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A interferência das agências reguladoras
nas empresas concessionárias de serviços públicos
Ana Cristina Willemann*
RESUMO
O presente trabalho teve como objetivo, a partir de estudos doutrinários e pesquisas bibliográficas de artigos em revistas e legislação, estudar a interferência das Agências Reguladoras nas empresas concessionárias de serviços públicos. Será dada ênfase na interferência do Direito Público (regulamenta as agências reguladoras) dentro do Direito Privado (regulamenta as empresas concessionárias). Empresas Concessionárias de Serviços Públicos são aquelas criadas nos moldes do Direito Privado, mas com características de Direito Público, pois prestam serviços de competência da Administração Pública, tais como telefonia, petróleo, saúde, energia elétrica. Já as Agências Reguladoras foram criadas para regulamentar e fiscalizar as atividades das concessionárias. São criadas sob a forma de autarquias em regime especial, concedendo, assim, maior autonomia administrativa e patrimonial em relação aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Assim, para garantir aos consumidores e usuários a qualidade e continuidade na prestação dos serviços públicos o Estado teve que fortalecer a sua função reguladora e fiscalizadora por meio das Agências Reguladoras. Sua atuação como ente regulador e a proteção aos consumidores ocorre, por exemplo, por meio da aplicação de multas às concessionárias infratoras; da edição de instruções normativas e portarias; do julgamento de questões controvérsas; da regulação e fiscalização da adequada qualidade de serviços e justas tarifas. No entanto, todos os atos praticados pelas Agências deverão obedecer aos princípios e normas da legislação brasileira.
Palavras-chave: Agência reguladora, concessionária,
interferência, serviço público
INTRODUÇÃO
O motivo da escolha do tema está
diretamente relacionado ao novo modelo de órgão regulador adotado pelo Direito
Brasileiro: as Agências Reguladoras.
Esta estrutura autárquica está
diretamente ligada ao processo de reforma em que o Estado está passando.
Profundas transformações políticas e sociais vem ocorrendo. Com esse trabalho
deseja-se focar a transferência dos serviços estatais para o controle da
iniciativa privada e as interferências do Estado na sua
atuação.
O Estado, com a sua política de
desestatização, transferiu à iniciativa privada todas as atividades que por ela
possam ser bem executadas de forma a atender às necessidades fundamentais da
população.
Com essa transferência, a
Administração Pública criou a figura das Agências Reguladoras, destinadas a
fiscalizar e controlar a atividade pública a ser prestada por companhias
privadas.
Deve ser considerado que o intuito
da presença dessas Agências é o de regular matérias específicas de determinados
segmentos do setor econômico e de serviços públicos. Assim, desempenham
importante função ao regular situações determinadas e de dirimir conflitos de
forma mais célere e precisa.
As Agências, quando regulamentam as
empresas concessionárias ou permissionárias, devem atender a um sistema
jurídico, composto de regras e princípios, que envolverão outras áreas do
direito, como: contratos, sociedades privadas, licitação.
Como argumentos invocados para
justificar a escolha do tema, relaciona-se, em primeiro lugar, a atualidade do
assunto.
Ademais, por ser um tema novo, o
campo, ainda, é muito tumultuado. É uma área de estudo recente e os autores
pouco escreveram sobre o assunto, causando certas incongruências na atuação
prática destas Agências.
No entanto, há uma farta doutrina
acerca dos institutos observados de forma isolada, exigindo, assim, uma análise
minuciosa de cada conceito para a realização do trabalho e, ao final, as
respostas para a problematização suscitada com o tema.
Para o desenvolvimento da pesquisa
será utilizado o método dedutivo, partindo-se da análise dos institutos das
empresas concessionárias de serviços públicos e seus afins e as Agências
Reguladoras. Utilizar-se-á, como base, às técnicas de pesquisa bibliográfica,
doutrinária, artigos em revista, leis etc.
O presente trabalho está dividido em
três capítulos, além desta introdução, resumo, conclusão e referências
bibliográficas.
No primeiro capítulo será abordada a
Sociedade Empresária brasileira. Inicialmente, será feito um rápido estudo do
surgimento das Sociedades. Em seguida, passará para análise da atual conjuntura
desta categoria no direito Brasileiro, analisando as suas características;
personalidade jurídica; desconsideração da personalidade jurídica; os tipos de
Sociedade, como as Sociedades Empresárias.
No capítulo seguinte discorre-se
acerca das empresas concessionárias de serviços públicos no direito brasileiro.
Serão apresentadas as principais características, um rápido histórico, a
diferenciação entre concessão e permissão de serviços públicos e as formas de
extinção deste tipo de delegação.
O capítulo terceiro dispõe sobre o
tema principal do trabalho, as Agências Reguladoras. Inicialmente, serão
abordados o histórico, o conceito, as principais características, a natureza
jurídica, a criação, a extinção, os objetivos dessas autarquias especiais. No
segundo momento, serão apresentadas as principais Agências Reguladoras
existentes no Brasil e a diferença entre Agências Reguladoras e Agências
Executivas. Na última parte, desenvolve-se o tópico que levou à realização da
monografia: a interferência das Agências Reguladoras nas empresas
concessionárias de serviços públicos.
Nas considerações finais, fez-se um
esforço reflexivo sobre os alcances e limites do tema investigado e da própria
pesquisa em si.
Esclarece-se que, o tema da
monografia é muito abrangente, motivo pelo qual no desenvolver do trabalho foram
apresentadas as principais características de cada entidade estudada, ou seja,
das Sociedades empresárias, das concessionárias de serviços públicos e das
Agências Reguladoras, para dar uma rápida noção de cada um desses entes. Assim,
não se teve a intenção de esgotar o tema.
Este assunto demanda um estudo bem
mais aprofundado que poderá ser feito em futuro trabalho
científico.
1 SOCIEDADES EMPRESÁRIAS NO DIREITO
BRASILEIRO
Para melhor compreender o papel das
Sociedades Empresárias no Direito Brasileiro, faz-se necessário analisar, de
forma sintética, o surgimento das Sociedades no Brasil e no
mundo.
A análise da evolução histórica do
homem mostra que o seu desenvolvimento socioeconômico se deu gradativamente, em
períodos diferenciados. Em cada um desses períodos acrescenta às suas conquistas
elementos novos e fundamentais à sua sobrevivência: trabalha a pedra,
confecciona instrumentos adequados à caça ou à sua defesa pessoal, constrói
habitações, descobre o fogo e passa dele utilizar-se; ao uso da pedra sucede-se
o uso do bronze etc., levando-o das necessidades individuais às necessidades dos
grupos, forçando-o, outrossim, a socorrer-se de novas formas de produção
(ALMEIDA, 2003, p. 3).
As pioneiras manifestações de
Sociedade encontram-se na reunião de duas ou mais pessoas que, unindo esforços e
bens, buscam partilhar entre si os resultados da atividade comum. Na dificuldade
de atingir determinados fins, atuando sozinho, o homem juntou-se a outros,
construindo assim as Sociedades (DORIA, 1998, p. 155).
Os povos antigos que se dedicaram ao
comércio tiveram, naturalmente, que criar, ainda que baseado nos costumes, as
normas aplicáveis aos negócios associativos (BORBA, 1997, p.
21).
No Direito Romano surgiram as
primeiras leis, as quais se tem conhecimento, que vislumbra a origem do direito
societário. José Edwaldo Tavares Borba afirma que surgiram os vestígios na
Sociedade familiar, ou seja:
Vestígios do contrato de Sociedade podem ser
identificados na Sociedade familiar, nas indivisão, entre os herdeiros, do
patrimônio constitutivo da herança, para o efeito de uma administração comum –
Sociedade familiar. Posteriormente ocorreriam nas Sociedades de publicanos, as
quais tinham por escopo explorar atividades ligadas ao Poder Público, inclusive
o recolhimento de rendas do Estado (BORBA, 1997, p. 21).
Todavia, foi na força mercantilista da Idade
média, principalmente nas cidades italianas, que surgiram o modelo mais próximo
da atual Sociedade empresária. Desenvolveu-se, ainda, a idéia de separação dos
patrimônios dos sócios em relação ao patrimônio da Sociedade. Nesta época, as
Sociedades eram eminentemente intuito personae, na qual o que aproximava
os sócios eram as suas características pessoais e seus objetivos em comum. Este
conjunto denomina-se de affectio societates, características existentes
até os dias de hoje nas chamadas Sociedades de pessoas (BERTOLDI, 2003, p.
160).
Na era do Renascimento e dos descobrimentos das
Américas surgiram as companhias colonizadoras, como a Companhia das Índias
Orientais, criada em 1602. Foi um período de grande crescimento para o comércio.
Nestas Sociedades, havia uma grande quantidade de capitais divididos em ações,
que por sua vez, eram distribuídos entre um grande número de pessoas. Não
importava mais as características pessoais dos sócios, bastando para entrar na
Sociedade a contribuição financeira. Assim, tem-se o surgimento das chamadas
Sociedades de capital (BERTOLDI, 2003, p. 160).
A Sociedade limitada surgiu na Alemanha, na
última década do século XIX, sendo a mais recente das formas societárias (BORBA,
1998, p. 22)
Após uma rápida retrospectiva do
surgimento das Sociedades é de fundamental importância analisar a sua atual
conjuntura. Desta forma, passaremos a estudar: a Sociedade; a personalidade
jurídica; a desconsideração da personalidade jurídica; os tipos de Sociedade,
como: as personificadas e não personificadas, as contratuais e institucionais,
de pessoas e de capital, de responsabilidade limitada, ilimitada e mista, as
Sociedades simples e empresária; os tipos de Sociedades empresárias, como as
anônimas e as limitadas.
1.1 A SOCIEDADE NO DIREITO
BRASILEIRO
Sociedade pode ser entendida como a
união de duas ou mais pessoas que se obrigam a reunir esforços e bens,
repartindo assim, os lucros obtidos (BORGES apud DORIA, 1998, p.
156).
Fran Martins, a define como:
"entidade resultante de um acordo de duas ou mais pessoas, que se comprometem a
reunir capitais e trabalho para a realização de operações com fim lucrativo"
(MARTINS, 2002, p. 135).
O Código Civil em seu artigo 981,
dispõe que:
Celebram contrato de Sociedade as pessoas que
reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício
de atividade econômica e a partilha, entre, si dos
resultados.
Com a entrada em vigor do Código Civil de 2002,
introduzido pela Lei nº 10.406, a antiga Sociedade comercial passou a ser
chamada de Sociedade Empresária, podendo ser assim conceituada: entidade
resultante de um acordo de duas ou mais pessoas, que se comprometem a reunir
capitais e trabalho para a realização de operações com o fim lucrativo, ou seja,
é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas convencionam por alguma coisa em
comum, para o exercício de atividade comercial lícita, visando à maximização de
seus lucros, com responsabilidades definidas em caso de perdas (BERTOLDI, 2003,
p. 160/161).
O antigo ordenamento jurídico
brasileiro que disciplinava a economia privada era afiliado ao sistema francês,
uma vez que, adotava a Teoria dos Atos de Comércio, a qual distingue Sociedade
comercial e Sociedade civil. A diferença pairava sobre a natureza do objeto,
sendo que as primeiras praticavam atos de comércio; estavam sujeitas a
falências, concordatas; obrigação de escriturar livros comerciais etc. Por outro
lado, a Sociedade que não praticasse atos de comércio era considerada
civil.
Com o novo ordenamento jurídico a
teoria adotada passou a ser a italiana, a qual se baseia na Teoria da Empresa. A
antiga classificação de Sociedade civil e comercial deixou de existir, passando
a unificar a legislação privada sem fazer distinção. A antiga Sociedade
Comercial passou a ser denominada de Sociedade Empresária.
A seguir será examinada a maneira
pela qual a Sociedade adquiri personalidade jurídica, ferramenta pela qual o
Direito estabelece para um ente incorpóreo a pratica de todo e qualquer ato ou
negócio jurídico em relação ao qual não tenha proibição
expressa.
1.1.1 A personalidade
jurídica
Segundo Fran Martins: "Entende-se
por pessoa jurídica o ente incorpóreo que, como as pessoas físicas, pode ser
sujeito de direitos" (MARTINS, 2002, p. 148).
J. X. Carvalho de Mendonça utilizou
o conceito de pessoa jurídica de Fadda e Bensa, in verbis: "a pessoa
jurídica é o ente que, não sendo homem, é provido de capacidade de direito"
(MENDONÇA, 2001, p. 94).
O mesmo autor ressalta que do
conceito de pessoa jurídica decorrem alguns elementos essenciais, são
eles:
[...] 1º a capacidade de determinar-se a agir
para a defesa e consecução dos seus fins, por meio dos indivíduos, que figuram
como seus órgãos; 2º o patrimônio autônomo, isto é, não pertence a nenhum dos
indivíduos que a compõem; 3º as obrigações ativas e passivas a seu cargo
exclusivo; e 4º a representação em juízo.(MENDONÇA, 2001, p.
94/95).
A pessoa jurídica constitui uma
ferramenta do direito utilizado para simplificar a disciplina de determinadas
relações entre os homens em Sociedade. Ela não tem existência fora do direito,
ou seja, fora dos conceitos tecnológicos compartilhados pelos integrantes do
mundo jurídico. Tal expediente tem o sentido bastante preciso, de autorizar
determinados sujeitos de direito à prática de atos jurídicos em geral (COELHO,
2003b, p. 112).
As principais teorias utilizadas
para justificar a existência das pessoas jurídicas são: Teoria Pré-normativista
e Teoria Normativista.
A primeira considera a pessoa
jurídica, nas palavras de Fábio Ulhoa Coelho, como:
[...] seres de existência anterior e
independente da ordem jurídica. Para os seus adeptos, a disciplina legal da
pessoa jurídica é mero reconhecimento de algo preexistente, que a ordem positiva
não teria como ignorar. Segundo entendem, além do ser humano, também elas se
apresentam ao direito como realidades incontestáveis, como os reais sujeitos das
ações dotadas de significado jurídico (COELHO, 2003a, p.
8).
Essa idéia de que a pessoa jurídica
existe antes que a lei a regule tem fundamento no conceito do direito subjetivo.
Assim, é a vontade o ato fundamental do direito:
[...] onde existe uma vontade capaz de se
determinar, existe um direito e, portanto, um sujeito de direitos, isto é: uma
pessoa. Pela mesma razão por que se reconhece a pessoa natural, de existência
visível, há de se reconhecer a pessoa jurídica, distinta das pessoas físicas que
formam, tendo uma vontade própria (MARTINS, 2002, p. 149).
A Teoria Normativista, defendida por
Ihering, Savigny, Laurent e outros, considera a pessoa jurídica como uma criação
do direito. Para Ihering: "as pessoas jurídicas são seres fictícios criados
artificialmente pelo direito positivo, pois a idéia natural da pessoa coincide
com a do indivíduo" (IHERING apud MARTINS, 2002, p. 148). Assim, a
existência da pessoa jurídica depende da vontade do legislador, sendo ela mera
criação da lei.
A teoria utilizada hoje é a que
considera as pessoas jurídicas como uma ficção do direito ou como uma pessoa
real, existindo antes da lei (MARTINS, 2002, p. 149).
No Reino Unido, a personalização da
Sociedade é associada à limitação da responsabilidade dos sócios. Nestes
sistemas, são despersonalizadas as Sociedades em que os sócios respondem
integralmente pelas obrigações sociais. No ordenamento jurídico brasileiro não
existe, necessariamente, esta correlação entre os esses dois temas societários,
ou seja, a personalização da Sociedade não está sempre ligada a limitação da
responsabilidade dos seus integrantes (COELHO, 2003a, p.
7).
A diferença entre o sujeito
personalizado do despersonalizado consiste no regime jurídico que a ele está
subordinado, em termos de autorização genérica para a prática dos atos
jurídicos. Enquanto as pessoas estão autorizadas a praticar todos os atos
jurídicos a que não estejam expressamente proibidos, os sujeitos de direito
despersonalizados só poderão praticar atos a que estejam, explicitamente,
autorizados pela lei (COELHO, 2003b, p. 112).
Portanto, o sujeito de direito
personalizado pode praticar todos os atos jurídicos, desde que não haja
proibição. Os entes despersonalizados só poderão praticar ato essencial ao
cumprimento de sua função, ou seja, aqueles que estão explicitamente
permitidos.
A Sociedade Empresária, como pessoa
jurídica, é sujeito de direito personalizado, assim, poderá praticar todo e
qualquer ato ou negócio jurídico em relação ao qual não tenha proibição expressa
(COELHO, 2003b, p. 113).
De acordo com o art. 40 do Código
Civil Brasileiro, as pessoas jurídicas são classificadas em dois grandes grupos:
pessoas jurídicas de direito público (União, Estados, Distrito Federal,
Municípios, autarquias etc.) e pessoas jurídicas de direito privado
(associações, Sociedades, fundações, partidos políticos e entidades
religiosas).
A principal diferença das pessoas
jurídicas de direito público e privado consiste no regime jurídico a que se
submetem. As primeiras encontram-se disciplinadas pelo direito público, e as
últimas, pelo direito privado (COELHO, 2003a, p. 11/12).
As pessoas jurídicas de direito
privado são separadas em duas categorias: as estatais e as particulares. O traço
diferencial entre elas é a procedência dos recursos empregados, sendo que, as
primeiras são constituídas por capital proveniente do Poder Público e as
particulares por recursos dos particulares.
As pessoas jurídicas de direito
privado particular são divididas em Sociedades, associações, fundações,
entidades religiosas e partidos políticos. Amador Paes de Almeida faz a
diferenciação entre elas:
A Sociedade empresária (mercantil ou civil)
caracteriza-se, sobretudo, pela finalidade lucrativa, inteiramente ausente nas
associações e fundações. As associações têm fins ideais, como as associações
científicas, literárias, artísticas, religiosas, beneficentes e recreativas. As
fundações, da mesma forma, têm finalidades religiosas, morais, culturais ou de
assistência. Distingue-se das associações porque, ao contrário destas últimas,
estão (as fundações) subordinadas aos fins preestabelecidos por seus
instituidores ou fundadores (ALMEIDA, 2003, p. 4/5)
De acordo com os arts. 45 e 985 do
Código Civil Brasileiro, a Sociedade adquire a sua personalidade jurídica a
partir da inscrição dos seus atos constitutivos no respectivo registro, e quando
necessário será precedida de autorização ou aprovação do Poder Executivo. A
responsabilidade do registro das Sociedades Empresárias ficará a cargo das
Juntas Comerciais.
As Sociedades Empresárias que
arquivam seus atos constitutivos no Registro Público de Empresas Mercantis
adquirem, assim, personalidade jurídica. São chamadas, por isso, Sociedades
personificadas. Ao contrário, as que não fazem, tenham ou não contrato escrito,
eram denominadas Sociedades não-personificadas, hoje Sociedade em comum,
conforme prevê o art. 986 do Código Civil (REQUIÃO, 2003, p.
381).
No que se refere as Sociedades em
Comum, o art. 990 do Código Civil estabelece que os sócios responderão de forma
solidária e ilimitada pelas obrigações sociais.
A partir da formação do contrato ou
estatuto social a Sociedade Empresária passa a existir, mesmo que em situação
irregular. Mas, com o registro perante a Junta Comercial, torna pública a sua
existência, facilitando o seu controle perante a sociedade, e passa a adquirir
personalidade jurídica.
O art. 45 do Código Civil
Brasileiro, prevê:
Começa a existência legal das
pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no
respectivo registro, procedida, quando necessário, de autorização ou aprovação
do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar
o ato constitutivo.
No mesmo sentido, o art. 1.150 do
mesmo diploma legal estabelece que:
O empresário e a Sociedade
empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das
Juntas Comerciais, e a Sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas
Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a
Sociedade simples adotar um dos tipos de Sociedade
empresária.
A partir da criação da pessoa
jurídica surge o princípio da autonomia patrimonial, que se destaca como um dos
elementos fundamentais do direito comercial, no qual os sócios, de um modo
geral, não respondem pelas obrigações da Sociedade. Ocorrendo, dessa forma, a
separação entre a pessoa jurídica e os membros que a
compõem.
Fábio Ulhoa Coelho classificou esse
princípio como:
a) Titularidade Negocial – quando a Sociedade
empresarial realiza negócios jurídicos, embora ela o faça necessariamente pelas
mãos de seu representante legal, é ela, pessoa jurídica, como sujeito de direito
autônomo, personalizado, que assume um dos pólos da relação negocial. O eventual
sócio que a representou não é parte do negócio jurídico, mas sim a
Sociedade.
b) Titularidade Processual – a pessoa jurídica
pode demandar e ser demandada em juízo; tem capacidade para ser parte
processual. A ação referente a negócio da Sociedade deve ser endereçada contra a
pessoa jurídica e não os seus sócios ou seu representante legal. Quem outorga
mandato judicial, recebe citação, recorre, é ela como sujeito de direito
autônomo.
c) Responsabilidade Patrimonial – em
conseqüência, ainda, de sua personalização, a Sociedade terá patrimônio próprio,
seu, inconfundível e incomunicável com o patrimônio individual de cada um de
seus sócios. Sujeito de direito personalizado autônomo, a pessoa jurídica
responderá com seu patrimônio pelas obrigações que assumir. Os sócio, em regra,
não responderão pelas obrigações da Sociedade. Somente em hipótese excepcionais,
que serão examinadas a seu tempo, poderá ser responsabilizado o sócio pelas
obrigações da Sociedade (COELHO, 2003b, p. 113/114).
O princípio da autonomia
patrimonial, base do direito societário, é de fundamental importância para o
desenvolvimento de atividades econômicas, da produção e circulação de bens e
serviços, pois limita a possibilidade de perdas nos investimentos mais
arriscados (COELHO, 2003a, p. 15).
O término da pessoa jurídica ocorre
por meio de dissolução judicial ou extrajudicial, o que se denomina de
despersonalização da forma jurídica. O simples fato de a Sociedade estar inativa
não vai acarretar o fim da pessoa jurídica, uma vez que é obrigatório o processo
de dissolução.
O processo de dissolução, iniciado
por atos praticados pelos sócios ou pelo Poder Judiciário, compreende três
fases: dissolução (dissolução em sentido estrito); liquidação (quitar as dívidas
e obrigações ainda pendentes); partilha (momento de distribuir entre os sócios,
quando existente, o saldo patrimonial).
Enquanto a dissolução não se
concretiza, a Sociedade continua titular de personalidade jurídica própria e
todos os efeitos derivados da personalização se verificam (COELHO, 2003a, p.
18).
A seguir, será analisado o fenômeno
da desconsideração da personalidade jurídica. Fato que foi recepcionado pelo
atual Código Civil Brasileiro para coibir a utilização fraudulenta das
Sociedades pelos seus sócios.
1.1.2 A desconsideração da
personalidade jurídica
Com a criação da personalidade
jurídica há a distinção entre direitos e obrigações da Sociedade e dos sócios
que a compõem, ou seja, há a concretização do princípio da autonomia
patrimonial.
Com a finalidade de impedir a
utilização temerária e fraudulenta das Sociedades por seus próprios sócios é que
surgiu, nos tribunais ingleses e norte-americanos, a chamada doutrina do
Disregard of Legal Entity, conhecida no Brasil como a Teoria da
Desconsideração da Personalidade Jurídica. Por essa teoria permite-se que os
credores invadam o patrimônio pessoal dos sócios que se utilizaram
maliciosamente da Sociedade com o objetivo claro de prejudicar terceiros. A
partir da aplicação desta teoria não se pretende anular a personalidade
jurídica, mas, tão-somente, afastá-la em situações-limites, devendo ser
comprovada a sua utilização em desconformidade com o ordenamento jurídico e
mediante fraude (BERTOLDI, 2003, p. 165)
A teoria da desconsideração da
personalidade jurídica é utilizada sempre que, por má-fé, dolo ou atitude
temerária, a Sociedade estiver sendo empregada não para o exercício regular do
comércio, mas para desvios ou a aventura de seus titulares (BORBA, 1997, p.
32)
O pressuposto da desconsideração da
personalidade jurídica é a fraude cometida com o uso da autonomia patrimonial da
pessoa jurídica.
Na legislação brasileira, a
desconsideração da personalidade jurídica está prevista nos arts. 28 do Código
de Defesa do Consumidor, 18 da Lei Antitruste (LIOE), 4º da legislação protetora
do meio ambiente (Lei nº 9.605/98) e 50 do Código Civil de
2002.
Segundo o art. 50 do Código
Civil:
Em caso de abuso da personalidade jurídica,
caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o
juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe
couber intervir no processo, que os efeitos das cartas e determinadas relações
de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou
sócios da pessoa jurídica.
Como pode se observar a teoria da
desconsideração da personalidade jurídica deve ser um meio utilizado para coibir
fraudes, sem comprometer o próprio instituto da pessoa jurídica, ou seja, sem
questionar a regra da separação de sua personalidade e patrimônio em relação aos
seus membros (COELHO, 2003a, p. 39).
