de produção do último.” [16].

 

Em que pese o entendimento muito bem fundamentos pelos ilustres ícones do direito tributário nacional, como ocorre via de regra, há posição contrária, pautada em relevantes fundamentos de direito.

 

Aqueles que entendem que entendem que o provimento de acesso é passível de tributação pelo ICMS, justificam sua posição, mais das vezes, na brilhante explanação de Marco Aurélio Greco (vide nota de rodapé n.º 3). O próprio autor esclarece em seus trabalhos o porque entende serem os serviços de provimento passíveis de tributação pelo ICMS:

 

“Entendo que o serviço prestado pelo provedor de acesso à Internet configura serviço de comunicação, estando abrangido pelo âmbito de incidência do ICMS de competência estadual. (...)

A primeira razão apoia-se na concepção de serviço em função do tipo de atividade exercida, ou seja, colocando a tônica no prestador de serviço. Dessa ótica, serviço de comunicação está ligado ao fornecimento de um meio para que alguém transmita mensagens. Ora, se o provedor de acesso fornece um meio diferente, um ambiente especial (= a segunda camada) que não se confunde com o ambiente que o serviço de telefonia proporciona (= a primeira camada). Telefonia é o meio físico apenas, Internet é meio lógico superposto ao físico apenas; um é fluxo contínuo o outro é em pacotes; um se dá mediante conexão constante enquanto outro pelo melhor caminho possível etc. Ou seja, o serviço prestado pelo provedor é de viabilizar um ambiente específico de transmissão de mensagens com características próprias para que haja comunicação com terceiros.

A segunda razão apoia-se na concepção de serviço como utilidade obtida, ou seja, colocando a tônica no usuário.”[17]

 

Dada a especialidade dos serviço fornecido pelos provedores de acesso a Internet, o qual tem características próprias, desenvolvidas em ambiente virtual singular, através da remessa de dados logicamente organizados, diversamente verificável nos procedimentos atinentes a telefonia, diversos doutrinadores tem entendido que o provimento é tributável pelo ICMS, dentre eles podemos citar Celso Ribeiro Bastos:

 

“Não há negar-se que na Internet há uma comunicação num ambiente próprio, qual seja, o computador. Através do acesso a Internet a comunicação se faz por intermédio do envio de mensagens, da reprodução de sons e imagens, dentre outros. Portanto, existe ali um ambiente de comunicação diferente do que é propiciado pelos serviços de telefonia, onde a troca de informações se encontra restrita à reprodução, ou transmissão de som. Em assim sendo, resta claro que há criação de um novo meio de comunicação e, por conseguinte, de uma nova prestação de serviço de comunicação que é realizado pelos provedores de acesso à Internet” [18].

 

Compartilhando do entendimento anterior temos os esclarecimentos de Carlos Henrique Abrão:

 

Decisiva e definitivamente, abrigou a Constituição Federal de 1988, no seu art. 155, II, a expressão genérica, global e, pois, abrangente de serviços de comunicação, querendo se referir a todo e qualquer meio que levasse o informe no âmbito de proporcionar ao usuário um serviço de conotação remunerada, independentemente de sua natureza, porquanto a própria comunicação telefônica, englobada de telefonia celular, também encontra incidência do ICMS.

Delimitando o panorama analisado, dentro de sua vertente, plausível se faz sublinhar, adotando o caráter genérico do serviço de comunicação, ser possível tributar ICMS no serviço disponibilizando a partir do provedor, dando acesso às multifunções disciplinadas pelo serviço da Internet.”[19].

 

De uma maneira geral, os posicionamentos a favor da tributação pelo ICMS do serviço de provimento e acesso à Internet, tem como base o conceito primário da norma raiz do ICMS, onde não se verifica adequada a adoção da LGT para a conceituação do termo “serviços de comunicação”, seria o que se aproxima do sentido literal da linguagem adotada pelo legislador. Nesse passo, tais doutrinadores também exercitam suas reflexões no sentido de diferenciar e distanciar os serviços prestados pelas empresas de telecomunicação dos serviços dos provedores.

 

Enquanto uns utilizam mecanismos de interpretação pautados no Código Tributário Nacional, outros se fixam no sentido finalístico do termo, impondo verdadeiro impasse à situação.

 

 

3.3 - TRIBUTAÇÃO PELO ISS

 

 

Uma vez esclarecida a posição do fisco Estadual acerca da possibilidade de tributação pelo ICMS, passa-se, neste momento, a verificação dos argumentos lançados pela Fazenda Municipal.

