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A
lei geral do processo administrativo (Lei nº 9.784/99).
Sua aplicação aos processos administrativos disciplinares
desenvolvidos nas empresas públicas federais
Mário Franzon Filho
empregado
público e advogado em Brasília (DF)
1 INTRODUÇÃO
A
Lei 9.784, introduzida no Ordenamento Jurídico brasileiro em 29 de janeiro de
1999, pode e ou deve ser aplicada aos processos administrativos
disciplinares [01] desenvolvidos nas empresas públicas
federais, para apuração de ilícitos administrativos?
Por
incrível que possa parecer aos que, como nós, desde a publicação da lei
respondemos afirmativamente a essa pergunta, há quem entenda não ser aplicável o
diploma legal no caso em pauta. Procurar-se-á, pois, aqui, a partir de base
hermenêutica, doutrinária e jurisprudencial, demonstrar que a lei pode e
deve ser aplicada no caso em apreço, sob pena, em não a aplicando, quando
for o caso de aplicá-la, de incorrer o operador do direito (magistrados,
sindicantes, autoridades julgadoras administrativas etc.) em desrespeito ao
Ordenamento Jurídico brasileiro hoje vigente, além de permitir a ocorrência de
situações passíveis de acarretar prejuízos à Administração Pública.
2 A HERMENÊUTICA JURÍDICA
CONTEMPORÂNEA E A APLICAÇÃO DA LEI 9.784/99
Segundo
consta na Exposição de Motivos respectiva e na própria lei 9.784/99,
esta foi introduzida no Ordenamento Jurídico brasileiro para regular o
processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. Assim,
o legislador, coerente com tal finalidade, deu o seguinte teor ao caput
de seu artigo 1º, abaixo transcrito:
"Art.
1o Esta Lei estabelece normas básicas sobre o processo
administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta,
visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao
melhor cumprimento dos fins da Administração. [Grifou-se.]"
Os
que advogam a não aplicação, argumentam, a partir do disposto acima, que a lei
9.784/99 é exclusiva para os administrados e que estes não estão
incluídos entre os agentes públicos [02], mas são terceiros
sem qualquer vínculo jurídico com a Administração Pública além daqueles dados
pelos direitos cidadãos. Assim, concluem que a lei não pode ser aplicada a
processos administrativos disciplinares que envolvam empregados públicos das
empresas públicas federais, por exemplo. Vê-se, pois, que, ao interpretarem a
lei, o fazem de forma literal, gramatical [03] e sem
considerar, entre outros fatores importantes e fundamentais para uma correta
exegese, a existência de outros métodos de interpretação mais recomendados por
mestres da Hermenêutica, como R. Limongi França (Hermenêutica Jurídica. 7ª
ed., revista e aumentada. Rio de Janeiro: Saraiva, 1999), por exemplo. É o caso
do método de interpretação sistemático, que, na definição de De Plácido
e Silva (Idem), é o método interpretativo que:
"...associando
os elementos gramatical e lógico, procura a exata inteligência da lei, tendo em
vista a relação das palavras e do pensamento com a razão natural, justiça,
ordem, e bem geral, para atingir, por meio de legítimas e fundadas conclusões,
o verdadeiro ou mais normal sentido do texto, e adotá-lo como o que exprime a
vontade do legislador."
É,
assim, na direção apontada pela Hermenêutica jurídica contemporânea
[04] que se pretende aqui caminhar. Senão, vejamos: poder-se-ia ainda
argumentar (utilizando o método gramatical), em favor da tese dos que são
contrários à aplicação da norma, que o artigo primeiro estabelece especial
proteção aos direitos dos administrados e que, portanto, a lei 9.784/99 é,
na verdade, lei especial, específica para a proteção dos direitos dos
administrados. Sendo lei específica, obviamente não é lei geral e só se
aplicaria mesmo a processos administrativos federais que envolvessem terceiros
e não agentes públicos. Ora, esta interpretação não resiste à simples consulta
(consulta esta indicada, de forma lógica e geral, pela interpretação sistemática)
ao teor da Exposição de Motivos [05], que, além de
reconhecer, seguindo a linha da Constituição de 1988, que todos (no bojo
de um processo administrativo) "têm direito a receber informações dos
órgãos públicos", atribui aos dispositivos da lei 9.784/99 o caráter de normas
gerais, no dizer do Professor Caio Tácito, este um dos muitos juristas de
escol que participaram da Comissão responsável pela elaboração do projeto de
lei. Assim se manifestou o mestre:
"A
Comissão firmou como parâmetros básicos da proposição os ditames da atual
Constituição que asseguram a aplicação, nos processos administrativos, dos
princípios do contraditório e da ampla defesa, bem como reconhecem a todos
o direito de receber informações dos órgãos públicos em matéria de interesse
particular ou coletivo e garantem o direito de petição e a obtenção de
certidões em repartição pública (art. 5º, nºs XXXIII, XXXIV e LV). Considerou
ainda a missão atribuída à defesa de direitos difusos e coletivos com a
participação popular e associativa.
