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Uma reflexão inicial merece ser desenvolvida quando o doutrinador volta as suas atenções para estudar e analisar as funções institucionais dos Tribunais de Contas no momento contemporâneo, em face das mudanças estruturais que estão sendo implantadas no Estado, especialmente, as já executadas no Brasil.
Esse panorama cultural decorre das trepidações atualmente sentidas na vida dessas Cortes, que exercem atribuições constitucionais visando, na essência e no resultado, garantir o cumprimento dos princípios da moralidade, da legalidade, da razoabilidade, da proporcionalidade, da impessoalidade e da eficiência por parte dos administradores públicos e semipúblicos (agentes privados vinculados ao Estado e que exercem, sob variados tipos de relação contratual, prestação de atos administrativos de império ou atos de gestão).
Nesse contexto de idéias, a atuação dos Tribunais de Contas alcança, na atualidade, patamar de alta responsabilidade contribuidora para o aperfeiçoamento da democracia, haja vista ser impossível a tal órgão desenvolver a imposição das linhas mestras defendidas, fora das homenagens constantes aos princípios já mencionados, tudo em benefício da cidadania.
Uma retrospectiva histórica sobre os ciclos vivenciados pelos Tribunais de Contas no Brasil revela que, a partir de 1832, quando Rui Barbosa, Silveira Martins, Afonso Celso, José de Alencar, Bernardo Pereira de Vasconcelos e outros iniciaram movimento para que o Estado brasileiro passasse a adotar um órgão autônomo, independente e tecnicamente capacitado para auxiliar o Legislativo na fiscalização das contas públicas, já se visualizava que o compromisso dos Tribunais de Contas, pelos membros que os compõem, era com a obediência às regras da moralidade pública e culto fechado aos ditames da legalidade, quando em jogo estivessem interesses financeiros e patrimoniais do Estado.
Célebre, pelo que deve ser relembrado, tornou-se a mensagem de Bernardo Pereira de Vasconcelos, Ministro da Fazenda, em 1832, a proclamar, perante o Legislativo, defendendo a criação dos tribunais fiscalizadores, o seguinte:
“Um câmbio quase ao par da nulidade; um luxo superior às fortunas individuais; a iniqüidade da justiça, a corrupção dos costumes, o peculato dos empregados; a ilimitada depredação de certos homens favorecidos; a emissão extraordinária de moeda sem valor; a pertinácia em certas práticas abusivas e, finalmente, um estado de inchação e não de saúde”
Se esse era o quadro revelador de um tipo de administração pública que, naquela época, não seguia o conteúdo da ética, da moralidade, da legalidade e do respeito à cidadania, o mesmo deve ser dito dos dias de hoje em que a sociedade convive com os mais graves problemas de descumprimento, em alto grau, por uma parcela de agentes públicos, das disposições postas na Carta Magna, especialmente, as retratadas em seu art. 37.
Neste alvorecer do Século XXI, em face das competências que a Constituição Federal de 1988 outorgou aos Tribunais de Contas, urge que eles encontrem o seu verdadeiro perfil e, cada vez, afirmem-se no tecido social estatal como instituição com vocação destinada a homenagear a moralidade, pelo que as suas vestes devem ter o talho determinado pela vontade do povo e com força capaz de fiscalizar e impor controle, no auxílio que prestam ao Poder Legislativo, a todos os excessos dos agentes administrativos, por mínimos que sejam, praticados contra o bem-estar da coletividade, a partir do respeito que devem ter pela dignidade humana, pela garantia dos direitos sociais e individuais do ser humano, pela da sua segurança nas relações jurídicas com o Estado, pelo culto ao trabalho e à livre iniciativa, tudo fazendo para que a pobreza seja erradicada do seio da população, além de outras condições necessárias e sempre integrantes do círculo formador da cidadania.
A caracterização institucional dos Tribunais de Contas no texto da Carta Magna, embora apresente-se complexa e sem uma definição compatível com o papel dele exigido, em face das atribuições definidas no art. 71, I a XX, §§ 1º a 4º, as quais não considero como exaustivas, necessita passar por um processo doutrinário de reavaliação, ajustando-se, pela adoção de uma interpretação sistêmica, ao que de tais Cortes a sociedade e o ordenamento jurídico estão a exigir.
