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TUTELAS DE URGÊNCIA

 

 

AUTORA MINISTRA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ELIANA CALMON

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

A morosidade da Justiça, problema não apenas brasileiro, mas de todo o mundo, mais se acentua nos países da civil law, especialmente quando a sociedade emerge para um regime democrático e encontra grande desordem nos diversos segmentos sociais.

 

Refiro-me, especificamente, à situação do Judiciário brasileiro, nos últimos dez anos, quando tivemos um significativo agravamento na má qualidade da prestação jurisdicional.

 

Coincidentemente, a crise acompanha a vigência da Constituição Federal de 1988. E não se pode ter dúvida de que a "Constituição-Cidadã", outorgando largamente direitos sociais, ampliando os direitos individuais, explicitando os direitos e interesses difusos e coletivos, deixou o Poder Judiciário desguarnecido, ao tempo em que sinalizou para ele como desaguadouro das LESÕES ou das AMEAÇAS DE LESÃO a direito ou interesse, na busca de recomposição.

 

Esta a origem política da desordem do Poder Judiciário atualmente, que se encontrando insuficiente, fragilizado e defasado para enfrentar a tarefa a ele outorgada pelo Constituinte de 1988, sem dele ter merecido, em contrapartida, a mudança estrutural indispensável.

 

A demora na prestação jurisdicional levou os advogados a buscarem solução processual e, no processo cautelar, ingenuamente estruturado no chamado Código de Buzaid, encontraram a saída para as urgências: as liminares acautelatórias para se aguardar a demorada sentença, sem correr o risco da imprestabilidade da atuação estatal. Esta foi a solução para atender, em um primeiro momento, aos direitos instantâneos.

 

O ponto crucial da utilização das cautelares, praticamente alertando a sociedade brasileira e os juristas nacionais para o problema, surgiu com o bloqueio dos ativos financeiros do Plano Collor I, pela Lei n. 8.024/90.

 

Milhares de brasileiros socorreram-se da Justiça Federal e, por via de liminares, proferidas em processos cautelares, conseguiram desbloquear os depósitos de contas-correntes e de poupanças, deixando um saldo de milhares e milhares de processos em duplicidade (ação cautelar e ação ordinária) para serem solucionados, em nome de uma formalidade apenas. Sim, porque a só liminar desbloqueando os depósitos bancários, de plena satisfatividade, tornou de absoluta inutilidade o longo caminho a percorrer com o iter procedimental de ambas as demandas (cautelar e ordinária).

 

Tomou-se consciência, então, de dois aspectos da mais alta relevância:

 

era necessário fosse o processo brasileiro munido de um meio, pronto e eficaz, para a proteção do direito instantâneo (este, se não reposto de imediato, se agredido, perderia a utilidade para o seu titular); e

 

a utilização das medidas cautelares assoberbava a Justiça com dois processos simultâneos, ao tempo em que lhes desvirtuava a finalidade. A razão política e o motivo fático indicados levaram o legislador brasileiro, pela mão da Escola Nacional da Magistratura, à edição da Lei n. 8.952, de 13/12/94, criando-se, então, a TUTELA ANTECIPADA do artigo 273 do CPC.

 

Em cinco anos, a comunidade judiciária avançou ainda mais, até chegar às instâncias especial e extraordinária, quando não obtida, nas instâncias ordinárias, a tutela de urgência. E para assim agir, passou-se a fazer uso da medida cautelar.

 

2. TUTELAS DE URGÊNCIA

 

Tutela jurídica ou tutela jurisdicional significa a atividade estatal de se substituir ao particular na solução dos conflitos, prestando a jurisdição, dizendo quem tem razão.

 

Tradicionalmente, o Estado presta a tutela certificando, executando ou acautelando, tutelas estas identificadas com o processo de conhecimento ou o de cognição, o de execução e o cautelar.

 

Nas situações de urgência, entendendo-se estas como a situação apta a gerar dano irreparável ou de difícil reparação, a tutela, geralmente embasada no princípio da segurança jurídica (devido processo legal), muda de rumo, passando a procurar, mais que a segurança, a efetividade da jurisdição, a razão de ser do próprio Poder Judiciário. A preocupação é não deixar a resposta estatal cair no vazio.

