® BuscaLegis.ccj.ufsc.br

 

 

 

Administração Pública - As carreiras de regime geral

 

 

 

 

 

 

 

por Nuno Barros - Assessor da carreira de Jurista do Centro de Estudos e Formação Desportiva

 

 

 

 


No presente artigo abordar-se-á, de modo sintético, o tema das carreiras de regime geral do pessoal da Administração Pública, fazendo-se referência às respectivas categorias.
Assim, na parte I, analisaremos os antecedentes legislativos das carreiras e respectivas categorias e, na parte II, o regime legal em vigor.

I
1 - O Decreto-Lei nº 49 410, de 24 de Novembro de 1969, estabelecia, nos nos 1 e 2 do artigo 23º, que os quadros discriminariam as categorias de pessoal permanente e o número de lugares, agrupando o pessoal de harmonia com a natureza das respectivas funções, devendo aquele agrupamento ser feito, em regra, com a seguinte classificação: pessoal dirigente, pessoal técnico, pessoal administrativo e pessoal auxiliar.

2 - João Alfaia (1) entende que os lugares dos quadros começam por agrupar-se em categorias, ou seja, o conjunto de lugares de uma profissão com a mesma graduação. Da categoria resulta assim a hierarquia da função. Em regra, pelo que respeita às categorias que fazem parte de carreiras - a graduação é feita através de classes. Desse modo, a categoria estabelecia, não só a posição relativa de um funcionário ou agente na orgânica do pessoal como lhe atribuía um certo vencimento fixo, a que correspondia uma letra na escala de vencimentos.

3 - O eminente Jurista, no que respeita às carreiras, defende que, em princípio, as categorias correspondentes a uma mesma espécie profissional formam uma carreira que assim se definirá como um conjunto hierarquizado de categorias respeitantes a uma dada profissão. Considera, no entanto, que a aquilo a que a lei designa como carreira deveria chamar-se grupo (profissional), pois, em bom rigor, carreira é a faculdade de ascensão progressiva a lugares das categorias mais elevadas adentro daquilo a que chama um grupo (e não o conjunto de lugares e de categorias, que formam este).

4 - O Decreto-Lei nº 191-C/79, de 25 de Junho, no seu artigo 19º, veio alterar a classificação dos grupos de pessoal acima referida, passando, então, a designarem-se do seguinte modo: pessoal dirigente, pessoal técnico superior, pessoal técnico, pessoal técnico-profissional e ou administrativo e pessoal operário e ou pessoal auxiliar.

5 - Posteriormente, o Decreto-Lei nº 41/84, de 3 de Fevereiro, que revogou o citado artigo 19º daquele diploma, mantendo a aludida classificação, definiu um princípio importante quanto ao número de lugares por cada categoria: aquele número não pode exceder o da categoria imediatamente inferior. João Alfaia concluía que, aquela medida, era de aplaudir, dado que criava maiores expectativas de promoção, tornando-a menos aleatória.

6 - O Decreto-Lei nº 248/85, veio revogar o diploma citado no anterior nº 4 e, tendo em conta as características da relação de emprego público, estabeleceu o regime geral de estruturação das carreiras da função pública numa perspectiva de avaliação global da funções exercidas (artigo 1º).

6.1 - Carreira e emprego (artigo 3º).
O desempenho de funções públicas correspondentes a necessidades permanentes e próprias dos serviços deve, em princípio, ser assegurado por pessoal em regime de carreira (nº 2).
Em relação às carreiras de regime geral, estruturam-se na base do princípio de adequação às funções e desenvolvem-se de acordo com as regras gerais de ingresso e de acesso definidas mais à frente.

6.2 - Carreira e categoria (artigo 4º).
As definições de carreira e de categoria são estabelecidas, julgamos que pela primeira vez, num diploma legal.
O legislador definiu carreira como o conjunto hierarquizado de categorias às quais correspondem funções da mesma natureza que os funcionários terão acesso de acordo com a antiguidade e o mérito evidenciado no desempenho profissional (nº 1).
No que respeita à categoria, é definida como a posição que os funcionários ocupam no âmbito de uma carreira, fixada de acordo com o conteúdo e qualificação da função ou funções, referida à escala salarial da função pública (nº 2).