A dissolução da Sociedade, tópico a
ser analisado em seguida, é a ato realizado para extinguir a personalidade
jurídica da Sociedade. Pode ocorrer de pleno direito, ou seja, independe da
vontade das partes ou em decorrência de uma sentença judicial. Está prevista nos
artigos 1.033 e 1.034 do Código Cuvil.
1.1.3 Dissolução de Sociedade em
geral
As Sociedades Empresárias adquirem
vida no momento em que duas ou mais pessoas se reúnem e as constituem com o
objetivo de exploração de alguma atividade econômica De outro vértice, a
extinção, ocorre quando verificada a ocorrência de algum fato que impeça sua
continuidade. A extinção se dá através do ato chamado dissolução (BERTOLDI,
2003, p. 168).
A dissolução pode ocorrer de pleno
direito, ou seja, independe da vontade das partes ou em decorrência de uma
sentença judicial. As hipóteses de cabimento estão previstas, respectivamente,
nos arts. 1.033 e 1.034 do Código Civil.
As hipóteses de dissolução de pleno
direito são:
I - expiração do prazo de duração,
salvo se, vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a Sociedade em
liquidação, hipótese em que se prorrogará por tempo
indeterminado;
II – consenso unânime entre os
sócios;
III – deliberação dos sócios, por
maioria absoluta, na Sociedade de prazo indeterminado;
IV – a falta de pluralidade de
sócios, não reconstituída no prazo de 180 (cento e oitenta)
dias;
V – extinção, na forma da lei, de
autorização para funcionar.
Nas hipóteses de dissolução por
deliberação dos sócios, a doutrina e a jurisprudência têm interpretado estes
casos com base no princípio da preservação da empresa, no qual, se um único
sócio, mesmo minoritário, que tiver o interesse de continuar com a pessoa
jurídica, poderá faze-lo, desde que admitido mais um sócio. Assim, a eficácia da
dissolução da Sociedade poderá ser questionada em juízo pelo minoritário
dissidente. Aqui, a dissolução ocorrerá em relação aos sócios e não a pessoa
jurídica.
O inciso V, do artigo acima citado,
refere-se às Sociedades que dependem de autorização do Poder Público para
funcionar. Esta autorização poderá ser cassada em qualquer momento que a
Sociedade infringir disposição de ordem pública ou praticar atos contrários aos
fins declarados no seu estatuto. Tal previsão está disposta no art. 1.125 do
CC.
As hipótese de dissolução em
decorrência de sentença judicial são:
I – anulação da constituição da
Sociedade;
II – exaurido o fim social da Sociedade, ou
quando verificada a sua inexeqüibilidade.
São exemplos de inexeqüibilidade do objeto
social: a) inexistência de mercado para o produto ou serviço fornecido pela
Sociedade (falta de interesse dos consumidores); b) insuficiência do capital
social para produzir ou circular o bem ou serviço referido como objeto no
contrato social; c) a grave desinteligência entre os sócios, que impossibilite a
continuidade de negócios comuns (COELHO, 2003b, p. 171).
A falência é outra causa de
dissolução da Sociedade. No entanto, só ocorrerá a efetiva dissolução com o
encerramento do processo de falência. Havendo a possibilidade de ser reformada a
sentença de falência, ou a falência ser convertida em concordata suspensiva, não
haverá a extinção da Sociedade.
Ademais, além das causas acima
citadas, a dissolução poderá ocorrer por meio do contrato social. Este poderá
prever outros aspectos relacionados como: a particularidade do negócio ou a
vontade dos sócios. Pode ser citado como exemplos: não-obtenção de determinados
patamares mínimos de lucro, redução do número de sócios a limites prefixados etc
(COELHO, 2003b, p. 171).
Depois de consolidada a dissolução
da Sociedade será iniciada o processo de liquidação do patrimônio social. Neste
ato será realizado o ativo e satisfeito o passivo, ou seja, todos os bens e
direitos pertencentes à Sociedade serão transformados em dinheiro para o
pagamento aos seus credores, e o saldo, que porventura sobrar desta operação,
será destinado aos sócios na proporção de seus quinhões. Na liquidação, muito
embora a Sociedade ainda exista, não mais poderá praticar normalmente os atos
que vinha executando, mas, tão-somente, aqueles necessários para levar a cabo a
liquidação (BERTOLDI, 2003, p. 173).
Neste momento, passaremos a analisar
os tipos de Sociedades existentes na legislação
brasileira.
1.2 TIPOS DE SOIEDADES NO DIREITO
BRASILEIRO
Várias são as formas de
classificação das Sociedades Empresárias apresentadas, atualmente, pela
doutrina. Dentre estas, as mais utilizadas pelos doutrinadores, por serem
consideradas mais lógicas e didáticas são: a responsabilidade dos sócios
(limitada, ilimitada, mista); a estrutura econômica (Sociedade de capital ou de
pessoas); o regime de constituição e dissolução do vínculo societário
(contratuais ou institucionais); a personificação (personificadas e não
personificadas).
O art. 983 do Código Civil
Brasileiro estabelece que a Sociedade empresária deve adotar uma das formas
previstas dentre os artigos 1.039 a 1.092 do mesmo diploma legal, são elas:
Sociedade em Nome Coletivo; Sociedade em Comandita Simples; Sociedade Limitada;
Sociedade Anônima ou Sociedade em Comandita por Ações.
Os tipos societários mais utilizados
são: as Sociedades Limitadas e a Sociedade Anônima. As demais Sociedades
praticamente estão em desuso no meio empresarial, e isto se explica,
especialmente, pelo fato de seus sócios, ou pelo menos uma classe deles, serem
responsabilizados ilimitadamente pelas dívidas da Sociedade, o que fez com que
caíssem em desuso (BERTOLDI, 2003, p. 202).
Inicialmente, serão abordadas as
Sociedades personificadas e não-personificadas.
1.2.1 Sociedades personificadas e
não-personificadas
As Sociedades Não-personalizadas são
irregulares denominadas pelo Código Civil de Sociedades em Comum. São aquelas
que não possuem seus atos constitutivos devidamente registrados no órgão
competente. Assim, estabelece o art. 986 do Código Civil:
Enquanto não inscritos, os atos
constitutivos, reger-se-á a Sociedade, exceto por ações em organização, pelo
disposto neste Capítulo, observadas, subsidiariamente e no que com ele forem
compatíveis, as normas da sociedade simples.
Já as personalizadas são aquelas que
efetuaram seus registros no órgão competente, ou seja, adquiriram personalidade
jurídica distinta de seus sócios. Neste sentido, dispõe o art. 985 do Código
Civil:
A Sociedade adquire personalidade
jurídica com a inscrição, no registro próprio e na forma da lei, dos seus atos
constitutivos (arts. 45 e 1.150).
Assim, a Sociedade empresária deverá
ser personalizada, conforme dispõe Amador Paes de Almeida:
[...] Sociedade empresária é aquela Sociedade
personalizada (pessoa jurídica) que exerce atividade econômica. No âmbito do
Direito Comercial, é a Sociedade regular ou de direito cujos atos constitutivos
foram regularmente inseridos no órgão competente. A Sociedade empresária é a
titular da empresa, não se confundindo, assim, com as pessoas físicas de seus
respectivos sócios (ALMEIDA, 2003, p. 52).
Desta forma, a Sociedade
personalizada é aquela que possui seus atos constitutivos registrados no órgão
competente e as não personalizadas, ao contrário, não possuem esse
registro.
A responsabilidade dos sócios em
relação à Sociedade decorre do princípio da autonomia patrimonial. Este
princípio é de fundamental importância, pois a partir dele será diferenciado as
obrigações da Sociedade e de seus sócios. No tópico seguinte iremos discorrer
sobre o assunto.
1.2.2 A Sociedade de
responsabilidade limitada, ilimitada e mista, de pessoas e de capital e as
contratuais e institucionais:
De acordo com o princípio da
autonomia patrimonial os bens e obrigações dos sócios são distintos da pessoa
jurídica, assim, aqueles não respondem, em regra, pelas obrigações contraídas
por esta.
Nestes tipos societários, a
responsabilidade dos sócios será subsidiária, conforme dispõe o art. 1.024 do
Código Civil e 596 do Código de Processo Civil, esta sempre será subsidiária.
Neste caso, os sócios só responderam com seus bens após o exaurimento do
patrimônio da Sociedade.
As Sociedades respondem, elas
próprias, sempre ilimitadamente pelas obrigações contraídas, envolvendo, assim,
todo o seu patrimônio nos negócios que realizam. Para cobrir os seus débitos,
poderá ser utilizado todo o seu capital (BORBA, 1997, p.
56/57).
São consideradas Sociedades
limitadas aquelas "quando o contrato social restringe a responsabilidade dos
sócios ao valor de suas contribuições ou à soma do capital
social".(REQUIÃO, 2003, p. 361). São exemplos deste tipo de
Sociedade: a Sociedade Anônima e as Sociedades Limitadas.
Ao contrário, as Sociedades
ilimitadas são aquelas que respondem de forma subsidiária, ilimitada e solidária
pelas obrigações assumidas pela Sociedade. São exemplos deste tipo de Sociedade:
em Nome Coletivo e as Sociedades em Comum.
As Sociedades mistas são aquelas que
há duas espécies de sócios: a) os que respondem ilimitadamente pelas obrigações
sociais; b) os que, quando não tem qualquer responsabilidade pecuniária, apenas
respondem, de maneira limitada, pelas obrigações assumidas pela Sociedade
(DORIA, 1998, p. 168). São exemplos deste tipo de Sociedades: Comandita Simples
e as em Comandita por Ações.
Sociedades de pessoas são aquelas em
que a pessoa do sócio tem papel fundamental, não apenas na constituição como
durante a vida da pessoa jurídica. Assim, constituindo-se uma dessas Sociedades,
ficará a sua existência, dependente à pessoa dos sócios, sendo que, a morte ou a
incapacidade de um refletirá na pessoa jurídica, provocando, assim, sua
dissolução (MARTINS, 2002, p. 161).
Neste tipo de Sociedade, como afirma
Marcelo M. Bertoldi:
[...] a razão de sua existência baseia-se na
confiança recíproca que cada sócio deposita nos demais e nas características
pessoais de cada um deles, a sua constituição se dá intuitu personae, ou seja,
são razão de ordem pessoal que fazem determinadas pessoas se reunirem para a
criação da Sociedade (BERTOLDI, 2003, p. 196).
Sociedade de capital são aquelas em
que não existe restrição quanto a entrada de novos sócios, sendo vedada qualquer
limitação a comercialização das cotas ou ações representativas do capital
social. A característica fundamental, neste tipo de Sociedade, é a contribuição
financeira do sócio, não importando, assim, suas características e aptidões
pessoais (BERTOLDI, 2003, p. 196).
Outra característica que diferencia
as Sociedades de pessoas e de capital é aquela referente às regras e aos
princípios para a constituição. Amador Paes de Almeida afirma
que:
[...] as Sociedades de pessoas cercam-se de
menor formalismo, escudada exatamente no relacionamento pessoal, normalmente
instituídas por meio de contratos particulares; as de capital, ao revés, estão
sujeitas ao rigorismo da lei, com a exigência de uma série de requisitos
impostergáveis (ALMEIDA, 2003, p. 49).
Entende-se que não existe Sociedade
composta unicamente por "pessoas" ou exclusivamente por "capital". Toda
Sociedade surge da união desses dois elementos, ambos imprescindíveis. O que faz
uma Sociedade ser "de pessoas" ou "de capital" é, na verdade, o direito de o
sócio impedir o ingresso de terceiro não sócio no quadro associativo existente
nas de perfil personalístico e ausente nas de perfil capitalístico (COELHO,
2003b, p. 122).
Podem ser classificadas como
Sociedade de pessoas: Sociedade em Nome Coletivo; Sociedade em Comandita
Simples; Sociedades em Conta de Participação; Sociedades Limitadas. As
Sociedades de capital são: Comandita por Ações e Sociedade
Anônima.
No que se refere às Sociedades
contratuais e institucionais, o traço diferencial são os regimes de constituição
e dissolução das Sociedades Empresárias.
Sociedades contratuais são aquelas
cujo ato de constituição e de regulamentação tem natureza
contratual.
Fábio Ulhoa Coelho, entende que para
a dissolução das Sociedades contratuais:
[...] não basta a vontade majoritária dos
sócios, reconhecendo a jurisprudência o direito de os sócios, mesmo
minoritários, manterem a Sociedade, contra a vontade da maioria; além disto, há
causas específicas de dissolução desta categoria de Sociedades, como a morte ou
a expulsão dos sócios (COELHO, 2003b, p. 120).
São exemplos de Sociedades
contratuais: Sociedade em nome coletivo, em comandita simples e a Sociedade
limitada.
As Sociedades institucionais,
também, designadas como estatutárias, ao contrário das contratuais, não têm como
fundamento a presença plena da autonomia da vontade, isto é, aos sócios não
cabe, normalmente, a ampla discussão a respeito das regras que regem a
Sociedade, motivo pelo qual o ato que rege não tem natureza contratual, mas sim
institucional ou estatutária (BERTOLDI,2003, p. 197/198).
A dissolução neste tipo de Sociedade
ocorre por meio da vontade da maioria dos sócios, mas, pode ocorrer também por
meio de liquidação e intervenção extrajudicial.
São exemplos de Sociedades
institucionais: Sociedade Anônima e em Comandita por
Ações.
As Sociedades contratuais têm seus
atos de constituição e de dissolução regidos pelo Código Civil, ao passo que as
institucionais, em regra, são pela Lei nº 6.404/76.
No tópico seguinte passaremos a
analisar a diferença entre Sociedade simples e empresária.
1.2.3 A Sociedades simples e a
Sociedade empresária
O Código Civil em seu art. 982
divide as Sociedades em Simples e Empresárias. O qual
dispõe:
Salvo exceções expressas,
considera-se empresária a Sociedade que tem por objeto o exercício de atividade
própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as
demais.
Amador Paes de Almeida faz a
diferenciação entre Sociedades simples e empresária:
Sociedade Empresária é a "regular ou
de direito (personalizada), que explora atividade econômica organizada,
estruturada sobre os diversos fatores da produção, a saber: empresário,
estabelecimento, empregados e atividade da empresa" (ALMEIDA, 2003, p.
94).
Sociedade Simples "é aquela
que não possui estrutura empresarial, faltando-lhe, pois, a organização dos
fatores de produção" (ALMEIDA, 2003, p. 94).
Por outro lado, Fábio Ulhoa Coelho
entende que esta diferença reside no modo de exploração de seu objeto.
Assim:
O objeto social explorado sem
empresarialidade (isto é, sem profissionalmente organizar os fatores de
produção) confere à Sociedade o caráter de simples, enquanto a exploração
empresarial do objeto social caracterizará a Sociedade como empresária (COELHO,
2003b, p. 111).
Nas palavras de Fábio Ulhoa Coelho
Sociedade Empresária é:
[...] a pessoa jurídica que explora uma
empresa. Atente-se que o adjetivo "empresária" conota ser a própria
Sociedade (e não os seus sócios) a titular da atividade econômica. Não se trata,
com efeito, de Sociedade empresarial, corresponde à Sociedade de
empresários, mas da identificação da pessoa jurídica como o agente
econômico organizador da empresa (COELHO, 2003a, p.5)
Desta forma, pode-se constatar que
Sociedade empresária é aquela que pratica uma atividade econômica organizada
para a produção ou para a troca de bens de serviços.
O Código Civil deu um formato
diferenciado a uma nova modalidade de contrato social no Direito Positivo
Brasileiro, originário do Códice Civile de 1942, que é a Sociedade
Simples. Esta Sociedade foi concebida com duas finalidades: a primeira de se
distinguir das Sociedades Empresárias, adotando objetivo diferente da atividade
empresarial, e a segunda de servir de modelo ou fonte complementar dos demais
modelos societários. A Sociedade Simples é uma Sociedade-padrão para as
Sociedades empresárias, como também uma espécie distinta quanto ao objeto,
destinadas exclusivamente às atividades não empresariais (NEGRÃO, 2003, p.
302).
Sociedade Simples, portanto, é
aquela que:
[...] não possui estrutura empresarial,
faltando-lhe, pois, a organização dos fatores de produção. Toda empresa
pressupõe uma organização composta da reunião dos diversos fatores da produção,
a saber: elemento subjetivo (empresário); elemento objetivo (o estabelecimento);
elemento corporativo (os empregados) e elemento funcional (a
atividade).(ALMEIDA, 203, p. 94/95).
No entanto, a Sociedade Simples não
se constitui de tais elementos, conforme dispõe o art. 983 do Código Civil. Ela
poderá ser revestida na forma de Sociedade em Comandita Simples, em Nome
Coletivo e Limitada. Deverão ser prestadoras de serviços.
Assim, as Sociedades Simples são
aquelas constituídas por pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com
bens e serviços, para execução de atividade econômica e distribuição dos
resultados, entre si. No entanto, não terão o objetivo de praticar atividade
eminentemente empresária.
Rubens Requião utilizou o conceito
de Sociedade Simples de Alfredo de Assis Gonçalves Neto: "Sociedade simples deve
ser considerada como aquela que terá por objeto o exercício de atividade rural
ou intelectual, de natureza científica, literária ou
artística".(GONÇALVES NETO apud REQUIÃO, 2003, p.
403).
O Código Civil Brasileiro não
oferece um conceito próprio de Sociedade Simples, sendo definida por exclusão
daquilo que não é considera Sociedade Empresária.
Pode ser citado como exemplo, dois
dentistas que se unem para a pesquisa e desenvolvimento de determinada
escovação, estes divulgam os resultados em congressos e periódicos. Aqui seria
uma Sociedade Simples, pois praticam atividade eminentemente intelectual. Mas,
se esta mesma Sociedade utilizar sua capacidade intelectual para o atendimento
de pacientes em consultório ou ministrando cursos, estarão explorando seus
conhecimentos intelectuais com características empresariais. Assim, de acordo
com o parágrafo único do art. 996 do Código Civil, esta Sociedade deixa de ser
simples e passa a ser empresária.
A Sociedade Simples constitui-se por
contrato escrito que deverá conter: I – nome, nacionalidade, estado civil,
profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e, se pessoas jurídicas,
a firma ou denominação, nacionalidade e sede; II – denominação, objeto, sede e
prazo; III – capital da Sociedade, expresso em moeda corrente, podendo
compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária; IV –
a cota de cada sócio no capital e o modo de realiza-la; V – prestação do sócio
cuja contribuição consista em serviço; VI – pessoas naturais incumbidas da
administração da Sociedade, seus poderes e atribuições; VII – participação de
cada sócio nos lucros e nas perdas; VIII – se os sócios respondem ou não,
subsidiariamente, pelas obrigações sociais (art. 997 do Código
Civil).
É por meio do contrato que a
Sociedade irá regulamentar suas atividades e obrigações, devendo este, estar nos
moldes da legislação vigente. Toda a alteração realizada nele deverá ser
aprovada por todos os sócios, podendo ser por maioria absoluta ou
não.
Não poderão ser opostos a terceiros
os pactos em separado, regras de conveniência entre os sócios, acordo de sócios,
que tenham como fim assuntos regulamentados pelo contrato social, relativos à
própria estrutura da Sociedade Simples, se de alguma forma forem de encontro com
alguma norma do contrato social, (REQUIÃO, 2003, p. 404).
O art. 998 do Código Civil
Brasileiro prevê:
Nos trinta dias subseqüentes à sua
constituição, a Sociedade deverá requerer a inscrição do contrato social no
Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local de sua sede.
A Sociedade Simples terá como objeto todas as
atividades próprias de profissão intelectual, como ciência, literatura ou artes,
desde que não constitua elemento de empresa.
Na Sociedade Simples clássica, se os bens da
Sociedade não forem capaz para cobrir o passivo, os sócios serão responsáveis de
modo subsidiário, pelo saldo faltante, na proporção da participação individual
que tiveram nas perdas sociais. O contrato poderá estabelecer solidariedade para
qualificar a responsabilidade dos sócios (art. 1.023 CC). A Sociedade simples
pode utilizar o modelo de Sociedade empresária (art. 983 c/c o art. 1.150 CC),
mas a responsabilidade de um, alguns ou todos os sócios pode ser limitada à
participação no capital social (REQUIÃO, 2003, p. 406).
Como já visto, Sociedade empresária
é aquela personalizada, que explora atividade econômica organizada com uma
estrutura própria. Em seguida, iremos apresentar os tipos de Sociedades
empresárias, são elas: Sociedade em Nome Coletivo (arts. 1.039 a 1.044 do CC),
Sociedade em Comandita Simples (arts. 1.045 a 1.051 do CC), Sociedade Limitada
(arts. 1.052 a 1.087 do CC), Sociedade Anônima (arts. 1.088 e 1.089 do CC) e
Sociedade em Comandita por Ações (arts. 1.090 a 1.092 do CC). No entanto, será
dando enfoque na Sociedade Anônima e na Limitada.
1.3 A SOCIEDADE EMPRESÁRIA NO
DIREITO BRASILEIRO
Sociedade empresária, conforme o
disposto no art. 982 do Código Civil Brasileiro, é aquela que tem como objeto o
exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro. Assim, pode ser
definida como aquela que exerce profissionalmente atividade econômica organizada
para a produção ou circulação de bens ou de serviços, constituindo elemento de
empresa.
A Sociedade Empresária deve se
constituir segundo um dos seguintes tipos societários: Sociedade em Nome
Coletivo (arts. 1.039 a 1.044 do CC), Sociedade em Comandita Simples (arts.
1.045 a 1.051 do CC), Sociedade Limitada (arts. 1.052 a 1.087 do CC), Sociedade
Anônima (arts. 1.088 e 1.089 do CC) e Sociedade em Comandita por Ações (arts.
1.090 a 1.092 do CC) (SERPA, 2003, p. 25).
Neste sentido, dispõe o art. 983 do
Código Civil Brasileiro, que:
A Sociedade empresária deve
constituir-se segundo um dos tipos regulamentados nos arts. 1.039 a 1.092; a
Sociedade simples pode constituir-se de conformidade com um desses tipos, e, não
o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias.
Como já citado anteriormente, os
tipos societários mais utilizados atualmente são das Sociedades Anônimas e das
Limitadas; as demais Sociedades não são mais utilizadas pelo meio
empresarial.
Desta forma, iremos apresentar as
principais características dos tipos societários menores (Sociedade em Nome
Coletivo; Sociedade em Comandita Simples e Sociedade em Comandita por Ações), e
as Sociedades Anônimas e as Limitadas serão dadas maior
atenção.
Iniciaremos o estudo pela Sociedade
em Nome Coletivo.
A Sociedade em Nome Coletivo, que nasceu na
Idade Média na Itália, é a mais antiga das sociedades medievais comerciais tendo
derivado da comunidade familiar, que entre si formavam Sociedades (ALMEIDA,
2003, p. 109).
Nas palavras de Vera Heleno de M.
Franco, este tipo societário era formado pela fraternidade entre mercadores e
artesãos. Assim:
Essas Sociedades constituíam verdadeiras
Sociedades fraternas entre artesão e mercadores, sedimentadas por um dever de
recíproca solidariedade entre os membros e dotadas de um patrimônio comum, num
regime de co-propriedade entre todos os sócios, que eram co-obrigados perante
terceiros. Por tal razão as dividas sociais eram rateadas entre os sócios,
proporcionalmente à sua participação nos negócios sociais (FRANCO, 2004, p.
207).
Aos poucos, a obrigação direta e proporcional
foi substituída pela idéia de responsabilidade limitada, ao que se acrescentou a
idéia de solidariedade, assim todos os sócios passaram a responder de forma
solidária e ilimitada pelos débitos sociais, independentemente do montante da
sua participação nos negócios sociais (FRANCO, 2004, p. 207).
Amador Paes de Almeida faz uma
rápida explanação sobre sua inclusão nos principais ordenamentos
jurídicos:
Acolhida na Ordonnance suer lê Commerce de
Terre, promulgada sob o reinado de Luís XIV, foi posteriormente incluída no
Código Comercial francês de 1807, vindo a ser regulamentada, inclusive, no
código Comercial brasileiro de 1850 (arts. 315 e 316). Continua em vigor entre
nós, nos arts. 1.039 a 1.044 do Código Civil (ALMEIDA, 2003, p. 109) (grifo no
original).
Fran Martins conceitua Sociedade em
Nome Coletivo como aquela: "formada por duas ou mais pessoas, em que todos os
sócios respondem subsidiariamente pelas obrigações sociais, de forma subsidiária
e ilimitada" (MARTINS, 2002, p. 183).
No entanto, de acordo com o
parágrafo único da art. 1.039 do Código Civil, os sócios podem, no contrato
social ou por unânime convenção posterior, limitar entre si a responsabilidade
de cada um. Este acordo, não tem eficácia perante terceiros, pois para estes os
sócios sempre responderão de forma solidária e ilimitada pelas obrigações
sociais. Diz o parágrafo único do art. 1.039 do Código
Civil:
Parágrafo único. Sem prejuízo da
responsabilidade perante terceiros, podem os sócios, no ato constitutivo, ou por
unânime convenção posterior, limitar entre si a responsabilidade de cada
um.