 

Assim sendo, surge, ao lado da outorga de tutelas acautelatórias, visando precipuamente à prestabilidade ou à efetividade da jurisdição, a antecipação dos efeitos de uma futura sentença, em nome de um direito instantâneo que, se não protegido de forma imediata, não mais servirá ao seu titular.

 

A tradicional tutela cautelar é de natureza provisória e instrumental, tendo como objetivo único afastar possíveis embaraços à jurisdição. Somente por via de conseqüência protege a cautelar o direito material.

 

Diferentemente, a tutela antecipatória provoca o adiantamento dos efeitos de uma futura sentença. Ainda não se sabe como será, mas já se tem a visão do que ocorrerá, haja vista os pressupostos exigidos: prova inequívoca e verossimilhança. Antecipa-se a medida para evitar o perecimento do direito material - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA ASSECURATÓRIA.

 

Contudo, pode haver antecipação sem estar o direito a correr risco. Isto ocorre ao se anteciparem os efeitos da futura sentença como espécie de castigo ao réu que abusar do direito de defesa. É a ANTECIPAÇÃO DE TUTELA PUNITIVA.

 

Ao lado das duas espécies de tutela de urgência, cautelar e antecipatória, esta última nas suas duas modalidades, punitiva e assecuratória, temos as chamadas MEDIDAS INTERINAIS, consubstanciadas na necessidade de se estabelecer disciplina à fruição de um direito surgido no curso de relações de trato continuado e prolongado, como sói acontecer nas relações de família. Temos, por exemplo, a disciplina sobre a guarda dos filhos, a administração dos bens do casal a partilhar, a questão dos alimentos, dentre outras questões, que precisam de solução provisória, enquanto se aguarda a sentença final relativa à separação do casal.

 

Por fim, é preciso que se diga: bem antes do art. 273 do Código de Processo Civil, já o legislador ordinário, aqui e ali, outorgava a possibilidade de antecipação dos efeitos da sentença, se a urgência, pressuposto para a outorga da liminar, fosse presumida adredemente pelo Legislativo. Tal ocorre nas ações possessórias, nos mandados de segurança, nas ações populares e, enfim, em todas as ações em que há previsão de concessão de liminar.

 

E o que foi dito, pode ser resumido no esquema seguinte:

 

Tutelas de urgência Tutela provisória - CAUTELAR (para afastar o embaraço a jurisdição)

 

Urgência presumida - estabelecidas pelo legislador especificamente (ações possessórias, mandados de segurança, etc.)

 

Medidas interinas (situação fática, no curso da lide)

 

Abuso do direito de defesa - PENA (mesmo quando não há perigo de dano, mas se pune o embaraço ao exercício do direito ou o abuso do direito de defesa)

 

Tutela antecipada (antecipa os efeitos da sentença para assegurar a efetividade do direito).

 

3. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA: GENERALIDADES E ESPÉCIES

 

A tutela provisória busca efetividade não da futura sentença, como a tutela cautelar, mas do próprio direito material, de tal forma se encontra a tutela antecipada vinculada e atrelada à tutela definitiva.

 

Mais do que uma cautela e menos do que uma sentença, cujo pronunciamento do Poder Judiciário se faz após um juízo de conhecimento, ou de cognição exauriente, completa, profunda e verticalizada, a tutela antecipada é espécie de cheque em branco dado pelo legislador ao magistrado; sai do campo da certeza, respaldado na prova, e entra no campo da verosimilhança, da aparência, do fumus boni iuris, mediante cognição superficial e sumária.

 

E se há incerteza, naturalmente a decisão é reversível e, portanto, limitada ao tempo, tendo duração até haver a outorga de sentença definitiva.

 

As diferenças existentes entre a tutela definitiva e a tutela provisória podem ser assim resumidas:

 

Tutela Definitiva

 

 Tutela Provisória

 

1) Segurança

 

 1) Efetividade

 

2) Juízo de certeza

 

 2) Juízo de verossimilhança

 

3) Cognição exauriente

 

 3) Cognição superficial ou sumária

 

4) Tutela autônoma

 

 4) Tutela vinculada a uma definitiva

 

5) Juridicamente imutável (coisa julgada)

 

 5) Faticamente reversível e de eficácia limitada.