6.3 - Estrutura das carreiras (artigo 5º).
6.3.1 - Quanto a esta matéria, o Decreto-Lei nº 191-C/79, de 25 de Junho, segundo João Alfaia, consagrou, embora pouco explicitamente, a existência de duas espécies de carreiras: as carreiras verticais e as carreiras horizontais. O ilustre Jurista entende, porém, que tal classificação partia da premissa mítica de que há carreiras em que a ascensão de categoria correspondia a um cargo distinto do da categoria anterior; e carreiras em que a ascensão da categoria não era acompanhada da mudança de funções.
Assim, preferia considerar antes as modalidades, estas sim, no seu entender, indiscutíveis:
a) Carreiras com dotações por categoria - constitui o sistema-regra o de limitar a quantidade de lugares, desde logo, ao nível das diversas categorias, em que a lei apenas estabelece a regra de que o número de lugares a fixar para cada categoria não deve exceder o da categoria imediatamente inferior (nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 41/84, de 3 de Fevereiro);
b) Carreiras com dotações globais - sistema mais flexível e mais estimulante, por não haver limite de vagas por categorias, em que a fixação das dotações se efectuava apenas ao nível de cada carreira e, portanto, através de dotações globais para cada uma delas (nº 4 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 41/84, de 3 de Fevereiro). Nesta modalidade, por não haver, pois, limite de vagas por categoria, estava assim a promoção assegurada, dado depender apenas de tempo de serviço mínimo e de bom serviço prestado.
6.3.2 - O artigo 5º do diploma que tem vindo a ser examinado, classifica as carreiras do seguinte modo (2):
a) Carreiras verticais, quando integram categorias com o mesmo conteúdo funcional, diferenciadas em exigências, complexidade e responsabilidade;
b) Carreiras horizontais, quando integram categorias com o mesmo conteúdo funcional cuja mudança de categoria corresponde apenas à maior eficiência na execução das respectivas tarefas;
c) Carreiras mistas, quando combinem características das carreiras verticais e das horizontais.

6.4 - Classificação das funções, grupos de pessoal e respectiva caracterização genérica do conteúdo funcional, graus, níveis e exigências habilitacionais (artigos 6º e 7º).
Estes temas constam dos mapas I e II anexos ao diploma em apreço e caracterizam-se, no essencial, do modo que se passa a explicar.
6.4.1 - As funções exercidas no âmbito da função pública, já citadas no anteriores nos 6 e 6.1, classificam-se em:
a) Funções de concepção - são funções de natureza científico-técnica, de investigação e estudo, concepção e adaptação de métodos científicos e técnicos, de âmbito geral ou especializado;
b) Funções de aplicação - são funções de estudo e aplicação de métodos e processos de natureza técnica, de âmbito especializado;
c) Funções de execução - são funções de natureza executiva, de aplicação técnica ou administrativa, com base no estabelecimento ou adaptação de métodos e processos enquadrados em directivas bem definidas.
6.4.2 - Grupos.
As carreiras podem integrar-se em grupos de pessoal, definidos com base na caracterização genérica do respectivo conteúdo funcional e nas exigências habilitacionais e profissionais.
6.4.3 - Níveis.
As funções podem escalonar-se em níveis, de acordo com a complexidade e as exigências de formação.
6.4.4 - Graus.
As carreiras verticais podem compreender graus que se diferenciam por um aumento expresso de autonomia, da complexidade funcional e da responsabilidade.

6.5 - As carreiras de regime geral e as carreiras de regime especial (artigo 8º).
Neste preceito estabelece-se a diferenciação daquelas carreiras, considerando-se que a estruturação de carreiras se fará de acordo com os princípios e o desenvolvimento geral de carreiras previsto neste diploma e seus mapas anexos já referidos, só podendo essa estruturação seguir uma ordenação própria quando, precedendo as adequadas acções de análise, descrição e qualificação de conteúdos funcionais, se venha a concluir pela necessidade de um regime especial. Assim, define-se no presente diploma quais as carreiras de regime geral e, nos casos já estabelecidos e nos que vierem a ser considerados, as carreiras de regime especial constarão de diplomas próprios.
Determina ainda o actual preceito legal que os diplomas de pessoal de cada serviço devem concretizar, relativamente a cada grupo de pessoal e ou carreira, as áreas funcionais respectivas, tendo em atenção a caracterização genérica dos conteúdos funcionais constante do anteriormente citado mapa I anexo ao diploma. No entendimento do presente diploma, área funcional será o conjunto de funções que, por terem um ou mais elementos comuns, permitem a tipificação de uma actividade.