Somente pessoas físicas podem fazer
parte da Sociedade em nome coletivo. Assim, é conferida a natureza de intuitu
personae. Isto é, fundada na confiança recíproca ou nas qualidades pessoais
dos sócios (ALMEIDA, 2003, p. 4).
Dispõe o art. 1.039 do Código
Civil:
Somente pessoas físicas podem tomar parte na
Sociedade em nome coletivo, respondendo todos os sócios, solidária e
ilimitadamente, pelas obrigações sociais.
A administração da Sociedade compete a todos os
sócios se nada dispuser o contrato social. Se este especificar quem deverá ser o
gerente, somente ele poderá administrar a Sociedade. Tal preceito está previsto
no art. 1.042 do Código Civil.
A firma social será composta, por extenso, pelo
nome de todos os sócios ou o nome abreviado de um, acompanhado de expressão
"companhia", abreviada ou por extenso (REQUIÃO, 2003, p. 417).
Sobre as Sociedades em Comandita
Simples, existem controvérsias no que se refere a sua origem. Vera Helena de M.
Franco adverte que:
Duas são as teses quanto a origem desta
Sociedade: para alguns decorreria da necessidade de limitar a responsabilidade
de alguns dos sócios nas Sociedades em nome coletivo; para outros, teria surgido
no final da Idade Média como transformação do antigo contrato de commenda
medieval, pelo qual se confiavam a mercadores ou ao capitão do navio
mercadorias ou dinheiro a fim de que fossem empregados no comércio ou em
benefício comum, repartindo-se os lucros obtidos. O prestador do capital ou da
mercadoria tinha o nome de comanditário, surgindo como sócio capitalista do
empreendimento (FRANCO, 2004, p. 204).
Com a Lei Fiorentina, de 1408, foi
adotada a medida que determina que as comanditas deveriam ser inscritas no
registro dos Municípios ou das Corporações, especificando o nome dos
comanditados e comanditários, bem como o montante das cotas de cada um. Assim,
com essa lei caracteriza-se a comandita em pessoa jurídica diversa da pessoa dos
sócios, passando a ter um patrimônio autônomo e obrigações distintas dos sócios
(MARTINS, 2002, p. 191).
Com traços semelhantes a Sociedade
em conta de participação, a Sociedade em comandita simples passou a adquirir
características próprias, sendo que o seu apogeu ocorreu com o inicio de seu
registro nas Corporações (DORIA, 1998, p. 176).
A partir de tal fato, a Sociedade em
comandita simples foi acolhida pelo Código Comercial Francês de 1807, vindo,
finalmente, a ser acolhido pelo Código Comercial brasileiro de 1850,
permanecendo sua previsão no atual Código Civil Brasileiro (ALMEIDA, 2003, p.
102).
Requião conceitua Sociedade em
comandita simples como:
[...] quando duas ou mais pessoas se associam,
para fins comerciais, obrigando-se como sócios solidário, ilimitadamente
responsáveis, e sendo outros simples prestadores de capitais, com a
responsabilidade limitada às suas contribuições de capital. Aqueles são chamados
sócios comanditados, e estes, sócios comanditários (REQUIÃO, 2003, p. 417).
Dispõe o art. 1.045 do Código Civil
Brasileiro:
Na Sociedade em comandita simples
tomam parte sócios de duas categorias: os comanditados, pessoas físicas,
responsáveis solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais; e os
comanditários, obrigados somente pelo valor de sua cota.
Parágrafo único. O contrato deve
descriminar os comanditados e os comanditários.
A administração da Sociedade em
comandita simples cabe, somente, ao sócio comanditado, sendo vedado aos
comanditários qualquer ato de gestão (ALMEIDA, 2003, p. 104). Se o contrato
social não designar quem deverá ser o gerente, todos os comanditados poderão
exercer a função (REQUIÃO, 2003, p. 418).
Os sócios comanditados serão,
sempre, pessoas físicas. No que se refere aos sócios comanditários, a lei foi
omissa em tal vedação, assim, poderão ser compostos de pessoas
jurídicas.
É vedado ao sócio comanditário a
prática de qualquer ato de gestão, sob pena de sua responsabilização pessoal, no
qual, sua responsabilidade torna-se ilimitadamente e solidária pelas obrigações
sociais (FRANCO, 2004, p. 206).
Os comanditários têm direito de
participar da distribuição dos lucros proporcionalmente às suas cotas, bem como
tomar parte das deliberações sociais e fiscalizar a administração dos negócios
da Sociedade (COELHO, 2003b, p. 149).
Neste mesmo sentido dispõe o art.
1.047 do Código Civil:
Sem prejuízo da faculdade de participar das
deliberações da Sociedade e de lhe fiscalizar as operações, não pode o
comanditário praticar qualquer ato de gestão, nem ter o nome na firma social,
sob pena de ficar sujeito às responsabilidades de sócio
comanditado.
O parágrafo único do art. 1.047 do Código Civil
estabelece que o sócio comanditário poderá ser constituído como procurador da
Sociedade, mas, somente, exercerá negócio determinado e com poderes
especiais.
A firma social será composta pelo nome
abreviado ou por extenso dos sócios solidários, ou seja, dos comanditados,
seguido da expressão "& Companhia", abreviada ou escrita por
extenso.
Ocorrendo a morte do sócio comanditado,
liquida-se a sua cota segundo a regra geral das Sociedades simples. Entretanto,
ocorrendo a morte do comanditário, se o contrato não estipular de forma diversa,
seus sucessores continuarão titularizando as cotas, no entanto, deverá ser
eleito um representante perante a Sociedade. Faltando uma das categorias de
sócio por mais de cento e oitenta dias, a Sociedade deve dissolver-se (COELHO,
2003a, p. 476).
A Sociedade em Comandita por Ações
surgiu da possibilidade das antigas Sociedades comanditas dividirem o seu
capital em ações. Manifestando, assim, no Código de Comércio Francês, de 1807,
as primeiras referências sobre as Sociedades em Comandita por Ações (MARTINS,
2002, p. 334).
O Código Comercial Brasileiro de
1850 não abriu a possibilidade da divisão do capital em ações das Sociedades
Comanditadas. Ademais, o Decreto nº 1.487, de 13 de dezembro de 1854, reforçou a
idéia e, também, proibiu o registro da Sociedade nesses moldes. Depois de um
longo período, que a Sociedade em comandita por ações encontraria a sua
disciplina legal do ordenamento jurídico brasileiro. Isso ocorreu com a
promulgação da Lei nº 3.150, de 1882 (DORIA, 1998, p.
290).
O Decreto nº 434, de 4 de julho de
1891, consolidou as disposições legislativas e regulamentares sobre as
Sociedades anônimas e manteve a orientação do Decreto anterior sobre as
Sociedades em comandita por ações, com alguns melhoramentos (MARTINS, 2002, p.
334).
Por sua vez, o Decreto lei nº 2.627,
de 26 de setembro de 1940, mudou a orientação, admitindo que todo o capital da
Sociedade fosse dividido em ações (BULGARELLI, 2000, p.
87).
Posteriormente, foi promulgada a Lei
nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que regulamentou as Sociedades em comandita
por ações nos arts. 280 a 284.
O Código Civil em vigor manteve, nos
arts. 1.090 a 1.092, a previsão das Sociedades em comandita por
ações.
Amador Paes de Almeida conceitua a
Sociedade em comandita por ações como:
[...] aquela em que o capital, tal como as
Sociedades anônimas, se divide em ações, respondendo os acionistas apenas pelo
preço das ações submetidas ou adquiridas, assumindo os diretores
responsabilidade solidária e ilimitada pelas obrigações sociais (ALMEIDA, 2003,
p. 156).
A Sociedade em comandita por ações é
classificada como Sociedade de capital e institucional. Praticamente todas as
disposições referentes a Sociedade anônima aplicam-se a esse tipo de Sociedade,
salvo, ao que se refere à responsabilidade de alguns acionistas, forma de
administração e sua denominação (BERTOLDI, 2003, p. 204). Nesse sentido dispõe o
art. 1.090 do Código Civil:
A Sociedade em comandita por ações
tem o capital dividido em ações, regendo-se pelas normas relativas à Sociedade
anônima, sem prejuízo das modificações constantes deste Capítulo, e opera sob
firma ou denominação.
A principal característica das
Sociedades em comandita por ações é diferenciação entre as responsabilidades dos
sócios, uns possuem a responsabilidade limitada e outros, em função do cargo que
ocupam, adquirem responsabilidade ilimitada e solidária pelas obrigações
sociais. Assim, a administração da Sociedade somente caberá aos seus
acionistas.
Há de se ressaltar que a
responsabilidade dos acionistas em relação à Sociedade é subsidiária, ou seja,
em primeiro lugar deverão ser perseguidos os bens da Sociedade para satisfazer
as obrigações sociais. Posteriormente, ingressarão no patrimônio particular dos
sócios administradores. A responsabilidade entre os administradores é solidária,
assim, o credor poderá escolher qualquer um para cobrar as obrigações (BERTOLDI,
2003, p. 204).
A Sociedade em comandita por ações
tanto pode usar a firma como a denominação, acrescida, porém, do aditivo,
escrito por extenso ou abreviado, "comandita por ações". Mas, se utilizar a
firma, nela só poderão constar os nomes dos gerentes ou diretores (ALMEIDA,
2003, p. 159).
Dispõe o art. 1.092 do Código Civil
que a assembléia geral não pode deliberar sem o consentimento dos diretores ou
gerentes para mudar o objeto social, prorrogar o prazo de duração, aumentar ou
diminuir o capital, criar debêntures ou partes beneficiárias ou aprovar a
participação em grupo de Sociedade. Fran Martins explica o porque de tal fato:
"Compreende-se esse fato porque qualquer um dos atos enumerados poderá acarretar
maiores responsabilidades para os diretores ou gerentes, em face da
responsabilidade subsidiária que os mesmos assumem" (MARTINS, 2002, p.
336).
Ademais, a Sociedade em comandita
por ações, difere das Sociedades anônimas por não contar com conselho de
administração, não pode ter capital autorizado (autorização estatutária para
aumento futuro do capital social) e não pode emitir bônus de subscrição
(BERTOLDI, 2003, p. 204/205).
No que se refere a origem das
Sociedades Anônimas tem gerado muitas discussões, alguns autores afirmam que as
primeiras manifestações desta Sociedade foram com o Banco de São Jorge, surgido
em Gênova no ano de 1407 (BERTOLDI, 2003, p. 241). Todavia, outros defendem que
o seu ponto de partida foi com as Companhias das Índias Orientais e Ocidentais,
no século XVII (MARTINS, 2002, p. 231).
Mas, como afirma Dylson Doria:
A maioria dos autores, no entanto, prefere
conferir à Holanda a primazia de haver revelado ao mundo o que seria
considerado, mais tarde, a origem da moderna Sociedade anônima. Relaciona-se,
com efeito, o surgimento da hodierna Sociedade anônima a Companhia das Índias
Orientais, fundada em 20 de março de 1602, a que seguiria a Companhia das Índias
Ocidentais (1621) (DORIA, 1998, p. 211).
Foi com o Código Comercial francês
de 1807 que as Sociedades anônimas foram erigidas como instituições mercantis e
não dependiam mais de privilégios outorgados pelo Estado mediante a edição de
leis especiais, mas se sujeitam, ainda, ao regime de autorização (ALMEIDA, 2003,
p. 167/168).
O desenvolvimento das Sociedades
anônimas ocorreu em três sistemas distintos de formação. São eles: o sistema de
privilégios, sistema da autorização e sistema da livre criação (BORBA, 1997, p.
96).
O primeiro refere-se àquele em que
para criar uma Sociedade anônima dependia de um ato do governo. Desta forma, a
Sociedade não era criada a partir da vontade das partes, mas sim de uma
concessão do Estado aos interessados, por meio de um ato legislativo que definia
o regime especial daquela Sociedade, não aplicável às demais. Esse período
vigorou entre os séculos XVII e XVIII (BORBA, 1997, p.
96).
No sistema de autorização, a
Sociedade era criada pelos interessados, mas essa criação dependia de
autorização preliminar do Governo (BORBA, 1997, p. 96).
Finalmente, no sistema da livre
criação, os interessados passaram a criar as Sociedades anônimas
independentemente de ato do legislativo ou de autorização governamental. Sendo
obrigadas, apenas, ao registro nos órgãos competentes. Este é o modelo
atualmente em vigor (BORBA, 1997, p. 96).
No Brasil, o regramento das
Sociedades anônimas ocorreu com a edição do Decreto nº 575, de 10 de janeiro de
1849, o qual determinara a autorização do Poder Público para a incorporação ou
aprovação de seus estatutos (ALMEIDA, 2003, p. 168).
Logo em seguida foi editado o Código
Comercial Brasileiro de 1850, que de forma resumida e precária previu em seus
arts. 295 a 299 as Sociedades anônimas. Permaneceu inalterada a condição da
autorização do governo para a sua constituição (BERTOLDI, 2003, p.
242).
Posteriormente, com o
aperfeiçoamento e a modernização da legislação, surgiram diversas normas
tratando das Sociedades anônimas. A norma de maior destaque refere-se a Lei nº
6.404, de 15 de dezembro de 1976, a qual ainda está em vigor (BERTOLDI, 2003, p.
242/243).
Amador Paes de Almeida conceitua
Sociedade anônima como:
[...] a pessoa jurídica de direito privado, de
natureza mercantil, com capital dividido em ações, sob uma denominação,
limitando-se a responsabilidade dos acionistas ao preço de emissão das ações
subscritas ou adquiridas (ALMEIDA, 2003, p. 174).
Dylson Doria define como aquela:
"que possui o capital social dividido em partes iguais, chamadas ações, e tem
responsabilidade de seus sócios ou acionistas limitada ao preço de emissão das
ações subscritas ou adquiridas." (DORIA, 1998, p. 214).
As principais características das
Sociedades anônimas são: capital social dividido em ações; Sociedade de capital;
responsabilidade dos sócios é limitada ao preço de emissão das ações subscritas
ou adquiridas; sempre será empresarial, independentemente de seu objeto;
possibilidade de subscrição do capital mediante apelo ao público (BERTOLDI,
2003, p. 243).
Existem duas espécies de Sociedades
anônimas previstas no art. 4º da Lei 6.404/76, são elas: companhia aberta e
companhia fechada.
A companhia aberta pode ser
conceituada como:
[...] procura captar recursos junto ao público,
seja com a emissão de ações, debêntures, partes beneficiárias ou bônus de
subscrição, ou ainda depósitos de valores mobiliários e que, por isso mesmo,
tenha admitido tais valores à negociação em Bolsa (instituição pública ou
privada destinada a operar ações e obrigações da companhia) ou mercado de balcão
(transação dos mesmos valores sem a intervenção da Bolsa) (ALMEIDA, 2003, p.
211).
Já a companhia fechada é
aquela:
[...] não formula apelo à poupança pública,
obtendo recursos entre os próprios acionistas ou subscritores. É, a rigor, a
Sociedade anônima tradicional, restrita à famílias ou grupos e que, por isso
mesmo, dispensa a tutela estatal, [...] (ALMEIDA, 2003, p.
211).
No que pertine ao nome da Sociedade
anônima, terá sempre a forma de denominação. Esta será acrescida da expressão
Sociedade anônima, abreviada ou por extenso. Também, poderá utilizar a palavra
companhia, abreviada ou por extenso, antes da denominação (MARTINS, 2002, p.
234).
Diferentemente do que aconteceu com
os demais tipos de Sociedades comerciais, que se formaram na prática, sendo,
posteriormente, regulamentadas pela legislação, a Sociedade Limitada foi
introduzida no direito comercial por decisão do legislador (MARTINS, 2002, p.
202).
Este tipo societário surgiu na
Alemanha, com a promulgação da Lei de 20 de abril de 1892, sob a denominação de
Sociedade de responsabilidade limitada (DORIA, 1998, p.
198).
A Sociedade limitada nasceu da
conjunção das Sociedades anônimas e dos demais tipos de Sociedades de pessoas
existentes na época. Ou seja, o comerciante estava buscando por um modelo que
não tivesse as dificuldades de constituição que as anônimas possuíam, além do
fato de seus sócios não responderem de forma ilimitada pelas dívidas da
Sociedade, como os demais tipos societários (BERTOLDI, 2003, p.
210).
O modelo germânico proliferou
rapidamente, influenciando a legislação portuguesa de 1901, e também a nossa lei
brasileira de 1919 (FRANCO, 2004, p. 222).
O projeto do novo Código Comercial,
elaborado por Inglês de Souza, em 1911, foi a primeira tentativa de trazer ao
Brasil o modelo de Sociedade limitada. No entanto, enquanto aguardavam a
aprovação do projeto, o deputado Joaquim Luiz Osório, baseando-se na proposição
de Inglês de Souza, apresentou à Câmara dos Deputados o projeto de criação das
Sociedades por quotas de responsabilidade limitada, que em pouco tempo se
transformou no Decreto 3.0708 de 10 de janeiro de 1919, o qual vigorou até o
surgimento do Código Civil de 2002 (BERTOLDI, 2003, p.
210/211).
O Decreto 3.708/19, muito foi
criticado pelos doutrinadores por ser lacônico e imperfeito. Não atendeu, com
precisão, aos objetivos da Sociedade limitada (BERTOLDI, 2003, p. 211).
Alguns doutrinadores, no entanto,
entendiam que o estilo lacônico não resultou grandes prejuízos para os
comerciantes que adotaram este tipo societário, pois a regulamentação ficou a
cargos dos sócios, dentro dos limites dos princípios gerais que regem as
Sociedades comerciais, através das normas do contrato social (REQUIÃO, 2003, p.
460/461).
A partir do Código Civil de 2002, a
Sociedade por cotas de responsabilidade limitada passou a ser designada de
Sociedade limitada. Foram dedicados trinta e cinco artigos do Código para
regulamentar a Sociedade limitada (FRANCO, 2004, p. 227). Assim, foi deixado de
lado o Decreto de 1919, o qual possuía muitas lacunas e imperfeições, e passamos
a contar com normas mais técnicas e completas.
Fran Martins conceitua Sociedade
limitada como sendo aquela: "formada por duas ou mais pessoas, assumindo todas,
de forma subsidiária, responsabilidade solidária pelo total do capital social"
(MARTINS, 2002, p. 201).
Dispõe o art. 1.052 do Código
Civil:
Na Sociedade limitada, a
responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas cotas, mas todos
respondem solidariamente pela integralização do capital
social.
A responsabilidade dos sócios é
limitada ao valor de suas cotas e sempre subsidiária em relação à Sociedade, ou
seja, primeiro os bens da Sociedade irão suportar pelas obrigações assumidas por
ela. Somente quando não forem suficientes que irão recorrer aos bens dos sócios,
no limite de suas cotas. No entanto, a responsabilização dos bens do sócio pelas
obrigações da Sociedade só ocorre ao montante do capital social ainda não
integralizado. Desta forma, se todos os sócios já tenham integralizado o capital
social, estarão livres de serem responsabilizados (BERTOLDI, 2003, p.
212).
Assim, José Tavares Borba afirma
que: "Perante a Sociedade, cada sócio encontra-se obrigado a integralizar as
próprias cotas. Perante terceiros, todos os sócios respondem solidariamente pela
integralização de todo o capital" (BORBA, 1997, p. 76).
Segundo Fábio Ulhoa Coelho a
Sociedade limitada é o tipo societário mais difundido na economia brasileira.
Assim:
A Sociedade limitada é o tipo societário de
maior presença na economia brasileira. Introduzida no nosso direito em 1919, ela
representa hoje mais de 90% das Sociedades empresárias registradas nas Juntas
Comerciais. Deve-se o sucesso a duas características: a limitação da
responsabilidade dos sócios e a contratualidade (COELHO, 2003b, p.
153).
A contratualidade e a limitação da
responsabilidade dos sócios são características fundamentais deste tipo
societário. No que se refere à limitação da responsabilidade, os sócios podem
limitar as perdas de capital particular em caso de insucesso da Sociedade. No
tocante à contratualidade, é facultado aos sócios pactuar de acordo com as
disposições de vontade de cada um, mas dentro dos limites da legislação (COELHO,
2003b, p. 153).
A Sociedade Limitada constituir-se-á
mediante contrato escrito lavrado por instrumento público ou privado, que
regulará, juntamente com o ordenamento jurídico, quais as regras aplicáveis a
Sociedade e seus sócios (BERTOLDI, 2003, p. 216).
A Sociedade limitada poderá utilizar
tanto a firma como a denominação. A firma é formada pelo nome de algum, alguns
ou todos os sócios, acrescidos da expressão limitada por extenso ou
abreviadamente (LTDA). Se não forem incluídos os nomes de todos os sócios,
obrigatoriamente deverá constar da expressão companhia, de forma abreviada ou
por extenso. Já a denominação será composta por qualquer nome criado que não
coincide com o nome de seus sócios. Devendo, ainda, ser acrescida da expressão
limitada por extenso ou de forma abreviada (ALMEIDA, 2003, p.
140).
No capítulo dois será analisado a
concessão de serviços públicos para as pessoas jurídicas de direito privado, ou
seja, as Sociedades empresárias. Serão estudados: o seu histórico, o conceito,
as características principais, a diferenciação da concessão com a permissão de
serviços públicos, as formas de extinção.
2 AS EMPRESAS CONCESSECIONÁRIAS DE
SERVIÇOS PÚBLICOS NO DIREITO BRASILEIRO
2.1 O SERVIÇO PÚBLICO NO BRASIL:
HISTÓRICO E PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS
O presente capítulo versará sobre a
concessão de serviços públicos. Serão apresentadas as principais
características, um rápido histórico, diferenciação entre a concessão e a
permissão de serviços públicos e as formas de extinção deste tipo de
delegação.
O conceito de serviços públicos não
é uniforme na doutrina, uma vez que, varia de acordo com as necessidades e
contingências políticas, econômicas, sociais e culturais de cada comunidade e em
cada momento histórico. Assim, destaca Hely Lopes Meirelles que serviço público
é:
[...] todo aquele prestado pela Administração
ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer
necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniência
do Estado (MEIRELLES, 2003, p. 319).
A titularidade da prestação de um
serviço público será da Administração Pública, somente podendo ser transferido a
um particular a execução da atividade. Assim, constata-se que a Administração
Pública poderá prestar o serviço de forma direta ou
indiretamente.
A execução direta ou centralização é
aquela através do qual o Estado presta diretamente os serviços públicos. Desta
forma, torna-se titular e prestador dos serviços. O Estado pode ser considerado
em nível Federal, Estadual, Distrital ou Municipal, dependendo da competência
dos serviços públicos a serem prestados (CARVALHO FILHO, 2000, p.
246).
A execução indireta ou
descentralização ocorre quando o serviço delegado é prestado por pessoas
distintas das federativas (União, Estado, Distrito Federal ou Município). São
consideradas as pessoas ou entidades periféricas ou indiretas; pessoas privadas
ou públicas gestoras de serviços públicos (CRETELLA JÚNIOR, 2000, p.
63).
A descentralização e centralização
podem ser tratadas em dois sentidos: político e administrativo. Seguindo o
primeiro aspecto, elas designam formas de organização do Estado, sendo que, o
Estado Unitário, caracteriza a centralização; já o Estado Federal, caracteriza a
descentralização. No que se refere ao aspecto administrativo, será a
transferência da prestação de uma atividade própria da Administração Pública
(descentralização), ou poderá ser exercida diretamente pelo Poder Público
(centralização) (DI PIETRO, 2002, p. 50/51).
Para Maria Sylvia Di Pietro, a
descentralização administrativa apresenta três modalidades: territorial ou
geográfica; por serviços, funcional ou técnica; e por colaboração. Essa
classificação não é uniforme entre os doutrinadores (DI PIETRO, 2002, p.
51).
A descentralização territorial ou
geográfica ocorre quando uma entidade local, geograficamente delimitada, é
dotada de personalidade jurídica própria, de direito público, com capacidade
administrativa genérica. Este tipo de descentralização, no Brasil, ocorre nas
figuras dos territórios federais (DI PIETRO, 2003, p.
351).
A descentralização por serviços,
funcional ou técnica, ocorre quando o poder público cria uma pessoa jurídica de
direito público ou privado, atribuindo a ela a titularidade e execução de
determinado serviço público. Podem ser citados como exemplos adotados no Brasil,
as autarquias, fundações governamentais, sociedades de economia mista e empresas
públicas que exerçam serviços públicos. No entanto, a criação dessas figuras só
ocorre por meio de lei (DI PIETRO, 2003, p. 351). Os doutrinadores não são
unânimes em afirmar que todas essas figuras são formas de descentralização por
serviços. Muitos afirmam que, somente, as autarquias possuem essa
característica.