 

Advirta-se, ainda: a outorga da tutela antecipada exige pedido expresso da parte, não devendo agir o magistrado de ofício, como sói acontecer nas ações cautelares.

 

Também não há outorga em relação aos direitos indisponíveis.

 

A medida de que se cuida é usualmente encontrada nos processos de conhecimento, mas nada impede que tenha aplicação no processo de execução.

 

A tutela antecipatória pode ser de duas espécies: punitiva e assecuratória.

 

Ambas exigem como pressupostos genéricos, juízo de verossimilhança ou de aparência, firmados diante de prova inequívoca.

 

Ao lado dos pressupostos genéricos, exigem-se os específicos, estes mutáveis à depender da espécie de tutela antecipada, a qual pode ser punitiva e assecuratória.

 

A tutela antecipada punitiva só se justifica havendo abuso do direito de defesa, ou manifesto propósito procrastinatório. É a litigância de má-fé que deve ser punida, evitando-se assim a chicana processual.

 

Na tutela ASSECURATÓRIA, faz-se iminente a antecipação dos efeitos da sentença, pois se assim não for corre-se o risco de consolidação de um dano irreparável ou de difícil reparação.

 

Esquematicamente, para efeito visual, podemos resumir a antecipação da tutela da forma seguinte:

 

Pressupostos

 

 genéricos

 

 prova inequívoca (comuns às 2 espécies)

 

verossimilhança

 

específicos

 

 ASSECURATÓRIA! receio de dano irreparável

 

PUNITIVA! abuso do direito de defesa ou propósito procrastinatório

 

4. A EFETIVIDADE DA TUTELA ANTECIPADA

 

A tutela antecipada tem como escopo a efetividade do resultado do esforço científico do processo, para salvar o direito instantâneo, aquele que não pode esperar. Quando ameaçado ou desrespeitado, impõe ao titular o ônus de suportar a perda de forma irreparável.

 

A tutela antecipada é, em princípio, uma violência ao sistema jurídico que se pauta na segurança, porque rasga o princípio do contraditório e atropela o do devido processo legal. Daí a preocupação que deve ter o magistrado de só concedê-la se indispensável. Mero desconforto ou remota possibilidade de dano não justifica a outorga que, entretanto, tem base legal na Constituição (art. 51, inciso XXXV).

 

Como a outorga da tutela antecipada é provisória, incorpora-se à sentença, ao ser a ação julgada procedente.

 

E quando estamos diante de uma sentença terminativa ou de improcedência? No meu entender, se após cognição plena e exauriente, o juiz conclui não ter o autor razão, ou ter sido o processo inútil, porque defeituoso ou carente, naturalmente não pode prevalecer a eficácia da tutela antecipatória.

 

Aliás, o Supremo Tribunal Federal, em relação ao mandado de segurança, fez editar a Súmula 405, que parece-me perfeitamente adequável não só ao mandado de segurança, como foi concebida, mas às hipóteses de antecipação de tutela. O verbete tem a seguinte redação:

 

"Denegado o mandado de segurança pela sentença, ou no julgamento do agravo, dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da decisão contrária"

 

Mutatis mutandis, é o que ocorre em relação à tutela objeto de apreciação, se há sentença terminativa ou improcedente.

 

O mesmo problema surge em relação às sentenças sujeitas ao duplo grau de jurisdição, vindo a colocar em foco a preocupação do Governo, expressa na Medida Provisória n. 1.570/97, originária da Lei n. 9.494, de 10/09/97.

 

De referência às ações contra o Poder Público, em que as sentenças só têm valia se submetidas ao Tribunal, se improcedentes, segue-se a regra geral: a solução preconizada na Súmula 405 do STF.

 

Se julgada procedente, naturalmente mantém-se a antecipação dos efeitos da sentença, subordinando-se a uma condição: reexame pelo Tribunal.

 

Neste ponto, convém destacar um aspecto interessantíssimo. Diz-se, geralmente, que não se deve conceder liminar satisfativa, esgotando no todo ou em parte os efeitos da sentença.

 

Ora, toda liminar é satisfativa e, se não o fosse, não haveria interesse em obtê-la.

 

O que se torna imprescindível evitar não é a satisfatividade, e sim a irreversibilidade.