O perfilhar de uma visão integrada do determinado para a presença das Cortes de Contas na Carta Magna permite que elas sejam redefinidas como entidades com compromissos maiores do que de serem simples órgãos informativos do Poder Legislativo e fiscalizadores, quase sem atuação coercitiva definitiva, do emprego das verbas públicas. Há de se conceber que os Tribunais de Contas, neste alvorecer do Século XXI, devem ser vistos como entidades organizadas vinculadas aos destinos da Nação com a cidadania, cuja precípua missão é de guardar, nas relações do agente público e do particular com a administração, a aplicação irrestrita dos princípios da moralidade, da legalidade, da impessoalidade, da publicidade, da eficiência, da continuidade do serviço público, da razoabilidade, da proporcionalidade e dos ideais democráticos.
As prerrogativas deferidas aos membros dos Tribunais de Contas não lhes pertencem. Elas, conforme os parâmetros estabelecidos pelo art. 79, § 3º, da CF, bem como, por dispositivos análogos postos nas Constituições Estaduais, são direitos subjetivos do cidadão que os delegam aos integrantes das Casas de Contas. Por isso, o intérprete deve conduzir a sua pesquisa em visualizá-las, quanto à função constitucional exercida, de modo extensivo e com missão de espelhar natureza concreta no sentido de que as suas atividades provoquem decisões que sejam fortalecidas por carga de executoriedade , em face da representatividade da força da moralidade, da legalidade, da eficiência, da impessoalidade, que a elas se integram.
2. - A ATUAÇÃO DOS TRIBUNAIS DE CONTAS NO MODELO JURÍDICO BRASILEIRO
A maneira ordenada de se conceber o atuar dos Tribunais de Contas, por força dos resultados surgidos da integração das normas que os regem, em confronto com os princípios implícitos e explícitos definidos pela Constituição Federal, está a demonstrar o crescimento de suas atribuições na fiscalização da gestão da coisa pública e a necessidade, imposta pela cidadania, de tornar-se eficaz e efetiva a disposição do Constituinte de 1988 de que a atividade pública há de ser exercida, de modo imperativo, vinculada, unicamente, a construção do bem-comum e apoiada em colunas construídas sobre bases de integridade, honestidade, transparência e amor à Nação.
Esse amplo campo de atuação dos Tribunais de Contas, onde há de exercitar, como já exercita, as suas competências constitucionais, exige condutas voltadas para ajudar na construção de uma democracia plena, pelo que comporta investigar a influência, em suas decisões, de variados aspectos que estão a afligir a humanidade no início deste Século XXI, por atingirem, diretamente, as atividades dos administrados integrantes da comunidade estatal.
Em face do limitado espaço reservado para este trabalho, não há como desenvolver-se um estudo mais detalhado sobre os temas que circundam o funcionamento dos Tribunais de Contas. Passo, então, a enfocá-los, de modo resumido, para que possam ser refletidos pelo estamento social e jurídico ligado ao funcionamento de tais Cortes.
Ei-los:
Os Tribunais de Contas do Século XXI enfrentarão as mudanças a serem impostas pela era atual e, por isso, devem ser instituições voltadas para impor consideração ao cidadão acima do Estado e não ao contrário.
A autonomia dos Tribunais de Contas há de ser aceita como sendo de natureza absoluta, sem qualquer subordinação hierárquica institucional, haja vista que o auxílio que presta ao Legislativo para que possa bem exercer o seu papel de controle e fiscalização das contas públicas, além de ser de natureza constitucional, decorre de julgamento proferido por permissão, também, oriunda da Carta Magna, para definir o acerto perante a lei da aplicação do dinheiro público, proceder que desenvolve-se com vinculação direta ao cumprimento dos princípios insculpidos no art. 37 da CF.
O cenário dos Tribunais de Contas no ordenamento jurídico brasileiro impõe a consideração de ser estreita a via para efetuar-se a revisão judicial das suas decisões. Isso porque a Constituição Federal entrega a eles uma carga decisória definitiva quando aplicam, em seus pronunciamentos, com obediência às regras do devido processo legal, os princípios da moralidade, legalidade, razoabilidade , proporcionalidade , impessoalidade e eficiência no apreciar as contas decorrentes da prática de atos e contratos administrativos.
O juízo emitido pelos Tribunais de Contas, em seu mérito, desde que harmônico com os fatos e com a lei, torna-se insuscetível de controle pelo Poder Judiciário, pois, este, não obstante, formalmente, possa examinar o “decisum” prolatado e guerreado, só lhe resta confirmá-lo, quando baseado em provas e fundamentos incontroversos.
A globalização gera, na época contemporânea, influência nas decisões dos Tribunais de Contas, especialmente, porque há de analisar as conseqüências decorrentes das mega-fusões empresariais nos seus relacionamentos com os Estados, quando envolve liberação de verbas para o funcionamento de tais empresas ou firmação de contratos para a concessão de uso de imóveis, isenções tributárias e outras vantagens, tudo a se desenvolver pela via das concessões e permissões para a exploração de serviços públicos.