Teve,
ainda, presente que o sistema legal resguarda, quanto a matérias específicas, a
observância de regimes especiais que regulam procedimentos próprios, como o
tributário, licitatório ou disciplinar, a par do âmbito de competência de
órgãos de controle econômico e financeiro.
Por
esse motivo, o projeto ressalvou a eficácia de leis especiais, com a
aplicação subsidiária das normas gerais a serem editadas. [Grifou-se.]"
Relativamente,
ainda, ao significado jurídico do termo ‘administrados’, presente na lei
9.784/99, observe-se a lição de Maria Helena Diniz ((Dicionário Jurídico,
Vol. 1, 1998, p. 111): "a) [administrado é] qualquer pessoa enquanto
sujeito de relação jurídico-administrativa; b) [administrado é o]
funcionário público quando participante da relação jurídico-administrativa,
subordinando-se ao Estado enquanto Administração Pública". Assim, ‘administrados’,
na lei mencionada, não são apenas terceiros em face da Administração Pública,
mas também os agentes públicos. Vê-se claramente que esta
conclusão é logicamente muito mais consentânea com o conteúdo da Exposição
de Motivos e com o conteúdo da própria lei 9.784/99, do que a conclusão
defendida pelos que negam sua aplicação.
3 A DOUTRINA E A APLICAÇÃO DA LEI
9.784/99
O
tema "apuração de ilícitos administrativos" está diretamente ligado
aos assuntos Processo Administrativo Disciplinar e Sindicância, que por sua vez
estão estreitamente relacionados. A Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990,
instituiu o Regime Jurídico Único para os servidores da Administração Direta,
Autárquica e Fundacional e regulamentou ambos os tópicos nos artigos 143
a 182. Mas tal lei não se aplica diretamente às empresas públicas federais, só
sendo aplicável por via analógica, guardando característica processual, sendo
relevante salientar, conforme assinala o Professor José Armando da Costa (Teoria
e prática do processo administrativo disciplinar. 3ª ed. Revista e
atualizada. Brasília: Brasília Jurídica, 1999, p. 31)
"que
tal supletividade analógica somente encontra objeção quando esteja diante de
norma que, mesmo guardando a característica processual, imponha defecção
libertária ou patrimonial. Em tais casos, em que a norma que se rebusca para
suprir lacunas restrinja direitos ou diminua o alcance do direito de defesa, a
analogia torna-se expediente defeso. Em outras palavras, a analogia in bonam
partem é sempre bem vinda; já a analogia in mala partem,
restringindo direitos, não encontra simílima receptividade, nem poderia, pois,
assim definindo-se, configurar norma de direito excepcional que somente
aplica-se às hipóteses previstas e definidas [e quando não se confrontar com ou
anular os preceitos celetistas, já que as empresas públicas federais são
empresas públicas de direito privado, tendo suas relações empregatícias regidas
pela CLT]."
A
Lei 8.112/90 e a CLT não esgotam, pois, a matéria, impondo-se, numa
interpretação lógico-sistêmica, recorrer a outros diplomas legais para apreciar
os casos concretos frente ao Direito. Mas as empresas públicas que têm suas
relações trabalhistas regidas pela CLT (como as federais) podem regulamentar,
no âmbito interno, detalhadamente, os procedimentos formais e prazos,
respeitando as prescrições da lei e do Direito (vide Parágrafo
único, inciso I, do art. 2º da Lei 9.784/99).