 

De nada adiantaria para a segurança jurídica, fim precípuo do Estado-Juiz, a outorga de uma liminar se, tirando o perigo de uma parte, o lançasse à outra.

 

Daí a preocupação maior do juiz, ao conceder tutela antecipada: a reversibilidade da situação fática se, ao final, com a sentença, chegar-se à conclusão de não ter razão o autor.

 

A angústia da incerteza e do provisório com que trabalha o magistrado pode ser amenizada com a caução ou a contracautela, consubstanciada em determinações que possam reverter, sem maiores conseqüências, uma liminar, após o insucesso da demanda, ao final.

 

Há quem afirme não haver caução em tutela antecipada, haja vista a exclusão constante no inciso I do art. 588 do CPC.

 

Entendo, diferentemente, não haver exclusão alguma no caput do art. 588 do Código de Processo Civil, ao se referir à caução na execução provisória; isto não significa exclusividade. A prudência nunca é demais, senão quando vem em prejuízo irreversível para os jurisdicionados.

 

Se a sentença é submetida a recurso no só efeito devolutivo, executa-se a mesma provisoriamente (art. 587, CPC).

 

Se o recurso interposto tem duplo efeito, suspensivo e devolutivo, entendo da mesma forma: se as sentenças estão sujeitas ao duplo grau de jurisdição, pode haver tentativa de se enquadrar a questão dentro da execução provisória.

 

Por fim, de referência à Lei n. 9.494, de 10/09/97, lembro que o Supremo Tribunal Federal, na cautelar de ação declaratória de constitucionalidade n. 4-6/DF, Relator o Ministro SYDNEY SANCHES, considerou inconstitucionais as decisões que concederam antecipação de tutela em desfavor do Poder Público, visando à concessão de vantagens pecuniárias a servidores públicos.

 

É bem verdade que o mesmo STF, em alguns processos, voltou atrás. Entretanto, como princípio, ficou sedimentada a proibição.

 

Assim, temos não se poder conceder tutela antecipada se importar em liberação de vantagens pecuniárias, pretendendo visar à liberação de mercadoria importada e à concessão de promoção ou de progressão funcionais.

 

Estas situações, e outras mais referidas no art. 11 da Lei n. 9.494/97, não impedem se faça a concessão, nas hipóteses extremas, mediante caução ou contracautela.

 

Por último, constitui-se a antecipação de tutela em uma decisão, recorrível por via do agravo, recurso que, recebido no só efeito devolutivo, pode merecer do relator a outorga do efeito suspensivo.

 

Em conclusão, temos:

 

Recursos

 

 Execução Provisória RECURSO COM EFEITO DEVOLUTIVO

 

Sentenças (improcedentes, terminativas, com recurso no duplo efeito) CONTROVÉRSIA (Súmula 405 do STF)

 

Agravo (art. 558, CPC)

 

 . efeito suspensivo . efeito suspensivo ativo

 

5. TUTELAS DE URGÊNCIA NOS TRIBUNAIS

 

É possível que a urgência, o perigo de sofrer o titular do direito dano irreparável, surja no curso do processo, ou quando já sentenciada a demanda, com os seus efeitos suspensos, por força de apelação recebida no duplo efeito.

 

Na hipótese, não estará obstada a tutela antecipada, que pode ser concedida pelo relator, observados os pressupostos genéricos e específicos do instituto.

 

Atualmente, não mais se tem dúvida quanto a possibilidade de liminar acautelatória ou antecipação em relação à ação rescisória, o que praticamente tornou letra morta o teor do art. 489 do CPC.

 

Aliás, a Lei n. 9.032, de 28/04/1995, dando nova redação ao parágrafo único do art. 71, da Lei n. 8.212/1991, previu expressamente a possibilidade de liminar nas ações rescisórias, suspendendo a execução do julgado rescindendo, em caso de fraude ou erro material comprovado.

 

Desta forma, não mais tem sentido o teor da Súmula n. 234 do TFR (não cabe medida cautelar em ação rescisória para obstar os efeitos da coisa julgada).

 

A utilização do mandado de segurança contra ato judicial, na pendência de recurso recebido no só efeito devolutivo, foi muito freqüente na década de noventa, diante da demora em se obter a revisão das decisões judiciais, em razão do atraso no processamento do agravo de instrumento.