De igual modo, fatos como a alta concentração de quantias monetárias retidas pelas instituições financeiras, com a autorização do Governo, pela via do Banco Central, deverão ser analisados e investigados pelos Tribunais de Contas, porque envolvem, muitas vezes, comportamentos contratuais ou prática de atos administrativos que têm forte relacionamento com vultosas somas de dinheiro que pertencem às pessoas jurídicas da administração indireta e que, de modo direto ou não, podem criar favorecimentos prejudiciais ao Estado e à cidadania.
3. A TEXTURA ESTATAL NO SÉCULO XXI E OS TRIBUNAIS DE CONTAS
Ainda, a título de introdução, entendo que os Tribunais de Contas, nestes momentos primeiros do Século XXI, necessitam envolver-se com o que está emergindo na textura social estatal, compreendendo os acontecimentos e ajustando-os, quando necessário, aos reais propósitos da Constituição Federal.
De forma sintética, devem os Tribunais de Contas, por ocasião dos seus julgamentos, envolver-se com os seguintes aspectos:
A questão da adoção da arbitragemna solução dos conflitos nascidos do cumprimento de contratos com o Poder Público, quer por via da administração direta, quer por via da administração indireta, quando houver amparo da lei para ser firmado acordo ou transação.
O exercício da medida cautelar fiscal pelo Estado para a proteção dos seus direitos tributários.
O uso da Ação Monitória contra o Poder Público quando existir dívida constituída sem ato formal autorizativo (empenho, ordem de serviço, etc).
As concessões de vantagens tributárias sem amparo legal a grandes grupos empresarias, com ferimento ao princípio da igualdade.
A verificação das imunidades de tributos a seitas religiosas não reconhecidas; a altos funcionários em missões diplomáticas ou paralelas; a partidos políticos sem registro definitivo; a publicações que servem aos controladores do tráfico das drogas e à exploração do sexo, etc..
A aplicação do princípio da moralidade pelo Estado em relação ao contribuinte.
A responsabilidade do Estado quando executado em ações decorrentes de interesses difusos e coletivos. Inicialmente, os favorecidos não são nominados. Na fase da execução aparecem inúmeros beneficiários da decisão, sem que exista um efetivo controle sobre a identidade dos mesmos.
O prejuízo causado pelo Estado pela demora na prestação jurisdicional e por protelar o cumprimento de decisões judiciais que, antecipadamente, sabe não ter qualquer alcance de êxito.
O impacto da inflação e dos juros nas contas governamentais, desequilibrando a gestão orçamentária. São obscuros os índices inflacionários e manipulados de modo que não há transparência a respeito, abrindo espaço para sensíveis prejuízos serem da responsabilidade do Estado .
A nova mentalidade fiscalizadora quanto ao processo de privatização da prestação dos serviços públicos, tendo-se em conta o art. 37, da CF.
O acompanhamento das empresas privadas no seu relacionamento com o Estado, quando, a título de concessão ou permissão, estão explorando serviços públicos. Os excessos de vantagens recebidas, considerando-se a legislação regedora de tal ajuste e as cláusulas contratuais firmadas.
O combate à corrupção , em decorrência do emprego de novas técnicas sempre aperfeiçoadas, pelo que há de ser empregada interpretação extensiva a qualquer norma que a vise proibir, com aplicação de medidas preventivas.
A influência que as decisões dos Tribunais de Contas tem para definir casos de inelegibilidade.
A contribuição que pode emprestar para a melhoria da prestação dos serviços públicos, com a adoção de regras onde o cidadão seja tido como o centro de atenções e de privilégios, especialmente, no referente à saúde, à educação, à segurança, ao combate das drogas, à proteção dos direitos humanos, ao lazer e à segurança jurídica.
4 - OS TRIBUNAIS DE CONTAS E A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL
A pretensão do Estado em instituir uma Lei de Responsabilidade Fiscal faz parte das reformas de sua base normativa e que estão sendo implantadas pelo Governo atual.
Esse projeto de lei insere-se em um campo filosófico ainda não muito definido, tendo em vista a visão da Ciência Política em determinar se as mudanças sobre o tamanho do Estado devem ser para que ele seja mínimo, médio ou máximo.