A descentralização por colaboração é
aquela em que o poder público, por meio de contrato ou ato unilateral, transfere
a determinada pessoa jurídica de direito privado, previamente existente, a
execução de um serviço público, conservando a titularidade do serviço (DI
PIETRO, 2003, p. 353).
Neste trabalho será enfocado esse
tipo de descentralização, pois é por meio de colaboração que se faz a concessão
e a permissão de serviços públicos.
A seguir será feito uma rápida
análise da classificação dos serviços públicos.
2.1.1 Classificação dos sevriços
públicos
Segundo Carvalho Filho, os serviços
públicos podem ser classificados sob diversos critérios. O modelo adotado por
ele é:
a) Serviços delegáveis e
indelegáveis: delegáveis são aqueles que, "por sua naruteza ou pelo fato de
assim dispor o ordenamento jurídico, comportam ser executados pelo Estado ou por
particulares colaboradores". Exemplos: transporte coletivo, energia elétrica,
telecomunicações. Indelegáveis são aqueles que só podem ser prestdaos pelo
próprio Estado diretamente. Exemplos: defesa nacional, segurança interna,
fiscalização das atividades (Carvalho Filho, 2000, p.235).
b) Serviços administrativos e de
utilidade pública: administrativos são aqueles serviços em que o Estado pratica
para organizar-se internamente, beneficiando toda a população de forma indireta.
Exemplos: imprensa oficial para a divulgação de atos administrativos, quando
implanta centro de pesquisas. Já os de utilidade pública são aqueles que se
destinam diretamente aos indivíduos. Exemplos: fornecimento de gás, atendimento
em postos de saúde (Carvalho Filho, 2000, p.236).
c) Serviços coletivos e singulares:
coletivos ou uti universi são aqueles "prestados a grupamentos
indeterminados de indivíduos, de caordo com as opções e prioridades da
Administração, e em conformidade com os recursos de que disponha". Não há
sujeito determinado, é prestado a população como um todo. Exemplos: iluminação
pública, pavimentação de ruas, implemantação de abastecimento de água.
Singulares ou uti singuli são organizados a destinatários individuais,
sendo mensurável a utilização por cada um dos indivíduos. Exemplo: energia
domiciliar (Carvalho Filho, 2000, p.236).
d) Serviços sociais e econômicos:
sociais são aqueles que o Estado executa para atender aos reclamos sociais
básicos e representam ou uma atividade propiciadora de comodidade relevante, ou
serviços assistenciais e protetivos. No entanto, esses serviços, em regra, estão
falhos e o Estado os financia através da arrecadação de recursos obtidos junto a
comunidade, principlamente sobre a arrecadação de tributos. Exemplos:
assistência médica e hospitalar, assistência educacional. Os serviços econômicos
são aqueles que representam atividades com um caráter mais industrial ou
comercial. Exemplo: segurança nacional (Carvalho Filho, 2000,
p.236).
Para a melhor compreensão das
concessões de serviços públicos e matérias a ela ligada, é fundamental fazer um
rápido estudo sobre o histórico da delegação de serviços
públicos.
2.1.2
Histórico
A primeira idéia de concessão surgiu
na Idade Média. Os senhores feudais transferiam à administração dos feudos ou a
exploração de atividades de seu domínio aos concessionários, mas, realizavam a
fiscalização e controle das atividades. Essas atividades eram transferidas
baseados no censier, um documento parecido com um contrato, no qual eram
estabelecidas as normas reguladoras da delegação (MEDAUAR, 1995,
p.11).
No período do Estado absoluto, na
França, ficou marcada a existência de contrato de gestão de serviços públicos,
em que os representantes do poder público exerciam o poder de direção, baixavam
diretrizes, alteravam e rescindiam unilateralmente os contratos. No século XVIII
foram ampliadas as garantias para o concessionário, como direito à indenização
no caso de culpa da Administração (MEDAUAR, 1995, p. 12).
Nos moldes atuais, a concessão foi
utilizada pela primeira vez no século XIX na Europa, sobretudo na França. Foi
criada em virtude da falta de capital do poder público para investir nas
necessidades da população. Os principais serviços concedidos ao poder privado
foram: estradas de ferro, fornecimento de água, gás, eletricidade, transportes
urbanos. Isso ocorreu, pois era necessário grande investimento de capital e
pessoal técnico especializado (MEDAUAR, 1995, p. 12).
Com o passar dos anos as
características iniciais da concessão foram sendo alteradas, dando maior
garantia ao poder público, como, por exemplo, a criação de cláusulas de
garantias de juros, e, mais tarde, com a aplicação da teoria da imprevisão.
Desta forma, este tipo de delegação de serviços começou a entrar em declínio (DI
PIETRO, 2002, p. 58/59).
O declínio das concessionárias de
serviços públicos, por volta da década de 30 e 40, período das grandes guerras
mundiais, fez surgir as sociedades de economia mista e as empresas públicas. O
que atraiu o poder público, nas primeiras, foi a possibilidade de atuar sob o
regime das pessoas jurídicas de direito privado e da empresa executar serviço
público de natureza comercial e industrial, acumulando um volume de recursos
financeiros que o Estado, sozinho, não conseguiria (DI PIETRO, 2002, p. 59).
Aqui, ocorre uma forma diferenciada de delegação de serviços públicos, ou seja,
ao invés do Estado conceder os serviços ao setor privado, repassa para a
Administração indireta (MEDAUAR, 1995, p. 13).
Passada a fase das guerras, o
Brasil, para acompanhar a tendência de outros países, voltou a utilizar o
instituto da concessão, delegando os serviços públicos a empresas estatais (DI
PIETRO, 2003, p. 355).
A partir dos anos 90 o Brasil passou
a viver uma fase de privatizações, no qual o País passou para o poder privado a
execução de muitos serviços públicos. Isso vem ocorrendo com a mesma finalidade
que se fez no século XIX: a execução de serviços sem encargos financeiros para a
Administração. A delegação é feita, principalmente, nos moldes de concessão,
permissão e autorização (DI PIETRO, 2003, p. 356).
A Administração Pública, quando
transfere a execução de certa atividade ou serviço público que lhe foi outorgada
com exclusividade pelo ordenamento jurídico, utiliza-se de pessoas jurídicas.
Estas pessoas podem ser criadas nos moldes do Direito Privado, por particulares,
como a sociedade civil, industrial ou comercial; ou pela Administração Pública,
como as empresas públicas ou as sociedades de economia mista (GASPARINI, 2001,
p. 288).
Nesta pesquisa serão apresentados os
estudos das pessoas jurídicas criadas por particulares: as permissionárias e as
concessionárias de serviços públicos. Atualmente, esses modelos são muito
utilizados pela ordem jurídica brasileira e merecem seu devido
destaque.
2.1.3 As características das
concessionárias de serviços públicos
Os doutrinadores divergem quanto ao
conceito de concessão de serviço público, uma vez que ele se apresenta variável,
sendo situado conforme as necessidades e contingências políticas, econômicas,
sociais e culturais de cada comunidade, em dado momento histórico (MUKAI, 1995,
p. 2).
Bandeira de Mello dispõe que
concessão de serviço público:
[...] é o instituto através do qual o Estado
atribui o exercício de um serviço público a alguém que aceita presta-lo em nome
próprio, por sua conta e risco, nas condições fixadas e alteráveis
unilateralmente pelo Poder Público, mas sob garantia contratual de um equilíbrio
econômico-financeiro, remunerando-se pela própria exploração de serviço, em
geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários de
serviço (MELLO, 2001, p. 622).
Diógenes Gasparini conceitua
concessão de serviço público, como:
[...] contrato administrativo pelo qual a
Administração Pública transfere, sob condições, a execução e exploração de certo
serviço, que lhe é privativo, a terceiro que para isso manifeste interesse e que
será remunerado adequadamente mediante a cobrança, dos usuários, de tarifa
previamente por ela aprovada (GASPARINI, 2001, p. 290).
A Lei nº 8.987/95, que trata sobre
as concessões e permissões de serviços públicos, considera a concessão de
serviço público como:
Art. 2º. Para os fins dispostos nesta Lei,
considera-se:
[...]
II – Concessão de serviços públicos - delegação
de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade
de concorrência, à pessoa jurídica ou consócio de empresas que demonstre
capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado.
Do conceito estabelecido pela Lei decorrem as
principais características da concessão de serviço
público:
a) A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, são considerados o poder concedente, desta forma, são de suas
competências os serviços concedidos;
b) A concessionária, aquela que executa os
serviços, por prazo determinado e por sua conta e risco, sempre será uma pessoa
jurídica ou consórcio de empresas. A partir da concessão a pessoa jurídica de
direito privado não se transformará em pessoa jurídica de direito público. No
entanto, alguns preceitos de direito público serão aplicados, como o regime de
responsabilidade civil para os entes administrativos (CF, art.37, § 6º) e os
princípios diretores do serviço público;
c) Normalmente, a concessionária receberá a sua
remuneração por meio de tarifa paga diretamente pelo usuário do
serviço;
d) O poder público concedente é responsável
pela fixação de normas de realização dos serviços, fiscalização das atividades,
a imposição de sanções aos concessionários e o reajuste das
tarifas;
e) A concessão é formalizada por contrato,
precedida de licitação. Este contrato é um tipo de contrato administrativo,
assim obedece aos preceitos gerais desta figura (MEDAUAR, 2003, p.
344).
A lei nº 8.987/95 faz diferenciação
entre concessão de serviços públicos e a concessão de serviços públicos
precedida de obra pública. O art. 2º, III da lei faz a
conceituação:
Concessão de serviço público precedida da
execução de obra pública: a construção, total ou parcial, conservação, reforma,
ampliação ou melhoramento de quaisquer obras de interesse público, delegada pelo
poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa
jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para a sua
realização, por sua conta e risco, de forma que o investimento da concessionária
seja remunerado e amortizado mediante a exploração do serviço ou da obra por
prazo determinado;
Ocorre que o inciso acima transcrito é apenas
uma minúcia do legislador, pois a concessão precedida de obra pública tem as
mesmas características daquela de serviços, diferenciando-se, apenas, porque
nesta o contrato visa a execução e exploração de um empreendimento público
rentável, a ser construído pelo concessionário e remunerado pelos usuários nas
condições e prazos estabelecidos no contrato (MUKAI, 1995, p.
21).
O art. 175 da Constituição Federal,
prevê:
Incumbe ao poder público, na forma da lei,
diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de
licitação, a prestação de serviço público.
Depreende-se da análise desse preceito
constitucional que a intenção do constituinte foi a de criar um estatuto
consolidador dos princípios e diretrizes gerais sobre concessão e permissão de
obras e serviços públicos (WALD, 2004, p. 149).
Pode-se entender a partir do
dispositivo legal que todo serviço concedido é de competência do Poder Público.
Mesmo passando os serviços para as mãos dos particulares não deixam de ser
público. Este desvinculamento das atividades não configura o abandono por parte
da Administração. Assim, preconiza Odete Medauar:
[...] a Administração não pode se
desvincular do serviço público, quando concedido. O serviço é concedido, mas
permanece serviço público; a concessão não configura abandono, desligamento
total. O Estado continua "fiador" da execução perante a coletividade (MEDAUAR,
1995, p. 13).
Na concessão de serviço público
ocorre, tão-somente, a delegação para a sua execução, respeitando os limites e
condições legais ou contratuais, sempre sujeito a regulamentação e fiscalização
do poder concedente (MEIRELLES, 2003, p. 367).
A competência para outorgar a
concessão de serviços públicos é da União, Estados-Membros, Distrito Federal e
Municípios, cada um dentro da cura estabelecida pelo ordenamento jurídico
brasileiro. Essa partição de competências está prevista na Constituição
Brasileira, mas, ainda, dentro de cada uma dessas pessoas políticas cabe
determinar qual o órgão competente, e, dentro deste, qual o agente com tal
atribuição. Esta previsão encontrar-se-á na lei e regulamentos aplicados a cada
caso (GASPARINI, 2001, p. 296).
Não havendo previsão, caberá ao mais
alto órgão da estrutura administrativa ou ao Chefe do Poder Executivo, federal,
estadual, municipal ou distrital, conforme pertença a União, Estados, Município
ou Distrito Federal, respectivamente, no qual a execução e exploração indireta
do serviço público está sendo promovida (GASPARINI, 2001, p.
296).
A concessão de serviço público só
pode ser outorgada ao particular se existir interesse público. Repassando os
serviços, a Administração Pública irá satisfazer os interesses da população e o
particular irá visar o lucro daqueles serviços. Desta forma, este tipo de
outorga envolve, não somente os interesses dos particulares, mas, também, do
Poder Público (GASPARINI, 2001, p. 294).
A manutenção da equação
econômico-financeira do contrato, ou seja, o equilíbrio entre as obrigações e as
remunerações do concessionário, revela-se fundamental na concessão, pois
assegura a continuidade do serviço público e a sua boa prestação. De acordo com
os termos constitucionais a equação econômico-financeira, começa a se formar com
a apresentação da proposta e atinge a sua eficácia com a homologação da
licitação e, posteriormente, com a assinatura do contrato (FIGUEIREDO, 2003, p.
92/93).
Segundo Diógenes Gasparini, a
celebração de um contrato de concessão de serviço público fundamenta-se em dois
aspectos: político e jurídico. O fundamento político consiste na: "conveniência
e oportunidade de ser descentralizado o serviço público, aproveitando-se o
potencial econômico, financeiro e tecnológico de particulares, transformando-se
após firmado o contrato em concessionário." No que se refere ao fundamento
jurídico, este diz respeito a previsão legal da concessão de serviço público, ou
seja, deverá estar prevista na lei ou na Constituição (GASPARINI, 2001, p.
295).
A concessão de serviço público está
prevista nos arts. 21, XI e XII, 175 e 223 da Constituição Federal. Da mesma
forma, há previsão na Lei nº 8.987/95, com posteriores alterações e Lei nº
9.074/95.
A competência para legislar normas
gerais sobre concessões e permissões de serviços públicos cabe privativamente à
União, conforme estabelece o art. 22, XXVII da Constituição
Federal.
A Lei nº 8.987/95, criada pela
União, estabelece as normas gerais sobre o regime de concessões e permissões de
serviços públicos. Já as normas específicas de cada outorga serão de
responsabilidade da União, dos Estados, do Distrito Federal e Municípios,
dependendo de quem está concedendo o serviço (FIGUEIREDO, 2003, p.
90).
A concessão de obras e serviços
públicos é disciplinada pela Lei nº 8.987/95, complementando-se com as
disposições da Lei nº 9.074/95, a qual estabelece normas para outorga e
prorrogação das concessões e permissões de serviços públicos, possuindo, além de
normas gerais, disposições especiais sobre energia elétrica (WALD, 2004, p.
155).
A Lei nº 9.074/95, art. 2º, veda à
União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a possibilidade de
outorga de concessão e permissão de serviços públicos sem que exista uma lei que
lhes autorize e fixe os termos, salvo algumas exceções como: saneamento básico e
limpeza urbana e nos artigos referidos na Constituição Federal, nas
Constituições Estaduais e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e Municípios,
observado, em qualquer caso, os termos da Lei no 8.987, de
1995 (MEDAUAR, 2003, p. 345).
Assim, Hely Lopes Meirelles
esclarece que toda concessão fica submetida a duas categorias de normas: as de
natureza regulamentar e as de ordem contratual. São elas:
As primeiras disciplinam o modo e forma de
prestação do serviço; as segundas fixam as condições de remuneração do
concessionário; por isso, aquelas são denominadas de leis do serviço, e estas,
cláusulas econômicas ou financeiras. Como as leis, aquelas são alteráveis
unilateralmente pelo Poder Público segundo as exigências da comunidade; como
cláusulas contratuais, estas são fixas, só podendo ser modificadas por acordo
entre as partes (MEIRELLES, 2003, p. 370).
Como regra geral a concessão deverá ser
outorgada sem exclusividade, para que seja sempre possível a competição entre os
interessados e, assim, favoreça os usuários com melhores serviços e tarifas mais
acessíveis. Somente quando devidamente justificado e houver inviabilidade
técnica ou econômica de concorrência na prestação do serviço, admite-se a
concessão com exclusividade (MEIRELLES, 2003, p. 367).
Para a outorga da concessão pela
Administração Pública aos interessados é indispensável a realização de
licitação, como regra geral, na modalidade de concorrência. Esta licitação
obedecerá aos moldes da Lei nº 8.666/93, ressalvado alguns critérios próprios da
Lei nº 8.987/95 do julgamento do certame (MELLO, 2001, p.
636).
O julgamento da licitação será feito
segundo os critérios:
a) O menor valor da tarifa do
serviço público a ser prestado;
b) A maior oferta pela outorga da
concessão;
c) Melhor proposta com preço fixado
no edital;
d) Combinação de proposta técnica
com valor da tarifa;
e) Combinação de proposta técnica
com o preço da concessão;
f) Melhor preço da concessão, após
aprovação da proposta técnica;
g) Menor valor da tarifa, após
aprovação da proposta técnica (WALD, 2004, p.358).
A partir desses critérios,
procurou-se combinar a avaliação da proposta técnica com o pagamento a ser
efetuado pela outorga da concessão, devendo o edital conter todos os parâmetros
e exigências para a formulação da proposta técnica (MEIRELLES, 2003, p. 373).
Após a realização da licitação será
acordado entre as partes o conteúdo do contrato e sua posterior assinatura.
Segundo Helly Lopes Meirelles, contrato de concessão é:
[...] o documento escrito que encerra a
delegação do poder concedente, define o objeto da concessão, delimita a área,
forma e tempo da exploração, estabelece os direitos e deveres das partes e dos
usuários do serviço (MEIRELLES, 2003, p. 373).
Os doutrinadores costumam enumerar
como as principais características dos contratos de concessão: a) contratos de
direito público, ou seja, são contratos orientados pelos princípios do Direito
Público, visando, assim, o interesse público; b) bilaterais, pois criam
obrigações recíprocas para ambas as partes; c) formais, pois, como regra geral,
devem ser escritos e obedecem alguns requisitos especiais; d) onerosos, pois
trazem vantagens para as duas partes contratantes; e) comutativos, pois cada
contraente, além de receber do outro prestação relativamente equivalente à sua,
pode verificar, de imediato, essa equivalência; e) intuitu personae, os
contraentes são de fundamental importância para a realização do contrato de
concessão (TOBA, 1995, p. 85/86).
É fundamental que o contrato de
concessão de serviço público esteja de acordo com as regras estabelecidas na
licitação e na proposta formulada pelo particular. Se fosse possível ocorrer
alteração nas condições da licitação e/ou da proposta, seria desnecessária a
realização de uma licitação (TOLOSA FILHO, 1995, p. 86).
O contrato de concessão, como os
demais contratos administrativos, deverá possuir cláusulas essenciais e
acessórias. As primeiras, estabelecidas no art. 23 da Lei nº 8.987/95, fixam o
objeto do acordo e estabelecem as condições fundamentais para a sua execução. Já
as segundas, complementam e esclarecem a vontade das partes para facilitar a
interpretação desse contrato (TOBA, 1995, p. 87).
De acordo com a legislação vigente,
o contrato de concessão deverá ser formalizado com prazo determinado, isto é,
deverá ter um lapso de tempo certo. A Lei nº 8.987/95 não determina qual deverá
ser esse tempo, nem menciona qual o prazo máximo de duração para cada concessão.
Todavia, as leis dos Estados, Distrito Federal e Municípios, que instituírem o
regime de execução e exploração de serviços públicos por particulares, por meio
de concessão, poderão fixar os prazos de duração desse tipo de contrato. Desta
forma, o prazo específico de cada outorga será determinado pela Administração
Pública concedente, a qual visará a demora do retorno do investimento a ser
realizado na execução do serviço público e a tarifa a ser praticada (GASPARINI,
2001, p. 291).
No contrato de concessão, assim como
nos demais contratos administrativos, existe a possibilidade de alteração
unilateral pela Administração Pública nas cláusulas regulamentares ou de
serviços. Essa alteração sempre deverá ser feita visando um melhor atendimento
do público. No entanto, não poderá alterar o equilíbrio econômico e financeiro
do contrato. Ocorrendo alteração no equilíbrio econômico-financeiro, poderão ser
alteradas as cláusulas remuneratórias da concessão (MEIRELLES, 2003, p.
374/375).
O art. 6º e seus parágrafos da Lei
nº 8.987/95 estabelecem que o serviço prestado pela concessionária deverá ser
adequado ao pleno atendimento do usuário. O parágrafo primeiro do artigo
mencionado conceitua serviço adequado como:
Serviço adequado é o que satisfaz as
condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade,
generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade de
tarifas.
Meirelles ensina que a prestação dos
serviços deve atender ao regulamento e às cláusulas contratuais específicas,
para a satisfação dos usuários, ou seja, o serviço deve ser adequado. Além
disso, a prestação deverá obedecer aos princípios regedores do serviço público,
são eles:
O princípio ou requisito da
generalidade significa serviço para todos os usuários, indiscriminadamente; o da
permanência ou continuidade impõe serviço constante, na área e período de sua
prestação; o da eficiência quer dizer serviço satisfatório, qualitativa e
quantitativamente; o da modicidade indica preços razoáveis, ao alcance de seus
destinatários; o da cortesia significa bom tratamento ao público (MEIRELLES,
2003, p. 376).
A fonte do artigo acima mencionado
encontra-se estabelecido na Constituição Federal no art. 175, IV. Na realidade,
o artigo constitucional é fonte de toda a Lei de Concessões (TOLOSA FILHO, 1995,
p. 36).
Da mesma forma que a concessionária
deverá manter o serviço adequado para satisfazer o usuário, o Poder Concedente é
obrigado a manter as condições mínimas exigidas para o perfeito cumprimento do
acordado para a exploração do serviço público, conforme previsto no edital, nas
normas regulamentares e no contrato de concessão (WALD, 2004, p.
313).
Para garantir a prestação de um
serviço adequado, na concessão dos serviços é fundamental que a Administração
Pública realize a fiscalização das empresas, verificando sua administração,
contabilidade, recursos técnicos, econômicos e financeiros, principalmente para
conhecer a rentabilidade do serviço, fixar as tarifas justas e punir as
infrações regulamentares e contratuais (MEIRELLES, 2003, p.
376).
O Poder Público tem repassado a
fiscalização das concessionárias de serviços públicos para uma nova figura
jurídica, às Agências Reguladoras. Estas foram criadas como autarquias em regime
especial, pois possuem mais privilégios que as autarquias comuns. O tópico sobre
Agências Reguladoras será devidamente estudado no próximo
capítulo.
Apesar de haver a outorga da
prestação do serviço público a terceiros, a obrigação e a responsabilidade legal
da prestação adequada desses serviços é do Poder Concedente. Desta forma, a
Administração poderá intervir na concessionária para assegurar a prestação do
serviço público de forma adequada e regular e o cumprimento das normas legais e
regulamentares, conforme prevê o art. 32 da lei 8.987/95:
O poder concedente poderá intervir
na concessão, com o fim de assegurar a adequação na prestação do serviço, bem
como o fiel cumprimento das normas contratuais, regulamentares e legais
pertinentes.
O parágrafo único do art. 32
estabelece que a intervenção será realizada por decreto do poder concedente, que
designará um interventor, o prazo da intervenção e os limites da medida. Tal ato
será devidamente motivado.
Após declarada a intervenção, o
Poder Concedente deverá, no prazo de trinta dias, instaurar um procedimento
administrativo, respeitando o devido processo legal. A intervenção será
provisória, com prazo máximo de duração de cento e oitenta dias. Estes prazos
estão previstos no art. 33 e seus parágrafos da Lei nº
8.987/95.
Lúcia Valle Figueiredo destaca que
da intervenção resultarão duas alternativas:
[...] ou a devolução ao concessionário do
objeto da concessão, com a respectiva prestação de contas e composto os
prejuízos, ou, então, será possível extinguir-se a concessão, havendo, nessa
hipótese, a declaração de caducidade da concessão, assumindo o poder concedente
o serviço, com a encampação dos bens afetos à concessão (FIGUEIREDO, 2003, p.
102).