 

Hoje, praticamente foi abolida a prática, eis que a nova sistemática do agravo de instrumento fez desaparecer a figura do mandado de segurança, com função nitidamente cautelar, como era utilizado.

 

Temos, então, resumindo graficamente o que foi dito:

 

Tutelas de Urgência nos Tribunais 1) medida cautelar inominada

 

2) medida cautelar preparatória de rescisória. 

 

3) mandados de segurança

 

4) aplicação do art. 273, CPC

 

5) agravo de instrumento

 

6. O AGRAVO

 

Entendo que não se pode falar em tutela antecipada sem se tecer considerações sobre o agravo, dentro da sistemática dada pela Lei n. 9.139/1995. Aliás, foi a adoção da tutela antecipada que tornou inevitável a reforma do agravo de instrumento.

 

Com o instituto da tutela antecipada, outorgado por via de decisão interlocutória, a concessão ou a negativa da antecipação vinha sendo impugnada por via do mandado de segurança. E para não funcionar o writ como substitutivo recursal, desenvolveu-se nos Tribunais a exigência de interposição do recurso próprio, após o mandado de segurança, para dar efeito suspensivo ao agravo. Assim, tínhamos a interposição de um agravo e a impetração de um writ para dar efeito suspensivo ao recurso.

 

Alguns poucos Tribunais avançaram e passaram a dispensar o agravo quando o ato atacado fosse negativo.

 

A nova performance do agravo teve como virtude o rápido ataque ao ato judicial, sem o desvirtuamento da ação de segurança, que estava a perder a sua majestosa posição de remédio heróico constitucional para transformar-se em espécie de medida cautelar.

 

Para alguns, após a Lei n. 9.139/95, não mais tem razão de ser a impetração de mandado de segurança contra ato judicial, o que é muito radical, eis que não desapareceu aquela utilização, apenas houve considerável diminuição.

 

O Código de Processo Civil, na nova disciplina do agravo, dá ao relator o poder de suspender a decisão impugnada (art. 527, inciso II, CPC).

 

Dentro de uma interpretação literal, só o ato positivo poderia receber do Tribunal a suspensividade, porquanto não se suspende ato negativo.

 

Os mais ortodoxos, de início, interpretavam literalmente o artigo 527, inciso II, do Código de Processo Civil, fazendo uso do mandado de segurança para ataque ao ato negativo e, do agravo, quando positiva a decisão.

 

Não demorou muito para criar-se na praxe forense a figura do efeito suspensivo ativo. Este, atacando ato negativo, tem como escopo obter do relator a liminar ou tutela antecipada negada pelo juiz a quo.

 

A invenção foi muito bem recepcionada e hoje forma posição majoritária, especialmente porque sistematiza-se a utilização do agravo de instrumento em ataque às decisões judiciais, sejam positivas ou negativas. Se positivas, o relator pode dar efeito suspensivo (art. 527, II, do CPC). Se negativas, o relator poderá rever a decisão e, se presentes os pressupostos ensejadores da urgência, poderá conceder a liminar que fora negada. É o que passou a ser chamado de EFEITO SUSPENSIVO ATIVO.

 

Não se pode deixar de abordar, ainda, expediente de particular interesse para o Estado: a suspensão de segurança ou de tutela antecipada, espécie de cautelar em favor do poder público.

 

O instituto, considerado por alguns como decadente, oriundo da época ditatorial, segundo o STF, está ligado a razões específicas, como estabelecido na lei: lesão grave à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas e só concedido a pessoas jurídicas de direito público (art. 41, Lei n. 4.348, de 26/06/64).

 

Em resumo, pode-se dizer que a suspensão em abordagem é de caráter excepcionalmente político, vinculado às hipóteses enumeradas em numerus clausus, prevalecendo as razões de legalidade que dão sustentáculo às decisões judiciais do relator ou da turma julgadora.

 

Nas instâncias ordinárias, são estes os institutos que dão guarida ao poder geral de cautela, em nome da preservação dos direitos instantâneos.

 

7. TUTELA DE URGÊNCIA NO STJ

 

O Superior Tribunal de Justiça tem jurisdição originária (art. 105, I, da CF/1988), revisora (art. 105, II, da CF/1988), mas a sua existência constitucional de maior expressão é a jurisdição especial.

