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A necessidade de fundamentação do indiciamento em inquérito policial





Alexandre Henrique Novaes de Araújo

Juiz de Direito da 1ª Vara da Comarca de Manacapuru/AM.

alexandreanovaes@globo.com







A enorme quantidade de serviço, agravada pela precariedade de recursos financeiros, humanos, materiais e tecnológicos de que dispõe a Polícia Judiciária no Brasil, tem feito com que passe despercebido pelas autoridades policiais um aspecto assaz importante: a necessidade de fundamentação, durante o inquérito policial, do indiciamento daquele sobre quem pesa a suspeita da prática do delito.



Com efeito, a praxe policial vem transformando em atividade meramente mecânica ato que, não raro, configura medida vexatória ao cidadão, qual seja, ver-se "respondendo a inquérito", ou em melhores palavras, estar sendo objeto de investigação em procedimento administrativo de natureza policial.



A bem da verdade, não dispõe a lei processual penal pátria sobre o indiciamento, nem comete à autoridade policial o dever de fundamentá-lo. Nada obstante, tem-se que ele acarreta gravames à pessoa, como sói ser a possibilidade de oferecimento de denúncia e a conseqüente instauração de ação penal. Isso sem falar na hipótese, mesmo que indevida, de configurar o indiciamento em inquérito policial óbice ao reconhecimento dos chamados "bons antecedentes" do imputado e, como tal, influir quando da dosimetria da pena. Chamo-a de indevida porque, conforme fartamente decidido em nossos tribunais, o indiciamento em inquérito não macula, por si só, os antecedentes do cidadão, ainda que muitos magistrados pensem de forma diversa.



Mas, voltemos ao tema proposto. Inexistindo tratamento legal sobre o indiciamento, o que se observa na prática da Polícia Judiciária é a mais absoluta falta de preocupação em demonstrar-se, nos autos do inquérito, os motivos de fato e de direito que justificam recair sobre determinada pessoa a probabilidade de ser a autora da infração penal, como se isso fosse dispensável.



O absurdo é tamanho que pelos autos do procedimento investigatório, na forma como costumam ser elaborados, a única diferença perceptível entre o indiciado e uma testemunha ou a vítima é o nome que se dá ao documento em que são colhidos os seus depoimentos. Assim, a testemunha tem as suas palavras reduzidas a um "termo de assentada", a versão do ofendido consta de um "termo de declarações" e a do suspeito, por seu turno, passa a estar inserida em um "auto de qualificação e interrogatório". Quanto ao porquê do indiciamento, nenhuma linha.



Não se pretende aqui que a autoridade policial transforme em libelo acusatório o ato de indiciar o indivíduo em inquérito policial, usurpando as atribuições ministeriais oportunas. Nem se espera dela a profusão de fundamentos que costumam ser articulados em sede de sentença judicial. O que se exige é uma decisão, minimamente fundamentada, dando conta das razões que a fizeram entender ser o indiciado o autor da infração penal apurada.



Ao agir assim, os delegados de polícia estarão em muito colaborando com o Ministério Público, fornecendo-lhe úteis elementos de convicção e possibilitando uma melhor formação da opinio dellicti ministerial. De igual modo, as autoridades judiciárias poderão ser municiadas com relevantes dados, cuja percepção depende de experiência investigatória que lhe é estranha, estando mais bem credenciadas a corretamente aplicar a lei penal.



Alexandre Henrique Novaes de Araújo



Retirado de: http://www.internext.com.br/valois