Além da fiscalização e da
intervenção, compete ao Poder Concedente outras obrigações. O art. 29 da lei nº
8.987/95 estabelece os encargos da Administração:
Incumbe ao poder
concedente:
I - regulamentar o serviço concedido e
fiscalizar permanentemente a sua prestação;
II - aplicar as penalidades regulamentares e
contratuais;
III - intervir na prestação do serviço, nos
casos e condições previstos em lei;
IV - extinguir a concessão, nos casos previstos
nesta Lei e na forma prevista no contrato;
V - homologar reajustes e proceder à revisão
das tarifas na forma desta Lei, das normas pertinentes e do
contrato;
VI - cumprir e fazer cumprir as disposições
regulamentares do serviço e as cláusulas contratuais da
concessão;
VII - zelar pela boa qualidade do serviço,
receber, apurar e solucionar queixas e reclamações dos usuários, que serão
cientificados, em até trinta dias, das providências
tomadas;
VIII - declarar de utilidade pública os bens
necessários à execução do serviço ou obra pública, promovendo as
desapropriações, diretamente ou mediante outorga de poderes à concessionária,
caso em que será desta a responsabilidade pelas indenizações
cabíveis;
IX - declarar de necessidade ou utilidade
pública, para fins de instituição de servidão administrativa, os bens
necessários à execução de serviço ou obra pública, promovendo-a diretamente ou
mediante outorga de poderes à concessionária, caso em que será desta a
responsabilidade pelas indenizações cabíveis;
X - estimular o aumento da qualidade,
produtividade, preservação do meio ambiente e conservação;
XI - incentivar a competitividade;
e
XII - estimular a formação de associações de
usuários para defesa de interesses relativos ao serviço.
A concessionária, além de executar e
explorar o objeto da concessão de serviços públicos, deverá cumprir com outros
encargos previstos no art. 31 da Lei 8.987/95:
Incumbe à
concessionária:
I - prestar serviço adequado, na forma prevista
nesta Lei, nas normas técnicas aplicáveis e no contrato;
II - manter em dia o inventário e o registro
dos bens vinculados à concessão;
III - prestar contas da gestão do serviço ao
poder concedente e aos usuários, nos termos definidos no
contrato;
IV - cumprir e fazer cumprir as normas do
serviço e as cláusulas contratuais da concessão;
V - permitir aos encarregados da fiscalização
livre acesso, em qualquer época, às obras, aos equipamentos e às instalações
integrantes do serviço, bem como a seus registros
contábeis;
VI - promover as desapropriações e constituir
servidões autorizadas pelo poder concedente, conforme previsto no edital e no
contrato;
VII - zelar pela integridade dos bens
vinculados à prestação do serviço, bem como segurá-los adequadamente;
e
VIII - captar, aplicar e gerir os recursos
financeiros necessários à prestação do serviço.
Parágrafo único. As contratações, inclusive de
mão-de-obra, feitas pela concessionária serão regidas pelas disposições de
direito privado e pela legislação trabalhista, não se estabelecendo qualquer
relação entre os terceiros contratados pela concessionária e o poder concedente.
A responsabilidade do concessionário
pelos danos causados a terceiros, em razão dos serviços públicos que executa e
explora, é objetiva, conforme prevê o art. 37, § 6º da Constituição Federal.
Desta forma, a concessionária irá responder pelos danos que seus empregados
causarem a terceiros no exercício de suas funções.
A modalidade do contrato de
subconcessão está previsto no art. 26 da Lei 8.987/95. Pode ser conceituado
como:
[...] a concessionária figura não como
contratante em nome próprio, mas no do Poder Público delegante, operando-se a
sub-rogação legal dos direitos e obrigações próprias do concessionário a
terceiros, no limites da subconcessão, mediante seleção da melhor proposta, em
processo licitatório que deve revestir-se de todos os requisitos ditados pela
Lei de Concessões, aplicada subsidiariamente a Lei de Licitações e Contratos
Administrativos (WALD, 2004, p. 388/389).
Para a subconcessão ter validade é
necessário que haja previsão no contrato, autorização do poder concedente e
realização de competente licitação. Estes requisitos estão previstos no art. 26
e parágrafos da Lei nº 8.987/95.
A seguir será apresentada, de forma
simples, outra modalidade de descentralização das atividades públicas, a
permissão, bem como um comparativo entre concessão e permissão, demonstrando as
principais diferenças.
2.2 A CONCESSÃO E PERMISSÃO DE
SERVIÇOS PÚBLICOS NO DIREITO BRASILEIRO
Como já foi mencionada
anteriormente, concessão de serviço público é a "faculdade que possui o poder
público de abrir mão da administração da atividade que lhe é inerente à
iniciativa privada, para que esta execute os serviços que serão colocados à
disposição da sociedade" (TOLOSA FILHO, 1995, p. 24/25).
Passa-se a analisar a outra
modalidade de descentralização dos serviços públicos, visto que a concessão já
foi analisada no tópico anterior.
De acordo com a Lei nº 8.987/95, em
seu art. 2º, IV, permissão de serviço público é:
[...] a delegação, a título precário, mediante
licitação da prestação de serviços públicos, feita pelo Poder Concedente à
pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua
conta e risco.
Hely Lopes Meirelles conceitua
permissão como:
[...] ato administrativo negocial,
discricionário e precário, pelo qual o Poder Público faculta ao particular a
execução de serviços de interesse coletivo, ou uso especial de bens públicos, a
título gratuito ou remunerado, nas condições estabelecidas pela Administração
(MEIRELLES, 2003, p. 184 2000).
Maria Sylvia Di Pietro preleciona
que permissão é:
[...] ato administrativo unilateral,
discricionário e precário, gratuito ou oneroso, pelo qual a Administração
Pública faculta ao particular a execução de serviço público ou a utilização
privativa de bem público por terceiros (DI PIETRO, 2002, p.128).
A permissão é outorgada por ato
administrativo, decreto ou portaria, podendo o seu conteúdo consistir na
exploração de serviço público ou na utilização de bem público por particular
(CRETELLA JÚNIOR, 2000, p. 352).
José Cretella Júnior faz a
diferenciação entre permissão de serviço público e de uso público, destacando
que naquela a permissionária presta serviço público para a sociedade, existindo
interesses concorrentes entre a Administração, permissionária e público em
geral; enquanto que nesta, a permissionária irá utilizar bem público.
Transcrevendo nas suas palavras:
Permissão de serviço público é o ato
administrativo unilateral, discricionário e precário pelo qual o Poder Público
torna possível ao administrado (pessoa física ou jurídica de direito privado) a
prestação de certa atividade de interesse coletivo, condicionando-o ao
preenchimento prévio de determinados requisitos, podendo ser dada a título
gratuito ou remunerado, nas condições estabelecidas pelo Poder
Público.
Permissão de uso de bem público é
ato administrativo discricionário mediante o qual a autorização competente
faculta ao interessado o uso excepcional de bens públicos (CRETELLA JÚNIOR,
2000, p. 354)
O art. 175 da Constituição Federal
estabelece que a permissão será, necessariamente, precedida de licitação,
devendo ser observados todos os requisitos do edital. Após a licitação será
realizado o contrato para a sua formalização.
O contrato celebrado entre o
permissionário e a Administração Pública é o de adesão, ou seja, é aquele
contrato em que as cláusulas foram estabelecidas e aprovadas pelo Poder
Concedente, atendendo ao interesse público, sem que o permissionário possa
discuti-lo ou modificá-lo. Havendo interesse o permissionário deverá aceitá-lo
como está (TOLOSA FILHO, 1995, p. 122).
Carvalho Filho (2000, p. 304) afirma
que, tanto a Lei nº 8.987/95 como a Constituição Federal, ao levar em conta as
características de contrato especial das permissões, adotaram uma redação
defeituosa, pois poderia levar ao equívoco de supor que as permissões possuem
caráter contratual. Ademais, tal interpretação seria descabida, porque
eliminaria a principal diferença entre as concessões e permissões. A permissão
continua sendo um ato administrativo, e a expressão contrato de adesão, adotada
na Lei nº 8.987/95, deve ser interpretada no sentido de que se trata de ato
negocial, no qual prevalece as regras de direito público.
A permissão é concedida a título
precário, ou seja, a Administração Pública poderá, por ato unilateral, revogá-la
a qualquer tempo. Em razão dessa característica a permissionária irá executar
serviços ou atividades transitórias, ou mesmo permanentes, mas que exijam
freqüentes modificações para acompanhar a evolução da técnica ou as variações do
interesse público (MEIRELLES, 2003, p. 383).
Maria Sylvia Di Pietro entende que a
precariedade da permissão encontra-se na origem do ato de outorga. Assim, em
suas palavras:
[...] a Administração, ao consentir, por ato
formal, na outorga da prestação do serviço público ao permissionário, já o faz
com a nota da precariedade; o particular que recebe a permissão já sabe que ela
é dada a título precário, sem prazo estabelecido, e que, por isso mesmo, pode
ser retirado, a todo momento, pela Administração, sem qualquer direito a
reparação pecuniária. Nesta hipótese, o fundamento da possibilidade de revogação
por ato unilateral é a própria precariedade inerente ao ato formal da permissão.
Essa precariedade afasta o direito de o permissionário opor-se à revogação e de
pleitear qualquer tipo de compensação pecuniária (DI PIETRO, 2002, p.
130/131).
A Lei nº 8.987/95, em seu art. 2º,
IV, não menciona se a permissão tem ou não prazo de duração. Alguns
doutrinadores aceitam que a permissão seja delegada com prazo determinado. Hely
Lopes Meirelles (2003, p. 382) designa de permissão condicionada e Cretella
Júnior (2000, p. 353) de permissão qualificada.
Maria Sylvia de Di Pietro disserta
que, estabelecendo prazo para a permissão de serviços públicos, desapareceria
outra grande diferença entre as concessões e as permissões de serviços públicos.
Eis a seguir as suas conclusões:
[...] a fixação de prazo na permissão faz
desaparecer a diferença entre esse instituto e a concessão, já que ocorrerá a
perda da precariedade e o permissionário se tornará titular de direito subjetivo
oponível a Administração, consistente no direito à prestação do serviço
permitido pelo prazo convencionado, sob pena de responder a Administração
Pública por perdas e danos (DI PIETRO, 2002, p. 131).
Em razão do caráter intuitu
personae da permissão, deverão ser analisados certos requisitos como a
capacidade jurídica, idoneidade técnica, a capacidade econômica, a regularidade
fiscal e outros fixados em lei (GASPARINI, 2001, p. 298). Neste caso, não é
permitido a substituição do permissionário, nem existe a possibilidade de
trespasse do serviço ou do uso permitido a terceiros sem a aprovação do
permitente (MEIRELLES, 2003, p. 383).
O art. 40 da Lei nº 8.987/95
estabelece as principais características da permissão:
A permissão de serviço público será
formalizada mediante contrato de adesão, que observará os termos desta lei, das
demais normas pertinentes e do edital de licitação, inclusive quanto a
precariedade e à revogabilidade unilateral do contrato pelo poder
concedente.
Parágrafo único. Aplica-se às
permissões o disposto nesta lei.
São as principais diferenças e
semelhanças da concessão e da permissão de serviços
públicos:
a) ambas, concessão e permissão,
exigem prévia licitação, sendo que na concessão é obrigatório que se faça sob a
modalidade de concorrência;
b) a permissão pode ser acordada por
pessoa física ou jurídica, mas a concessão só poderá ser por pessoa jurídica ou
consórcio de empresas;
c) o serviço público precedido de
execução de obra pública somente pode ser objeto de concessão e não de permissão
(WALD, 2004, p. 111).
Villela Souto (2001, p. 153)
apresenta duas correntes doutrinárias que fazem a diferenciação entre concessão
e permissão de serviço público:
Para a Corrente Majoritária,
defendida por Helly Lopes Meirelles; José Cretella Júnior, Tupinambá Miguel
Castro do Nascimento, Elcias Ferreira da Costa e Carlos Pinto Coelho Motta, e
consubstanciada nas diferenças assentadas em posicionamento pacífico da
doutrina, a concessão de serviço público tem caráter contratual, advindo daí as
demais características da concessão:
a) é ato administrativo bilateral,
formalizado através de contrato administrativo, que consolida num acordo de
vontades, entre a Administração concedente e o particular concessionário,
visando à consecução de um interesse público da
Administração;
b) revestindo-se dos poderes
vinculado e discricionário na sua celebração e no seu cumprimento (cláusulas de
serviços e cláusulas econômicas);
c)
onerosidade;
d) estabilidade
contratual;
e) vinculação intuito
personae;
A permissão de serviço público, ato
administrativo unilateral, discricionário e precário da Administração
concedente, emite uma declaração unilateral de vontade visando à realização de
negócio jurídico público (remunerado ou não) no interesse do particular, desde
que não se contrarie ao interesse público. A permissão é reservada a serviços
que não exijam prévia obra pública e pode ser delegada a pessoa
física.
De acordo com a Corrente
Minoritária, que tem como adeptos Maria Sylvia Zanella Di Pietro e Raul Armando
Mendes, a concessão como a permissão de serviços públicos são modalidades de
contrato administrativo, tendo por característica essencial a consensualidade do
ajuste (SOUTO, 2001, p. 153/154).
Desta forma, entende-se que as
principais diferenças entre a concessão e a permissão reside na natureza
jurídica e no prazo da delegação dos serviços. Assim, as primeiras têm natureza
contratual e prazo pré-determinado pela Administração e as segundas têm natureza
de ato negocial e não possuem prazo.
No tópico seguinte serão
apresentadas as formas de extinção da concessão de serviços públicos. As
principais são: reversão, encampação, caducidade, anulação, advento do termo
contratual, falecimento ou extinção da empresa concessionária e falecimento ou
incapacidade do titular, no caso de empresa individual.
2.3 A EXTINÇÃO DO CONTRATO DE
CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO
A concessão de serviços públicos é
sempre concedida com prazo pré-fixado, e, normalmente, irá perdurar até o
término do contrato. Entretanto, há casos excepcionais em que a concessão poderá
ser extinta quando não atender mais aos interesses
públicos.
No entendimento de Diógenes
Gasparini, diversos atos e fatos jurídicos levam à extinção da concessão. Dentre
estes destaca-se: fato jurídico, ou seja, qualquer acontecimento que tem
relevância para o Direito, como decurso do prazo e desaparecimento do
concessionário; ato jurídico; ato administrativo, como: interesse público,
desafetação do serviço, inadimplemento do concessionário e ilegalidade da
concessão; ato consensual; ato jurisdicional (sentença) (GASPARINI, 2001, p.
318).
A Lei nº 8.987/95, em seu art. 35,
enumera os casos de extinção de serviços públicos: rescisão, reversão,
encampação, caducidade, anulação, advento do termo contratual, falecimento ou
extinção da empresa concessionária e falecimento ou incapacidade do titular, no
caso de empresa individual.
A pessoa jurídica de direito privado
da concessionária não irá desaparecer com a extinção da concessão, embora deixe
de ser prestadora e exploradora de um serviço público, possuindo tais aptidões
quando está na qualidade de concessionária de serviços públicos (GASPARINI,
2001, p. 319).
Com a extinção da concessão, os
direitos e obrigações do concessionário, relativos à concessão, serão extintos,
como, também, se extinguirá os direitos especiais que o concessionário detinha
em virtude de sua gestão do serviço público (CRETELLA JÚNIOR, 1997, p.
165).
A extinção da concessão pelo advento
do termo contratual ocorre com o término da concessão do serviço público. Esta é
a maneira normal e mais comum de sua extinção. Vencido o prazo do contrato de
concessão os bens do concessionário utilizados para desenvolver suas atividades
em nome do poder público, reverterão para o patrimônio do concedente, ocorrendo
a reversão (MELLO, 2001, p. 661). No momento oportuno será explanado sobre o
assunto.
Os efeitos da extinção pelo advento
do termo contratual são ex nunc, desta forma só com o termo final é que o
serviço se considera revertido ao poder concedente. E, também, a partir desse
momento é que o concessionário irá se desvincular de suas obrigações, perdendo,
assim, os privilégios administrativos que possuía em virtude da vigência do
contrato (CARVALHO FILHO, 2000, p. 295).
De acordo com o art. 39, da Lei nº
8.987/95, a extinção do contrato de concessão poderá ocorrer por rescisão
judicial, feita a pedido do concessionário, quando o poder público torna-se
inadimplente, ou a pedido do poder concedente, se a inadimplência parte do
concessionário. Como conseqüência desse tipo de extinção, ocorre a composição
patrimonial entre as partes; a indenização do capital ainda não amortizado do
concessionário e reversão para o Poder Público do equipamento necessário à
prestação do serviço. Havendo culpa do poder concedente, o juiz fixará a
composição dos lucros que o concessionário tenha deixado de auferir por razão da
extinção da concessão (MELLO, 2001, p. 661).
Com a rescisão consensual a
concessão será extinta em virtude do acordo entre as partes, ou seja,
concessionário e poder concedente, de forma amigável, resolvem antecipar a
extinção da delegação dos serviços públicos. Neste caso, a composição
patrimonial será resolvida de forma amigável (MELLO, 2001, p.
661).
Dispõe Bandeira de Mello, que a
extinção da concessão por ato unilateral do poder concedente tem três
modalidades: encampação ou resgate; caducidade ou decadência e anulação da
concessão (MELLO, 2001, p. 661/664).
O art. 37 da Lei nº 8.987/95
conceitua a encampação como:
[...] retomada do serviço pelo poder concedente
durante o prazo da concessão, por motivo de interesse público, mediante lei
autorizativa específica e após prévio pagamento da indenização
[...].
Para Cretella Júnior encampação ou
resgate é o:
[...] ato administrativo unilateral
discricionário pelo qual, no decurso do prazo da concessão de serviço público, a
Administração, mesmo sem culpa, do particular, põe fim à colaboração instituída,
avocando a si o serviço, por motivos de interesse público, mediante justa
indenização paga ao concessionário (CRETELLA JÚNIOR, 1997, p.
168).
A encampação funda-se em razões de
ordem administrativa. Ocorre quando o concedente deseja retomar o serviço
concedido. Neste tipo de extinção, o Poder Público utiliza-se da sua
prerrogativa especial de extinguir unilateralmente os contratos administrativos.
Na extinção não há qualquer inadimplência por parte do concessionário; somente o
interesse da Administração retomar o serviço (CARVALHO FILHO, 2000, p.
299).
A encampação ou resgate deve ser
precedido de lei autorizativa específica e o poder concedente deve promover a
prévia indenização do concessionário, mediante levantamento e avaliação, para
determinar o valor a ser pago ao concedente, contabilizando, inclusive, as
parcelas dos investimentos vinculados a bens reversíveis, ainda não amortizados
ou depreciados, que tenham sido realizados com o objetivo de garantir a
continuidade e atualidade dos serviços concedidos (TOLOSA FILHO, 1995, p.
114/115).
O art. 38 da Lei nº 8.987/95 dispõe
que caducidade é:
A inexecução total ou parcial do contrato
acarretará, a critério do poder concedente, a declaração de caducidade da
concessão ou a aplicação das sanções contratuais [...].
Segundo Bandeira de Mello caducidade
ou decadência é:
[...] modalidade de encerramento da concessão,
por ato do concedente, antes da conclusão do prazo inicialmente fixado, em razão
de inadimplência do concessionário; isto é, por motivos de fato comissivo ou
omissivo, doloso ou culposo, imputável ao concessionário e caracterizável como
violação grave de suas obrigações (MELLO, 2001, p. 663).
A caducidade ocorre quando o
concessionário não executa o contrato integralmente ou o faz de forma parcial,
caracterizando a inexecução total ou parcial. Poderá ocorrer, também, quando
houver a transferência do serviço concedido ou do controle societário da
concessionária sem prévia anuência do poder concedente (TOLOSA FILHO, 1995, p.
115).
Preliminarmente, o poder concedente
poderá aplicar sanções contratuais antes de declarar a caducidade, na tentativa
de reconduzir a execução contratual a níveis satisfatórios (TOLOSA FILHO, 1995,
p. 115).
A indenização não será devida nos
casos de caducidade ou decadência, salvo para o pagamento dos bens não
amortizados (FIGUEIREDE, 2003, p. 105). Serão descontadas do montante da
indenização, o valor relativo às multas a serem pagas pelo concessionário em
virtude dos danos provocados ao concedente (BLANCHET, 2000, p.
178).
Depois de comprovada a inexecução
total ou parcial do contrato pelo concedente, por meio de processo
administrativo, respeitando o princípio do contraditório, a caducidade será
declarada por decreto do poder concedente. O valor da indenização será apurado
no decurso do processo administrativo (MEIRELLES, 2003, p.
380).
Tanto a encampação como a caducidade
devolvem o serviço ao poder concedente, mas diferencia-se porque a primeira tem
como pressuposto o interesse público, e a segunda o descumprimento total ou
parcial das obrigações decorrentes da concessão (TOLOSA FILHO, 1995, p.
115).
A anulação da concessão ocorrerá
quando o contrato firmado entre as partes possui vícios de ilegalidade. A sua
decretação pode se concretizar por meio de decisão administrativa ou judicial, e
os seus efeitos são ex tunc, ou seja, a partir da ocorrência do vício
(CARVALHO FLIHO, 2000, p. 296).
Segundo Lopes Meirelles, a anulação
não se confunde com os demais tipos de extinção da concessão de serviços
públicos, assim afirma:
A anulação não se confunde as formas de
extinção antes examinadas, porque todas elas pressupõem um contrato válido, mas
mal executado (inadimplência) ou cuja execução pelo concessionário se tenha
tornado inconveniente ao interesse público, ao passo que a anulação pressupõe um
contrato ilegal, embora esteja sendo regularmente executado (MEIRELLES, 2003, p.
381).
Comprovada a boa-fé do concessionário, este
terá direito a indenização pelas despesas efetuadas e, se já se encontrar o
serviço em funcionamento, revertidos os bens, terá de ser indenizado pelas
parcelas não amortizadas (MELLO, 2001, p. 664).
Ocorrendo a falência da pessoa
jurídica de direito privado, a concessionária de serviços públicos, irá se
extinguir o contrato com a Administração Pública. Tal causa está prevista no
art. 35, VI da Lei nº 8.987/95.
Com a falência ocorre o
desaparecimento da concessionária, desta forma, não tem como manter a concessão
de serviço público, pois é impossível manter um contrato se uma das partes está
extinta.
Os efeitos jurídicos da extinção
conta-se da decretação da falência, ou seja, são ex nunc. Como nos demais
casos de extinção, os bens da concessionária irão reverter em favor da
Administração, assim devendo indenizar aqueles que não foram amortizados ou
depreciados (GASPARINI, 2001, p. 321).
Ocorrendo a morte de um dos sócios
não leva à extinção da concessão de serviços públicos, salvo se em razão dela, a
Sociedade se dissolver. Se a Sociedade continuar com os demais sócios e o
representante do de cujus, não há que se falar em dissolução. Mas, se for
individual, ocorrendo à morte ou incapacidade de seu titular irá extinguir
imediatamente a concessão dos serviços públicos (GASPARINI, 2001, p.
322).
Na prática, poucas vezes ocorre a
extinção da concessão em virtude do falecimento ou incapacidade do
concessionário de empresa individual, porque a maioria das concessões é
repassada a Sociedades Empresárias ou consórcio delas, raramente a indivíduos
(CRETELLA JÚNIOR, 1997, p. 177).
Em seguida passaremos para análise
do instituto da reversão.
2.3.1 Reversão
Extinguindo a concessão, retorna ao
Poder Concedente todos os bens reversíveis, direitos e privilégios transferidos
ao concessionário conforme previsto no edital e estabelecido no contrato
(BRASIL, Lei nº 8.987/95 art. 35 §1º).
Carvalho Filho conceitua reversão
como: "a transferência dos bens do concessionário para o patrimônio do
concedente em virtude da extinção do contrato" (CARVALHO FILHO, 2000, p.
300).
Para Cretella Júnior reversão
é:
[...] o instituto de Direito Público mediante o
qual, expirado o prazo da concessão e todo o bem público temporariamente cedido
ao concessionário, voltam automaticamente para o domínio do Estado, todo o
material de instalação (CRETELLA JÚNIOR, 1997, p. 165).
O art. 36 da Lei nº 8.987/95 prevê o
instituto da reversão, quando disciplina:
A reversão no advento do termo contratual
far-se-á com a indenização das parcelas dos investimentos vinculados a bens
reversíveis, ainda não amortizados ou depreciados, que tenham sido realizados
com o objetivo de garantir a continuidade e atualidade do serviço
concedido.
Dispõe Bandeira de Mello, que a reversão não é
considerada uma forma de extinção da concessão, apenas uma conseqüência dela.
Portanto, sem extinção não haverá a reversão (MELLO, 2001, p.
666).
No entanto, só reverterão em favor
da Administração Pública, titular do serviço público, os bens que realmente eram
vinculados à prestação do serviço; os demais permanecerão sob o domínio do
ex-concessionário.
A Lei nº 8.987/95 estabelece que o
edital de licitação (art. 18, X) e o contrato de concessão de serviço público
(art. 23, X) deverão determinar quais os bens reversíveis à Administração
Pública. Na falta de tais previsões, a reversão será presumida, utilizando as
normas gerais da Lei nº 8.987/95 que trata sobre o
assunto.
A reversão pode ser onerosa ou
gratuita. A primeira ocorre quando extinta a concessão, o concessionário durante
a vigência do contrato cobrou as tarifas e, mesmo assim, não conseguiu amortizar
o valor dos bens reversíveis. Já a segunda forma, a gratuita, o concessionário
conseguiu amortizar o valor dos bens, cobrando as tarifas, durante a vigência do
contrato. Neste caso, a reversão será sem ônus para a Administração Pública
(GASPARINI, 2001, p. 331).