Não
havia, até o final de 1998, legislação específica à qual devesse se enquadrar a
empresa pública federal, no tocante aos processos administrativos
disciplinares, dispondo a CLT, nos artigos 492 a 500, apenas sobre a situação
do estável, para cujo desligamento exige inquérito, sendo extensível aos mesmos
as considerações expendidas sobre a possibilidade de regulamentação no âmbito
das empresas.
Mas,
como informa o Dr. Eury Pereira Luna Filho (www.jus.com.br), em artigo denominado "A
nova lei geral do processo administrativo",
"[a]
Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999, veio dispor sobre normas básicas para o
processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta,
com vistas à proteção dos direitos dos administrados e o melhor cumprimento dos
fins da Administração. Sua vigência foi imediata, seguindo-se à publicação em
1º de fevereiro de 1999.
Traz
esse diploma federal, então, particular interesse, porquanto terá influência
nos diversos procedimentos administrativos hoje regulados em legislações
especiais de aplicação mais ou menos restrita, a exemplo [da Lei 8.112/90] em
suas disposições relativas ao [processo] administrativo disciplinar.
Anote-se
que a aplicação das regras contidas na referida lei aos processos
administrativos disciplinares (regidos por lei especial, como a Lei 8.112/90 –
Estatuto dos Servidores Públicos Federais) será subsidiária, vale dizer, a Lei
9.784/99 - nova Lei geral do processo administrativo - incidirá nas partes
omissas e sempre que não houver disposição especial no Estatuto, como prevê o
art. 69 da referida Lei geral."
Segundo
o mesmo autor, "a limitação imposta ao alcance dessas normas processuais
administrativas gerais, recém-introduzidas no regramento brasileiro, que se faz
no art. 69 da Lei 9.784/99, em nada lhe reduzirá a importância e a
novidade", ao que se pode concluir que tal fato (a não redução de sua
importância e novidade) se dá principalmente no âmbito das empresas públicas
federais, pois seus documentos instrutores de apuração de ilícitos
administrativos de cunho disciplinar, apesar de regulamentarem o assunto em seu
âmbito, não detêm o mesmo status de Lei Federal [06], sendo,
na hierarquia das leis, simples regulamento interno e, portanto, inferior a
qualquer Lei Federal, devendo, pois, se adequar à Lei 9.784/99.
Assim,
é de se concluir que os Manuais orientadores de apuração de ilícitos
administrativos de cunho disciplinar nas empresas públicas federais devem ser
adaptados à Lei 9.784/99, em toda a sua extensão (ressalvados os preceitos
celetistas), ou seja, a nova Lei geral não se aplica apenas subsidiariamente
aos Manuais, mas estes devem ser modificados inteiramente no que conflitarem
com a Lei Federal, inclusive nos prazos estabelecidos.
Registre-se,
pois, que, para os fins da Lei Geral do Processo Administrativo, os empregados
públicos federais de qualquer empresa pública federal que figurem como acusados
em feitos disciplinares são considerados administrados (art. 3º, caput,
Lei 9.784/99), por estarem sujeitos ao poder de império e disciplinar da
Administração Pública a que se vinculam, e também interessados, porque
se amoldam à figura legal daqueles que têm direitos ou interesses que podem ser
afetados pela decisão a ser adotada no processo (art. 9º, inciso II, da Lei
9.784/99), de sorte que os processados gozam da proteção legal da norma
genérica em apreço, sem embargo das garantias asseguradas pela Lei 8.112/90 [07].