O que se tem como verdadeiro é a necessidade de uma regulamentação mais rígida para o exercício da sua gestão, em face dos graves problemas financeiros que está experimentando e em razão de acontecimentos com as seguintes configurações: a) má gestão da administração pública; b) custos excessivos e desnecessários com execução de projetos ditos sociais; c) idem com execução de projetos não sociais e com resultados insuficientes para solucionar as dificuldades vividas pela cidadania; d) os altos compromissos decorrentes dos juros incidentes sobre a dívida interna e externa; e) a influência da globalização a exigir uma nova visão administrativa financeira das contas públicas; f) a força exercida pela concentração de capitais por parte de empresas privadas (as grandes fusões); g) o incontrolável problema da corrupção; h) a universalização do crime e outros e outros fatos plenamente conhecidos da população.
A Lei de Responsabilidade Fiscal, instrumento em fase de ampla discussão e já em vigor, tem por finalidade específica fazer cumprir vontade explicitada nos art. 163 a 169 , que formam o Capítulo II do Título VI, tudo da Constituição Federal. Essa parte da Carta Magna dedica-se a estabelecer normas gerais de finanças públicas, inclusive disposições relativas à elaboração e execução do orçamento. Todos os artigos desse campo devem ser interpretados de forma sistêmica, tendo como ponto maior de comando os arts. 1º, 3º e 37, da Carta Maior. Pela importância que os mencionados dispositivos têm para uma melhor compreensão da Lei de Responsabilidade Fiscal, passo a transcrevê-los na nota abaixo.
ENUNCIADO 1 – Considerar que o conceito de gestão fiscal está ampliado pela redação do §1º do art. 1º da Lei. Toda gestão fiscal hoje gera grau de responsabilidade (máximo, médio e mínimo) civil e penal e há de ser exercida pela prática de atos administrativos vinculados que contenham os seguintes elementos: a) o estabelecimento de um planejamento de acordo com a realidade administrativa e os recursos financeiros de que dispõe a pessoa jurídica; b) absoluta transparência nas ações a serem desenvolvidas, o que exige publicidade das intenções administrativas e controle pelos administrados; c) demonstração explícita de que os riscos de afetação do equilíbrio das contas públicas foram evitados, bem como o compromisso de corrigir, imediatamente, desvios capazes de fazer com que a despesa supere a receita; d) estabelecimento de metas cujos resultados sejam compatíveis com as receitas e despesas; e) não geração de despesas com pessoal, com seguridade social, com dívidas consolidadas e mobiliárias, com operações de crédito, com concessão de garantia e com Restos a Pagar fora dos desenhos orçamentários e em proporções exigidas pela Constituição, legislação complementar e ordinária.
ENUNCIADO 2 – Os Tribunais de Contas estão, ao lado dos demais órgãos do Poder Executivo, do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, obrigados ao cumprimento do estabelecido pela Lei no referente ao seu atuar administrativo interno .
ENUNCIADO 3 – Impor cumprimento à determinação da lei de que toda atividade de gestão fiscal que resultar em desequilíbrio entre receitas e despesas será considerada como provocadora de responsabilidade atribuída ao agente público.
ENUNCIADO 4 – Exigir do Poder Executivo que, até trinta dias após a publicação dos orçamentos, estabeleça a programação financeira a ser adotada e o cronograma de execução mensal de desembolso.
ENUNCIADO 5 – Impossibilitar que recursos legalmente vinculados a determinada finalidade sejam utilizados para o atendimento de qualquer outra ação, mesmo que tal seja feito em exercício diverso daquele da efetivação do seu ingresso.
ENUNCIADO 6 – Atentar para o exato cumprimento das Metas Fiscais , considerando o bimestre da execução das mesmas, fiscalizando o exercício de limitações de empenho e movimentação financeira, segundo o que for fixado na lei de diretrizes orçamentárias.
ENUNCIADO 7 – Cobrar do Poder Executivo o envio do relatório para a avaliação obrigatória que deverá fazer, em audiência pública, a comissão referida no § 1º do art. 166 da Constituição ou equivalente nas Casas Legislativas estaduais e municipais.
ENUNCIADO 8 – Fiscalizar se o Poder Executivo limita as quantias financeiras a serem liberadas para os Poderes Legislativo e Judiciário e para o Ministério Público, de acordo com os critérios da lei de diretrizes orçamentárias, no caso de descumprimento do art. 9º da Lei de Responsabilidade Fiscal .
.ENUNCIADO 9 – Acompanhar a atuação do Banco Central no pertinente à obrigação de, no prazo de noventa dias após o encerramento de cada semestre, apresentar, as comissões pertinentes do Congresso Nacional, em reunião conjunta, avaliação do cumprimento dos objetivos e metas das políticas monetária credíticia e cambial, evidenciando o impacto e custo fiscal de suas operações e os resultados demonstrados nos balanços(art. 9º §5º).