Na reversão onerosa, a indenização
será calculada nos termos do contrato, pelo custo histórico (custo da
aquisição), pelo custo de reprodução (preço atual do bem) ou pelo custo
histórico atualizado (custo de aquisição corrigida). O pagamento será prévio nos
casos encampação ou resgate, conforme o art. 37 da Lei nº 8.987/95. Nas demais
hipóteses de extinção esse pagamento será posterior à reversão. A indenização
será paga de uma só vez, salvo acordo entre as partes. (GASPARINI, 2001, p.
332).
Assim, em toda concessão encerrada
ocorrerá, necessariamente, a reversão, ou seja, os bens utilizados para a
prestação do serviço público passarão para a Administração Pública, de forma
onerosa ou gratuita. Não estando prevista no contrato ou no edital de licitação,
a reversão será presumida.
A seguir, passa-se as discussões do
terceiro capítulo deste trabalho, acerca das Agências Reguladoras. Inicialmente,
serão analisados: o histórico e principais características dos entes
reguladores. No último momento será estudado o tópico que deu o título a
monografia: a interferência das Agências Reguladoras na empresas Concessionárias
de Serviços Públicos.
3 AS AGÊNCIAS REGULADORAS SEGUNDO O
DIREITO BRASILEIRO E A SUA INTERFERÊNCIA NAS EMPRESAS CONCESSIONÁRIAS DE
SERVIÇOS PÚBLICOS
O presente capítulo, último do
trabalho, irá abranger o tema sobre Agências Reguladoras. Será tratado sobre: o
seu histórico, o conceito, as principais características, a natureza jurídica, a
criação, a extinção, os objetivos e no último tópico será exposto o tema que
levou ao desenvolvimento da monografia, ou seja, a interferência das Agências
Reguladoras nas empresas concessionárias de serviços públicos.
O trabalho não tem objetivo de
esgotar o tema, afinal ele merece um estudo mais detalhado. Todos os tópicos
sobre Agências Reguladoras foram apontados de forma a dar uma idéia geral o que
são esses entes reguladores presentes no ordenamento jurídico brasileiro.
Inicialmente será feito um breve
retrospecto histórico de tais órgãos no direito público.
3.1 A ORIGEM DAS AGÊNCIAS
REGULADORAS
O papel do Estado, nas últimas
décadas, tem sofrido grandes alterações. Devido à escassez dos recursos do
Estado e sua inoperância para atender a demanda das necessidades da sociedade,
estabelecida na Constituição Federal de 1988, levou a substituição do poder
econômico estatal pelas Sociedades privadas (SERPA, 2003, p.
125).
As Agências Reguladoras foram
implantadas no ordenamento jurídico brasileiro a partir da instituição de um
novo modelo organizacional do Estado, especialmente, durante a década de 90.
Nasceram em decorrência da reformulação do papel do Estado, que passou a ser um
agente normativo e regulador da ordem econômica. Toda essa reformulação ocorreu
no intuito de superar a crise em que o Estado se encontrava, sendo, portanto,
uma tentativa de reconstruí-lo e fortalecê-lo (CUÉLLAR, 2001, p.
55).
O modelo de Agências Reguladoras
teve sua origem no direito norte-americano, com a instituição da Interstate
Commerce Comission, em 1887, servindo este de base para a criação das
Agências Reguladoras de outros países (MEDAUAR, 2002, p.
86/87).
As Agências norte-americanas são
criadas pelo Poder Legislativo, que lhes outorga independência em relação ao
Poder Executivo não estando, entretanto, submetida ao controle hierárquico. São
autorizadas a elaborar regras jurídicas e aplicá-las a casos concretos, e bem
como detêm poderes para fiscalizar, investigar, punir e decidir controvérsas
(CUÉLLAR, 2001, p. 71).
Como observa Di Pietro, o direito
norte-americano serviu de base para o fenômeno que já vem sendo chamado de
"agencificação", isto é:
[...] a proliferação de Agências, em
substituição ao fenômeno anterior de proliferação de entes com personalidade
jurídica própria, que compõem a administração indireta do Estado. Não é um
fenômeno que ocorre apenas no direito brasileiro; ele vem se difundindo pelo
mundo como uma decorrência da globalização (DI PIETRO, 2002, p.
143).
Inicialmente, no Brasil, foi adotado
o "Welfare State", ou seja, o Estado do Bem Estar Social, acrescentando
ao Poder Público os deveres como a promoção da saúde, da educação, da
previdência, a geração de empregos, além da criação de empresas estatais para
promover as políticas públicas. Num primeiro momento, o Estado interveio na
economia, pois não havia empresas privadas com capacidade financeira e
infra-estruturas suficientes para promover o desenvolvimento (MENEZES, 2002, p.
50).
A partir das décadas de 50 e 60, os
setores brasileiros de infra-estrutura oportunizaram a formação de monopólios
devido à necessidade de criação em grande quantidade e o alto custo de produção.
Com isso, o Estado passou a prestar os serviços para estruturar o mercado
(MENEZES, 2002, p. 50).
Após a crise econômica mundial dos
anos 70, das crises do petróleo, o Estado de Bem Estar Social entrou em crise
com o crescimento do capitalismo no mundo. Várias causas foram dadas para
justificar tal decadência do Estado, como a súbita alteração da dinâmica
financeira e a incapacidade das instituições adaptarem-se ao ritmo acelerado de
transformação social e econômica (TOJAL, 2002, p. 153).
A progressiva retirada do Estado na
prestação dos serviços públicos e das atividades econômicas, em função do
incremento da tecnologia de infra-estrutura e aumento da demanda, permitiu o
surgimento de empresas privadas para participar da concorrência na prestação dos
serviços (MENEZES, 2002, p. 51).
Com a transferência de parte dessas
atividades para a mão das entidades privadas, a relação entre o público e o
privado ficou alterada, fazendo surgir à correlata necessidade de acompanhamento
do setor por intermédio de regulação, para não perder de vista o interesse
público (TOJAL, 2002, p. 154).
De forma sintética Tojal expõe o
surgimento do atual modelo dos órgãos reguladores:
Em resumo, as funções de prestação
do serviço e da regulação do serviço que antes se concentravam no mesmo ente -
grandes empresas estatais - separam-se, passando os serviços a ser concedidos e
autorizados a empresas privadas e privatizadas, e o papel de mediação dos
interesses que compõem os setores privatizados a ser exercido pelas Agências
Reguladoras recém-criadas (TOJAL, 2002, p. 155).
Deste modo, o Constituinte
Brasileiro buscou uma nova forma de intervenção estatal. É nesse contexto que
surgem às Agências Reguladoras.
Destarte, os órgãos reguladores
foram criados com a justificativa de dotar-se um órgão independente dos poderes
para exercer o controle da execução dos contratos de concessão, e a fiscalização
dos serviços e das concessionárias, editando normas de regulação, reprimindo
condutas ilegais e abusivas e até resolver os conflitos entre os agentes
envolvidos na prestação determinados serviços públicos (WALD, 2004, p.
222/223).
No tópico seguinte passaremos a
análise do conceito e as principais características das Agências Reguladoras em
nível federal, como: autonomia financeira e administrativa, poder normativo,
estabilidade dos dirigentes, o controle dos Poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário.
3.2 AS AGÊNCIAS REGULADORAS: NOÇÕES
GERAIS E PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS
Inicialmente, cabe ressaltar que
serão analisadas todas as noções gerais e as principais características das
Agências Reguladoras em nível federal.
As Agências Reguladoras não possuem,
no ordenamento jurídico brasileiro, uma lei específica que traga sua definição.
Desta forma, não existe uma norma genérica, fixando de forma clara e precisa o
conceito de Agência Reguladora. (CUÉLLAR, 2001, p. 75).
Após as alterações das Emendas
Constitucionais nº 8/95 e 9/95, foi inserido no seu texto a expressão "órgão
regulador". No entanto, não fazem referência ao termo Agências Reguladoras. Tal
designação passou a ser usada pelo legislador brasileiro para esse novo modelo
de instituição encarregada de disciplinar e controlar certas atividades (PAULO,
2003, p. 71).
As primeiras Agências Reguladoras
criadas no Brasil foram: Agência Nacional de Energia Elétrica, ANEEL, criada
pela Lei nº 9.427/96; Agência Nacional de Telecomunicações, ANATEL, criada pela
Lei nº 9.472/97 e a Agência Nacional de Petróleo, ANP, criada pela Lei nº
9.478/97.
Afirma a doutrina pátria que só há
previsão na Constituição Federal para instituição da ANATEL e da ANP. A primeira
está prevista no art. 21, XI, enquanto a ANP está prevista no § 2º do art. 177
da Constituição Federal (WALD, 2004, p. 227).
Assim, somente as leis específicas
que criam os órgãos reguladores e a doutrina é que fazem referência ao termo
Agências Reguladoras (CUÉLLAR, 2001, p. 76).
Apesar das Agências Reguladoras não
possuírem uma disciplina única para sua criação e modelo, a sua instituição vem
obedecendo mais ou menos o mesmo padrão (DI PIETRO, 2003, p.
404).
De acordo com Vicente Paulo e
Marcelo Alexandrino, Agências Reguladoras podem ser conceituadas
como:
[...] entidades administrativas com alto grau
de especialização técnica, integrantes da estrutura formal da Administração
Pública, instituídas sob a forma de autarquias em regime especial, com a função
de regular um setor específico de atividade econômica, ou de intervir de forma
geral sobre relações jurídicas decorrentes destas atividades, que devem atuar
com a maior independência possível perante o Poder Executivo e com
imparcialidade em relação às partes interessadas (Estado, setores regulados e
sociedade) (PAULO, 2003, p. 20).
Leila Cuéllar conceitua as Agências
Reguladoras como:
[...] pessoas jurídicas de direito público,
criadas por lei e que somente por lei podem ser extintas. Exercem atividades e
serviços administrativos (regulação e fiscalização da atividade econômica em
sentindo amplo), possuem capacidade administrativa, autonomia patrimonial, mas
permanecem sob o controle e tutela do Estado quanto a sua organização,
administração e fiscalização financeira (CUÉLLAR, 2001, p.
90/91).
Segundo Maria Sylvia Di Pietro as
Agências Reguladoras são:
[...] em sentido amplo, no direito brasileiro,
qualquer órgão da Administração Direta ou entidade da Administração Indireta com
função de regular a matéria específica que lhe está afeta (DI PIETRO, 2003, p.
402).
Marçal Justen Filho caracteriza
Agências Reguladoras como:
É uma autarquia especial, criada por lei para a
intervenção estatal no domínio econômico, dotada de competência para a regulação
de setor específico, inclusive com poderes de natureza regulamentar e para
arbitramento de conflitos entre particulares, e sujeita a regime jurídico que
assegure sua autonomia em face da Administração direta (JUSTEN FILHO, 2002, p.
344).
Pode-se constatar que as Agências
Reguladoras são criadas para controlar e fiscalizar os serviços prestados pela
ordem privada. Nesse sentido, afirma Sandra Melillo Bittencourt em sua
dissertação de mestrado:
A criação das Agências Reguladoras
decorre de um novo modelo de provisão de serviços públicos, em que o Estado
transfere para a iniciativa privada a sua prestação e as Agências Reguladoras
regulamentam tais serviços e outras atividades econômicas de interesse social
(BITTENCOURT, 2004, 57/58).
Conforme o art. 37, XIX, da
Constituição Federal, as autarquias só poderão ser criadas por lei específica.
Desta forma, as Agências Reguladoras por serem autarquias em regimes especiais,
por representar uma opção discricionária de descentralização de uma função
regulatória, também, por lei deverão ser criadas (SOUTO, 2001, p.
447).
Quanto à extinção dos órgãos
reguladores, o ato deve ser motivado por um interesse público relevante. Será
exercida de acordo com os princípios inerentes à Administração pública (SOUTO,
2001, p. 448). Também, pelo mesmo tipo de lei que foi criada, a Agência
Reguladora será extinta (BARROSO, 2002, p. 121).
A Agências Reguladoras são
tipificadas, pelo legislador nacional, como autarquias especiais, e não só
autarquia, porque elas possuem algumas peculiaridades que as diferenciam das
autarquias clássicas (CUÉLLAR, 2001, p. 91).
Destaca Bandeira de Mello que a
autarquia pode ser conceituada como: "pessoa jurídica de direito público de
capacidade exclusivamente administrativa" (MELLO, 2001, p.
123).
Hely Lopes Meirelles afirma que as
autarquias são: "entes administrativos autônomos, criados por lei específica,
com personalidade jurídica de Direito Público interno, patrimônio próprio e
atribuições estatais específicas" (MEIRELLES, 2003, p.
332).
Para o autor autarquias especiais
são aquelas que:
[...] a lei instituidora conferir privilégios
específicos e aumentar a sua autonomia comparativamente com as autarquias
comuns, sem infringir os preceitos constitucionais pertinentes a essas entidades
de personalidade pública (MEIRELLES, 2003, p. 341).
Wald constata que, o caráter
especial das Agências Reguladoras representa:
"uma ampla autonomia administrativa e
financeira e atribuições estatais específicas para o desempenho de atividade
especializada, conforme as respectivas competências estabelecidas nas leis de
criação" (WALD, 2004, p. 229).
A especialidade das Agências
Reguladoras, como dito, está especificada na lei criadora e decorre das
previsões legais especiais que adornam. Assim, cada entidade possuirá um grau
específico de especialidade, conforme estabelecido em lei, não podendo estender
os mesmos elementos de uma para outra Agência (CUÉLLAR, 2001, p.
92).
Desta forma, a principal diferença
entre a autarquia especial e a clássica decorre que na primeira são concedidos
maiores privilégios do que possuem as autarquias clássicas, de forma a ampliar a
autonomia.
Afirma Leila Cuéllar que os
privilégios das Agências Reguladoras decorrem principalmente da independência
administrativa, da ausência de subordinação hierárquica, da previsão de mandato
fixo e estabilidade de seus dirigentes e autonomia financeira (CUÉLLAR, 2001, p.
93).
Conforme Wald e Moraes existem
quatro dimensões que caracterizam uma Agência Reguladora: a independência
decisória, a independência de objetivos, a independência de instrumentos e a
independência financeira. Assim:
A independência decisória consiste na
capacidade da Agência de resistir às pressões de grupos de interesse no curto
prazo. Procedimentos para a nomeação e demissão de dirigentes, associados com a
fixação de mandatos longos, escalonados e não coincidentes com o ciclo eleitoral
são arranjos que procuram isolar a direção da Agência de interferências
indesejáveis tanto por parte do governo quanto da indústria regulada. A
independência de objetivos compreende a escolha de objetivos que não conflitem
com a busca prioritária do bem-estar do consumidor. Uma Agência com o número
pequeno de objetivos bem definidos e não conflitantes tende a ser mais eficiente
que uma outra com objetivos numerosos, imprecisos e conflitantes. A
independência de instrumentos é a capacidade da Agência escolher os instrumentos
de regulação - tarifas, por exemplo - de modo a alcançar os seus objetivos da
forma mais eficiente possível. Finalmente, a independência financeira refere-se
à disponibilidade dos recursos materiais e humanos suficientes para a execução
das atividades de regulação (WALD, 1999, p. 146).
A independência administrativa e
autonomia financeira são imprescindíveis para que os Órgãos Reguladores cumpram
satisfatoriamente seu papel funcional de regulação.
Segundo Alexandre de
Moraes:
A independência funcional e financeira das
Agências Reguladoras é consagrada pela presença dos seguintes preceitos
obrigatórios nas suas leis de criação: independência financeira; escolha dos
instrumentos de regulação e modo de nomeação de seus dirigentes (MORAES, 2002,
p. 25).
A independência das Agências
Reguladoras, inicialmente, diz respeito à ausência de vínculo hierárquico formal
entre a Agência e a pessoa administrativa central. São fundamentais, também, a
autonomia de atuação e a financeira, bem como a previsão de garantias para
evitar a captura das Agências por interesses políticos ou econômicos (CUÉLLAR,
2001, p. 93).
Afirma Edmir Neto de Araújo
que:
[...] as Agências são autônomas (pois atuam em
seu próprio nome, mas de acordo com o sistema geral estatal) e não independentes
(pois são partes ou apêndices do regime financeiro e orçamentário geral estatal)
(ARAÚJO, 2002, p. 48).
Para Marçal Justen Filho a
atribuição de autonomia às Agências Reguladoras pressupõe a existência de
competências privativas, ou seja:
[...] um pressuposto essencial para a
configuração de uma entidade autônoma consiste na existência de competências
exclusivas, determinadas legislativamente, de modo a excluir o poder jurídico ou
político de outro órgão para determinar as hipóteses em que caberá a sua atuação
(JUSTEN FILHO, 2002, p. 399).
O que diz respeito à autonomia
financeira, Alexandre de Moraes dispõe que:
[...] deverá ser assegurada pela
disponibilidade de recursos humanos e infra-estrutura material fixados em lei,
além da previsão de dotações consignadas no orçamento geral da União, créditos
especiais, transferências e repasses que lhe forem conferidas (MORAES, 2002, p.
25/26).
Além disso, as leis instituidoras
das Agências Reguladoras poderão prever outras formas de receita, conforme
assevera Leila Cuéllar:
[...] (a) arrecadação de taxas de fiscalização
sobre os serviços ou atividades econômicas reguladas, (b) produtos de multas,
emolumentos e retribuição de serviços prestados a terceiros, (c) rendimentos de
operações financeiras, (d) recursos provenientes de convênios, acordos ou
contratos celebrados, (e) doações, legados, dentre outros recursos que lhe forem
destinados, (f) valores apurados na venda ou aluguel de bens móveis ou imóveis
de propriedade das Agências (CUÉLLAR, 2001, p. 94).
Assim, pode-se constatar que
independência administrativa, financeira e técnica das Agências Reguladoras
destacam-se como suas principais características, pois a partir delas a sua
atuação será realizada de forma transparente e eficiente.
No entanto, segundo Bandeira de
Mello, a independência administrativa, autonomia financeira e patrimonial,
autonomia nas suas decisões técnicas e ausência de subordinação hierárquica são
elementos inerentes a toda autarquia. Desta forma, não há peculiaridade alguma,
o que pode ocorrer é um grau mais ou menos intenso dessas características
(MELLO, 2001, p. 135).
O mesmo autor afirma que o único
ponto relevante que diferencia as autarquias comuns das Agências Reguladoras diz
respeito à investidura e à estabilidade do mandato de seus dirigentes (MELLO,
2001, p. 135).
Dissertando sobre a estabilidade dos
dirigentes, Roberta Fragoso de Medeiros Menezes afirma
que:
A direção das Agências Reguladoras federais é
feita por um colegiado, com mandatos não coincidentes, sujeitos ao período da
quarentena após o término. A estabilidade dos mandatos dos dirigentes é uma
conseqüência do princípio da independência na atuação das Agências Reguladoras.
Significa que, à exceção dos casos legalmente previstos, como crimes de
improbidade administrativa, violação grave dos direitos funcionais,
descumprimento do contrato de gestão, não poderão os dirigentes ser demitidos ao
arbítrio do Ministro ou Presidente da República (MENEZES, 2002, p.
57).
A Lei nº 9.986/2000 que dispõe sobre
a gestão de recursos humanos das Agências Reguladoras, padronizou a escolha de
seus dirigentes, e, em seu art. 5º estabeleceu que eles serão escolhidos pelo
Presidente da República, sendo por ele nomeado, após aprovação do Senado
Federal. Havendo rejeição pelo Senado, não se aperfeiçoará a investidura no
cargo.
Os diretores das Agências deverão
ser brasileiros de reputação ilibada, formação universitária e elevado conceito
no campo da especialidade dos cargos para os quais serão nomeados. (MELLO, 2001,
p. 135).
A Lei acima mencionada, em seu art.
4º, estabeleceu que as Agências serão dirigidas por órgãos colegiados, compostos
por cinco diretores ou conselheiros, e no art. 6º estabeleceu que o mandato dos
conselheiros e diretores terá o prazo fixado na lei da criação de cada Agência.
Sobre o assunto, afirma Sandra
Melillo Bittencourt:
Os dirigentes das Agências Reguladoras são
agentes políticos, não selecionados através de concurso público, mas escolhidos
e nomeados pelo Chefe do Poder Executivo entre pessoas de notório conhecimento
jurídico sobre o assunto a ser regulado, que posteriormente passam pela
aprovação do Congresso Nacional onde são sabatinados (BITTENCOURT, 2004, p.
72).
Os dirigentes das Agências
Reguladoras federais podem ser classificados como agentes políticos, pois
integram órgãos aos quais o legislador reconhece independência funcional e
autonomia financeira e administrativa, além de exercerem atividade de produção
de normas e terem regime jurídico distinto dos servidores estatutários (SILVA,
2003, p. 125).
Hely Lopes Meirelles conceitua
agentes políticos como:
[...] componentes do Governo nos seus primeiros
escalões, investidos em cargos, funções ou mandatos ou comissões, por nomeação,
eleição, designação ou delegação para o exercício de atribuições
constitucionais. Esses agentes atuam com plena liberdade funcional,
desempenhando suas atribuições com prerrogativas e responsabilidades próprias,
estabelecidas na Constituição e em leis especiais. Têm normas específicas para a
sua escolha, investidura, conduta e processo por crimes funcionais e de
responsabilidade, que lhe são privativos.
Os agentes políticos exercem funções
governamentais, judiciais e quase-judiciais, elaborando normas legais,
conduzindo os negócios públicos, decidindo e atuando com independência nos
assuntos de sua competência (MEIRELLES, 2003, p.75/76).
A Constituição Federal, em seu art.
37, II, estabelece duas formas de provimento de cargo público. A primeira ocorre
por meio de seleção mediante concurso público de provas ou de provas e títulos,
destinada ao provimento de cargos efetivos. A segunda, refere-se ao provimento
de cargos de confiança e de funções gratificadas, de livre nomeação e exoneração
pelos Chefes do Poder quanto aos cargos das respectivas estruturas.
As Agências Reguladoras possuem um
modelo próprio de nomeação de seus dirigentes. Como já mencionado os dirigentes
desses órgãos são nomeados pelo Presidente da República, após aprovação do
Senado Federal; seria um cargo de confiança, e, por isto, demissível a qualquer
tempo (SOUTO, 2001, p. 453).
Em relação às Agências Reguladoras
não se admite a demissão ad nutum dos membros responsáveis pela direção,
preservando, assim, a independência dos órgãos reguladores. Isso não diz
respeito a um privilégio dado aos dirigentes das Agências; mas, um requisito
essencial para resguardar o princípio da segurança jurídica para os agentes
regulados, objetivando maior continuidade nos atos regulatórios (MENEZELLO,
2002, p. 87).
Villela Souto defende a
constitucionalidade da norma que estabelece a estabilidade dos dirigentes das
Agências, citando o art. 37, I da Constituição Federal:
Em defesa da constitucionalidade da norma, pode
ser citado o art. 37, I, CF, que prevê a acessibilidade aos cargos públicos
daqueles que preencham os requisitos previstos em lei; se o requisito é a
aprovação política de profissional de reputação ilibada e notória especialização
no setor regulado, não pode haver perda do cargo senão nas hipóteses autorizadas
na lei (SOUTO, 2001, p. 453).
Segundo a Lei nº 9.986/2000, os
cargos de diretoria das Agências Reguladoras são qualificados como os cargos
comissionados de direção, porém com a característica de poderem ser providos por
prazo determinado e a demissão subordinar-se a motivação e procedimento formal
(FIGUEIREDO, 2003, p. 142).
De acordo com o art. 9º da citada
lei, os conselheiros e diretores somente perderão o mandato em caso de renúncia,
de condenação judicial transitada em julgado ou processo administrativo
disciplinar. O parágrafo único do mesmo artigo estabelece que as leis
instituidoras das Agências poderão impor outras condições de perda do
mandato.
Conforme dispõe Fernando Quadros
Silva, a partir do dispositivo supra-mencionado, ficou clara a opção do
legislador em dar maior independência aos dirigentes em relação à Chefia da
Administração Federal (SILVA, 2003, p. 122).
Uma questão importante levantada por
Bandeira de Mello é a de se saber se a garantia dos mandatos por todo o prazo
previsto pode ou não se estender além de um mesmo período governamental (MELLO,
2001, p. 136).
O entendimento do mesmo
autor:
[...] a garantia dos mandatos dos dirigentes
destas entidades só se opera dentro do período governamental em que foram
nomeados. Encerrado tal período governamental, independentemente do tempo
restante para a conclusão deles, o novo Governo poderá sempre expelir livremente
os que os vinham exercendo (MELLO, 2001, p. 136/137).