4 A JURISPRUDÊNCIA E A APLICAÇÃO DA
LEI 9.784/99
Jurisprudência
é um termo derivado
do latim jurisprudentia, de jus (Direito, Ciência do Direito) e prudentia
(sabedoria), entendendo-se literalmente, na lição de De Placido e Silva (Idem,
p. 469), que jurisprudência é a ciência do Direito vista com sabedoria. Jurisprudência
pode ser definida também como sendo um conjunto de decisões judiciais uniformes
sobre casos concretos semelhantes. E aqui vale ressaltar, por oportuno, que o
magistrado, tal qual o sindicante, a autoridade instauradora e todos quantos
operam o direito, não está obrigado apenas à lei – no sentido de conjunto
normativo escrito – mas também ao Direito, cabendo, assim, ao intérprete,
"proceder a uma ‘elaboração criativa do direito", conforme ensina
Rigaux (A lei dos juízes. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 161.). Entendemos,
pois, que se pode chegar à conclusão de que a lei 9.784/99 se aplica aos
processos administrativos nos quais figurem agentes públicos, também a partir
da análise crítica de julgados, em especial de julgados do Superior Tribunal de
Justiça – STJ. Senão, vejamos:
"JURISPRUDÊNCIA
1
Processo: MS 8946 / DF ; MANDADO DE
SEGURANÇA 2003/0027888-4
Relator(a): Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS
(1096)
Órgão
julgador: S1 –
PRIMEIRA SEÇÃO
Data
do julgamento:
22/10/2003
Data
da publicação/Fonte:
DJ 17.11.2003 p. 197 – RSTJ vol. 183 p. 38
Ementa
I
– (...)
II
– ADMINISTRATIVO – LEI 9.784/99 – DEVIDO PROCESSO ADMINISTRATIVO – COMUNICAÇÃO
DOS ATOS – INTIMAÇÃO PESSOAL – ANULAÇÃO E REVOGAÇÃO.
I
– (...)
II
– A Lei 9.784/99 é, certamente, um dos mais importantes instrumentos de
controle do relacionamento entre Administração e Cidadania. Seus
dispositivos trouxeram para nosso Direito Administrativo, o devido processo
legal. Não é exagero dizer que a Lei 9.784/99 instaurou no Brasil, o verddeiro
Estado de Direito. [Grifou-se.]
III
– A teor da Lei 9.784/99 (Art. 26), os atos administrativos devem ser objeto de
intimação pessoal aos interessados.
IV
– (...) "
A
partir da leitura do texto grifado, pergunta-se: 1) o agente público é
cidadão? R.: Claro que é; 2) o agente público pode, em algum
momento de sua vida, figurar em processo administrativo de cunho disciplinar e,
no bojo do referido processo, se relacionar com a Administração? R.:
Claro que pode; 3) existem diferentes espécies de processo
administrativo, como os licitatótios, disciplinares etc.? R.: Claro que
existem e sobre este tema recomenda-se consultar obra de Nelson Nery Costa (O
processo administrativo e suas espécies. 3ª ed. revista e ampliada. Rio de
Janeiro: Forense, 2001). Assim, a partir deste julgado já é possível inferir
que a lei 9.784/99 também pode ser utilizada pelos agentes públicos para, no
mínimo, fundar petições à Administração Pública em processos administrativos
disciplinares nos quais, eventualmente, venham a figurar como interessados,
citados etc.
"JURISPRUDÊNCIA 2
Processo: RMS 16776 / PR ; RECURSO ORDINÁRIO
EM MANDADO DE SEGURANÇA 2003/0130796-4
Relator(a): Min. Felix Fischer (1109)
Órgão
julgador: T5 –
QUINTA TURMA
Data
do julgamento:
25/05/2004
Data
da publicação/Fonte:
DJ 28.06.2004 P. 349
Ementa
RECURSO
ORDINÁRIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. PODER JUDICIÁRIO ESTADUAL. PRAZOS.
FLUÊNCIA. FÉRIAS FORENSES. AUSÊNCIA DE PREVISÃO.
LEI
9.784/99. APLICAÇÃO
SUBSIDIÁRIA.
Silente
o Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná acerca da fluência
dos prazos durante as férias forenses, deve ser aplicado subsidiariamente, no
caso dos recursos administrativos, o disposto no art. 67 da Lei nº 9.784/99. Isso
porque, sendo a norma que regulamenta os procedimentos de igual espécie em
âmbito federal, tem preeminência em relação ao Código de Processo Civil, que
cuida dos processos judiciais.
Recurso
desprovido."
Esta
decisão do Egrégio STJ é mesmo exemplar. Aparece como um ‘tapinha com luva de
pelica’ nos que têm a pretensão de, ignorando o Direito, aplicarem as leis com
base nelas mesmas ou exclusivamente em suas visões pessoais.
O
primeiro ponto a destacar é que a decisão demonstra ser a lei 9.784/99
aplicável
mesmo em âmbito estadual, desde que o seja em caráter subsidiário (com base em
seu art. 69) e para regular procedimentos de igual espécie (processos
administrativos) desenvolvidos em âmbito federal.