6.6 - A intercomunicabilidade de carreiras (artigo 16º).
O Decreto-Lei nº 248/95, de 15 de Julho, previa dois tipos de intercomunicabilidade de carreiras: a horizontal e a vertical. No entanto, só se referirá, agora, a horizontal, dado que o preceito legal que se dedicava à segunda (artigo 17º) foi revogado pelo Decreto-Lei nº 404-A/98, de 18 de Dezembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 44/99, de 11 de Junho, o qual será tratado adiante.
As regras para a intercomunicabilidade horizontal são as seguintes:
a) Quaisquer funcionários possuidores de habilitações literárias exigidas podem ser opositores a concurso para lugares de acesso de carreiras integradas no mesmo grupo de pessoal, desde que:
a1) À categoria a que se candidatem corresponda, na estrutura dessa carreira, letra de vencimento igual ou imediatamente superior à que detêm (3);
a2) Se observem os requisitos gerais e especiais para acesso;
a3) Exista identidade ou afinidade entre os conteúdos funcionais previstos para uma e outra carreira, considerando-se a primeira, quando a natureza e complexidade das tarefas e responsabilidades inerentes aos lugares forem idênticas, e a segunda, quando aqueles pressupostos forem semelhantes;
b) A identidade e afinidade de conteúdo funcional afere-se de acordo com os critérios estabelecidos na lei geral, nomeadamente através de reconhecimento expresso na lei ou na base da identidade da designação ou de declaração do serviço ou do organismo de origem, as quais valem como presunção;
c) No que concerne aos concursos de pessoal, a verificação da inexistência de identidade ou afinidade de conteúdo funcional pelo júri constitui fundamento de exclusão dos candidatos.

6.7 - Grupos de pessoal (artigo 14º).
Em relação ao que atrás foi exposto (anteriores nos 4 e 5), o actual diploma estabelece os mesmos grupos de pessoal, mas de modo autónomo, isto é, deixa de existir a designação "e ou" nos grupos referentes ao pessoal técnico-profissional, administrativo, operário e auxiliar, passando a serem considerados cada um de per si.

6.8 - As regras respeitantes ao ingresso e acesso nas carreiras previstas no artigo 15º do diploma em causa foram alteradas pelos artigos 26º a 30º do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, tendo sido, posteriormente, revogado aquele preceito legal pelo Decreto-Lei nº 404-A/98, de 18 de Dezembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 44/99, de 11 de Junho, diplomas que, a seguir, serão devidamente referenciados.

6.9 - Finalmente, quanto ao regime geral de carreiras estabelecido no Decreto-Lei nº 248/95, de 15 de Julho, refira-se que foi alterado pelo Decreto-Lei nº 265/88, de 28 de Julho, na parte que respeita às carreiras técnica superior e técnica, e, finalmente, revogado na totalidade pelo já citado Decreto-Lei nº 404-A/98, de 18 de Dezembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 44/99, de 11 de Junho, sendo, o actual regime, objecto de tratamento na parte II deste artigo.

7 - Como já foi supramencionado, o Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, veio estabelecer, no seu Capítulo II, princípios gerais sobre gestão da Administração Pública, definindo novas regras para o ingresso, o acesso e a progressão nas carreiras.

7.1 - Ingresso nas carreiras (artigo 26º).
O ingresso nas carreiras da função pública faz-se obrigatoriamente por concurso (4) e, em regra, no primeiro escalão da categoria de base na sequência daquele procedimento ou de aproveitamento de estágio probatório (5).

7.2 - Acesso nas carreiras (artigos 27º e 28º).
É igualmente obrigatório o concurso para o acesso nas carreiras da função pública, fazendo-se esse acesso por promoção, sendo esta a mudança para a categoria seguinte da respectiva carreira - carreiras verticais - e opera-se para escalão a que corresponda remuneração base imediatamente superior.
A promoção (6) depende da verificação cumulativa das seguintes condições mínimas:
a) Mérito adequado;
b) Tempo mínimo de serviço na categoria imediatamente inferior, de acordo com as regras estabelecidas no Decreto-Lei nº 404-A/98, de 18 de Dezembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 44/99, de 11 de Junho;
c) Existência de vaga.
O acesso nas carreiras horizontais faz-se por progressão, não carecendo de concurso.
Excepcionalmente, em casos devidamente fundamentados, podem ser recrutados, mediante concurso externo, para lugares de acesso indivíduos que possuam licenciatura adequada e qualificação e experiência profissional de duração não inferior à normalmente exigível para acesso à categoria, bem como indivíduos habilitados com mestrado ou doutoramento (7).