No entanto, Maria D’Assunção Costa
Menezello entende de forma diversa de Bandeira de Mello ao afirmar
que:
Sobre este posicionamento, permito-nos
discordar do ilustre mestre porque, a nosso juízo, é a lei de criação da Agência
que determina a validade dos mandatos, e não à vontade do novo Chefe do
Executivo. Pelo princípio da continuidade das leis, permanece válido e eficaz o
preceito de que a cada nova eleição os novos governantes devem atender ao
direito legitimamente posto. A característica de autonomia também aqui se
configura no sentido de que, por ser um órgão técnico, o mandato da direção da
Agência segue intocável até o seu término, nos estritos limites da lei
(MENEZELLO, 2002, p. 89).
Na realidade, o que pode vir acontecer é o fato
da não-recondução pelo Chefe do Executivo dos antigos dirigentes aos seus
cargos, quando encerrado seu mandatos. Neste caso poderão ser indicados novos
nomes, mas, também, respeitando a aprovação pelo Senado Federal (MENEZELLO,
2002, p. 89).
Fernando Quadros Silva ensina
que:
As Agências Reguladoras foram criadas por lei,
para o desempenho das atividades regulatórias, não havendo disciplina
constitucional sobre o regime jurídico de sues dirigentes. Por outro lado,
embora seja inegável que atuam com independência funcional, não se pode dizer
que formulam diretrizes políticas ou atuem na formação da vontade superior do
Estado (SILVA, 2003, p. 126).
Desta forma, denota-se que os
dirigentes dos órgãos reguladores deverão permanecer nos seus cargos até o
término do mandato fixado pela Lei instituidora da Agência. Isso garante maior
autonomia no cumprimento de suas funções e, conseqüentemente, menos ingerência
política nas atividades praticadas por esses órgãos.
O art. 8º da Lei nº 9.986/2000
estabelece que o ex-dirigente da Agência deverá ficar num período de quarentena.
Segundo Maria Sylvia Di Pietro, esse é um período moralizador, pois proíbe o
ex-dirigente de exercer atividade ou prestar qualquer serviço no setor regulado
pela respectiva Agência, por um período de quatro meses, contados da exoneração
ou do término do seu mandato. Durante a quarentena o ex-dirigente continua
vinculado à Agência, recebendo remuneração compensatória equivalente ao cargo
que exerceu (DI PIETRO, 2003, p. 405).
Outra característica de extrema
importância que vem sendo atribuída às Agências Reguladoras é a função
reguladora, exatamente o que justifica o nome da Agência. (DI PIETRO, 2003, p.
407).
Há uma grande discussão acerca da
constitucionalidade da produção normativa das Agências Reguladoras, em virtude
da dúvida se tal atribuição invade esfera exclusiva do Poder Legislativo. Vale
lembrar que para a viabilização dos objetivos os quais as Agências Reguladoras
federais foram criadas, imprescindível é a consideração de sua capacidade de
emissão de normas técnicas, ressalvando seus limites de normas propriamente
ditas, as quais jamais poderão se opor.
Deste modo, cabe agora apenas a
manifestação de Leila Cuéllar:
[...] é preciso salientar que na própria noção
de Agência Reguladora está implícita a idéia de poder regulador, exercido por
meio de atribuição normativa. Logo, não teria sentido criar tais entes sem que
eles pudessem editar normas referentes às diversas áreas sob suas respectivas
competências (CUÉLLAR, 2001, p. 107).
Paulo e Alexandrino afirmam que os
doutrinadores mais recentes asseveram que o poder regulador não se confunde com
poder regulamentar tradicionalmente estudado pelo Direito Administrativo (PAULO,
2003, p. 51).
Assinala Maria D’Assunção Costa
Menezello que poder regulamentar é:
O poder exclusivo atribuído por dispositivo
constitucional ao Chefe do Poder Executivo para disciplinar leis, por meio de
atos normativos, denominados decretos. Regulamentação é atribuição prevista em
lei exclusiva do Poder Executivo para expedir atos que orientem a fiel execução
das leis (MENEZELLO, 2003, p. 97).
Poder regulador, conforme preleciona Menezella,
"é o poder e um dever atribuídos institucionalmente pelo Poder Legislativo a uma
autarquia denominada Agência Reguladora" (MENEZELLO, 2003, p. 101).
Ainda, sobre o
assunto:
[...] regular é a competência delegada, por
lei, às Agências, a fim de expeçam normas jurídicas compulsórias (atos
administrativos gerais ou individuais) para os usuários, para todos os agentes
econômicos e para todos os entes públicos ou privados alcançados pela atividade
normativa e fiscalizatória da Agência. Dizendo de outra forma, Poder Regulador é
o poder que cria a regulação em parceria com os agentes regulados nos limites da
legalidade (MENEZELLO, 2003, p. 106).
Neste sentido se manifestou
Wald:
O direito da regulação não se confunde com a
regulamentação, pois a Agência não regulamente a lei, mas estabelece normas para
o funcionamento dos serviços que estão sob sua jurisdição. Não há, assim, por
que pretender equiparar as normas de regulação ao chamados regulamentos
independentes (WALD, 2004, p. 224).
O Poder Legislativo por meio de lei
do Poder Executivo concede às Agências Reguladoras uma delegação para exercer
seu poder normativo de regulação. No entanto, cabe ao Congresso Nacional a
fixação das finalidades, dos objetivos básicos e da estrutura das Agências, bem
como a fiscalização de suas atividades. Assim, o Congresso Nacional permanecerá
com a centralização governamental, pois decidirá politicamente sobre a delegação
e seus limites às Agências Reguladoras, mas realizará a descentralização
administrativa, permitindo o exercício do poder normativo para alcançar as metas
traçadas na lei (MORAES, 2002, p. 20).
O poder normativo das Agências
Reguladoras não tem a finalidade de abranger a função legislativa propriamente
dita, com a possibilidade de inovar na ordem jurídica, afinal isto contraria o
princípio da separação de poderes e o art. 5º, II da Constituição Federal,
segundo o qual ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão
em virtude de lei (DI PIETRO, 2003, p. 407/408).
Desta forma, as normatizações
criadas pelos órgãos reguladores deverão ser operacionais apenas, e respeitar os
limites estabelecidos na lei instituidora do órgão (ARAÚJO, 2002, p.
56).
Sobre o assunto afirma
Menezello:
A limitação do Poder Regulador das Agências
advém dos limites previstos na Constituição Federal, por meio dos princípios e
dos preceitos fundamentais, e na lei de criação de cada uma das Agências. Assim,
podemos afirmar que regular é, pois, editar atos normativos infralegais com
legitimidade e eficácia nos limites outorgados pela lei (MENEZELLO, 2002, p.
103).
As Agências Reguladoras - detentoras
de maior grau de especialidade nas atividades que normatizam e fiscalizam -
desenvolverão suas funções de forma mais eficiente que uma Agência que atende a
vários segmentos.
Alexandre de Moraes destaca
que:
As Agências Reguladoras não poderão, no
exercício de seu poder normativo, inovar primariamente a ordem jurídica - ou
seja, regulamentar matéria para a qual inexista um prévio conceito genérico em
lei instituidora (standards) -; tampouco poderão criar ou aplicar sanções não
previstas em lei (MORAES, 2002, p. 22).
Paulo e Alexandrino afirmam que o
poder normativo das Agências Reguladoras deverá respeitar aos seguintes
preceitos:
1) é pacífico que as Agências Reguladoras não
podem editar atos primários, independentes de lei;
2) a atuação normativa de uma Agência
Reguladora depende de expressa delegação ou autorização
legal;
3) a lei deve estabelecer claramente os
assuntos de competência da Agência (devem sempre ser assuntos de natureza
técnica) e as diretrizes e os limites da atuação normativa da Agência Reguladora
(não se admite a denominada delegação ou autorização legislativa "em
branco");
4) toda a atuação normativa da Agência
Reguladora está sujeita a permanente controle legislativo (CF, art. 49, V e X)
(PAULO, 2003, p. 56/57).
Destarte, o poder normativo
conferido às Agências Reguladoras pelos diplomas legais que as instituíram é
inerente à atividade de regulação por elas desenvolvidas e, também,
imprescindível para que tais entes possam desempenhar de maneira eficiente suas
atribuições (CUÉLLAR, 2001, p. 141).
Obviamente, junto com a concessão
dos serviços públicos faz-se necessária a fiscalização e delimitação da atuação
destas empresas, de modo que a capacidade para expedir normas técnicas, guiando
e delimitando a atuação das empresas, representa mais uma importante
prerrogativa das Agências Reguladoras.
Tais órgãos reguladores podem ser
classificados segundo diversos critérios. Todavia, Alexandre dos Santos Aragão
considera o mais relevante é aquele que adota a atividade regulada como base.
Assim, teríamos as Agências Reguladoras de serviços públicos, como a ANATEL
(Agência Nacional de Telecomunicações); as Agências Reguladoras da exploração de
monopólios públicos, como a ANP; as Agências Reguladoras da exploração de bens
públicos, como ANA (Agência Nacional de Águas) e as Agências Reguladoras de
atividades econômicas privadas, como ANVISA (Agência Nacional de Vigilância
Sanitária) e ANS (Agência Nacional de Saúde) (ARAGÃO, 2002, p.
291).
Não importa a classificação quanto à
atividade regulada da qual a Agência pertença, todas as leis que as instituíram
pressupõem a competência para fiscalizar as empresas privadas prestadores de
serviços ou atividades por elas reguladas (ARAGÃO, 2002, p.
317).
Caberá à Agência Reguladora a
vigilância das empresas privadas que estão sob sua competência, no sentido de
preservar a qualidade dos serviços públicos prestados, e, também, preservar um
justo preço pela sua prestação.
Quanto à autonomia das Agências em
relação aos três Poderes do Estado, Maria Sylvia Di Pietro destaca que somente
em relação ao Poder Executivo é que existe uma certa autonomia, mas respeitando
os limites da Lei.
A independência em relação ao Poder
Judiciário praticamente não existe. A Agência pode dirimir conflitos na esfera
administrativa, até em última instância. Mas, tal fato não poderá ser impedido
de ser analisado e julgado pelo judiciário, tendo em vista a norma do art. 5º,
XXXV da Constituição (DI PIETRO, 2003, p. 405).
No que se refere ao Poder
Legislativo também não existe independência, visto que os seus atos normativos
não podem conflitar com as normas constitucionais ou legais, conforme estabelece
o princípio da legalidade. Além disso, estão sujeitas ao controle pelo Congresso
Nacional, previsto no art. 49, inciso X, da Constituição Federal, e ao controle
financeiro, contábil e orçamentário exercido pelo Legislativo, com o auxílio do
Tribunal de Contas, conforme previsto no art. 70 e seguintes da Constituição (DI
PIETRO, 2003, p. 406).
A maior independência que existe é
em relação ao Poder Executivo, mesmo assim deverão ser respeitados os limites
estabelecidos em lei. São duas características: como autarquia em regime
especial, os seus atos não poderão ser revistos ou alterados pelo Executivo e,
como já foi dito anteriormente, a estabilidade conferida aos dirigentes das
Agências é uma forma de autonomia em relação ao Executivo (DI PIETRO, 2003, p.
406).
Outro aspecto importante a ser
salientado diz respeito ao controle dos entes
regulatórios.
Como já mencionado anteriormente, a
lei instituidora de cada Agência Reguladora estabelece autonomia
político-administrativa para a realização de suas funções. No entanto, parte-se
do princípio que toda autarquia, por mais que possua regime especial, deverá ter
alguma forma de controle.
Alexandre de Moraes entende
que:
[...] apesar de sua independência, as Agências
Reguladoras devem sofrer controle dos Poderes constituídos, em face da
necessária manutenção do sistema de freios e contrapesos caracterizador da idéia
de separação de poderes da centralização governamental (MORAES, 2002, p. 29).
Como são entidades que compõem a
Administração Indireta, a modalidade de controle prevista na Constituição
Federal e demais normas aplicáveis servirão, também, para controlar os atos
praticados pelas Agências Reguladoras (PAULO, 2003, p.
60).
Floriano Marques Neto apresenta três
formas de controle da atividade regulatória:
1) controle de gestão: fiscalização da
aplicação dos recursos (TCU, Ministério Público, órgão de controladoria
governamental etc.);
2) controle da atividade-fim: o cumprimento da
função de implementar os objetivos e metas da política pública deve ser feito
pelo Executivo, Legislativo e instâncias da sociedade especificamente criadas
para isso (conselhos de usuários, conselhos consultivos, organizações sociais
etc.);
3) controle judicial: exercido sobre todos os
atos das Agências Reguladoras, mediante provocação (MARQUES NETO apud PAULO,
2003, p. 61).
Em relação ao controle exercido pelo
Poder Judiciário, o sistema vigente no Brasil é o da jurisdição una, ou seja, é
válido o principio da inafastabilidade do acesso ao Poder Judiciário, previsto
no art. 5º, XXXV da Constituição Federal. Portanto, é impossível impedir que as
decisões das Agências Reguladoras sejam submetidas à apreciação do Poder
Judiciário (BARROSO, 2002, p. 126). O controle jurisdicional será efetuado sobre
a constitucionalidade e legalidade dos atos emanados dos entes reguladores
(MEZELLO, 2002, p. 78).
Na lição de Arnoldo Wald e Luiza de
Moraes, as Agências Reguladoras, como verdadeiras autarquias, serão submetidas
ao poder de supervisão e tutela, exercido pelo Poder Executivo sobre tais
pessoas jurídicas de direito público, que estão vinculadas a algum ministério ou
secretaria, conforme sua criação em nível federal, estadual ou municipal (WALD,
1999, p. 164).
O Poder Executivo tem a iniciativa
de lei para criar, alterar e extinguir as Agências Reguladoras. Além dessas
funções, mantém a coordenação geral da Administração Pública, indicando no
projeto de lei quais as funções e finalidades da respectiva Agência. Poderá,
também, realizar a fiscalização por meio de contratos de gestão (MORAES, 2002,
p. 29).
A Constituição Federal, em dois
dispositivos, prevê o controle das autarquias pela Administração Direta. O art.
87, I, estatui que compete aos Ministros de Estado exercer a orientação,
coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da Administração Federal na área
de sua competência. E o art. 84, II atribui ao Presidente da República a
competência privativa para exercer, com auxílio dos Ministros de Estado, a
direção superior da administração federal.
O Poder Executivo, assim como nas
demais autarquias integrantes da Administração Indireta, irá exercer o controle
sobre as Agências Reguladoras. Paulo e Alexandrino afirmam
que:
O que se verifica é que as leis, tendo em vista
sobretudo a necessidade de transmitir segurança aos investidores privados,
dotaram as Agências Reguladoras de determinados instrumentos que ampliam (de
forma variável, dependendo da Agência) sua autonomia perante o poder político.
Essas leis, entretanto, devem ser interpretadas em consonância com nossas normas
e princípios constitucionais. Não existindo um instrumento expresso na lei,
destinado a limitar a atuação da Administração Centralizada (desde que esse
instrumento não seja inconstitucional), o controle exercido pelo Poder Executivo
será exercido da mesma forma que o é sobre as outras autarquias federais (PAULO,
2003, p. 70).
Em relação ao Poder Legislativo, a Constituição
Federal no art. 49, X, determina ser da competência exclusiva do Congresso
Nacional fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os
atos do Poder Executivo, incluindo os da Administração Indireta. Conforme Marçal
Justen Filho, a "fiscalização significa a possibilidade de exigir, a qualquer
tempo, explicação e justificativa da Agência Reguladora acerca das decisões
adotadas".(JUSTEN FILHO, 2002, p. 588).
Devido ao amplo poder normativo
concedido à Agência Reguladora, é fundamental que o Congresso Nacional esteja
permanentemente fiscalizando os atos normativos por elas editados, visto que é
seu dever zelar pela preservação de sua competência legislativa em virtude da
atribuição normativa dos outros Poderes, de acordo com o art. 49, XI da
Constituição Federal. Neste mesmo artigo, no inciso V, confere ao Congresso
Nacional a suspensão de atos praticados pela Agência Reguladora, quando houver
excesso no exercício do poder normativo, ou seja, quando ultrapassar os limites
da delegação legislativa (PAULO, 2003, p. 64).
Ademais, as Agências Reguladoras
possuem o controle administrativo interno realizado pela diretoria do órgão. Tal
controle pode ser exercido de ofício ou por provocação recursal de qualquer
agente regulado. Serão realizados os reexames das questões apresentadas e há a
possibilidade de reconsideração, restabelecendo, assim, a legalidade e
legitimidade.
Por não haver relação de subordinação
hierárquica entre a autarquia e o Ministério, a decisão proferida pela Agência é
coisa julgada administrativa, não cabendo mais nenhum recurso na esfera estatal
(MELLO, 2001, p. 126).
Dentro da análise do pedido das questões
apresentadas por qualquer agente regulado na esfera administrativa serão
obedecidas todas as etapas de um processo administrativo. Cabendo, assim,
recursos e revisão da decisão. Percebe-se que esse processo tem todas as
características do processo judicial, com exceção da característica de
definitividade, inexistente na coisa julgada administrativa, que poderá ser
revista pelo Poder Judiciário (MENEZELLO, 2002, p. 74).
Hely Lopes Meirelles, dissertando
sobre coisa julgada administrativa, esclarece:
[...] é apenas uma preclusão de efeitos
internos, não tem o alcance da coisa julgada judicial, porque o ato
jurisdicional da Administração não deixa de ser um simples ato administrativo
decisório, sem a força conclusiva do ato jurisdicional do Poder Judiciário
(MEIRELLES, 2003, p. 652).
Preceitua Maria D’Assunção Costa
Menezello que a Agência Reguladora pode proferir decisões
em:
[...] (i) procedimentos que busquem a expedição
de um ato autorizativo; (ii) procedimentos licitatórios em geral; (iii)
procedimentos de mediação de conflitos entre agentes econômicos e entre estes e
os usuários; (iv) processos sancionadores decorrentes da aplicação de sanções
administrativas; além dos (v) processos disciplinares relacionados aos
servidores (MENEZELLO, 2002, p. 75).
As decisões proferidas em processos
administrativos criam direitos e obrigações às Agências, aos usuários e aos
agentes econômicos na esfera administrativa. Após a decisão final administrativa
da Agência não cabe mais ao ente regulado interpor recurso em nenhuma outra
instância administrativa para solucionar a sua insatisfação perante a decisão
(MENEZELLO, 2002, p. 76).
No entanto, mesmo após a realização
do procedimento administrativo interno, não poderá ser afastado da análise do
Judiciário os atos praticados pelas Agências. Conforme emncionado anteriormente,
essa garantia está prevista no art. 5º, XXXV da Constituição Federal.
Cabe mencionar, de forma sintética,
o controle realizado pelo Tribunal de Contas e pelo Ministério Público.
Conforme determina o art. 70 da Constituição
Federal, o Tribunal de Contas realizará o controle na fiscalização contábil,
financeira e orçamentária das Agências para averiguar a legalidade, a
legitimidade e a economicidade dos atos realizados pelos órgãos reguladores no
exercício das atribuições e competências constitucionais e legais pertinentes
(MENEZELLO, 2002, p. 77). Não cabe ao Tribunal de Contas inquirir o conteúdo das
decisões regulatórias emitidas pela Agência. Assim, compete a ele o controle e
fiscalização de licitações e contratações produzidas e dos atos relacionados a
pessoal e sua remuneração (JUSTEN FILHO, 2002, p. 589).
Por força do art. 127 da Constituição Federal,
o Ministério Público tem competência para a defesa da ordem pública, do regime
democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, podendo
averiguar a legalidade e a legitimidade das decisões das Agências Reguladoras
(MENEZELLO, 2002, p. 78). Desempenhará suas atribuições por via judicial,
propondo ação popular ou ação civil pública. Também, poderá instaurar inquérito
civil público para a colheita de provas e informações atinentes ao desempenho
das funções das Agências Reguladoras (JUSTEN FILHO, 2002, p. 589).
Fugindo um pouco da esfera
tradicional, acima mencionada, sobre o controle externo das Agências
Reguladoras, as leis instituidoras dos órgãos estão prevendo a participação
popular, por meio de audiência pública e consulta pública, na realização do
controle, fiscalização e na própria atuação das Agências
Reguladoras.
Dentro das leis instituidoras são
estabelecidas as formas de ser convocada essa participação popular. Normalmente
tal ato ocorre quando uma decisão do órgão regulador possa afetar os direitos
dos usuários e consumidores do setor regulado (PAULO, 2003 p.
62).
Está tramitando no Congresso
Nacional o projeto nº 3.337/2004, que cria a Lei Geral das Agências Reguladoras.
A legislação traz como mudanças principais:
a) a outorga da exploração de serviços:
atualmente realizada pela Agência Reguladora passará para a competência dos
Ministérios, que regulam os setores, mas, também, poderão delegá-la para as
Agências;
b) contrato de gestão: atualmente, existe
previsão apenas para a ANEEL, mas todas as Agências serão obrigadas a firmar o
contrato com o ministério a que estiverem vinculadas;
c) ouvidor: nomeado pelo Presidente da
República para um mandato de dois anos, passará a ser nomeado para um período de
quatro anos e deixa de ter subordinação hierárquica à direção da
Agência;
d) mandatos dos diretores das Agências: variam
de três a cinco anos, em algumas Agências, é permitida a recondução; com a nova
lei os mandatos passarão a ter quatro anos, vedando-se a recondução. Também, são
sincronizados, isto é, deverão encerrar entre 1º de janeiro e 30 de junho do
segundo anos de mandato do Presidente da República;
e) consulta pública: prevista para a discussão
de atos normativos. Passará a ser obrigatória para a revisão de tarifas e
alterações de atos normativos de interesse dos agentes econômicos e dos
usuários;
f) indicação de especialistas: atualmente não
há previsão. Com a aprovação da Lei, entidades ambientais, de proteção ao
consumidor e outras pré-cadastrada na Agência, conquistam o direito de indicar
até três especialistas para lhes dar assessoria qualificada no acompanhamento
das matérias de objeto de consulta pública;
g) controle externo: a regra atual não trata do
assunto. O Congresso passará a exercer controle externo sobre a Agência com o
auxílio do Tribunal de Contas da União (JORNAL DO SENADO, 2004, p.
5).
Com a promulgação da Lei serão
estabelecidos os marcos regulatórios, isto é, as principais regras que envolvem
as Agências Reguladoras, como: fiscalização, controle externo, mandato dos
dirigentes.
O projeto de lei está gerando muita
discussão entre os membros do Congresso e pessoas ligadas aos setores regulados.
Muitos afirmam que a criação do contrato de gestão enfraquecerá as Agências,
pois se tornarão instrumentos do Governo e não do Estado. Como instrumentos do
Governo sofrerão maiores interferências políticas. Por outro lado, os
consumidores sairão fortalecidos devido à ampliação do processo de consultas
públicas (JORNAL DO SENADO, 2004, p. 5).
Em seguida serão apresentadas as
principais diferenças entre Agências Executivas e Agências
Reguladoras.
3.2.1 As Agências Reguladoras e as
Agências Executivas
Cabe aqui apresentar as diferenças
das Agências Reguladoras e das Agências Executivas.
As Agências Executivas foram inseridas no
Direito Brasileiro a partir do Decreto 2.487 de 2 de fevereiro de 1998, como
qualificativo atribuível a autarquias e fundações integrantes da Administração
Federal, por iniciativa do Ministério Supervisor, devendo haver anuência do, já
extinto, Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado, que hajam
celebrado contrato de gestão com o respectivo Ministério Supervisor e possuam um
plano estratégico de reestruturação e desenvolvimento institucional (FIGUEIREDO,
2003, p. 149).
Assim, Agência Executiva é uma nomenclatura
utilizada para qualificar autarquias e fundações preexistentes que preencheram
os requisitos legais e receberão tal designação. Foram criadas com a finalidade
de melhorar a eficiência e a redução de custos das autarquias e fundações (DI
PIETRO, 2003, p. 401).
Preceitua Marçal Justen Filho que a
"Agência executiva seria uma autarquia destituída de competências regulatórias,
que se dedicaria a desenvolver atividades administrativas clássicas" (JUSTEN
FILHO, 2002, p. 341).
No dizer de Roberta Fragoso de
Medeiros Menezes a Agência Executiva:
[...] não representa um tipo novo de entidade.
Trata-se de uma qualificação dada tanto às autarquias como às fundações públicas
que tenham um plano estratégico de reestruturação e desenvolvimento
institucional, visando à obtenção de maior autonomia, para torná-las mais ágeis
e eficazes (MENEZES, 2002, p. 49).
Fernando Quadros Silva aponta como
traços distintivos entre as Agências Reguladoras e as Agências Executivas a
natureza da atividade e o grau de independência conferido à Agência Reguladora.
Em suas palavras:
As Agências executivas estariam vocacionadas a
exercer atividade típicas do Poder Executivo e insuscetíveis de delegação aos
particulares, como, por exemplo, a atividade de arrecadação de tributos, a
fiscalização ligada ao meio ambiente e a atuação na área social (saúde e
previdência).