 

A instância especial tem por escopo uniformizar a jurisprudência infraconstitucional, fazendo justiça por via de conseqüência. Nesta instância, não se examina prova mas tese jurídica, interpretado o Direito Federal. É o Superior Tribunal de Justiça, portanto, um tribunal de precedentes.

 

Naturalmente que, em relação às competências originária e revisora, há o exercício do poder geral de cautela. E tudo que já foi dito em relação aos juízos de primeiro e segundo graus aplica-se ao Superior Tribunal de Justiça.

 

Entretanto, em termos de jurisdição especial, torna-se necessário alguns destaques.

 

Com a expansão das tutelas de urgência e a expansão dos direitos instantâneos, aliados aos crônicos problemas do Judiciário, lentidão e decrescente qualidade técnica, procuram os jurisdicionados, cada vez mais, a obtenção de liminares, sejam acautelatórias (medidas cautelares inominadas), sejam antecipativas (tutela antecipada).

 

Assim, instalou-se como prática acionar-se o Superior Tribunal de Justiça para obtenção daquilo que não foi possível conseguir nas instâncias ordinárias: tutela de urgência.

 

O problema mais se agravou quando do advento da Lei n. 9.756, de 17/12/1998, diploma que acrescentou o § 3º ao art. 542 do CPC, assim redigido:

 

O recurso extraordinário, ou o recurso especial, quando interposto contra decisão interlocutória em processo de conhecimento, cautelar ou embargos à execução ficará retido nos autos e somente será processado se o reiterar a parte, no prazo para a interposição do recurso contra a decisão final, ou para as contra-razões.

 

Pelo texto transcrito, se negada uma liminar acautelatória ou uma antecipação de tutela, por via de uma decisão, esta não mais seria apreciável, senão como preliminar de um recurso especial que no futuro atacasse o mérito da demanda.

 

Para contornar o problema, adotou-se o expediente de, negada a tutela de urgência na primeira instância, recorrer-se ao tribunal via agravo de instrumento. Se o relator negar o efeito suspensivo ativo, recorre-se à turma julgadora via agravo regimental. E se este for negado, recorre-se para o STJ, pedindo: 1º) a tutela de urgência; e 2º) o imediato exame do especial.

 

E tudo isto sob o auspício de dar efeito suspensivo ao recurso especial. A construção é tão falsa que muitas vezes o especial não foi sequer admitido ou mesmo interposto e a parte já está a ajuizar medida cautelar, para dar efeito suspensivo a um recurso que ainda não existe.

 

O STF, perante ao qual tem sido ajuizada a cautelar, da mesma forma que no STJ, restringiu a utilização, não admitindo a medida cautelar enquanto o recurso extraordinário não chegar à Corte. O STJ tem sido bem mais liberal, embora venha, nos últimos meses, restringindo a prática.

 

Tenho a compreensão de que não se pode perder de vista a natureza da jurisdição do STJ e do STF, instâncias especial e extraordinária, onde o direito é discutido em tese, sem exame de prova.

 

Se há na reivindicação da parte, via cautela, possibilidade de prejuízo irreversível, com a consagração, na decisão impugnada, de uma tese jurídica contrária ao que já está sedimentado nos Tribunais Superiores, pode o relator, em caráter excepcionalíssimo, outorgar a tutela de urgência, ao tempo em que se apressa a chegada do especial que, na hipótese, não deve ficar retido.

 

Há quem diga, inclusive, que a liminar na cautelar deve ser concedida apenas para fazer subir o especial que pelo art. 542, § 3º, do CPC, deveria ficar retido.

 

Por último, especulou-se quanto à atuação do presidente dos Tribunais. Ora, se a cautelar no STJ e no STF ficar restrita às hipóteses de existência de recurso especial ou extraordinário admitido, temos em pendência ato do Presidente do Tribunal que admite ou não os recursos derradeiros, mas determina sua retenção (art. 542, § 3º, do CPC).

 

Pergunta-se: qual a natureza jurídica deste ato judicial? É um despacho ou uma decisão? Se despacho, não haverá como caber recurso. Se decisão, caberia agravo de instrumento.