7.3 - Progressão nas carreiras (artigo 29º).
A progressão aplica-se tanto nas carreiras verticais como nas horizontais e faz-se pela mudança de escalão na mesma categoria, constando do Decreto-Lei nº 404-A/98, de 18 de Dezembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 44/99, de 11 de Junho, o número de escalões e índices em cada categoria ou carreira horizontal, bem como os módulos de tempo e o mérito necessários.

7.4 - Mérito excepcional (artigo 30º).
Aquele preceito legal estabelece a hipótese de promoção ou progressão na carreira por mérito excepcional nos seguintes termos:
a) Os membros do Governo podem atribuir menções de mérito excepcional em situações de relevante desempenho de funções, quer a título individual, quer conjuntamente, aos membros de uma equipa;
b) Cabe aos dirigentes máximos de cada ministério, constituídos, para o efeito, em júri ad hoc, apresentar a proposta ao membro do Governo respectivo sobre a atribuição de mérito excepcional;
c) A referida proposta é da iniciativa do dirigente máximo do serviço, que deve, no âmbito da avaliação, atender ao trabalho desenvolvido pelos efectivos de todos os grupos de pessoal do respectivo serviço;
d) A atribuição da menção de mérito excepcional deve especificar os seus efeitos, permitindo, alternativamente:
d1) Redução do tempo de serviço para efeitos de promoção ou progressão;
d2) Promoção na respectiva carreira independentemente de concurso;
e) As atribuições de mérito excepcional são publicadas na 2ª Série do Diário da República por extracto, que conterá, de forma sucinta, os motivos da atribuição.

8 - O diploma anteriormente analisado previa, no seu artigo 43º, o desenvolvimento e a regulamentação dos princípios gerais nele contidos, pelo que, sobretudo em termos de implementação de um novo estatuto remuneratório, com a publicação do Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro, tal desiderato veio a ser cumprido (8).
No Capítulo III, referente a carreiras, o diploma vem estabelecer regras para a promoção, a mobilidade e a progressão.

8.1 - Promoção (artigos 16º e 17º).
A promoção a categoria superior depende da existência de vaga de concurso e da prestação de serviço na categoria imediatamente inferior durante o tempo e com a classificação de serviço previstos no Decreto-Lei nº 404-A/98, de 18 de Dezembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 44/99, de 11 de Junho.
A promoção a categoria superior da respectiva carreira faz-se da seguinte forma:
a) Para o escalão 1 da categoria para a qual se faz a promoção;
b) Para o escalão a que na estrutura remuneratória da categoria para a qual se faz a promoção corresponde o índice superior mais aproximado, se o funcionário vier já auferindo remuneração igual ou superior ao escalão 1.
A integração na nova categoria far-se-á no escalão seguinte da estrutura da categoria, sempre que do disposto no parágrafo anterior resultar um impulso salarial inferior a 10 pontos.
Em caso de progressão, se a remuneração for superior à que resulta da aplicação do exposto nos parágrafos anteriores, a promoção faz-se para o escalão seguinte àquele que lhe corresponderia por força daquelas regras, excepto se o funcionário tiver mudado de escalão há menos de um ano.

8.2 - Mobilidade (artigo 18º).
Esta figura está relacionada com as situações de intercomunicabilidade de carreiras e as respectivas regras são:
a) Para efeitos de determinação da categoria da nova carreira nos casos de intercomunicabilidade horizontal ou vertical ou ainda de mobilidade entre carreiras, a relação de natureza remuneratória legalmente fixada estabelece-se entre os índices remuneratórios correspondentes ao escalão 1 da categoria em que o funcionário se encontre e o escalão 1 da categoria da nova carreira;
b) Naqueles casos, a integração na nova carreira faz-se em escalão a que corresponde:
b1) O mesmo índice remuneratório;
b2) Na falta de coincidência, o índice superior mais aproximado na estrutura da categoria;
c) Nas situações previstas na anterior alínea b1), o tempo de serviço prestado no escalão de origem releva para progressão na nova carreira;
d) As regras previstas nas antecedentes alíneas b) e c) aplicam-se também às situações de mobilidade, mediante concurso, entre carreiras inseridas nos grupos de pessoal operário e auxiliar e, bem assim, entre carreiras para cujo provimento esteja estabelecido legalmente o mesmo nível de habilitação superior.

