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Anotações sobre as mais recentes alterações ao Código de Processo Civil
Caetano Lagrasta Neto
Juiz do Tribunal de Alçada Criminal de São
Paulo e Secretário-Executivo do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas
Judiciais
Palestra proferida no dia 15-3-2002, em
Campinas, a convite do Centro de Estudos da Associação Paulista dos
Magistrados, por seu Diretor, Dr. Richard Pae Kim
I - Comentários à Lei n.
10.352, de 26 de dezembro de 2001
A Reforma,
realizada de forma tópica, pretende deixar caracterizado um novo sistema de
recursos, minimizando os efeitos de um processamento formalista e moroso que,
ao menos nos Tribunais Civis do Estado de São Paulo, vem permitindo o
represamento de 300.000 feitos - dados de dezembro de 2001. Anote-se, ainda,
que o ano de 2001 apresentou fator sazonal que irá interferir na estatística,
qual seja, o movimento grevista de seus funcionários.
Por outro lado,
os Tribunais Superiores e os juízes federais, como um todo, não se apresentam
em situação melhor, revelando-se em torno de 6.000 processos nos gabinetes de
cada um dos desembargadores federais, em São Paulo. Resta saber se a Lei n.
10.259/01, que criou os Juizados Especiais Federais, irá minimizar o problema
do acúmulo, ao menos para as ações cíveis, até o valor de sessenta salários
mínimos (art. 3.º), excluídos os executivos fiscais (§ 1.º).
Crêem alguns
que a razão desses represamentos esteja na proliferação dos agravos de
instrumento; no excessivo número de recursos; no pagamento de custas irrisórias
para recorrer; outros, ao contrário, entendem que a razão está no processamento
burocrático dos feitos, sendo que bastaria a automação dos prazos e do
processamento para reduzir o Tempo do Processo (Walter Ceneviva, 2002).
Antes de
apresentar estas anotações, cabe reafirmar a lição de Kazuo Watanabe (1999)
quando, ao examinar a combinação das várias modalidades de cognição, antecipa
características da Reforma atual, no sentido de que: "... as limitações ao
direito do contraditório e, por via de conseqüência, da cognição do juiz, sejam
as estabelecidas em lei processual ou em lei material, se impossibilitam a
efetiva tutela jurisdicional do direito contra qualquer forma de denegação da
justiça, ferem o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional e por
isso são inconstitucionais (ofensa ao inc. XXXV do art. 5.º da CF 88; na
anterior, art. 153, § 4.º)". Extrai, ademais, da tutela constitucional do
processo, uma tríade baseada na busca de resultados efetivos na vida das
pessoas (efetividade), na agilização dos prazos (tempestividade),
um direito que seja justo aos cidadãos (justiça), para concluir que sem
esses predicados o sistema processual de qualquer país torna-se ilegítimo.
Sob o pálio
dessas lições, iniciam-se estas breves anotações à Reforma:
Art. 475
(Remessa obrigatória)
Sujeitam-se ao
duplo grau de jurisdição as sentenças proferidas contra a União, Estados e,
doravante, Distrito Federal, Município, autarquias e fundações de direito
público, revogado o inciso I, que a determinava na anulatória de casamento, sem
justificativa plausível após promulgada a lei do divórcio, conforme aponta o
atual Ministro da Justiça, em sua Mensagem.
De qualquer
modo, essa esdrúxula remessa - que não é recurso! - não se coaduna com
as novas conquistas da ciência processual, revelando-se demasia protecionista
que contradiz os princípios de economia e celeridade processuais, incentivando
tratamento desigual às partes. Proteção que vem sendo reiterada através de Súmulas
(45 STJ) ou mesmo da atividade de Procuradores-Gerais da União, desde os tempos
do governo Collor, com restrições à concessão de medidas cautelares; ampliação
às Fazendas do prazo da rescisória ou diante da concessão de efeitos
suspensivos, sempre à margem da lei processual. Aqui reside, talvez, a
explicação para a timidez do reformador, já que a exclusão deste artigo poderia
inviabilizar a própria Reforma.