Outro traço distintivo é a independência
administrativa conferida por lei as Agências Reguladoras ou, ainda, o poder
normativo que somente é reconhecido às Agências Reguladoras (SILVA, 2003, p.
109).
Paula Catherine de Lira dispõe que a
diferença entre as duas Agências ocorre da seguinte
maneira:
As Agências executivas são aquelas ligadas à
implementação de políticas, atuando em diversos setores: tributário,
previdenciário, segurança pública, proteção ambiental etc. Já as Agências
Reguladoras não têm por função desempenhar uma atividade positiva, tal qual a
executiva, mas sim desempenhar uma atividade fiscalizatória e regulatória
(LIRA).
Desta forma, a diferença entre ambas
paira, principalmente, no que se refere à natureza da atividade e autonomia
conferida às Agências Reguladoras.
No item a seguir serão apresentadas
as principais Agências Reguladoras criadas no Brasil em nível federal: ANEEL,
ANATEL, ANP, ANVISA, ANS, ANTT, ANTAQ e ANCINE.
3.2.2 As principais Agências
Reguladoras no Brasil
Nesta parte passa-se a apresentar as
principais Agências Reguladoras federais existentes no Brasil. Serão
apresentadas as suas características fundamentais. Iniciar-se-á pela primeira
Agência criada, a ANEEL.
Agência Nacional de Energia Elétrica
- ANEEL, criada pela Lei nº 9.427 de 26 de fevereiro de 1996, foi a primeira
autarquia sob regime especial instituída pelo governo federal na fase de
privatizações dos serviços públicos nos anos 90. A finalidade da ANEEL é regular
e fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia
elétrica em conformidade com as políticas e diretrizes do governo federal
(AZEVEDO, 1998, p. 143).
A ANEEL está vinculada ao Ministério
das Minas e Energias. A sua missão é proporcionar condições favoráveis para que
o mercado de energia elétrica se desenvolva com equilíbrio entre os agentes e em
benefício da sociedade.
Agência Nacional de Telecomunicações
- ANATEL foi criada pela Lei nº 9.472 de 16 julho de 1997, e está vinculada ao
Ministério das Telecomunicações. Foi a segunda Agência Reguladora a ser criada
nesta fase de privatizações brasileira. Considerada, entre os conhecedores do
assunto, como a Agência brasileira que seguiu mais próximo do modelo proposto de
Agência Reguladora dos Estados Unidos e Europa (PAULO, 2003, p. 71).
Azevedo afirma que criação da ANATEL
foi:
[...] objeto de uma lei única, redigida com
maior exação e juridicidade, já que resultou da minuta preparada pelo eminente
administrativista Carlos Ary Sundfeld, em que os variados aspectos da matéria
são cuidados com a devida atenção (AZEVEDO, 1998, p. 144).
A missão desta Agência é promover o
desenvolvimento das telecomunicações do País de modo a dotá-lo de uma moderna e
eficiente infra-estrutura de telecomunicações, capaz de oferecer à sociedade
serviços adequados, diversificados e a preços justos, em todo o território
nacional.
Segundo a doutrina, por possuir
previsão constitucional, a lei instituidora da ANATEL possui maior legitimidade
naquilo que caracteriza os órgãos reguladores, principalmente no que se refere a
sua independência. Diversamente ocorre nas Agências que possuem previsão
unicamente em lei (PAULO, 2003, p. 72).
A Agência Nacional do Petróleo - ANP
é uma Agência Reguladora com base na Constituição Federal, art. 177, § 2º, III.
Foi criada pela Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997 com a finalidade de
promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas
integrantes da indústria do petróleo, estimulando a competição, com a entrada de
novos competidores e capitais; cabendo-lhe aumentar a arrecadação e
supervisionar o poder de mercado. Está vinculada ao Ministério de Minas e
Energia (SOUTO, 2001, p. 467).
A Agência Nacional de Vigilância
Sanitária, ANVISA, autarquia sobre regime espacial, vinculada ao Ministério da
Saúde, foi criada pela Lei nº 9.782 de 26 de janeiro de 1999, com a missão de
proteger e promover a saúde da população garantindo a segurança sanitária de
produtos e serviços e participando da construção de seu acesso. Possui as mesmas
características de estrutura e autonomia da ANATEL, ANEEL e ANP, delas diferindo
em virtude do fato de que nesse setor não se faz qualquer contrato de concessão
com as mesmas empresas fiscalizadas (SOUTO, 2001, p. 470).
Agência Nacional de Saúde
Suplementar - ANS, autarquia sobre o regime especial, foi criada pela Lei nº
9.961 de 28 de janeiro de 2000, está vinculada ao Ministério da Saúde. É um ente
de regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantam
a assistência suplementar à saúde. A finalidade institucional da Agência é
promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde,
regular as operadoras setoriais, inclusive quanto a suas relações com
prestadores e consumidores e contribuir para o desenvolvimento das ações de
saúde no País (PAULO, 2003, p. 85).
Agência Nacional de Águas - ANA,
autarquia especial, dotada de autonomia administrativa e financeira, vinculada
ao Ministério do Meio Ambiente, foi criada pela Lei nº 9.984, de 17 de julho de
2000 com a finalidade de implementar os recursos hídricos, cuja missão é regular
o uso da água dos rios e lagos de domínio da União e implementar o Sistema
Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
Agência Nacional de Transporte
Terrestre - ANTT, e Agência Nacional de Transporte Aquaviários - ANTAQ, são
autarquias especiais vinculadas ao Ministério dos Transportes, caracterizadas
pela independência administrativa, autonomia financeira e funcional e mandato
fixo de seus dirigentes. Foram instituídas pela Lei nº 10.233 de 5 de junho de
2001, com a finalidade de implementar a política de transportes, terrestres e
aquaviários, no país.
Agência Nacional do Cinema - ANCINE,
é uma Agência Reguladora cujo objetivo é fomentar a produção, a distribuição e a
exibição de obras cinematográficas e videofonográficas em seus diversos
segmentos de mercado, assim como promover a auto-sustentabilidade da indústria
nacional nos vários elos da cadeia produtiva. Criada em 6 de setembro de 2001,
através da Medida Provisória 2228, está vinculada ao Ministério da Cultura desde
o dia 13 de outubro de 2003.
O Jornal Nacional, no dia 9 de
agosto de 2004, pronunciou que no Congresso Nacional está em discussão sobre o
projeto que cria a Agência Nacional de Cinema e Audiovisual - ANCINAV, em
substituição da atual Agência Nacional do Cinema, ANCINE. A proposta do Governo
estabelece: o planejamento, a regulamentação, a administração e fiscalização do
setor que reúne produtores de cinema, distribuidores de filmes e empresas de
rádio e televisão. E, também, cria um novo tributo.
No período de 11 de agosto a 1º de
outubro do corrente esteve disponível no site do Ministério da Cultura a minuta
do projeto da ANCINAV, para a realização de uma consulta pública. Todas as
mensagens foram encaminhadas para o Conselho Superior de Cinema e,
posteriormente, serão publicadas no site.
No próximo tópico será analisada a
interferência das Agências Reguladoras na atuação das empresas concessionárias
de serviços públicos.
3.3 A INTERFERÊNCIA DAS AGÊNCIAS
REGULADORAS NAS EMPRESAS CONCESSIONÁRIAS DE SERVIÇOS
PÚBLICOS
Conforma já mencionado
anteriormente, o papel do Estado vem mudando nos últimos anos. Devido à
insatisfação da população e à falta de recursos do governo, o Poder Executivo
passou a descentralizar os serviços públicos por ele
prestado.
O principal objetivo do Poder
Público passou a ser a criação de metas e políticas regulatórias e
fiscalizatória dos diversos setores da economia, descentralizando a realização
dos serviços públicos, por meio de contratos de permissão, concessão e
autorização ao setor privado. Na concepção de Alexandre de
Moraes:
A moderna administração pública mantém a
centralização governamental nos Poderes Políticos - Executivo e Legislativo -,
que deverão fixar os preceitos básicos as metas e finalidades da Administração
Pública, porém, exige maior descentralização administrativa, para a consecução
desses objetivos, demonstrando a necessidade de ruptura da unidade do sistema
administrativo e o surgimento de diversos pólos administrativos, como as
Agências Reguladoras (MORAES, p.1).
As Agências Reguladoras atuam, em
geral, regulamentando, regulando, sancionando, fiscalizando, dirigindo,
mediando, coordenando e controlando as concessionárias de serviços públicos. Em
suma, estes entes são responsáveis pela manutenção e segurança da qualidade e de
preços justos dos serviços, primordialmente públicos, prestados por empresas
privadas.
Desta forma, em vários setores da
economia, como o de telecomunicações, de geração e distribuição de energia e de
transporte, entre outros, passou gradativamente de um Estado interventor a um
Estado regulador, fiscalizador e fomentador da atividade econômica, desenvolvida
pelas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, ou seja, pessoas
jurídicas de direito privado (SERPA, 2003, p. 125).
Assim, para assegurar aos usuários e
aos consumidores a qualidade e continuidade na prestação dos serviços públicos o
Estado teve que fortalecer a sua função reguladora e fiscalizadora por meio das
Agências Reguladoras.
Wald e Rangel de Moraes dispõem
que:
Os instrumentos regulatórios precisam ser
concebidos de forma abrangente, permeando por entre os campos de prevenção
antitrust, de defesa do consumidor, de proteção do meio ambiente, de definição
de políticas tarifárias, de fixação de planos de investimento para os
concessionários e de fiscalização efetiva da qualidade do serviço, entre outros
aspectos (WALD, 1999, p. 144).
Essas entidades jurídicas de Direito
Público possuem a sua competência para regulamentar, contratar, fiscalizar,
aplicar sanções e atender os reclamos dos usuários/consumidores de determinado
serviço público. A Agência atuará como autoridade administrativa independente,
fiscalizando os serviços e o cumprimento das condições ditadas no contrato de
concessão, desde a fixação de tarifas até as sanções de natureza
disciplinar.
Pode ser observada a atuação das
Agências Reguladoras através, por exemplo, da aplicação de multas às
concessionárias infratoras; da edição de instruções normativas e portarias; da
concessão, permissão, autorização e outorga de atuação de particulares em
serviços públicos; do julgamento de questões controvérsias; da regulação e
fiscalização da adequada qualidade de serviços e justas
tarifas.
A criação das Agências Reguladoras
federais tem obedecido ao sistema de especialização do ente regulador para cada
atividade concedida ao setor privado.
Cabe lembrar que há segmentos de
serviços públicos que são prestados de forma monopolística (exemplo: área de
eletricidade), demandando, muitas vezes, da atuação regulatória, uma simulação
das condições da concorrência perfeita ao mesmo tempo em que deve adotar
mecanismos para estimular a competição, a concorrência, a eficiência na
prestação de serviço e a alocação adequada dos investimentos (WALD, 2004, p.
248).
Assim, a especialização das Agências
Reguladoras traz maior aperfeiçoamento das suas
atividades.
Mas, neste ângulo de especialização
e intervenção das Agências, deverá ser observado o excessivo intervencionismo
estatal, evitando que acabe por impedir a formação de um mercado competitivo, e
instigação na eficiência das empresas prestadoras de serviços públicos (WALD,
2004, p. 249).
Para cumprir com seus objetivos de
fiscalização e regulação é fundamental que a autarquia seja dotada de uma
estrutura apta a conjugar o exercício das funções atribuídas pelo Poder
Concedente, com a necessária harmonia nas relações entre este, as
concessionárias e os usuários, através de canais decisórios abertos, abrangendo
as audiências públicas e outras formas de diálogo com a sociedade (WALD, 2004,
p. 249).
Manifestou-se Menezello sobre o
assunto:
[...] o universo do dever-ser do direito
regulatório está moldado para propiciar ampla participação da sociedade nos
destinos das atividades e dos serviços públicos regulados; no entanto, como se
pode perceber, atingir esse objetivo cultural demanda, desde logo, uma nova,
mais extensa e profunda compreensão e vivência da própria interação entre
sociedade e Estado para, partindo daí, lograr-se um conseqüente avanço
instrumental pelo aperfeiçoamento dos canais de diálogo e interação. Esses
canais devem ser desenvolvidos com a devida antecedência do processo normativo
regular e com a maturidade que o trato desses assuntos requer. [...] devem-se
buscar na atividade regulatória os resultados pretendidos, minimizando os altos
custos da ineficiência.
[...] essa relação há que ser tripartite,
agasalhando os interesses governamentais, os econômicos e os sociais (MENEZELLO,
2002, p. 157/158).
No entanto, cabe destacar que as
Agências Reguladoras devem atuar respeitando as normas legais definidoras de
suas funções. Não poderão, ainda, inovar na ordem jurídica, devendo sempre
respeitar o princípio da legalidade e da separação dos
poderes.
Desta forma, a possibilidade de
aplicar sanções, pelas Agências Reguladoras, àqueles que descumprem as normas
vinculadas aos serviços concedidos, garantem aos consumidores o reconhecimento e
a penalização dos abusos cometidos pelas empresas privadas. Tal prerrogativa
traz à população a segurança de que os serviços delegados aos particulares são,
efetivamente, fiscalizados.
As autarquias especiais, como os
demais agentes administrativos, devem atender a todos os princípios informadores
dos atos administrativos em geral, devendo, assim, impor ônus e penalidades que
estejam previstos no contrato de concessão/permissão e na lei (WALD, 2004, p.
252).
Sobre a Lei de Concessões, nº
8.987/95, Wald dispõe:
Não constam expressamente na Lei de Concessões
os princípios, diretrizes e regras gerais aos quais deve obedecer ao ordenamento
das Agências Reguladoras, o que dificulta o propósito de uma uniformidade quanto
aos pontos essenciais, quais sejam, os concernentes às suas funções, objetivos e
principais atribuições, à sua estrutura organizacional e de custeio, à
formatação jurídica do órgão e do seu grau de independência em relação ao Poder
Público (WALD, 2004, p. 251).
Os principais objetivos atribuídos às Agências
Reguladoras estão relacionados à promoção da eficiência, à defesa do mercado e
das liberdades econômicas das pessoas ligadas à prestação de serviços públicos,
principalmente aquilo que se refere à fixação das tarifas para garantir o
equilíbrio econômico-financeiro (WALD, 2004, p. 251).
Segundo Barroso, as funções que
normalmente são incluídas nas leis instituidoras das Agências Reguladoras
são:
a) o controle de tarifas, de modo a
assegurar o equilíbrio econômico e financeiro do contrato;
b) universalização do serviço,
estendendo-o a parcela da população que dela não se beneficiavam por força de
escassez de recursos;
c) fomento da competitividade, nas
áreas nas quais não haja monopólio natural;
d) fiscalização do cumprimento do
contrato de concessão;
e) arbitramento dos conflitos entre
as diversas partes envolvidas: consumidores do serviço, poder concedente,
concessionários, a comunidade como um todo, os investidores potenciais etc
(BARROSO, 2002, p. 120).
A Lei de Concessões nº 8.987/95, nos
arts. 29 e 30, estabelece como encargos do Poder
Concedente:
a) o controle e a fiscalização da
execução dos serviços e das obrigações das
concessionárias;
b) a homologação de reajustes e
revisões;
c) o zelo que a administração deve
ter para assegurar a prestação de serviço adequado e o atendimento aos direitos
dos usuários;
d) as providências do Poder Público,
necessários a execução do serviço público ou da obra necessária para a sua
realização (desapropriações e constituição de servidões);
e) a implementação de estímulos à
qualidade, produtividade, preservação do meio ambiente, competitividade e à
formação de associações de usuários (WALD, 2004, p. 253).
A partir da criação das Agências
Reguladoras, as funções de regulação e fiscalização, anteriormente realizadas
diretamente pela Administração Pública, passaram a ser exercida pelas novas
autarquias especiais para atender aos anseios da sociedade de forma mais célere
e eficaz.
Com a finalidade de facilitar as
ações das Agências Reguladoras, estas vêm realizando convênios com entidades
públicas para cooperação e posterior satisfação dos interesses públicos. São
acordos de colaboração ou parcerias que podem ocorrer entre entidades que
integram a administração da mesma pessoa de direito público ou estão em esferas
hierárquicas distintas. Normalmente, ocorre o convênio para a realização de
atividades complementares a regulação, controle e fiscalização, entre a Agência
federal com o Estado no qual serão prestados os serviços concedidos (WALD, 2004,
p. 261/262).
As Agências Reguladoras, quando for
de extrema necessidade, poderão intervir na concessão, conforme estabelece a Lei
nº 8.987/95, com o fim de assegurar o fiel cumprimento das normas contratuais,
regulamentares e legais pertinentes.
Entretanto, tal controle exercido
pelas Agências Reguladoras sobre as empresas concessionárias de serviços
públicos deve ser de forma moderada, não podendo o Poder Público interferir na
livre decisão da empresa privada. Por outro lado, não pode deixar ao bel prazer
das empresas estabelecerem: a forma, a qualidade, o valor das tarifas; devendo
assim, fiscalizar suas atividades para alcançar, da melhor maneira, os objetivos
traçados.
Sobre o limite do controle desses
entes autárquicos, que compõe a Administração indireta, salienta Di
Pietro:
O controle sobre entidades da Administração
Indireta, também chamado de tutela, é um controle externo que só pode ser
exercido nos limites estabelecidos em lei, sob pena de ofender a autonomia que
lhes é assegurada pela lei que as instituiu. Esse controle diz respeito aos
órgãos encarregados do controle, aos atos de controle possíveis e aos aspectos
sujeitos ao controle (DI PIETRO, 2003, p. 601).
A atuação do Estado por meio das
Agências Reguladoras é a forma garantidora que os serviços conferidos às
empresas privadas em setores de relevado interesse público sejam prestados de
forma eficiente e atendam a finalidade pública, mas, sempre, respeitando os
limites da livre iniciativa garantida constitucionalmente às atividades
empresariais e as políticas públicas fixadas pelo Poder
Executivo.
No exercício da regulação, Menezello
destaca:
[...] cabe ao Direito Regulatório encontrar as
alternativas legais e possíveis, justas e rezoáveis na aplicação de normas
constitucionais e legais, com atendimento do interesse dos entes regulados e com
destaque para ampliar a competição entre os agentes econômicos. É bom que se
diga esse ramo do direito está irremediavelmente atrelado ao princípio da
competição como regra fundamental do mercado, com aperfeiçoamento constantes da
relação de consumo (MENEZELLO, 2002, p. 123).
A Agência Reguladora, por ser um órgão
diferenciado no ordenamento jurídico brasileiro, com poderes de fiscalização e
regulação mais abrangente que as demais autarquias, é fundamental que realizem
ajustes e correções no modelo vigente, a fim de que sejam vistas como organismos
capazes de atender aos anseios da coletividade e não meros
controladores/fiscalizadores das concessionárias de serviços públicos (SERPA,
2003, p. 132).
Pode-se constatar que o direito
regulatório envolve diversas áreas jurídicas, como: direito constitucional,
direito administrativo, direito do consumidor, direito da concorrência. Devendo
cada um desses setores atuar no limite da lei, para que um não desrespeito ou
contrarie o que o outro estabelece. Deve ser salientado que a
multidisciplinariedade tem como objetivo o atendimento do interesse
público.
Entende-se que por ser uma autarquia
em regime especial, órgão com garantias diferentes da demais autarquias
clássicas, é fundamental que o Poder Público estabeleça, com a maior
transparência, todas as funções a serem desenvolvidas pelas Agências
Reguladoras, principalmente aquilo que se refere à capacidade técnica de seus
administradores e seus mandatos, evitando a ingerência política; regras claras e
precisas de uma política regulatória e determinação do poder normativos que
obedeça aos princípios e normas estabelecidos no ordenamento jurídicos
brasileiro.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Nas últimas décadas, o Estado tem
passado por grandes transformações. Por ter demonstrado a sua incapacidade para
atender aos interesses da coletividade frente aos setores estratégicos da
economia, o Estado vem repassando ao setor privado a exploração dos serviços e
atividades públicas. Isto se deve ao alto investimento para a manutenção e
desenvolvimento tecnológico dos setores que estavam sobre sua
tutela.
A partir dos anos 90, iniciou um
período de privatizações e desestatização de alguns setores da economia,
objetivando a concessão de serviços públicos para as empresas privadas. Tal
política visou implementar o desenvolvimento da economia nacional, pois a
atuação do setor privado, diferentemente da atuação estatal, é voltada ao
capitalismo e a lucratividade, realizando, assim, grandes investimento que o
Estado não tinha mais condições de empregar.
O Estado passou a ser um agente
normativo e regulador da ordem econômica, disciplinando os serviços públicos
prestados pelas empresas privadas. Desta forma, deixou de atuar diretamente nos
setores estratégicos da economia, passando de um Estado Nacional para um Estado
Regulador, tal qual a tendência mundial.
Com a finalidade de regular a
atuação das empresas privadas, concessionárias de serviços públicos, foram
criadas autarquias, dotadas de prerrogativas especiais, que visam,
principalmente, a independência frente às pressões político-partidárias,
financeiras, técnicas e funcional.
Essas novas entidades passaram a ser
designadas Agências Reguladoras. São pessoas jurídicas de direito público,
vinculadas aos Ministérios do Estado, enquadradas como entes da Administração
Pública Indireta. Como autarquias especiais, são dotadas de privilégios
peculiares, as quais visam, principalmente, assegurar a sua atuação de forma
imparcial e independente.
A Agência Reguladora brasileira teve
sua origem no direito americano e inglês. Contudo, essas Agências possuem
características próprias, pois tiveram que se adaptar ao ordenamento jurídico
pátrio.
Até o momento inexiste uma lei ou
norma jurídica própria que estabeleça a forma que as Agências Reguladoras devem
ser instituídas, cabendo, assim, à Lei criadora de cada Agência a definição e
delimitação de suas atividades.
Tramita no Congresso o Projeto nº
3.337/2004, que criará a Lei Geral das Agências Reguladoras. Com a nova Lei
serão estabelecidas as principais regras que envolvem as Agências Reguladoras,
como: fiscalização, controle externo e mandato dos
dirigentes.
Os doutrinadores vêm criticando a
falta dessa Lei Geral. Enquanto isso as Agências vão sendo criadas de forma
desconexas. No entanto, o Projeto está gerando muitas discussões e controvérsias
nas casas legislativas e nos setores regulados, com alegações de que a nova Lei
enfraquecerá as Agências, uma vez que se tornarão instrumentos do Governo e não
do Estado. Como instrumentos do Governo sofrerão maiores interferências
políticas.
É fundamental que o Governo
promulgue uma lei para estabelecer normas claras e precisas para a atuação
desses entes regulados não transformá-los em instrumentos de realizações
particulares.
Esses órgãos são caracterizados pela
sua independência administrativa, financeiras, ausência de subordinação
hierárquica, mandato fixo, estabilidade dos dirigentes e não podem ser demitidos
ad nutum.
A característica fundamental para a
atuação das Agências Reguladoras é o poder normativo. Assim, são dados a esses
órgãos os poderes de ditar normas técnicas, que não inovarão na ordem jurídica,
devendo sempre atuar nos limites estabelecidos na lei.
As Agências Reguladoras deverão
atuar, em geral, regulando, regulamentando, sancionando, fiscalizando, mediando,
coordenando e controlando as concessionárias de serviços públicos. São
responsáveis pela qualidade dos serviços prestados e a manutenção do equilíbrio
econômico-financeiro nas parcerias público-privado.
Todavia, a atuação dos órgãos
reguladores sobre as empresas concessionárias de serviços públicos deve ser
realizada de forma moderada para evitar que o Poder Público não interferi na
livre decisão da empresa privada. Por outro lado, não pode deixar ao bel prazer
das empresas estabelecer a forma, a qualidade, o valor das tarifas; devendo
assim, fiscalizar suas atividades para alcançar, da melhor maneira, os objetivos
traçados.
Para que não ocorra a interferência
no desenvolvimento e prestação dos serviços públicos é fundamental que o Poder
Público estabeleça, de forma precisa e transparente, todas as funções a serem
desenvolvidas pelas Agências Reguladoras, principalmente naquilo que se refere à
capacidade técnica de seus administradores e seus mandatos, evitando, assim, a
ingerência política; estabelecendo regras claras e precisas de uma política
regulatória e determinação do poder normativos que obedeça aos princípios e
normas determinadas no ordenamento jurídicos brasileiro.
Hoje, as Agências Reguladoras
representam um marco da evolução do nosso ordenamento voltado ao desenvolvimento
econômico. Destarte é mister ressaltar a necessidade de se manter a cautela para
o seu devido tratamento legal, pois o papel de Estado regulador depende de
entidades constitucionalmente viáveis.
Num futuro muito próximo pretende-se
dar seguimento ao estudo aqui iniciado, aprofundando-se na pesquisa sobre a
atuação das Agências Reguladoras nas empresas concessionárias de serviços
públicos e desenvolvendo, com maior rigor, tópicos pouco explorados neste
trabalho.
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*bacharel em
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Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7183
Acesso em 22/08/05.