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As diversas acepções da palavra "tributo" para o Código Tributário Brasileiro.

 

 

Maria Augusta de Albuquerque Melo Diniz
mariaaugustadiniz@bol.com.br - novembro/2001

1.0. Introdução:

Cada fonte do Direito possui uma função especial. Geralmente, a doutrina tem a atividade de conceituar e detalhar a lei. Entretanto, a lei tributária definiu o tributo, em face da complexidade do assunto e das múltiplas divergências doutrinárias. Tal conceituação encontra-se no artigo 3º do Código Tributário Nacional. O presente trabalho tenta, timidamente, demonstrar as acepções da palavra tributo, de acordo com o Código tributário Nacional e a doutrina pátria e especialmente, segundo o doutrinador Paulo de Barros Carvalho.

 

2.0. Conceito de Tributo para o Código Tributário Nacional:

"art. 3º. Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sansão de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada."

 

3.0. Interpretação do artigo 3º do Código Tributário Nacional:

TRIBUTO É TODA PRESTAÇÃO...

É objeto de relação jurídica, de uma obrigação. No caso, relação de direito público. Ao contrário das relações privadas, aqui a obrigação não nasce dos contratos, mas diretamente da própria lei.

PECUNIÁRIA...

Devem ser expressos em moeda. Não se pode mais considerar tributos in natura (pagos em bens diversos do dinheiro) nem in labore (pagos em serviços).

COMPULSÓRIA...

Não há a voluntariedade do particular em pagar tributos. Há a compulsoriedade decorrente do poder soberano do Estado no fiel desempenho da atividade financeira.

EM MOEDA...

Como já explicado acima, os tributos devem ser pagos em moeda, devido a sua natureza pecuniária.

OU CUJO VALOR NELA SE POSSA EXPRIMIR...

Aqui, o legislador constituinte, excepcionalmente, admite que a quitação dos tributos seja feita por entrega de bens. Estes devem ser suscetíveis de avaliação pecuniária. É uma situação especial, exigindo, portanto, lei específica com a autorização.

Por exemplo, o decreto-lei nº 195, de 24 de fevereiro de 1967, que dispõe sobre a cobrança da contribuição de melhoria, espécie de tributo, estabelece em seu artigo 12, § 4º:

"é lícito ao contribuinte liquidar a Contribuição de Melhoria com títulos da dívida pública, emitidos especialmente para financiamento da obra pela qual foi lançado; neste caso, o pagamento será feito pelo valor nominal do título, se o preço do mercado for inferior".

É uma opção para o contribuinte, neste caso, quitar a contribuição de melhoria com pagamento em moeda ou com títulos da dívida pública, emitidos especialmente para financiamento da obra pela qual foi lançado. Note-se a existência de uma lei regulando a alternatividade.

QUE NÃO CONSTITUA SANSÃO DE ATO ILÍCITO...

O fato gerador do tributo é um ato ilícito, condenável, enquanto o fato gerador do tributo é um ato lícito. As penalidades tributárias, as multas fiscais e os tributos possuem algumas características comuns, como a compulsoriedade. Entretanto, a finalidade das duas primeiras é uma punição, um castigo pelo cidadão ter violado algum preceito sócio-jurídico. E, a do terceiro, é a própria manutenção do Estado, para que ele adquira recursos e satisfaça as necessidades sociais.

INSTITUÍDA EM LEI...

A Constituição Federal estabelece em seus preceitos algumas limitações ao poder de tributar. São os princípios constitucionais da tributação. Um dos mais importantes princípios expressos é o princípio da reserva de lei ou da legalidade estrita, segundo o qual é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir ou aumentar tributos sem que a lei op estabeleça (art. 150, I). Assim, para que seja cobrado um tributo, deve ele ser tipificado na lei e, excepcionalmente, no decreto (no caso de alteração de alíquotas dos impostos sobre importação, exportação, produtos industrializados e operações financeiras – de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a valores mobiliários – atendidas as condições e os limites estabelecidos na Constituição Federal).

Além disso, há o princípio da anualidade do exercício financeiro, segundo o qual o tributo só será cobrado no exercício seguinte da existência do fato gerador criador da obrigação tributária. Têm-se como exceções a esta regra os impostos sobre a importação, exportação, produtos industrializados, operações financeiras e impostos extraordinários, previstos nos artigos 153, I, II, IV e V e 154.

E COBRADA MEDIANTE ATIVIDADE ADMINISTRATIVA PLENAMENTE VINCULADA.