O alcance da
expressão "proferida contra" abrange as decisões de extinção do
processo, sem apreciação meritória, acreditando-se que seu verdadeiro sentido
seja: "decisão contrária", aos entes enumerados, quer se apresentem
no processo na condição de autores ou réus (Gomes Júnior, 2002). Enquanto a
ampliação, visando autarquias e fundações de direito público, repete o
dispositivos da Lei n. 9.469/97.
Cândido
Dinamarco (2001), ao examinar a liquidação de sentença e a supressão do cálculo
do contador, alertava para o fato de que o juiz não deve arvorar-se em
"defensor da Fazenda Pública", que "...já tem tantos privilégios
tipo fascista no processo brasileiro", que não seria demasia desobrigar as
partes à manifestação sobre a conta, antes da citação. Sob todos os aspectos,
contudo, é excessiva a precaução de duplo grau obrigatório, uma vez que possuem
as Fazendas Públicas, bem como Estados, Municípios e Distrito Federal e suas
autarquias e fundações, com raras exceções, corpo de procuradores, concursados,
para fiscalizarem o andamento processual, ao contrário da maioria da população,
que deve recorrer à assistência judiciária. Assim, essa ampliação nada mais é
do que novo protecionismo, digno da legislação trabalhista do Estado Novo,
origem para o apelido: "fascista".
O inciso III do
art. 475 dizia: "julgar improcedente a execução da dívida ativa da Fazenda
Pública (art. 585, VI)"; agora alterada para: "julgar procedentes os
embargos à execução", em redação aprimorada).
O § 1º existia
na redação anterior - parágrafo único - com o mesmo caráter impositivo e
avocatório, apenas que acrescido agora da expressão "haja ou não
apelação", suprimido-se o último vocábulo (voluntária), realmente inócuo.
Bastante
razoável, dentro do sistema acolhido, a redação do § 2º, já que veda a
aplicação obrigatória do duplo grau se a dívida não exceder a 60 (sessenta)
salários mínimos - aqui, sem interferência da Lei n. 10.259/2001 - e,
fixados no momento da sentença, ainda que de maior valor, no momento do
ajuizamento (Gomes Júnior, 2002), ou nos casos de procedência dos embargos do
devedor, dentro do mesmo limite de 60 salários mínimos.
No § 3º,
talvez, a explicação para a publicação da Lei, durante os festejos natalinos:
inserem-se, de forma sub-reptícia, duas questões não pacificadas: a) da jurisprudência
dominante, nos Tribunais superiores e b) de suas súmulas
(vinculantes), impostas como razão de decidir. Apesar de voltadas
exclusivamente às Fazendas Públicas, não resta dúvida de que a estratificação
da jurisprudência, ou de interpretações sumuladas, poderá se constituir em
retrocesso, ao menos no nosso sistema civilista, codificado. Trata-se de
conseqüência plausível no da Common Law, em que a evolução dos costumes
é acompanhada por decisões sistematicamente adaptadas (leading cases), a
título de precedentes - com caráter legislativo. No sistema adotado pela
doutrina brasileira apresenta-se, desde logo, como dificuldade até mesmo ao
ensino jurídico, especialmente diante da inexpressiva aplicação do instituto da
uniformização da jurisprudência, agora retomado, através da remessa ao órgão
superior (art. 555, infra). Resta saber se, a partir do excessivo
número de recursos, poderá ocorrer ou um reiterado e pernicioso acomodamento ou
o puro e simples cerceamento de defesa, diante dos interesses do contribuinte e
da convicção dos juízes.
Consuma-se,
assim, de forma abrandada, a adoção das súmulas vinculantes, sem que haja
garantia efetiva à diminuição do número de recursos dirigidos às instâncias
federais, mesmo aqueles de caráter interno (agravos regimentais), por absoluta
falta de pesquisas, baseadas em dados confiáveis.