8.3 - Progressão (artigos 19º e 20º).
A progressão nas categorias efectua-se por mudança de escalão, dependendo esta da permanência no escalão imediatamente anterior durante módulos de tempo de três anos nas carreiras verticais e de quatro anos nas carreiras horizontais (9).
A atribuição de classificação de serviço de Não satisfatório ou equivalente determina a não consideração do tempo de serviço prestado com essa classificação para efeitos de progressão.
A progressão é automática e oficiosa, não carecendo da fiscalização prévia do Tribunal de Contas nem de publicação no Diário da República.
A progressão não depende de requerimento do interessado, sendo dever dos respectivos serviços proceder com diligência ao processamento oficioso das progressões, vencendo-se aquele direito à remuneração pelo escalão superior no dia 1 do mês seguinte ao do preenchimento dos requisitos estabelecidos no primeiro parágrafo deste nº 8.3, dependendo o seu abono, apenas, da simples confirmação das condições legais por parte do dirigente máximo do serviço a cujo quadro o funcionário pertence ou o agente está vinculado.

II
Nesta parte II, iremos analisar o actual regime geral de estruturação de carreiras da Administração Pública, estabelecido pelo Decreto-Lei nº 404-A/98, de 18 de Dezembro (10), posteriormente alterado pela Lei nº 44/99, de 11 de Junho, diploma que já, por várias vezes, foi referido no presente artigo.
O diploma em apreço revogou o regime geral de carreiras estabelecido no Decreto-Lei nº 248/85, de 15 de Julho, prevendo novas regras para o ingresso e acesso nas várias carreiras de regime geral.

1 - Antes de iniciarmos a análise das várias carreiras, julgamos ser pertinente referir duas situações.

1.1 - Carreiras com dotação global.
Estas carreiras caracterizam-se por permitir que o acesso seja feito sem ser necessária a existência de lugares vagos ou ocupados. Tomemos como exemplo o quadro de pessoal de um determinado serviço: existe a carreira técnica superior, que comporta cinco categorias, o número de lugares é de cinco (11), os quais estão preenchidos - a modalidade de carreira com dotação global permite aos cinco técnicos superiores, respeitando os requisitos legais para acesso, atingirem a categoria de topo, isto é, não é necessário verificar-se a situação de lugares vagos para poderem concorrer e esse concurso é destinado aos funcionários do serviço, não concorrendo, neste exemplo concreto, qualquer funcionário exterior ao serviço, situação que serve realmente de estímulo para os funcionários em termos de promoção.
O diploma acima referido previa que as categorias de assessor principal e de assessor fossem convertidas, a partir de 1 de Janeiro de 1999, em dotação global. Entretanto, o Decreto-Lei nº 141/2001, de 24 de Abril, veio estabelecer o regime aplicável à globalização das dotações individuais das várias carreiras de regime geral (12), bem como das dotações semiglobais já previstas para a carreira técnica superior. Assim, os quadros de pessoal dos serviços e organismos abrangidos consideram-se automaticamente alterados, de acordo com as regras previstas no artigo 3º. Tal situação, como é evidente, vem criar, agora para todos os funcionários, perspectivas de promoção nas respectivas carreiras mais sólidas e reais.

1.2 - Conteúdos funcionais das carreiras.
Em nossa opinião, o Decreto-Lei nº 404-A/98, de 18 de Dezembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 44/99, de 11 de Junho, ao não publicar a caracterização genérica do conteúdo funcional e das exigências habilitacionais dos vários grupos de pessoal, constantes do mapa I anexo ao Decreto-Lei nº 248/85, de 15 de Julho, leva a que se tenha perdido uma excelente oportunidade para actualizar aquelas regras, as quais, em alguns casos, não estão conformes às que foram agora estabelecidas pelo primeiro dos referidos diplomas.

2 - O Decreto-Lei nº 404-A/98, de 18 de Dezembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 44/99, de 11 de Junho, estipula novas regras para a intercomunicabilidade vertical (artigo 3º):
a) Os funcionários possuidores das habilitações exigidas podem ser opositores a concurso para lugares de categorias de acesso, cujo escalão 1 seja igual ou superior mais aproximado do escalão 1 da categoria de origem de carreiras de um grupo de pessoal diferente, desde que se trate de carreiras inseridas na mesma área funcional;
b) Os funcionários não possuidores dos requisitos habilitacionais exigidos podem, também, nos termos previstos neste diploma, candidatar-se a concursos para lugares de categorias integradas em carreiras de grupos de pessoal diferentes, desde que pertencentes à mesma área funcional;
c) O número de lugares a prever nos termos das alíneas anteriores não pode ultrapassar a quota a fixar, em cada caso, atento o aproveitamento racional de recursos humanos e as necessidades do serviço.