 

As Municipalidades, de uma maneira geral, a exemplo dos Estados, buscam aplicar a tributação à tantas quantas forem as hipóteses de incidências verificáveis, não escapa dessas possibilidades o provimento de acesso à Internet. Nesse passo, tendendo aplicar a tributação segundo sua esfera de competência, os Município sustentam que o serviço prestado pelos provedores de acesso seriam passíveis de incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN.

 

A base legal dessa figura de tributação é verificada inicialmente na Constituição em seu art. 156, III:

 

“Art. 156. Compete ao Municípios instituir impostos sobre:

...

III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar:”

 

O comando Constitucional estabelece aos Municípios a competência de tributar os serviços não tributados pelo ICMS, os quais devem ser previstos em lei complementar. Já na esfera compreendida pela lei complementar, temos que tais serviços estão previstos na lista definida pela LC n.º 56/87, que dá nova redação à Lista de Serviços a que se refere o art. 8º do Decreto-lei n.º 406, de 31 de dezembro de 1968, o qual por sua vez estabelece as normas gerais aplicáveis ao imposto sobre serviços de qualquer natureza.

 

Certo é, no entanto, que na lista de serviços do Decreto-lei n.º 406 não se verifica disposto especificamente a denominação “serviço de provimento ao acesso à Internet”, motivo pelo qual alguns entendem não ser possível a tributação pelo ISSQN ante a inexistência de previsão legal (princípio da legalidade tributária).

 

A corrente que entende ser tributável, o provimento de acesso, pelo ISSQN, busca enquadrar a atividade no item referente ao “serviço de processamento de dados”.

 

Não há como negar que o provimento ao acesso à Internet é caracterizado especificamente pelo processamento de dados, vez que, o aludido processamento é, na verdade, a atividade mister do provedor, que nada mais faz do que, através de seus sistemas, decodificar e codificar as informações “processando-as” de modo a possibilitar a comunicação. Nesse modo de entender, exclui-se por completo a possibilidade de incidência do ICMS na medida de que o serviço prestado em nada se relaciona com os serviços de comunicação, onde também é utilizada toda a argumentação contraria a aplicação do ICMS, retro suscitada.

 

Considerando o provimento de acesso como serviço de valor adicionado, tem-se pois a impossibilidade de incidência de ICMS, dando azo a defesa de que tal serviço tratar-se-ia de serviço de processamento de dados.

Em verdade, o serviço de processamento de dados para fins de ISSQN tem aplicação ampla e variada, podendo ser aplicado a todo o tipo de manipulação de dados, sejam eles informatizados ou não, vez que a legislação não faz qualquer menção específica a respeito:

 

“Decreto-lei n.º 406/68

Lista de serviços:

24- Análises, inclusive de sistemas, exames, pesquisas e informações, coleta e processamento de dados de qualquer natureza.”

 

Acerca do assunto, leciona Sérgio Pinto Martins:

 

“Necessariamente, não serão tributados pelo ISS apenas os serviços de processamento de dados por computador, mas qualquer serviço de processamento de dados, inclusive aquele feito manualmente ou por outro tipo de máquina, até por meio de teleprocessamento de dados.”[20]

 

Para essa corrente, em suma, o serviço prestado pelos provedores de acesso à Internet não passa de um serviço de processamento de dados, tributável pelo item 24 da lista de serviços com a redação da Lei Complementar n.º 56/87. O fato de tal serviço chamar-se "acesso à Internet" não transforma a sua natureza, com não transformaria em se tratando de acesso a um outra rede de computadores qualquer.

3.4 - POSIÇÃO DOS PROVEDORES DE ACESSO À INTERNET

 

 

Invocando o princípio da estrita legalidade, os defensores dos interesses dos provedores de acesso, sustentam, ser, a atividade de provimento, insuscetível de tributação, na medida de que, por ser fato jurídico novo não encampado pela legislação vigente, não haveria legislação que respaldasse a tributação. O entendimento esboçado deflui do disposto nos arts.  150, I da CF/88 e 97 do CTN.

 

Partindo desse entendimento, há manifesta contrariedade às alegações de que os provedores prestariam serviço de comunicação, ou àquelas referentes ao entendimento de que prestariam serviço de processamento de dados.

 

Em não havendo norma que discipline especificamente a tributação à atividade de provimento, não haveria como tributá-la.

 

 

3.5 - ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

 

 

A matéria em comento foi tema recentemente discutido no Superior Tribunal de Justiça, onde no Resp 323358/PR, por votação unânime, entendeu-se que o serviço de provimento ao acesso à Internet está sujeito a tributação pelo ICMS.

