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Autor: Antônio Henrique
Gabriel *
Sancionada pelo
Presidente da República em 31 de julho último, a Lei Complementar nº 116/03
institui e consolida toda a legislação concernente ao Imposto Sobre Serviços de
Qualquer Natureza até então vigente. A nova norma manteve alguns institutos já
consagrados no Decreto-lei 406/68. Inegavelmente, como tudo na vida tende a
evoluir, trouxe também inovações quanto à responsabilidade dos contribuintes,
domicílio tributário, regime de recolhimento das chamadas sociedades simples
(nomenclatura adotada pelo novo Código Civil para se referir às sociedades
civis), etc. Destacamos algumas;
Já no artigo
primeiro da lei nova, o legislador federal entendeu por bem considerar a
incidência do ISS mesmo que a atividade do contribuinte não seja
preponderantemente a de execução de serviços. Com isso, apesar de existirem
sólidos posicionamentos em contrário, alguns lastreados até mesmo na
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, entendemos que superada está a
distinção feita entre a preponderância da função realizada pelo contribuinte
para se fixar incidência do ISS ou do ICMS.
Clara é a Lei
Complementar 116/03 sobre este tema, não havendo mais razão para este assunto
ser solucionado pela jurisprudência. Assim, imaginemos uma sociedade simples
que tenha como objetivo social vender cortinas. Neste ramo de atividade, como
previa o Decreto-lei 406/68, comum é a absorção do serviço pela venda, situação
que sujeitava o contribuinte somente ao ICMS. Agora, mesmo que a instalação
seja a parte minoritária da atividade negocial realizada pela sociedade, haverá
a incidência do ISS, bastando, para isso, que haja previsão legal para esta atividade
na lista de serviços anexa à norma comentada.
No parágrafo
primeiro, do mesmo artigo, inovou mais uma vez o legislador, frisando que
haverá a incidência do ISS sobre os serviços provenientes do exterior ou que
tenham seu início fora dos limítrofes brasileiros.
Imaginemos que o
Governo Federal resolva, visando a modernização do Sistema de Vigilância da
Amazônia – SIVAM – contratar uma empresa estrangeira para desenvolver um
software, ou seja, um produto personalizado, somente possível de uso no Brasil.
Embora o desenvolvimento deste serviço seja feito realizado integralmente no
exterior, sua execução, (instalação e verificação se o programa funciona) será
no Brasil, e, em conseqüência disso, incidirá o ISS.
Não há que se
confundir realização do serviço com a sua execução. O legislador deixou bem claro
que mesmo que o serviço seja feito fora do Brasil, mas em sendo aqui executado,
haverá a incidência do tributo mencionado.
Não se trata aqui de
nova exceção ao princípio da territorialidade contido no artigo 102 do Código
Tributário Nacional. Não é isso. O município não vai fazer incidir a sua
legislação no estado estrangeiro, já que nem competência para fazê-lo possui. O
ente com a competência tributária descrita no artigo 156 da Constituição
Federal exercerá o poder de cobrança daquilo que lhe pertence, ou seja, do ISS
devido em função dos serviços realizados em sua base territorial.
Outra possibilidade
elencada no mesmo parágrafo primeiro refere-se aos serviços que tiveram o
início de sua execução no exterior, desenvolvendo-se, em continuidade, no
território nacional. Se, por exemplo, a Bolívia resolve celebrar acordo com o
Brasil objetivando a construção de um novo oleoduto para o escoamento de
petróleo. Iniciando esta obra no estado estrangeiro, ao adentrar em nosso
território, haverá a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza.
No parágrafo
terceiro, com o objetivo de afastar a definição desses assuntos pela
jurisprudência, o legislador originário da Lei Complementar 116/03, frisou que
mesmo havendo a exploração de serviços prestados sob o regime de permissão ou
concessão, haverá a incidência do tributo municipal.
Entendemos que o
objetivo do legislador, neste ponto, foi deixar bem patente que, embora as
empresas privadas exerçam funções públicas por delegação do Estado, não assumem
as prerrogativas deste no que tange à imunidade tributária. Por conseguinte,
devem se sujeitar às normas atinentes aos
empreendimentos privados, pagando todos os tributos incidentes em função
da atividade exercida.
No último parágrafo,
ainda do artigo primeiro, mencionou-se que para a determinação do ISS pouco
importa a nomenclatura utilizada pelo contribuinte em seu controle gerencial. A
jurisprudência pátria vinha de forma tímida inclinando-se neste sentido,
principalmente para negar vigência a Súmula 588 do STF face aos serviços
bancários novos criados após pelas Instituições Financeiras após a edição da
Lei Complementar 56/87.
Comum são os casos, alguns típicos de elisão fiscal, em que
o sujeito passivo da obrigação tributária denomina a sua atividade de forma
diferente a exposta na lei visando fugir de sua literalidade.