3 - Regime das carreiras (artigos 4º a 17º).
A fim de não tornar demasiado longo o texto deste artigo, vamos somente referir os pontos essenciais de cada carreira, aconselhando-se, de qualquer modo, a leitura atenta do diploma.

3.1 - Grupo de pessoal técnico superior.
O diploma prevê a carreira técnica superior (artigo 4º) com as seguintes categorias: assessor principal, assessor, técnico superior principal, técnico superior de 1ª classe, técnico superior de 2ª classe e estagiário.
O ingresso faz-se na categoria de base - técnico superior de 2ª classe -, de entre indivíduos habilitados com licenciatura em área de formação adequada ao conteúdo funcional do lugar a prover, aprovados em estágio com classificação não inferior a Bom (14 valores).
O acesso efectua-se por, pelo menos, módulos de três anos de serviço classificados de Muito Bom ou cinco anos classificados de Bom, para as categorias de assessor principal e de assessor, e de, pelo menos, três anos de serviço classificados de Bom, para as restantes categorias.

3.2 - Grupo de pessoal técnico.
Neste grupo de pessoal (artigo 5º) está incluída a categoria de técnico que se desenvolve com as seguintes categorias: técnico especialista principal, técnico especialista, técnico principal, técnico de 1ª classe, técnico de 2ª classe e estagiário.
O ingresso faz-se na categoria de base - técnico de 2ª classe -, de entre indivíduos habilitados com curso superior que não confira o grau de licenciatura em área de formação adequada ao conteúdo funcional do lugar a prover, aprovados em estágio com classificação não inferior a Bom (14 valores).
O acesso efectua-se por, pelo menos, módulos de três anos de serviço classificados de Muito Bom ou cinco anos classificados de Bom, para as categorias de técnico especialista principal e de técnico especialista, e de, pelo menos, três anos classificados de Bom, para as restantes categorias.

3.3 - Grupo de pessoal técnico-profissional.
Desaparecem as carreiras de técnico auxiliar e de técnico adjunto, unificadas na carreira técnica profissional (artigo 6º) com as seguintes categorias: coordenador, técnico profissional especialista principal, técnico profissional especialista, técnico profissional principal, técnico profissional de 1ª classe e técnico profissional de 2ª classe.
O ingresso faz-se na categoria de base - técnico profissional de 2ª classe -, de entre indivíduos habilitados com adequado curso tecnológico, cursos das escolas profissionais, curso das escolas especializadas de ensino artístico, curso que confira certificado de qualificação profissional de nível III, definida pela Decisão nº 85/368/CEE, do Conselho das Comunidades Europeias, de 16 de Julho, ou curso equiparado.
O acesso faz-se, para coordenador, de entre técnicos profissionais especialista principais com classificação de serviço de Bom, bem como de entre técnicos profissionais especialistas com, pelo menos, três anos de serviço na categoria classificados de Muito Bom ou cinco anos classificados de Bom, só podendo ser criada aquela categoria quando se verifique a necessidade de coordenar, pelo menos, dez profissionais da mesma área funcional.
O acesso para as categorias de técnico profissional especialista principal e de técnico profissional especialista por, pelo menos, módulos de três anos de serviço classificados de Muito Bom ou cinco anos classificados de Bom, sendo de, pelo menos, três anos classificados de Bom, para as restantes categorias.

3.4 - Grupo de pessoal administrativo.
3.4.1 - Categoria de chefe de secção (artigo 7º).
O recrutamento para esta categoria faz-se de entre assistentes administrativos especialistas e tesoureiros, em ambos os casos com classificação de serviço não inferior a Bom, sendo a progressão feita por módulos de três anos.
3.4.2 - Carreira de assistente administrativo ( artigo 8º).
Os antigos segundo e terceiros-oficiais passam a designar-se assistentes administrativos, os primeiros-oficiais passam a assistente administrativo principal e os oficiais administrativos principais a assistentes administrativos especialistas.
O ingresso faz-se na categoria de base - assistente administrativo , de entre indivíduos habilitados com o 11º ano de escolaridade ou equivalente.
O acesso efectua-se por, pelo menos, módulos de três anos de serviço com classificação não inferior a Bom.
3.4.3 - Carreira de tesoureiro (artigo 9º).
O recrutamento para a carreira referida faz-se de entre assistentes administrativos especialistas com classificação de serviço não inferior a Bom, bem como de entre assistentes administrativos principais com, pelo menos, três anos de serviço na categoria e com classificação de serviço não inferior a Bom, sendo a progressão feita segundo módulos de três anos.