 

No julgamento do caso, os Ilustres Ministros entenderam que não se trata de serviço de valor adicionado, mas sim, de serviço de comunicação propriamente dito, vez que o provedor utiliza de recursos específicos e próprios à atividade desenvolvida, não se confundindo com o serviço de telecomunicação.

 

Em seus votos, discorrendo sobre o assunto, os Nobres Julgadores fizeram referência a grande parte da doutrina ora transcrita, dentre elas a de Marco Aurélio Greco, Luciana Angeiras e Roque Antônio Carraza.

 

Não sendo necessárias maiores observações a respeito, entende-se que a ementa do referido acórdão é suficiente para a elucidação da posição do C. Tribunal:

 

“TRIBUTÁRIO. PROVEDOR DA INTERNET. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO, ESPÉCIE DE SERVIÇO DE TELECOMUNICAÇÃO. RELAÇÃO DE NATUREZA NEGOCIAL COM O USUÁRIO. FATO GERADOR DE ICMS DETERMINADO. INCIDÊNCIA. LEI COMPLEMENTAR N.º 87/1996. LEI N.º 9.472/1997. 1. Recurso Especial interposto contra v. Acórdão que entendeu que "o provedor de acesso à Internet não presta serviço de comunicação ou de telecomunicação, não incidindo sobre a atividade por ele desempenhada o ICMS". 2. O Provedor da Internet é um agente interveniente prestador de serviços de comunicação, definindo-o como sendo "aquele que presta, ao usuário, um serviço de natureza vária, seja franqueando o endereço na INTERNET, seja armazenando e disponibilizando o site para a rede, seja prestando e coletando informações etc. É designado, tecnicamente, de Provedor de Serviços de Conexão à INTERNET (PSC), sendo a entidade que presta o serviço de conexão à INTERNET (SCI)". (Newton de Lucca, em artigo "Títulos e Contratos Eletrônicos", na obra coletiva Direito e INTERNET", pág. 60) 3. O provedor vinculado à INTERNET tem por finalidade essencial efetuar um serviço que envolve processo de comunicação exigido pelo cliente, por deter meios e técnicas que permitem o alcance dessa situação fática. 4. O serviço prestado pelos provedores está enquadrado como sendo de comunicação, espécie dos serviços de telecomunicações. 5. A Lei Complementar n.º 87, de 13/09/1996, estabelece, em seu art. 2º, que incide o ICMS sobre "prestações onerosas de Serviços de Comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição a ampliação de comunicação de qualquer natureza", círculo que abrange os serviços prestados por provedores ligados à INTERNET, quando os comercializam. 6. Qualquer serviço oneroso de comunicação está sujeito ao pagamento do ICMS. 7. A relação entre o prestador de serviço (provedor) e o usuário é de natureza negocial visando a possibilitar a comunicação desejada. É suficiente para constituir fato gerador de ICMS. 8. O serviço prestado pelo provedor pela via da Internet não é serviço de valor adicionado, conforme o define o art. 61, da Lei n.º 9.472, de 16/07/1997. 9. Recurso provido. (RESP 323358/PR; RECURSO ESPECIAL (2001/0056816-9) DJ DATA: 03/09/2001, PG:00158, RDDT VOL.:00074, PG:00153, Min. JOSÉ DELGADO , 21/06/2001, T1 - PRIMEIRA TURMA).”

 

Do referido acórdão, verifica-se que o STJ entendeu que dada a especialidade do serviço prestado, o mesmo é suscetível de tributação pelo ICMS. Nas razões que respaldam a decisão, verifica-se que a tributação pelo ICMS é pautada na norma raiz que estabelece as hipóteses de incidência (art. 2.º da LC n.º 87), não dando guarida às teorias acerca das normas de interpretação da legislação tributária.

 

Na verdade não se afastou a aplicabilidade da LGT, o que se verificou foi que o serviço de provimento não é caracterizado como serviço de valor adicionado, conforme o define o art. 61, da Lei n.º 9.472, de 16/07/1997.

 

Trata-se, pois, de um primeiro entendimento do STJ acerca  da matéria, passível, portanto, superação, sendo certo, contudo, que o referido aresto nos dá um panorama do que está por vir.

 

Na integra do V. Acórdão verifica-se que os Nobres Ministros efetivamente compulsaram as mais recentes e importantes obras que tratam do assunto. Não é demais salientar que as atividades que envolvem sistemas de tecnologia demandam profundos estudos, na medida em que a especificidade da matéria tende a dificultar sua compreensão, e impor a multiplicidade de entendimentos acerca do tema.