O
segundo ponto, também importantíssimo, diz respeito à preeminência
(superioridade, no sentido de, necessariamente, ter de vir antes; de ter
preferência) de aplicação da Lei 9.784/99 em relação ao CPC, no caso concreto
em análise e em todos os casos semelhantes. A razão dada na jurisprudência, é
uma das razões pelas quais [08], no processo administrativo
disciplinar levado a efeito nas empresas públicas federais não se poder
resolver eventuais questões legais surgidas no bojo do processo, usando as
regras civis ou outras, antes de esgotar a possibilidade de solução pelo uso
das regras administrativas. Veja-se abaixo, um exemplo concreto.
Certa
empresa pública determina, no seu documento norteador de apurações de ilícitos
administrativos, que o prazo para defesa escrita, disponibilizado ao citado,
deve ser de cinco dias úteis e os responsáveis pela redação do documento
buscam justificar tal prazo citando o CPC. Ora, a lei administrativa mais
próxima e que regulamenta procedimento da mesma espécie é a Lei 8.112/90, que
determina 10 dias. E devem ser dias corridos, por força da lei 9.784/99 (art.
66, § 2º).
"JURISPRUDÊNCIAS
3 e 4
Processo: MS 9344 / DF ; MANDADO DE
SEGURANÇA 2003/188040-1
Relator(a): Min. Jorge Scartezzini (1113)
Órgão
julgador: S3 –
TERCEIRA SEÇÃO
Data
do julgamento:
25/022004
Data
da publicação/Fonte:
DJ 26.04.2004 P. 143
Ementa
(...)
7
– Improsperável a assertiva de nulidade do procedimento face à ausência de
publicação da Portaria Instauradora da Comissão em Diário Oficial, tendo em
vista que a Lei 9.784/99 (Capítulo IX), que regula o processo
administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, bem como a Lei
8.112/90 (art. 151, I), em nenhum momento assim o exigem. Admissível, pois, que
seja realizada em Boletim Interno de serviço do INSS.
(...)
JURISPRUDÊNCIA
4
Processo: MS 9511 / DF ; MANDADO DE
SEGURANÇA 2004/0008267-0
Relator(a): Min. Arnaldo Esteves Lima (1128)
Órgão
julgador: S3 –
TERCEIRA SEÇÃO
Data
do julgamento:
23/022005
Data
da publicação/Fonte:
DJ 21.03.2005 P. 213
Ementa
(...)
2.
A omissão existente no Regime Jurídico dos Servidores Públicos – Lei 8.112/90 –
quanto ao prazo a ser observado para a notificação do acusado em processo
administrativo disciplinar é sanada pela regra existente na Lei 9.784/99,
que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública
Federal.
3.
O servidor público deve ser intimado com antecedência mínima de 3 (três) dias
úteis a respeito de provas ou diligências ordenadas pela comissão processante,
mencionando-se data, hora e local de realização do ato. Inteligência dos arts. 41
e 69 da Lei 9.784/99 e 156 da Lei 8.112/90.
4.
Ilegalidade da audiência de oitiva de testemunhas e, por conseguinte, do
processo administrativo disciplinar em razão do fato de que o impetrante foi
notificado desse ato no dia que antecedeu a sua realização, contrariando a
legislação de regência e os princípios da ampla defesa e do contrditório.
5.
Segurança concedida."
Infere-se
que se a Lei 8.112/90 se calasse, mas a Lei 9.784/99 exigisse, a Portaria teria
que ser publicada em Diário Oficial. Vê-se, pois, que a lei 9.784/99 pode ser
aplicada em processos administrativos disciplinares (envolvendo agentes
públicos, naturalmente) baseados na Lei 8.112/90. Isto se dá em função do
contido no art. 69 da Lei Geral do Processo Administrativo.
O
caput do art. 1º da lei 9.784/99 estabelece que ela regula o processo
administrativo (lato sensu) no âmbito da Administração Pública Federal
direta e indireta. Portanto, se houver omissão desta mesma natureza em regras
sobre processo administrativo existentes nas empresas públicas federais, a lei
9.784/99 terá de ser aplicada.
