® BuscaLegis.ccj.ufsc.br



Ação Monitória


Yves Cássius Silva



Ação Monitória - Linhas Gerais


A ação monitória foi instituída no nosso direito processual civil pela Lei nº 9.079/14.7.95 especialmente para cobrir o vácuo até então existente entre o processo de conhecimento e o de execução.

Pretendeu a lei conferir ao interessado, desde que mediante a concomitância de certos requisitos, uma forma processual mais célere para recebimento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível (substituível) ou determinado bem móvel.

Ocorria que, muitas vezes, de posse de um título executivo imperfeito, era o interessado obrigado a percorrer todo o árduo caminho do processo de conhecimento para ver declarado seu direito.

Quantos não forma obrigados a utilizar a ação ordinária de cobrança porquanto o cheque encontrava-se prescrito ou o contrato não continha as duas testemunhas exigidas pelo Art. 585, II do CPC para efeito de ação executiva ? (vale ressaltar porém, que a jurisprudência dominante tem entendido não ser imprescindível a existência de testemunhas nos contratos de locação onde o locador pretenda executar o débito locativo).

Despiciendo ressaltar que a nossa justiça é por demais morosa, inúmeros são os recursos e formas processuais para se procrastinar os feitos e poucos são os serventuários e juízes para julgá-los.

Com a propositura de uma ação monitória, de imediato, é expedido em desfavor do requerido o chamado mandado de pagamento ou entrega da coisa com prazo de cumprimento de 15 dias.

Optando o requerido pelo cumprimento do mandado ficará isento do pagamento de custas processuais e honorários.

Caso contrário, ou seja, optando o requerido pelo não cumprimento do mandado, no prazo acima, poderá opor " embargos " suspensivos da ordem de pagamento ou entrega da coisa, caso em que o feito segue pelo rito ordinário. Os embargos independem de segurança do juízo e são processados nos mesmos autos.

Daí, entenderem alguns, de forma acertada, que o nome " embargos " é impróprio, pois em praticamente nada se assemelham aos " embargos à execução " propriamente ditos.

Não opostos os embargos ou, se opostos, rejeitados, o mandado inicial converte-se em mandado executivo, constituindo-se assim o título executivo judicial, caso em que o feito prosseguir-se-á na forma prevista no Livro II, Título II, Capítulo II e IV do CPC, conforme assim determina o caput do Art. 1.102 c do CPC.


A Prova Escrita na Ação Monitória


Traçadas as linhas gerais, ingressamos ao tema proposto, que é aquele concernente a um dos requisitos objetivos da ação monitória, qual seja : " a prova escrita sem eficácia de título executivo ".

Prefacialmente, mister se faz esclarecer que a ação monitória (que em verdade é procedimento) " ... compete a quem pretende, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa ... " (Art. 1.102 a do CPC).

Assim é que não é permitido ao requerente simplesmente " escolher " --- como se fosse permitido --- a providência processual que para satisfazer seus anseios.

Bastante comum tem sido o uso da ação monitória instruída com simples notificação (ou contra - notificação promovida pela parte contrária), como se isso representasse a mencionada " prova escrita sem eficácia de título executivo ", quando a providência é destinada quase que sempre para efeito de constituição em mora do notificado.

Com efeito, no caso acima referido, onde se vê a prova escrita sem eficácia de título executivo ?

Sabe-se, que o Direito Brasileiro adotou o monitório documental, qual seja, aquele que exige título executivo informal ---- impossível de instruir ação executiva --- .

É verdade, que : " Se o credor, dispondo de prova escrita, entendo não ser ela título executivo extrajudicial, pode optar pela ação monitória, ainda que o julgador tenha entendimento contrário quanto à natureza do título. Não se pode obrigar o credor a trilhar a via executiva quando tem dúvida sobre a liquidez e certeza do título, valendo-se da ação monitória. " (TJSC, ac. un. da 3ª C. Cív., publ. 1.6.98 - Rel. Des. Cláudio Dutra).

Naturalmente, a prova escrita sem eficácia de título executivo deve emanar da parte passiva da demanda de maneira que convença o magistrado acerca da existência do débito que se reclama pagamento.