Em breve parêntese,
recordam-se a título de exemplo os recentes posicionamentos do STJ, quanto ao
alcance do Código de Trânsito Brasileiro, especialmente no que dizia ao art. 32
da LCP, em que apenas a persistência dos juízes acabou por derrubar
jurisprudência iterativa que insistia em considerar a falta de habilitação,
como infração penal, além de administrativa; ou mesmo o teor da Súmula n. 174
do STJ (v.g., arma de brinquedo), revogada.
Sob esses
aspectos, sempre oportuna a lição de Vítor Nunes Leal, ao definir súmula como:
"...um método de trabalho, um instrumento de autodisciplina do Supremo
Tribunal Federal...", que poderá servir para racionalizar os serviços
judiciários. E só! Não se admitindo possa tornar-se requisito para o manejo de
recursos ou, o que seria pior, para conduzir a convicção das Cortes estaduais
ou dos juízes de 1º grau.
Da mesma forma,
o conceito de jurisprudência dominante é fator que oscila, conforme a
composição do Tribunal e de seus órgãos fracionários: o que é dominante
hoje, não terá sido ontem e não o será amanhã. É necessário que a
jurisprudência seja cambiante, para não refletir apenas o desejo do Executivo;
servir de respaldo à instabilidade econômica do país ou impedir a evolução dos
costumes de um povo etc. O divórcio, ontem execrado, hoje é permitido, até mais
de uma vez. O grande exemplo da inutilidade da jurisprudência dominante ou de
uma interpretação engessada - digo, sumulada - deve ser buscado no
posicionamento de juízes como Edgard de Moura Bittencourt, especialmente no que
diz respeito ao concubinato, admitido, hoje, constitucionalmente, a título de
entidade familiar, de companheirismo. Por fim, anote-se que os votos vencidos,
raramente admitidos em publicações oficiais, ou por "comissões de
jurisprudência" dos Tribunais, vem submetendo as decisões inovadoras a um
verdadeiro controle ideológico. O colegiado, quando atuante, reflete as
diferenças de entendimento, que, em hipótese alguma, podem ser confundidas com
teimosia inútil.
Crê-se, pois,
que o posicionamento de alguns magistrados, contrário ao julgamento vinculante
ou à jurisprudência dominante, acabe por se constituir na única forma de
apreciar o teor duvidoso e, até mesmo, ditatorial da maioria das Medidas
Provisórias, usurpadoras da função legislativa, invasiva da atividade
judiciária ou à sanha legiferante do Executivo, que obriga constantes
interpretações.
O que engessa a
jurisprudência - tornando-a usurpadora e dominante - também é a estratificação
dos tribunais, com a excessiva permanência de seus membros, às vezes, por mais
de vinte anos! De outro lado, o que permite os avanços jurisprudenciais é a
modificação de composição de seus órgãos fracionários, o seu arejamento.
Art. 498
(Recursos ordinário e extraordinário. Prazo comum, e embargos infringentes)
A nova redação
merece aplausos, pois vem dirimir dúvidas e interpretações restritivas, quase
sempre ocorrentes. Na anterior, interpostos embargos, simultâneo aos recursos
extraordinário e especial, ficavam estes sobrestados até o julgamento daqueles.
Pelo novo dispositivo, "apenas após o julgamento dos embargos e
conseqüente publicação do acórdão será iniciada a contagem dos prazos para os
recursos extraordinário e especial, abrangendo todo o julgado", inclusive
na matéria não impugnada pelo embargante (Lenzi, 2002).
Ademais, o
acréscimo do parágrafo único evidencia que, em havendo decisão parcial de
unanimidade, não interpostos embargos infringentes, ao julgamento por maioria,
a data do trânsito destes será a inicial para interposição dos recursos.