Por
considerarmos despiciendo novas demonstrações como as acima, encerramos aqui
nossa análise, mas não sem antes citarmos os julgados MS 7436 / DF ;
2001/0033916-6 (CONAB), AgRg no MS 8692 / DF 2002/0129931-1 (ECT) e AgRg no MS
8717 / DF ; 2002/0140684-4 (ECT), como exemplos que trazem a aplicação da Lei
9.784/99 a empresas públicas federais.
5. CONCLUSÃO
Viu-se
que, mormente a partir da doutrina e da jurisprudência, analisadas de forma
sistêmica, não cabe qualquer razão aos que defendem a impossibilidade de
aplicação da Lei 9.784/99 aos processos administrativos disciplinares levados a
efeito nas empresas públicas federais.
NOTAS
01 Em nosso livro "A APLICAÇÃO DO
PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR NAS EMPRESAS PÚBLICAS FEDERAIS",
lançado em Brasília em abril de 2005, demonstramos que o processo
administrativo disciplinar desenvolvido nas empresas públicas federais tem
características próprias e não deve ser confundido com o PAD da Lei 8112/90. Demonstração
neste sentido, porém mais concisa, também pode ser encontrada em artigo de
nossa autoria no site jurídico JUS NAVIGANDI, no endereço eletrônico http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6807.
02 Esta expressão – agentes
públicos – que utilizamos aqui, para Celso Antônio Bandeira de Mello (Curso
de Direito Administrativo Brasileiro. 12ª ed., rev., atual. e ampliada. São
Paulo: Malheiros, 2000, p. 218) "...é a mais ampla que se pode conceber
para designar genérica e indistintamente os sujeitos que servem ao Poder
Público como instrumentos expressivos de sua vontade ou ação, ainda quando o
façam apenas ocasional ou episodicamente". Portanto, ela abarca, por
exemplo, os empregados públicos (celetistas) das empresas públicas federais
(Adm. Indireta) e os servidores públicos (estatutários) dos órgãos federais
(Adm. Direta).
03 Interpretação Gramatical – é
a interpretação literal, fundada na própria significação das palavras, em que
se expressa. É a interpretação à letra ou segundo a linguagem da
própria lei. (...) Por ela se procura o pensamento do legislador pela própria
construção textual. (De Plácido e Silva. Vocabulário Jurídico. 15ª ed.,
Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 445). Sublinhe-se que conforme os mais
destacados hermeneutas não restam dúvidas de que é sobre a letra da lei e seu
significado verbal que se deve iniciar o processo interpretativo, mas este é
apenas o ponto de partida da atividade hermenêutica.
04 A interpretação literal como único
método válido de interpretação da norma jurídica, data da época de Napoleão. Atualmente
a interpretação literal é apenas o início do trabalho interpretativo. Para uma
visão mais completa da questão, pelo leitor interessado, sugere-se consultar
excelente artigo - A Hermenêutica Constitucional Contemporânea em
Perspectiva - de autoria do Dr. Rafael Otávio Ragugnetti Zanlorenzi, que
pode ser encontrado no site www.revistadoutrina.trf4.gov.br.
05 EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS – Denominação
dada ao preâmbulo ou considerandos, que antecedem os textos dos
projetos de lei ou de qualquer outra resolução, para mostrar as suas vantagens
e necessidades. É uma justificativa às medidas ou regras que se consignam nas
leis apresentadas para aprovação ou em quaisquer outras resoluções de ordem
administrativa. (De Plácido e Silva. Idem, p. 340)
06 O vocábulo lei é tomado aqui
em sua acepção estrita ou técnica, em que a palavra lei
indica tão-somente a norma jurídica elaborada pelo Poder Legislativo, por meio
de processo adequado.
07 As garantias a que se quer referir aqui são
exclusivamente as de ordem processual, que podem ser aplicadas por analogia a
casos concretos nas empresas públicas federais, como, por exemplo, a adoção do
prazo em dobro para defesa, quando, no mesmo processo, figurar mais de um
acusado.
08 As outras são de ordem civil, mas
de caráter geral, eis que oriundas da LICC (art. 4º) e de ordem trabalhista
(art. 8º da CLT), com ambos os dispositivos regulando as aplicações analógicas necessárias.
Acesso em:
05 de setembro de 2005
Disponível
em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7238