"Atividade vinculada é aquela em cujo desempenho a autoridade administrativa não goza de liberdade para apreciar a conveniência nem a oportunidade de agir. A lei não estabelece apenas um fim a ser alcançado, a forma a ser observada e a competência da autoridade para agir. Estabelece, além disso, o momento, vale dizer o quando agir, e o conteúdo mesmo da atividade. Não deixa margem à apreciação da autoridade, que fica inteiramente vinculada ao comando legal".

A autoridade administrativa deve atender a princípios e regras descritos na lei, além de ser responsável pela cobrança do tributo determinado.

Descreve o parágrafo único do artigo 142 do Código Tributário Nacional :

"A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional".

Assim, a autoridade não pode cobrar os tributos mediante modos e juízos pessoais, subjetivos, sob pena de delito administrativo e, até mesmo, penal.

 

4.0. Conceito de tributo para a lei 4.320, de 17 de março de 1964:

A lei 4.320 também conceitua o tributo. Aqui, analisa-se sobre outro ângulo, sendo definido em seu artigo 9º como "a receita derivada, instituída pelas entidades de direito público, compreendendo os impostos, taxas e contribuições de melhoria, nos termos da Constituição Federal e das leis vigentes em matéria financeira, destinando-se o seu produto ao custeio de atividades gerais ou específicas exercidas por essas entidades".

 

5.0. Espécies de tributos:

Estabelece o artigo 145 da Constituição Federal que "a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

I – impostos;

II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;

III – contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas".

Além desse preceito, reza o artigo 5º do Código Tributário Nacional:

"Os tributos são impostos, taxas e contribuição de melhoria".

Entretanto, não se pode deixar de considerar os empréstimos compulsórios e as contribuições parafiscais como espécies de tributos.

Segundo o artigo 16 do Código Tributário Nacional, "imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte".

Taxa é o tributo que "tem como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição" (art. 77 CTN).

Contribuição de melhoria é o tributo "instituído para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado" (art. 81 CTN).

Empréstimo compulsório é o "tributo atípico que tem por objetivo absorver, temporariamente, o excesso de poder aquisitivo, com vistas a combater a inflação".

 

6.0. Acepções da palavra "tributo", segundo Paulo de Barros Carvalho:

Segundo Paulo de Barros Carvalho, a palavra "tributo" possui, pelo menos, seis acepções, reproduzidas integralmente abaixo:

 

a) "tributo" como quantia em dinheiro;

b) "tributo" como prestação correspondente ao dever jurídico do sujeito passivo;

c) "tributo" como direito subjetivo de que é titular o sujeito ativo;

d) "tributo" como sinônimo de relação jurídica tributária;

e) "tributo" como norma jurídica tributária;

f) "tributo" como norma, fato e relação jurídica;

 

6.1. "Tributo" como quantia em dinheiro:

É a mais vulgar das acepções. É comum ouvir pessoas, principalmente as menos escoladas, empregar tal sentido. Como exemplos, cita-se: trago-lhe este imposto para você depositar em sua poupança; essa taxa é para que compres o teu presente de aniversário; vamos nos unir, para, com o tributo, ajudarmos os necessitados, entre outros.

Entretanto, esse sentido é utilizado pelo Código Tributário Nacional em seu artigo 166, quando reza: "a restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la".

Tal preceito trata do pagamento indevido, em que o sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento (...) (art. 165 CTN). Aqui, o Código aproveita-se da acepção "tributo" como quantia em dinheiro.

Alfredo Augusto Becker afirma ser o tributo objeto da prestação que satisfaz o dever. Tal dever é o imposto ao sujeito passivo pelo sujeito ativo de efetuar uma determinada prestação. Atribui-se ao sujeito ativo o direito de obter a prestação. Então, como o objeto acima citado é dado por uma "quantia em dinheiro" ao sujeito ativo, a palavra "tributo" utilizada pelo autor tem este sentido, uma vez que o objeto da relação jurídica tributária seria (para ele) o tributo.

 

6.2. "Tributo" como prestação correspondente ao dever jurídico do sujeito passivo:

Nesta segunda acepção, torna-se importante a observância de um relação jurídica e de seus elementos: o sujeito ativo (o Estado), o sujeito passivo (o contribuinte), a prestação (o tributo) e o vínculo (elo que liga os dois sujeitos). É, portanto, o tributo resultante do comportamento de certa pessoa, possuidora de um débito que, devido ao dever jurídico de solvê-lo, deve ser quitado.