ENUNCIADO 10 – Verificar se a ordem cronológica do pagamento dos precatórios (art. 100, CF) foi obedecida, bem como se na contabilidade da administração financeira há registro da identificação dos credores(ART. 10).
ENUNCIADO 11 – Considerar como não autorizadas por lei, portanto, irregulares e lesivas ao patrimônio público, qualquer despesa ou assunção de obrigação que: a) tenha sido originada de criação, de expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental sem estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes; b) não tenha recebido declaração do ordenador de despesa de que o aumento está de conformidade com os quantitativos orçamentários e financeiros ditados na lei anual e harmônico com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias; ; c) não esteja acompanhada, em se tratando de despesa obrigatória de caráter continuado, de comprovação de que não afetará as metas de resultados fiscais, bem como, que as suas repercussões financeiras, nos períodos seguintes, sejam compensadas pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa(art. 17, § 2º).
ENUNCIADO 12 – Fiscalizar se a despesa total com pessoal, em cada período de apuração, não excederá os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados: I – União: 50%(cinqüenta por cento); II – Estados: 60% (sessenta por cento); III – Municípios (60%) sessenta por cento
.ENUNCIADO 13 – Verificar o cumprimento, sem qualquer exceção, no final de cada quadrimestre (art. 22) do art. 20 da Lei de Responsabilidade Fiscal: “Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais:
I - na esfera federal:
a) 2,5% (dois inteiros e cinco décimos por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas da União;
b) 6% (seis por cento) para o Judiciário;
c) 40,9% (quarenta inteiros e nove décimos por cento) para o Executivo, destacando-se 3% (três por cento) para as despesas com pessoal decorrentes do que dispõem os incisos XIII e XIV do art. 21 da Constituição e o art. 31 da Emenda Constitucional no 19, repartidos de forma proporcional à média das despesas relativas a cada um destes dispositivos, em percentual da receita corrente líquida, verificadas nos três exercícios financeiros imediatamente anteriores ao da publicação desta Lei Complementar;
d) 0,6% (seis décimos por cento) para o Ministério Público da União;
II - na esfera estadual:
a) 3% (três por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Estado;
b) 6% (seis por cento) para o Judiciário;
c) 49% (quarenta e nove por cento) para o Executivo;
d) 2% (dois por cento) para o Ministério Público dos Estados;
III - na esfera municipal:
a) 6% (seis por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Município, quando houver;
b) 54% (cinqüenta e quatro por cento) para o Executivo.
§ 1o Nos Poderes Legislativo e Judiciário de cada esfera, os limites serão repartidos entre seus órgãos de forma proporcional à média das despesas com pessoal, em percentual da receita corrente líquida, verificadas nos três exercícios financeiros imediatamente anteriores ao da publicação desta Lei Complementar.
§ 2o Para efeito deste artigo entende-se como órgão:
I - o Ministério Público;
II- no Poder Legislativo:
a) Federal, as respectivas Casas e o Tribunal de Contas da União;
b) Estadual, a Assembléia Legislativa e os Tribunais de Contas;
c) do Distrito Federal, a Câmara Legislativa e o Tribunal de Contas do Distrito Federal;
d) Municipal, a Câmara de Vereadores e o Tribunal de Contas do Município, quando houver;
III - no Poder Judiciário:
a) Federal, os tribunais referidos no art. 92 da Constituição;
b) Estadual, o Tribunal de Justiça e outros, quando houver.
§ 3o Os limites para as despesas com pessoal do Poder Judiciário, a cargo da União por força do inciso XIII do art. 21 da Constituição, serão estabelecidos mediante aplicação da regra do § 1o.
§ 4o Nos Estados em que houver Tribunal de Contas dos Municípios, os percentuais definidos nas alíneas a e c do inciso II do caput serão, respectivamente, acrescidos e reduzidos em 0,4% (quatro décimos por cento).
§ 5o Para os fins previstos no art. 168 da Constituição, a entrega dos recursos financeiros correspondentes à despesa total com pessoal por Poder e órgão será a resultante da aplicação dos percentuais explicitados neste artigo, ou aqueles prescritos na lei de diretrizes orçamentárias.”