 

Não é por outro motivo, senão este, que o debate acerca da tributação do serviço de provimento ao acesso à Internet tende a gerar muita discussão nos períodos que se seguem.

 


 

 

 

 

 

 

4 – CONCLUSÕES

 

 

Da análise dos fatos e razões trazidos à colação no presente trabalho, verifica-se que a estrutura normativa brasileira nem sempre está preparada para albergar e dirimir toda a sorte de conflitos oriundos  das possibilidades fáticas apresentadas pela evolução da sociedade.

 

Não é demais ressaltar, que, quando da promulgação da Constituição Federal de 1988, a informática era uma realidade e seus contornos revolucionários se mostravam pujantes. Desta feita é importante verificar que, havendo o fato da informática quando da instauração da atual ordem jurídica, é de se entender que seus ditames estariam de acordo com os fatos jurídicos então existentes. Ocorre que, a realidade dos fatos se apresentam antes do aparecimento da norma, criando uma lacuna temporal entre o fato e a norma jurídica tendente a regulamentá-lo.

 

Certo é, contudo, que nas normas jurídicas existentes no país, verifica-se a possibilidade de adequação do fato “provimento de acesso” a diversas leis tributárias, onde todas as correntes apresentadas têm sólida fundamentação, e aplicabilidade patente acerca de suas posições.

 

Toda discussão se acirra ainda mais na medida que se verifica a interferência do interesse do poder público na tributação dos provedores de acesso. A queda de braço entre o fisco e os contribuintes sempre foi palco de discussões homéricas, variando, de acordo com a época e o tema em voga, a favor do fisco ou dos contribuintes.

 

Especificamente acerca do serviço de provimento ao acesso à Internet, temos que a discussão é recente e que as posições, por mais fundadas que estejam, são passíveis de eficaz impugnação por parte daquele que tenha interesse colidente.

 

É correto afirmar que existe respaldo normativo tanto para a tributação pelo ICMS, como pelo ISSQN, ou até mesmo para a ausência de tributação. Sendo assim, existem duas claras possibilidades para por fim às discussões, ou os tribunais superiores sedimentam definitivamente a matéria, usando para tanto a legislação existente, ou o poder legislativo se propõe a produzir norma tendente a disciplinar de maneira específica o tema. Certo é, contudo, que tanto uma quanto a outra possibilidade, demandam de tempo para sua implantação, do que se conclui que o debate permanecerá ainda por um longo tempo.

 

 


5 – BIBLIOGRAFIA

 

BRUNO, Gilberto Marques. A disputa pela fatia da arrecadação tributária na Internet. http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=1968. Acesso em:  08 Jun 2002.

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SCHOUERI, Luís Eduardo. (Org.) Internet o direito na era virtual. Rio de Janeiro: Forense, 2001. 2. ed. ampl.

SEVERINO, Antônio J. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Cortez, 2002. 22. ed. rev. e ampl.

 



[1] REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. São Paulo: Saraiva. 1995. 22. ed., p. 64 e 65.

 

[2] Bit é a menor unidade na notação numérica binária, que pode ter o valor 0 ou 1; é a menor unidade de dado que um sistema pode tratar.

[3] I) Uma primeira camada corresponde ao que se poderia chamar de “camada de ligação física” entre o usuário e o seu provedor de acesso. Esta primeira camada é viabilizada pela prestadora de telefonia na medida que estabelece uma ligação telefônica entre dois pontos físicos (números telefônicos) da sua rede. Esta camada abrange:

a) meio físico utilizado para a ligação, ou seja, o telefone, um cabo de fibra ótica, uma antena parabólica etc.;

b) o usuário que se liga ao provedor; e

c) a rede de telefonia fixa com os respectivos números discados para se dar a conexão.

Neste nível de ligação, procede-se da mesma forma que outras ligações físicas para destinatários dentro da rede de telefonia.

II) Uma vez estabelecida esta ligação física, como em ambas as pontas da ligação física há computadores, ao invés de singelos aparelhos telefônicos, ambos passam a trocar mensagens entre si com o objetivo de instaurar uma camada mais complexa de comunicação. Neste momento é atribuído ao usuário, pelo provedor, um endereço lógico que irá permitir que ele seja reconhecido pelos demais da rede. Por sua vez, o provedor de acesso está ligado a um backbone, assim entendido um conjunto de roteadores conectados por canais de transmissão de grande volume de dados.

Esta Segunda camada pode-se denominar “camada de conexão lógica” na medida em que, estando o usuário conectado à rede e tendo recebido um endereço IP alocado pelo provedor de acesso, passa a fazer parte da rede, podendo instaurar-se uma conexão entre dois endereços IP. Nesse momento, o usuário no brasil, a quem foi alocado um endereço lógico, passa a poder se conectar com outro usuário em outro País a quem foi alocado outro endereço lógico.