3.5 - Grupo de pessoal auxiliar.
O recrutamento para as carreiras de pessoal auxiliar (artigo 10º) efectua-se de acordo com as seguintes regras:
a) Motorista de transportes colectivos, condutor de máquinas pesadas, motorista de pesados e motorista de ligeiros, de entre indivíduos habilitados com a escolaridade obrigatória e carta de condução adequada;
b) Fiscal de obras e fiscal de obras públicas, de entre operários qualificados e semiqualificados da respectiva área funcional habilitados com a escolaridade obrigatória e com, pelo menos, quatro anos de prática profissional;
c) Telefonista, auxiliar administrativo, operador de reprografia, guarda-noturno, servente e auxiliar de limpeza, de entre indivíduos habilitados com a escolaridade obrigatória.
Existe ainda a categoria de encarregado de pessoal auxiliar (artigo 11º), à qual terão acesso auxiliares administrativos posicionados no escalão 4 ou superior, sendo a progressão feita segundo módulos de três anos.

3.6 - Grupo de pessoal operário.
3.6.1 - O pessoal operário compreende as carreiras de operário qualificado e de operário semiqualificado (artigo 12º).
O recrutamento para cada uma das carreiras fica condicionado a concurso de prestação de provas práticas e à posse da escolaridade obrigatória e de comprovada formação ou experiência profissional, adequada ao exercício da respectiva profissão, de duração não inferior a dois ou um anos, consoante se trate da carreira de operário qualificado ou de operário semiqualificado.
3.6.2. - Carreira de operário qualificado (artigo 14º).
A carreira compreende as seguintes categorias: encarregado geral, encarregado, operário principal e operário.
O acesso às duas primeiras faz-se por módulos de tempo de serviço de, no mínimo, três anos com classificação de serviço não inferior a Bom. O acesso à categoria de operário principal faz-se por, pelo menos, por módulos de tempo de serviço de seis anos na categoria anterior e classificação de serviço não inferior a Bom.
3.6.3 - Carreira de operário semiqualificado (artigo 15º).
A carreira compreende duas categorias: encarregado e operário.
O acesso à primeira faz-se por módulos de tempo de serviço de, no mínimo, seis anos na categoria anterior e classificação de serviço não inferior a Bom.
A carreira é horizontal e a progressão faz-se segundo módulos de três anos, quando se trate da categoria de encarregado.
3.6.4 - Lugares de chefia do pessoal operário (artigo 16º).
Só poderá ser criado um lugar de encarregado geral quando se verifique a necessidade de coordenar, pelo menos, três encarregados do respectivo sector de actividade.
Só poderá ser criado um lugar de encarregado quando se verifique a necessidade de dirigir e controlar, pelo menos, vinte profissionais das carreiras de operário qualificado e semiqualificado.

4 - Chefe de repartição (artigo 18º).
O diploma vem estabelecer o seguinte:
a) Os lugares de chefe de repartição são extintos à medida que as leis orgânicas dos serviços operem a reorganização da área administrativa, sendo os respectivos titulares reclassificados na categoria de técnico superior de 1ª classe;
b) Os chefes de repartição que não estejam habilitados com licenciatura ou curso superior que não confira o grau de licenciatura não podem ascender a categoria superior à de técnico superior principal;
c) Os chefes de repartição licenciados, bem como os que, habilitados com curso superior que não confira grau de licenciatura, hajam sido reclassificados em técnicos superiores de 1ª classe, podem ser opositores em concursos para director de serviços e chefe de divisão das áreas administrativas, desde que tenham, respectivamente, seis ou quatro anos de experiência profissional naquelas áreas;
d) Enquanto existirem nos quadros de pessoal lugares de chefe de repartição, a respectiva escala salarial será a correspondente à de técnico superior de 1ª classe, fazendo-se a progressão segundo módulos de três anos;
e) Sem prejuízo do disposto na anterior alínea a), os chefes de repartição habilitados com licenciatura podem candidatar-se nos termos das regras de intercomunicabilidade a lugares de técnico superior de 1ª classe;
f) Os chefes de repartição que se encontrem providos em lugares dirigentes consideram-se reclassificados, de acordo com as regras da já referida alínea a), independentemente da reorganização da área administrativa.