ENUNCIADO 14 – Declarar a nulidade de pleno direito de qualquer ato de provocação de aumento de despesa com pessoal, sem que tenham sido atendidas as exigências dos arts. 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal, e o disposto no inciso XIII do art. 37 e no § 1º do art. 169 da Constituição; sem obedecer ao limite legal de comprometimento aplicado às despesas com pessoal inativo; e que tenha sido expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão referido no art. 20.
A Lei de Responsabilidade Fiscal está formada por linhas centrais que objetivam modificar a conduta dos agentes públicos, em razão dos fatos comprovarem que eles arrecadam mal e gastam sem qualquer planejamento e, em muitas ocasiões, sem vinculação com o interesse nacional.
Busca, pelas modificações introduzidas, que a eficiência administrativa na gestão fiscal imponha equilíbrio nas contas públicas, a fim de que abra-se espaço para que as atividades administrativas voltem-se ao atendimento das necessidades de saúde, educação, segurança, amparo à velhice, proteção à infância, ser erradicada à pobreza, surgindo assim o desenvolvimento que a cidadania reclama.
O exame primeiro da lei dá a impressão de que ela contém regras que afetarão o princípio federativo, pela falsa sensação que se tem da posição intervencionista que a União passa a adotar em face dos Estados e dos Municípios.
O seguimento, contudo, de uma interpretação sistêmica da Constituição Federal, partindo-se dos propósitos moralizadores insculpidos no seu art. 37, em combinação com as disposições dos arts. 1º e 3º, permite a conclusão de que a Lei de Responsabilidade Fiscal não gera nenhum conflito com os desígnios federativos. Ela cultua a moralidade, a legalidade, a impessoalidade, a eficiência nas realizações administrativas, tudo em benefício do bem comum. Essa circunstância não interfere na autonomia dos Estados e dos Municípios, pois, eles, também, devem filiar-se aos mesmos propósitos. .
A atenção dos Tribunais de Contas no tratar com essa lei deve voltar-se para os seus aspectos fundamentais e que podem ser resumidos no esquema que passo a registrar:
a) Confere aos Tribunais de Contas um controle singular da gestão fiscal, fortalecendo tais órgãos.
b) Ela estabelece os princípios essenciais e as normas gerais de finanças públicas, além de definir o que deve ser acatado como gestão fiscal responsável.
c) A implantação do abaixo sequenciado está entre os objetivos da Lei Complementar n. 101, de 4.5.2000: c.1 - um tipo de controle das despesas que acabe com o déficit público; c. 2 – uma política tributária estável e previsível; c.3 – contenção e delimitação da dívida pública; c.4 – prudência na gestão financeira e patrimonial; c.5 – transparência de todos os gastos públicos; c.6 – medidas para evitar desvios da política de equilibrar as contas públicas; c.6 – vias de restrição ao endividamento público; c.7 – conduta administrativa que obrigue compensar despesas de longo prazo com a redução de outras despesas ou aumento de receitas; c. 8 – um rígido regulamento para o inter-relacionamento fiscal dos entes da Federação.
d) A finalidade maior da lei é a consolidação de uma cultura de que a máquina do Estado deve servir ao cidadão e não aos governantes.
e) A sua destinação é de adotar estabilidade fiscal, de forma gradativa, proporcionando tempo para que seja encontrada solução para o desequilíbrio das contas públicas, reduzindo, assim, os impactos negativos que esse desencontro de contas provoca sobre os investimentos públicos básicos(saúde, educação, segurança, proteção ao meio ambiente, lazer ), sobre os meios de produção, sobre a renda dos indivíduos e sobre a capacidade das empresas aumentar a oferta de empregos.
f) A sua aprovação faz parte da estratégia adotada pelo Governo para sair da crise financeira que atualmente impede o desenvolvimento econômico da Nação, optando por um ajuste rápido e suficiente para, no menor tempo possível, alcançar o nível desejado que é o equilíbrio entre receitas e despesas.
g) A lei tem como filosofia econômica reduzir o déficit público, para evitar o aumento dos juros, a diminuição dos investimentos e, consequentemente, a redução do crescimento dos setores empresariais.
h) A sua finalidade específica é de mudar, de forma definitiva, o ambiente fiscal, resolvendo o problema do déficit público, para que o Brasil volte a crescer sem depender da poupança externa.
É importante a compreensão sobre o sentido político da Lei de Responsabilidade Fiscal, para que a sua interpretação seja feita, pelos Tribunais de Contas, de modo que valorize os seus verdadeiros propósitos.
A sua aplicação não pode ficar desvinculada dos princípios que inspiraram o legislador para a sua elaboração, acatando proposta do Executivo.