Não há porque se
restringir à incidência da norma tributária por este motivo. Isso seria
preciosismo. Somente em sede de Direito Penal tal raciocínio, onde se se exige
a expressa descrição da figura típica na norma incriminadora, isso é válido. Já
em Direito Tributário, para a configuração do fato gerador, busca-se a base
econômica e real da função realizada pelo contribuinte. Este ramo do direto vai
às raízes de outras ciências para trazer o que venha a ser economicamente
relevante para a cobrança dos recursos indispensáveis à manutenção do Estado.
Exemplo comum que
enfrentamos em nosso órgão recursal versava sobre o enquadramento dos
contribuintes na função de despachantes policiais. Estes, visando fugir do
enquadramento do recolhimento de ISS pelo regime de ESTIMATIVA, modificavam
suas atividades para “controle de documentação junto ao Detran”. Endentemos que
independente do nome a ser utilizado pelo sujeito passivo, configurando-se os
elementos da função de despachante, deveria haver o recolhimento de ISS por
Estimativa, senão, estaria o Poder Público tratando de forma desigual pessoas
estivessem em situações análogas.
Em artigo anterior [1] sustentamos o raciocínio de que o ISS
deve incidir abstraindo-se a nomenclatura da atividade realizada.
Portanto, a mudança
trazida na nova legislação é extremamente benéfica aos municípios, sendo que as
discussões quanto a taxatividade e literalidade da lista de serviços, aos poucos,
perderão força junto ao Poder Judiciário.
Continuam sem eficácia as chamadas isenções heterônimas, ou
seja, aquelas não confirmadas pelos respectivos Poderes Públicos após a
promulgação da Constituição Federal de 1988 - (art. 41 do ADCT). A Lei Complementar 116/03, ao revogar o
artigo 11 do Decreto-lei 406/68, assim como previa a Lei Complementar 22/74,
apenas manteve uma situação que já não vigorava mais.
Isenção é instituto
de política fiscal, necessitando de norma específica como dispõe o CTN para a
sua concessão e ainda, deve o poder concedente atentar aos princípios contidos
na Lei Complementar 101/00 – Lei de Responsabilidade Fiscal.
Deixando isso expresso em seu corpo, a nova lei sepulta de
vez discussões a esse respeito, estando mais evidente do que nunca que as obras
contratadas com o Poder Público não gozam, a princípio, de isenção.
Outro ponto inovador
trazido pela lei foi o local da prestação de serviços. Ao contrário do que
algumas prefeituras insistiam em fazer, a Lei Complementar 116/03 manteve a
regra do local do domicílio tributário para a fixação territorial do ISS. A
novidade é que em caráter excepcional poderá ser cobrado este imposto no lugar
onde se desenvolveu na prática o fato gerador.
Isso não é regra.
Tanto é norma de aplicação subsidiária que o art 3º da Lei Complementar
descreve que somente em caráter excepcional o imposto será devido no local da
execução do serviço.
Inovou o legislador
e inovou bem. A legislação anterior não acompanhou o avançar dos tempos,
deixando lacunas por onde existiam formas de evasão de receitas dos municípios.
Corroborando nosso
entendimento sobre o assunto, embora até a edição da Lei Complementar 116/03
ela era minoritário na doutrina, entendemos que continua mantida a
impossibilidade de dedução de materiais na área de construção civil, quando
estes materiais não forem fornecidos pelo prestador de serviço.
Pode-se concluir isso ao se analisar que a Lei Complementar
nº 116/03 revogou expressamente os incisos III, IV, V e VII do art. 3o do
Decreto-Lei no 834/69, sendo que esta norma dava suporte àqueles que insistiam
na possibilidade de dedução.
Ousamos, para não
parecermos omissos, externar nossas razões, em apertada síntese, sobre o
assunto.
Em primeiro lugar
com o advento da Constituição Federal de 1988, as chamadas isenções heterônimas
perderam eficácia, como já fora dito acima. Ora, não pode mais a União fazer
caridade com o chapéu alheio. Logo, não pode o Governo Central conceder isenção
de tributo que não lhe compete.
Em segundo,
indaga-se, por quê só o setor de construção civil tem este benefício? Sabemos
que quando o Decreto-lei 406/68 foi criado, atendeu a fatores como a
implementação e o desenvolvimento do país; aumento do número postos de
trabalhos, e fomento da iniciativa privada para a realização de grandes obras
de engenharia. Sabemos disso!
Mas, como diz
Kelsen[2], o que está fora da lei não interessa ao direito.
Utilizando-se da
lógica jurídica, sustentamos a pergunta, por que só a construção civil tem este
benefício e um outro setor, como o de saúde que é tão relevante socialmente
como, não o possui?
Infelizmente, ao
fazermos esta indagação não obtivemos fundamento de validade, para sustentar a
vigência da dedução, no ordenamento jurídico-constitucional brasileiro.
A própria CF em seu
artigo 150, II menciona que não pode haver tratamento desigual entre
contribuintes que estejam em situações equivalentes, portanto, já entendíamos
antes da edição da Lei Complementar 116/03 que não era mais possível à
permanência da dedução para a área de construção civil.