NOTAS
(1) In "Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público", Vol. I, Livraria Almedina - Coimbra, 1985, págs. 47 a 67.
(2) Com se verificará o legislador não seguiu a ordem de ideias de João Alfaia.
(3) Apesar da parte referente a vencimentos não estar no âmbito deste artigo, julga-se ser pertinente notar que a estrutura das remunerações bases dos funcionários e agentes da Administração Pública, nos termos definidos no Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, e desenvolvidos pelo Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro, deixou de ser feita pela correspondência de categoria a uma determinada letra de vencimento, sistema que vigorava há mais de 50 anos, para passar a ser constituída por escalas indiciárias, tal como estabelecido no artigo 17º do primeiro dos diplomas acima citados e que se transcreve na parte que interessa:
1 - A remuneração base anual é determinada pelo índice correspondente à categoria e escalão em que o funcionário ou agente está posicionado.
2 - Escalão é cada uma das posições remuneratórias criadas no âmbito das carreiras horizontais ou de cada categoria integrada em carreira.
Assim, as regras definidas reportam-se, actualmente, quer no regime da intercomunicabilidade, quer nos de ingressos, de promoções, de reclassificações e reconversões profissionais, a um determinado índice da categoria diversa daquela de que o funcionário ou agente é detentor ou o índice da categoria de outra carreira, conforme as situações.
(4) Cfr., nomeadamente o nosso anterior artigo publicado, neste Suplemento Justiça e Cidadania, em 25 de Maio de 2000.
(5) O estágio é obrigatório nas carreiras técnica superior e técnica, tendo a duração, em regra, de um ano, e sendo o seu aproveitamento condição sine qua non para a nomeação definitiva nas respectivas categorias de base, técnico superior de 2ª classe e técnico de 2ª classe, respectivamente. O índice atribuído à situação de estagiário é, em ambos os casos, substancialmente inferior ao índice correspondente ao primeiro escalão das referidas categorias de base.
O regime do estágio consta do artigo 5º do Decreto-Lei nº 265/88, de 28 de Julho.
(6) A propósito do concurso de promoção, afigura-se relevante referir o que defende, e bem, na nossa modesta opinião, o ilustre Jurista João Alfaia, na obra citada na anterior nota 1, pág. 340:
"(...)no caso de promoção, a avaliação deverá incidir, fundamentalmente, sempre que possível, sobre o trabalho produzido anteriormente pelos candidatos no desempenho de cargos da mesma área funcional e não sobre as potencialidades dos aludidos candidatos. (...) Assim, temos defendido que no caso de promoção e sempre que o trabalho produzido fique documentado, o concurso deveria incidir sobre o desempenho do cargo (concurso que revestiria natureza mista de concurso documental e de prestação de provas) apreciado e classificado periodicamente não só pelos superiores hierárquicos como ainda por um corpo de inspectores (comum a cada Ministério ou de cada departamento de grande dimensão) no sentido de assegurar uniformidade de critério.
Tal sistema não só conduziria à apreciação directa daquilo que o funcionário é, e não só à das suas potencialidades, como funcionaria como poderoso estímulo de produtividade, pois ao produzir trabalho em quantidade e qualidade o funcionário estaria a «investir» na sua carreira."
(7) Julgamos que, nestes casos, certamente referentes à carreira técnica superior, dado que se menciona a licenciatura e outros graus académicos superiores, o legislador deveria ter sido mais claro e preciso na definição das regras para o recrutamento excepcional para lugares de acesso, nomeadamente no que respeita aos termos dos fundamentos (p. e., inexistência de técnicos superiores com elevada capacidade técnica específica no serviço ou organismo, o interesse público, etc. ...), a quem compete o despacho favorável para recrutar (director-geral ou equiparado, membro do Governo respectivo, Ministro das Finanças, membro do Governo que tiver a seu cargo a Administração Pública) e, ainda, se deverá ser por despacho conjunto de vários membros do Governo ou não.
(8) V. anterior nota 3.
(9) Exceptuam-se, nas carreiras horizontais, os casos referentes à categoria de chefe de secção e à carreira de tesoureiro, cuja progressão se faz segundo módulos de três anos, nos termos, respectivamente, do nº 2 do artigo 7º e do nº 2 do artigo 9º, ambos do Decreto-Lei nº 404-A/98, de 18 de Dezembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 44/99, de 11 de Junho.
(10) O diploma foi adaptado à administração local pelo Decreto-Lei nº 412-A/98, de 30 de Dezembro.
(11) Por norma, as carreiras com dotação global não podiam prever um número de lugares superior ao numero de categorias.
(12) O diploma aplica-se igualmente às carreiras de regime especial e com designações específicas, que não são objecto deste artigo.


Justiça e Cidadania, Suplemento do Primeiro de Janeiro, 30-Jul-2001

 

© 1991-2001 Priberam Informática e o(s) autor(es). Todos os direitos reservados.