Esses princípios podem ser escalonados, de forma resumida, como sendo:
- o da necessidade de ser estabelecido um processo de mudanças básicas nos ambientes institucionais vinculados à gestão fiscal;
6. MECANISMOS DE CONTROLE E DE FISCALIZAÇÃO DAS CONTAS QUE PODEM SER UTILIZADOS PELOS TRIBUNAIS DE CONTAS
A Lei de Responsabilidade Fiscal outorga aos Tribunais de Contas novos mecanismos jurídicos de controle e de fiscalização das contas públicas, além dos já existentes. Esses novos instrumentos apresentam-se, em tese, eficazes para os fins a que eles se destinam. O que se faz necessário é que sejam bem aplicados e deles afastadas quaisquer influências que descaracterizem os resultados que eles produzem.
Esses mecanismos não estão exaustivamente consagrados no texto da Lei. Merecem destaques, entre outros, os que devem ser utilizados pelos Tribunais de Contas, ora agindo diretamente sobre o ato de gestão fiscal com a adoção de providências que permitam adequá-lo à lei, ora tomando medidas preventivas, para que o equilíbrio fiscal seja atingido.
É da competência dos Tribunais de Contas:
- alertar os gestores das contas públicas de que estão descumprindo a Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 59, § 1º);
- fazer uso dos instrumentos ancorados na Lei de Diretrizes Orçamentárias para fins de exercício do controle de custos e resultados;
- acompanhar e controlar os saldos dos créditos abertos, investigando se estão sendo obedecidos os limites pretendidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 38, § 3º);
- controlar as dívidas consolidadas e mobiliárias (art. 31, § 4º, da LC n. 101);
- impor medidas para a limitação do poder de efetuar despesas (art. 5º, § 5º, da Lei de Responsabilidade Fiscal);
- emitir pareceres prévios, separadamente, sobre as contas anuais do Chefe do Poder Executivo, do Legislativo e do Judiciário;
- assinar prazo razoável para que o órgão da administração corrija desvios praticados ou que está praticando na execução de negócios jurídicos biliaterais ou plurilaterais;
- sustar a execução ou a continuação de qualquer contrato ou atividade administrativa que apresente violação à lei ou, se a União figurar como contratante, representar ao Congresso Nacional para que efetue a sustação;
- buscar, nos registros dos órgãos dos Poderes, informações necessárias para expedir o ato de alerta, para julgar as contas ou para emitir os pareceres prévios;
- declarar nulo, de pleno direito, qualquer ato que aumente a despesa com pessoal e não atenda, ainda, aos requisitos que estão expostos nos arts. 4º, § 1º, 16, I, II, 18 da Lei de Responsabilidade Fiscal, e nos arts. 37, XIII, 169, §1º da CF;
- declarar a nulidade de pleno direito de ato de desapropriação de imóvel urbano, quando não atendidos os requisitos do art. 182, § 3º da Constituição Federal;
- declarar a vedação de unidades da federação receberem transferências voluntárias e contratarem operações de crédito, por ter havido descumprimento do art. 51 da Lei de Responsabilidade Fiscal (dever de encaminhamento das contas ao Poder Executivo, por parte dos Estados e Municípios, para consolidação e publicação); e/ou por não ter reduzido a despesa com pessoal (art. 23, da Lei de Responsabilidade Fiscal, em combinação com o art. 169, § 2º da CF); e por não ter tomado providências administrativas para o pleno exercício das atividades relativas à cobrança dos tributos devidos de acordo com as regras do ordenamento jurídico;
- exigir cumprimento das sanções previstas no art. 22 da Lei de Responsabilidade Fiscal, quando a despesa total com pessoal exceder a noventa e cinco por cento do previsto pelo art. 20 da mesma lei;
- representar ao Ministério Público contra os agentes administrativos que, ao descumprirem as normas da Lei de Responsabilidade Fiscal, cometem ilícitos penais, infrações que deverão ser apuradas e punidas segundo as prescrições do Código Penal, das Leis nºs 1.079, de 1950, e 8.429, de 1991, do Decreto-lei n. 201, de 1967, e demais diplomas legais pertinentes, enquanto não for aprovada a Lei que vai definir, especificamente, os crimes cometidos contra a gestão fiscal.
Outros mecanismos de controle e fiscalização podem ser utilizados pelos Tribunais de Contas. O rol acima apresentado não é exaustivo. Há de se compreender que a Lei de Responsabilidade Fiscal abre espaço para que, qualquer tipo de irregularidade praticada pelos agentes público seja, imediatamente, apurada e punida, quer na órbita administrativa, quer no âmbito político, quer pelo Poder Judiciário.