 

O meu entendimento é o de que se trata de um mero despacho de expediente, e como tal irrecorrível. Observe-se que é recorrível o ato que nega seguimento aos recursos derradeiros, porque assim está expressamente consagrado no CPC, no art. 544:

 

Não admitido o recurso extraordinário ou o recurso especial, caberá agravo de instrumento no prazo de dez (10) dias, para o supremo Tribunal Federal ou para o Superior Tribunal de Justiça, conforme o caso.

 

Em sendo um despacho e não havendo previsão de recurso, chega-se à conclusão que é irrecorrível.

 

De tudo que foi dito, podemos concluir, em relação às medidas cautelares, na pendência de recurso especial e/ou extraordinário:

 

a) a concessão de liminar, ou mesmo admissibilidade, da cautela é prática extrema e restrita, visando a salvar direito instantâneo, que perecerá se não acudido com urgência (periculum in mora), quando estiver o direito instantâneo respaldado em precedentes da Corte (fumus boni iuris)

 

b) o fumus boni iuris é aquele que se harmoniza coerentemente com o sistema de precedentes e não com o direito material propriamente dito, pois este vem a ser protegido por via de conseqüência;

 

c) a parte não precisa exercitar-se com malabarismos processuais, dizendo que pretende dar efeito suspensivo aos recursos derradeiros, ou especular a natureza jurídica do ato do presidente ao admitir, inadmitir ou reter o especial e/ou o extraordinário;

 

d) ao admitir a cautelar, cabe ao relator manter alerta a necessidade de administrar o caminho processual aberto com a cautela, a qual inaugura uma seqüência de providências, todas interligadas, de tal forma que, decidida a primeira, caem por terra todas as outras. Exemplo, se julgado pelo juiz a quo o mérito, resta prejudicado tudo que se perseguiu em relação a liminar;

 

e) a prática é importante para resguardar a coerência do sistema de precedentes.

 

Resumidamente, temos:

 

TUTELAS DE URGÊNCIA

 

I - Urgência - Situação apta a gerar dano irreparável ou de difícil reparação

 

II - Tutelas de Urgência

 

 - Tutela provisória - CAUTELAR (para afastar o embaraço à Jurisdição)

 

- Urgência presumida - POSSESSÓRIAS (estabelecidas pelo legislador)

 

- Medidas interinas (situação fática, no curso da lide)

 

- Abuso do direito de defesa - PENA (mesmo quando não há perigo de dano, mas objetiva evitar embaraço do exercício do direito)

 

- Tutela antecipada (antecipa os efeitos da sentença)

 

III - Diferenças

 

Tutela Definitiva

 

 Tutela Provisória

 

1) Segurança

 

 1) Efetividade

 

2) Juízo de certeza

 

 2) Juízo de verossimilhança

 

3) Cognição exauriente

 

 3) Cognição superficial ou sumária

 

4) Tutela autônoma

 

 4) Tutela vinculada a uma definitiva

 

5) Juridicamente imutável (coisa julgada)

 

 5) Faticamente reversível e de eficácia limitada.

 

IV - Tutela Antecipatória

 

Características:

 

a) antecipam-se os efeitos executivos da tutela - EFICÁCIA DO RESULTADO, e não a certificação, a constituição ou a condenação.

 

b) base jurídica (Constituição Federal, art. 51, XXXV) (proteção jurídica em caso de LESÃO e/ou AMEAÇA)

 

c) Pressupostos

 

 - genéricos

 

 - prova inequívoca

 

- verossimilhança

 

- específicos

 

 - receio de dano irreparável

 

- abuso do direito de defesa ou propósito procrastinatório

 

V - Tutelas de Urgência nos Tribunais

 

1. Processos de competência originária

 

 1) medidas cautelares

 

2) aplicação do 273, CPC

 

2. Competência Recursal

 

 Execução Provisória RECURSO COM EFEITO DEVOLUTIVO

 

Sentenças (improcedentes, terminativas, com recurso no duplo efeito) - CONTROVÉRSIA (Súmula 405 do STF)

 

Agravo (art. 558, CPC)

 

 . efeito suspensivo

 

. efeito suspensivo ativo

 

Medida Cautelar no STJ e no STF

 

Suspensão de Segurança

 

 

 

 

 

retirado de: http://direitobancario.com.br/