Mera notificação, da forma que vem sendo usada, não preenche a exigência legal do monitório documental, assim como a contra - notificação, onde quase sempre diz o requerido não ser devedor do credor da importância.

Não é qualquer documento emanado da parte ex - adversa que poderá ser utilizado para aforamento da demanda monitória. Toda a documentação obtida pelo suposto credor e exemplificada acima poderá revestir-se em início de prova, ou pressuposto processual, para embasar ação ordinária, jamais, servirá de sustentáculo para ajuizamento de ação monitória.


Doutrina e Jurisprudência sobre o Tema em Questão


Em uma das mais esclarecedoras obras sobre o tema (Código de Processo Civil Reformado, 3ª ed., Del Rey, p. 370) esclarece o Mestre Carreira Alvim que :


" Ensina Amaral Santos, com apoio na mais autorizada doutrina (Chiovenda, Liebman, Micheli, Ugo Rocco, Battaglini, Echandia, Pontes de Miranda) , que, por " começo " de prova escrita se entende, em suma, o escrito que, emanado da pessoa contra quem se faz o pedido, ou de quem a represente, o torna verossímil ou suficientemente provável e possível.


No entanto, a certeza ou convicção relativamente ao contrato dependerá das provas subsidiárias ou complementares, que poderão consistir na produzida por testemunhas.


Por outras palavras, a certeza em relação ao contrato dependerá do começo da prova escrita e da testemunhal que a completa, e como o procedimento injuncional não admite, na primeira fase, instrução nem contraditório, somente em ação ordinária terá o autor condições de provar o seu direito. " (grifo nosso).


Seguindo a esteira de raciocínio acima, à vista da documentação acostada pelo autor da ação monitória, o juiz deverá, DE IMEDIATO, convencer-se pela existência da prova escrita sem eficácia de título executivo de forma a autorizar a expedição do mandado de pagamento.

Como dito acima, assim o será porque o procedimento monitório em sua primeira fase inadmite a instrução, assim como o contraditório. É procedimento de cognição sumária e destinado a obter o quanto antes o título necessário ao início da execução.

Não se admite em sede de ação monitória o acertamento de obrigações, que seria objeto de discussão em processo ordinário.

Como sustenta Calamandrei : " ... a cognição (na primeira fase) é considerada não tanto na função imediata de acertamento, mas na sua função mediata de preparação do título executivo. " (in Carreira Alvim, Ação Monitória e Temas Polêmicos da Reforma Processual, Del Rey, 1995, p. 32).


O Egrégio Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, decidindo a questão posta, assim se pronunciou na pessoa do ilustre e culto Herondes de Andrade :


" Requisito essencial da ação monitória é a existência de prova escrita desprovida de eficácia executiva. Como tal considerado apenas o escrito emanado da parte contra quem se utilizar o documento, ou que com ele guarde relação de caráter pessoal, sendo imprestável para tal fim, mera notificação promovida pelo interessado. " (grifo nosso) (ac. un. 1ª T. TAMG ac. 210926/6 - DJMG 06.08.96, p. 01).


Na mesma linha decidiu certa vez o 2º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, na apelação 517.938 em que foi relator o juiz Gilberto dos Santos :


" Para propor ação monitória, a lei exige prova escrita da obrigação que se pretende ver cumprida, compreendendo-se como tal o documento demonstrativo de crédito, em princípio, líqüido e exigível, mas desprovido de certeza, merecedor de fé, pelo julgador, quanto à autenticidade e eficácia probatória. "


O brilhante Araken de Assis, Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, assim conceituou " prova escrita " :


" A prova escrita, exigida pelo artigo 1.102a do CPC, é todo documento que, embora não prove, diretamente, o fato constitutivo, permite ao órgão judiciário deduzir, através de presunção, a existência do direito alegado. " (5ª Câmara Cível, apelação 597.030.873, j. 15.5.97).


Ora, admitir a notificação ou contra - notificação como sendo documento suficiente para ajuizamento da ação monitória seria dar amplitude não autorizada pelo procedimento que regula a matéria. Fosse assim, toda e qualquer dívida poderia embasar ação monitória, bastando ao credor notificar seu devedor ; ou que este o contra - notificasse.