7 – OS TRIBUAIS DE CONTAS E OS CONSELHOS DE GESTÃO FISCAL.
O art. 67 da Lei de Responsabilidade Fiscal instituiu uma inédita forma de controle da gestão fiscal. É a que passa a ser feita pelo Conselhos de Gestão Fiscal.
O referido dispositivo dispõe: “Art. 67. O acompanhamento e a avaliação, de forma permanente, da política e da operacionalidade da gestão fiscal serão realizados por conselho de gestão fiscal, constituído por representantes de todos os Poderes e esferas de Governo, do Ministério Público e de entidades técnicas representativas da sociedade, visando a:
I - harmonização e coordenação entre os entes da Federação;
II - disseminação de práticas que resultem em maior eficiência na alocação e execução do gasto público, na arrecadação de receitas, no controle do endividamento e na transparência da gestão fiscal;
III - adoção de normas de consolidação das contas públicas, padronização das prestações de contas e dos relatórios e demonstrativos de gestão fiscal de que trata esta Lei Complementar, normas e padrões mais simples para os pequenos Municípios, bem como outros, necessários ao controle social;
IV - divulgação de análises, estudos e diagnósticos.
§ 1o O conselho a que se refere o caput instituirá formas de premiação e reconhecimento público aos titulares de Poder que alcançarem resultados meritórios em suas políticas de desenvolvimento social, conjugados com a prática de uma gestão fiscal pautada pelas normas desta Lei Complementar.
§ 2o Lei disporá sobre a composição e a forma de funcionamento do conselho.”
A instalação e funcionamento de tais Conselhos está na dependência da lei ordinária que deverá ser aprovada fixando a sua composição e a forma do seu funcionamento.
A seguir-se, rigorosamente, a vontade do legislador expressada no caput do art. 67, evidencia-se que representante do Tribunal de Contas integrará esses Conselhos.
É verdade que a doutrina há de esclarecer, de modo bem claro, as atribuições desses Conselhos, de modo que eles atuem de acordo com os propósitos da Lei de Responsabilidade Fiscal.
8 – CONCEITOS NOVOS FIRMADOS PELA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL SOBRE ENTIDADES FINANCEIRAS E A SUA ABSORÇÃO PELOS TRIBUNAIS DE CONTAS
Esses conceitos são de natureza fechada, por estarem concentrados na Lei de Responsabilidade Fiscal. Eles ingressam na órbita jurídica do modo que o legislador os assentou. A doutrina e a jurisprudência têm pouco campo de ação para discuti-los, pelo que a obediência dos Tribunais de Contas as linhas por eles fixadas é de imediato e sem restringir ou ampliar o raio das ações por eles delimitadas.
9. CONCLUSÃO
De tudo quanto exposto, sem esgotamento da análise dos vínculos dos Tribunais de Contas com a Lei de Responsabilidade Fiscal, há lugar para a afirmação de que a doutrina e a jurisprudência têm um campo fértil para trabalhar, com o objetivo de determinar uma compreensão dessa norma complementar de acordo com a filosofia por ela adotada.
São relevantes para o desenvolvimento da Nação todos os aspectos regulados pela Lei Complementar n. 101, de 4.5.2000. Ela, se bem aplicada, imporá sérias mudanças no cenário nacional no tocante à gestão de recursos públicos. As complexidades que ela possui criam dificuldades para a sua compreensão na maioria das situações reguladas. A sua marca maior , no tocante ao aspecto formal, é o seu elevado caráter técnico, com a redifinição de conceitos, princípios e normas de ordem financeira e econômicas, introduzindo modificações no comportamento de agentes públicos não afeitos ao controle por ela introduzido.
Há acenos de parte da doutrina levantando a inconstitucionalidade de alguns dispositivos, a exemplificar o art. 20. Alega-se que há quebra do princípio federativo.
Os Tribunais de Contas não devem, ao meu entender, desenvolver preocupações com tais reivindicações. Cumpre-lhes, de imediato, emitir julgados que reflitam na instalação de condições para o seu efetivo respeito e alcance: o de, no menor prazo possível, impor o equilíbrio das contas públicas. Os incidentes de inconstitucionalidade sobre artigos da Lei de Responsabilidade Fiscal serão apreciados pelo Colendo Supremo Tribunal Federal. Esta Suprema Corte avaliará a harmonização ou não dos dispositivos legais com a Constituição Federal. Enquanto tal não ocorrer, ela impera em todos os sentidos, pela presunção de que está de conformidade com os princípios maiores da Carta Magna.