 

6.3. "Tributo" como direito subjetivo de que é titular o sujeito ativo:

Nesta, continua a observação do conceito de relação jurídica. Só que, desta vez, por outro ângulo: o do sujeito ativo. Desse modo, o tributo é cobrado devido à soberania e ao direito subjetivo estatais.

 

6.4. "Tributo" como sinônimo de relação jurídica tributária:

Neste âmbito de significação, a relação tributária não parte de um determinado elemento da relação jurídica. Esta é o próprio tributo, que engloba todos os seus elementos. O tributo é a própria obrigação, resultante da realização do fato previsto na norma.

Geraldo Ataliba discorda explicitamente com a segunda acepção ("tributo" como prestação correspondente ao dever jurídico do sujeito passivo), pois afirma a prestação da relação jurídica é diferente do seu objeto. E o tributo não é objeto da relação tributária. Este é "o comportamento consistente em levar dinheiro aos cofres públicos. E este dinheiro – levado aos cofres públicos, por força da relação tributária – recebe vulgarmente a designação de tributo. Juridicamente, porém, tributo é a obrigação de levar dinheiro e não o dinheiro em si mesmo." Explica ele que o direito e suas realidades, por serem abstratos não podem possuir objeto concreto. O dinheiro é objeto do comportamento. Este é que é objeto da obrigação. E, como conceito básico, define o mesmo autor o tributo como: "instituto nuclear do direito tributário (...) como obrigação (relação jurídica)." E, mais adiante afirma ser o sujeito ativo uma pessoa pública (ou delegado por lei desta) e o passivo alguém nessa situação posto pela vontade da lei. Confirma-se, pois, o propósito de conceituar tributo como "relação jurídica tributária".

 

6.5. "Tributo" como norma jurídica tributária:

É o tributo como a própria norma de direito, preceito normativo. Como exemplo, tem-se o artigo 153, inciso III da Carta Magna, estabelecendo: "compete à União instituir impostos sobre: rendas e proventos de qualquer natureza". O que o legislador quis dizer foi: compete à União instituir leis cujo conteúdo seja a cobrança de tributos sobre rendas e proventos de qualquer natureza. Utilizou, portanto, a palavra tributo significando lei, norma, preceito.

 

6.6. "Tributo" como norma, fato e relação jurídica:

O tributo deve ser entendido como todo o processo jurídico: desde a norma que o instituiu, passando pelo caso concreto, nela descrito até o surgimento da relação obrigacional decorrente daquele fato. É nesse sentido que a lei 5.172/66 e o CTN se propõem determiná-lo.

Observe-se:

Lei 5.172/66, art. 3º "Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada".

Como se observa, o conceito descrito nessa lei é idêntico ao exposto no CTN. Ou seja, o tributo é descrito pela lei (princípio da reserva legar tributária), tem-se um caso concreto (o contribuinte deve quitar a prestação) e a cobrança far-se-á por autoridade administrativa plenamente vinculada.

 

7.0. Conclusão:

Diante do exposto e, tendo em vista o modo de compreensão de cada um, notou-se a grande divergência doutrinária em relação à palavra tributo. Isso em razão da grande divergência doutrinária que rege o direito pátrio. E, mesmo o Código Tributário Nacional, por descuido ou até por técnica jurídica, empregou tal palavra em mais de uma acepção.

Tal discussão, bastante salientada por Paulo de Barros Carvalho e seguida por outros doutrinadores, como Geraldo Ataliba, torna-se quase que vã pois o Código, tomando para si o papel da doutrina, definiu o tributo, seguido pela Lei 4.320, de 17 de março de 1964. Resta, então, a cada um posicionar-se de acordo com o melhor entendimento.

 

1.0. Bibliografia:

ACQUAVIVA. Novíssimo Dicionário Jurídico. São Paulo: Brasiliense, 1999.

ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988. 4. ed.

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. São Paulo: Lejus, 1998. 3. ed.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2000. 13 ed.

Código Tributário Nacional.

LAROUSSE. Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Nova Cultural, 1994.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. Brasil: Malheiros Editores, 2001. 19 ed.

ROSA JR., Luiz Emygdio F. Da. Manual de Direito Financeiro e Direito Tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. 15 ed.

 

Fonte: http://www.apriori.com.br/artigos/acepcoes_de_tributo.shtml