Desta forma é que antes de aforar a ação monitória, deve-se procurar perfeita consonância com o dispositivo processual que regula a matéria, não se pode admitir a " escolha " de procedimento mais célere para se chegar à satisfação do pedido, sem a observância dos requisitivos legais inerentes ao pedido formulado.

Assim, a não obediência ao que dispõe a lei, deve implicar na extinção do processo sem julgamento do mérito, seja por impossibilidade jurídica do pedido (carência da ação) ; seja por ausência de pressuposto de constituição válido e regular do processo (a prova escrita sem eficácia de título executivo), tudo nos termos do Art. 267, VI e IV, respectivamente, do Código de Processo Civil.

Tem sido comum os credores desvirtuarem a finalidade e requisitos da ação monitória, o que, felizmente, tem sido muito bem combatido pelos nossos mais renomados Tribunais.


Acontece que nem sempre o magistrado analisa perfuctoriamente a documentação que instrui a ação monitória.


O Tribunal de Justiça do Distrito Federal, na pessoa do Juiz Hilário de Vasconcelos, assim se pronunciou sobre o tema :


" Ação Monitória - Contrato de Promessa de Compra e Venda - Rescisão - Notificação e Contra Notificação


Havendo litígio quanto à culpa de quem tenha dado causa à rescisão contratual, cuja decisão determinará a apuração das obrigações das partes, não se presta à solução de tal controvérsia a ação monitória, cuja finalidade é conferir, desde logo, executividade a título em poder do credor.


É a ação de conhecimento o meio adequado para acertamento da relação jurídica fundamental antecedente, até porque, no caso em exame, sequer se tem certeza de que determinada parte seja credora da outra.


Na ação monitória já se pressupõe a existência do crédito, cujo título carece apenas de executividade. Devem as partes, não pela via monitória, mas pela de conhecimento pleno, buscar decisão sobre a relação creditícia eventualmente existente. " (ac. 1ª T.Cív. publ. 11.6.97) (grifo nosso).


Ao contrário do que equivocadamente tem-se observado, notificações, contra - notificações e documentos semelhantes, tais como duplica sem aceite e comprovante de entrega da mercadoria ou prestação de serviço, não são prova escrita sem eficácia de título executivo de forma a ensejar instauração de ação monitória.

Como dito alhures, admitir o contrário seria desvirtuar a finalidade do instituto e conferir à ação monitória uma interpretação que a lei não autoriza.


Recentemente, o Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul que :


" Por documento escrito deve-se entender qualquer documento que seja merecedor de fé quanto à sua autenticidade e eficácia probatória. Se os documentos revelam-se cheios de incerteza, não pode a ação monitória properar. " (ac. un. 3ª T. Cív. Rel. Des. Nelson Mendes Fontoura) (grifo nosso).


A relevância da conversão do procedimento monitório em executivo é extraordinária. De posse do título executivo judicial, sequer a origem da dívida e seu pagamento terá a parte contrária condições de provar, nos termos do Art. 741 do CPC, pelo que a admissão da prova escrita sem eficácia de título executivo deve ser cercado de cuidados extremos, o que infelizmente não se tem observado às vezes.


Carreira Alvim cita como exemplos de prova escrita sem eficácia de título executivo uma confissão de dívida, uma carta missiva, um telegrama, um recibo rubricado. Outros bastantes comuns têm sido os cheques prescritos, as duplicatas desacompanhadas de aceite ou do comprovante de entrega das mercadorias.

Aliás, o mestre referido vai ainda mais além quanto diz que a oração correta do artigo não seria " prova escrita sem eficácia de título executivo, mas, sim, " documento do qual procede o crédito. "


Conclusão


Assim, não é qualquer documento obtido pelo credor que poderá instruir ação monitória. Numa análise preliminar, deverá se convencer o juiz de que o crédito reclamado pelo autor é existente e cuja responsabilidade é da parte contrária, ou seja, o documento que instruir o pedido monitório deverá conter ao menos indícios de admissão da dívida.

O documento que se reveste em prova escrita para instruir ação monitória é aquele hábil, produzido pelo réu ou conjuntamente com ele, que não possua força executiva, e que contenha admissão de pagamento de quantia em dinheiro, entrega de coisa fungível ou determinado bem móvel.





retirado de: http://www.subjudice.hpg.ig.com.br/art1.htm