III) A esta Segunda camada superpõe-se terceira  que é a “chamada de aplicativos” em que são acionados softwares que irão desempenhar funções específicas como um navegador (browser), ou um programa de “bate-papo” (chat), ou um motor de pesquisas na rede, ou um programa de correio eletrônico etc. A rigor podem ser executados diversos aplicativos ao mesmo tempo pelo mesmo usuário, inclusive conectando cada um deles a endereços IP situados em distintos lugares do mundo (por exemplo, mediante a abertura de várias “janelas” no browser).In GRECO, Marco Aurélio. Internet e direito. São Paulo: Dialética, 2000. 2. ed. rev. e ampl. p. 127 e 128.)

 

[4] SCHOUERI, Luís Eduardo. (Org.) Internet o direito na era virtual. Rio de Janeiro: Forense, 2001. 2. ed. ampl. p. 231.

[5] MACHADO, Hugo de Brito. Aspectos fundamentais do ICMS. São Paulo: Dialética, 1997. p. 22.

[6] Também a lei complementar não cria tributo, a não ser nos casos em que a Constituição o determina, colocando a criação do tributo em campo reservado a esta espécie normativa. A criação de tributo é, em princípio, obra do legislador ordinário. Por isso mesmo é na lei ordinária é que se encontra definida a situação de fato que, se e quando acontecer, fará nascer o dever jurídico de pagar o tributo. Em outras palavras, é a lei ordinária que descreve a hipótese de insidência tributária, cuja concretização é conhecida como fato gerador do tributo, porque faz nascer a obrigação tributária, vale dizer, o dever de pagar o tributo. Id Ibid. p. 22

[7] In ICMS. São Paulo: Malheiros, 1999. 3. ed. p. 97. Apud SCHOUERI, Luís Eduardo. (Org.) Internet o direito na era virtual. Rio de Janeiro: Forense, 2001. 2. ed. ampl. p. 231.

[8] MACHADO, Hugo de Brito. Aspectos fundamentais do ICMS. São Paulo: Dialética, 1997, p. 37 e 38.

 

[9] In, GRECO, Marco Aurélio. Internet e direito. São Paulo: Dialética, 2000. 2. ed. rev. e ampl. p. 122.

[10] In MARTINS, Ives Gandra da S. (Coord.) Tributação na Internet. São Paulo: Revista dos Tribunais – Centro de Extensão Universitária, 2001. p. 133.

[11] Apud ROSA JR., Luiz Emygdio F. da. Manual de direito financeiro e direito tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 1995. 10. ed. rev. e atual. p. 431 e 432

 

[12] In MARTINS, Ives Gandra da S. (Coord.) Tributação na Internet. São Paulo: Revista dos Tribunais – Centro de Extensão Universitária, 2001. p. 49

 

[13] In In MARTINS, Ives Gandra da S. (Coord.) Tributação na Internet. São Paulo: Revista dos Tribunais – Centro de Extensão Universitária, 2001 p. 89

[14] Id. Ibid., p. 89

[15] “Resolução da Anatel n.º 73, de 25 de novembro de 1998:

Art. 3.º Não constituem serviço de Telecomunicações:

I – o provimento de capacidade de satélite;

II – a atividade de habilitação ou cadastro de usuário e de equipamento para acesso de serviços de telecomunicações;

III – os serviços de valor adicionado, nos termos do art. 61 da Lei 9.472 de 1997.

Parágrafo único. A Agência poderá estabelecer outras situações que não constituam serviços de telecomunicações, além das previstas neste artigo”

[16] In MARTINS, Ives Gandra da S. (Coord.) Tributação na Internet. São Paulo: Revista dos Tribunais – Centro de Extensão Universitária, 2001. p. 104

 

[17] In GRECO, Marco Aurélio. Internet e direito. São Paulo: Dialética, 2000. 2. ed. rev. e ampl. p 131 e 132.)

[18]  In MARTINS, Ives Gandra da S. (Coord.) Tributação na Internet. São Paulo: Revista dos Tribunais – Centro de Extensão Universitária, 2001. p. 74

[19] In MARTINS, Ives Gandra da S. (Coord.) Tributação na Internet. São Paulo: Revista dos Tribunais – Centro de Extensão Universitária, 2001. p. 200

 

[20] In MARTINS, Sergio P. Manual do imposto sobre serviços. São Paulo: Atlas, 2000. 3. ed. atual., rev. e ampl. p. 91