Ora, se uma oficina
mecânica ao realizar um serviço qualquer com compra graxa e querosene não pode
deduzir isso na base de cálculo do ISS, por quê um empreiteiro poderá fazê-lo,
se utilizar os mesmos produtos na construção de um prédio? Isso não violaria o artigo 150, II da
Constituição?
Portanto, retornando
a idéia exposta no começo do tópico, hoje, com a vigência da Lei complementar
116/03, não pode haver o abatimento de materiais da base cálculo, salvo se
estes forem fornecidos pelo prestador de serviço.
A nova lei do ISS
acabou com o enquadramento diferenciado dos profissionais liberais/sociedades
uniprofissionais do regime de FIXO de recolhimento de ISS.
Assim, antes desta
norma três eram as formas possíveis para o lançamento do ISS; recolhimento por
APURAÇÃO MENSAL; recolhimento pelo regime de ESTIMATIVA e o chamado regime
FIXO.
O regime FIXO era
muito mais vantajoso para os profissionais liberais pelos seguintes motivos; a)
não estavam obrigados a efetuar a recolhimento de diferença de base de cálculo
caso tivessem um desempenho econômico superior ao lançado pelas prefeituras e,
principalmente, b) sendo sociedades uniprofissionais, o ISS seria lançado por
profissional integrante da sociedade.
Esta última situação
gerava algumas distorções. Empresas de grande porte na área de advocacia,
contábil, médica, etc, possuíam desempenho econômico infinitamente superior ao
lançado pelo fisco, sem que este pudesse exigir a complementação do valor
lançado. A solução utilizada por
algumas fiscalizações municipais era mediante um árduo trabalho de investigação
- o qual, às vezes, esbarrava nas prerrogativas constitucionais e profissionais
de cada um desses contribuintes – desenquadrá-los do regime uniprofissional.
Outras prefeituras, porém, optavam por lançar o ISS pelo número de empregados,
o que o Superior Tribunal de Justiça já mencionou em algumas decisões não ser
correto.
Enfim, polêmicas à
parte, parece-nos que com a vinda ao mundo jurídico da Lei Complementar 116/03
o regime de recolhimento de ISS FIXO dará os seus últimos suspiros em 31 de
dezembro de 2003.
Poder-se-ia indagar:
mas se não existe o regime FIXO, como os profissionais liberais recolherão o
ISS?
Uma coisa é a
incidência, esta não foi abalada. Há na lista de serviços anexa à Lei
Complementar 116/03, previsão quanto a isso. Entretanto, caberá a cada
prefeitura determinar se os profissionais liberais passarão para o regime de
APURAÇÃO MENSAL ou de ESTIMATIVA. Esta última continua sendo possível, visto
que decorre de previsão constitucional (art. 150, § 7º da CF) e não foi
alterada pela lei nova.
Alíquota máxima do
ISS será de 5%, sendo que a mínima embora não prevista em lei, está estipulada
na Emenda Constitucional nº 037, sendo de 2%.
Como último
comentário, mencionamos que cada município deverá editar a nova norma, visando
adaptar-se às diretrizes trazidas pela nova lei, sendo que a efetiva cobrança
do ISS com base nela só poderá ser feita no exercício seguinte.
A Lei Complementar 116/03 trouxe novas com atividades
sujeitas à incidência do tributo municipal. Instituir a vigência a partir deste
ano seria afrontar o Princípio Anterioridade, parte de sua estrutura refere-se
a normas gerais que regulam obrigações acessórias. Convictos estamos que não
poderá nenhuma prefeitura exigir isso ainda este ano.
É o que tínhamos a comentar, sendo que estamos em fase final
elaboração de comentários item a item quanto às mudanças da nova lista de
serviços.
Atenciosamente
Antônio Henrique Gabriel
Presidente da Junta de Recursos Fiscais do Município de
Guarujá/SP – Bel em Direito pela Universidade Católica de Santos –
Ex-presidente do Centro “Acadêmico Alexandre de Gusmão”.
A nova Lei do ISS
Antonio Henrique
Gabriel
Pres. da Junta de Recursos Fiscais de Guarujá
Rua Mário Ribeiro . 261 – Praia de Pitangueiras – Centos –
Guarujá
F(s) 13 – 3386 92 46
13. 91468304
[1] Súmula 588 do STF x ISS das Instituições Financeiras –
artigo disponibilizado nos sites
www.jus.com.br; www.faroljuridico.com.br; www.advogado.adv.br
[2] Hans Kelsen -
Teoria Pura do Direito.
--------------------------------------------------------------------------------
Autor: Antônio
Henrique Gabriel
Bel. em Direito pela Universidade Católica de Santos, ex-presidente do Centro Acadêmico Alexandre
de Gusmão e atual Presidente da Junta de Recursos Fiscais do Município de
Guarujá
Email.jrfguaruja@globo.com.br
Endereço: Rua Mário Ribeiro 261, Centro, Guaruja-SP
Fone: 13 91468304
Retirado de: http://www.advogado.adv.br