Art. 515, § 3º
(Apelação - Conhecimento)
Extinto o feito
sem julgamento do mérito (art. 267), "o tribunal pode julgar desde
logo a lide, se a causa versar sobre questão exclusivamente de direito e
estiver em condições de imediato julgamento".
Dirão alguns
que dificilmente o feito estará pronto para imediato julgamento e que sempre
haverá o risco da supressão de instância, quer o tribunal o faça em situações
de instrução incompleta, quer diante de causa que não esteja madura para o
julgamento. Ocorre que o juiz singular, ao sentenciar, acolhendo preliminar,
nos casos elencados no art. 267, examina a matéria, preliminar e de mérito, e
sua discussão, isto é, desde que colocada a matéria como questão. Não
assim quando do indeferimento da inicial ou pendente a possibilidade de
apresentação de provas ou testemunhos.
Aponta
Dinamarco (2001) que, podendo ser concedida tutela antecipatória, a qualquer
tempo, "...inclusive no momento de decidir a causa ou até mesmo depois
da sentença, estando ainda o processo perante o juiz de primeiro
grau", há que se sujeitar a regra do exaurimento da competência a uma
outra "soberanamente superior, que é a garantia do acesso à justiça"
(p. 348 e 350). Também na hipótese do artigo em discussão, o acesso a uma ordem
jurídica justa é garantia que sobreleva àquela do duplo grau, atendidos os
princípios processuais da celeridade e economia, e sem desatender aos do devido
processo legal e do contraditório. Anote-se, ademais, que o princípio do
duplo grau não se inscreve na Constituição como garantia.
Ainda na lição
de Dinamarco (desde "Fundamentos" até o recentíssimo,
"Instituições"), examinados os pressupostos processuais e os
requisitos de regularidade do processo, existe o que ele denomina pretensão
bifronte, no julgamento, com ou sem apreciação do mérito, ou seja, negada a
pretensão ao julgamento de mérito, restará apreciar a outra pretensão, qual
seja, a do bem da vida. A satisfação daquela é dada pelo Estado-juiz, enquanto
a desta, pela parte. Assim, a pretensão insatisfeita - pelo não-ressarcimento
ao bem da vida - não pode estar submetida à exclusiva apreciação da pretensão
ao julgamento de mérito, negada em 1.º grau, e que, diante da integral
apreciação, irá atender à pretensão ao bem da vida, que, em 2.ª instância
desobrigará o retorno, determinado para preencher mera formalidade.
Por outro lado,
a vontade do legislador, de alguma forma, vem de encontro aos anseios de muitos
juízes, obrigados que estavam, ante a procedência do recurso, a novo
julgamento, após vencidos na preliminar, contrário ao próprio
convencimento. E, nada garante que, ao retorno, possa encontrar-se modificada a
composição da câmara ou turma e, por absurdo, antepor-se com nova contradição
preliminar entre os componentes.
A apreciação do
recurso é devolvida ao tribunal, por inteiro, desde que se trate de matéria de
direito, não padeça de exame qualquer fato pendente e esteja pronta para o
julgamento (não falte prova alguma), cabível o julgamento de mérito. Nada há no
sistema processual que impeça tal atividade, conforme se extrai da redação do §
2.º, do art. 515, visto que ao pedido ou a defesa, manejados em mais de um
fundamento, se acolhido apenas um, devolve a apelação o conhecimento dos demais
e, nada obstante não tenham sido objeto de apreciação meritória, acabam apreciados
pelo Tribunal, sem que se cogite de supressão de instância.
Ademais, não
procedem as críticas de que haja conflito entre este § 3.º e o caput do
art. 515, pois a matéria foi discutida, contestado o mérito, o juiz a ambos
examinou, concretizando o julgamento apenas da questão preliminar. Assim, o
pedido existe e foi examinado, não se tratando, à evidência, de decisão além ou
fora do pedido, em que não exercido o contraditório (arts. 128 e 460). No caso,
o mérito não foi acolhido, nada obstante impugnado. O que se busca
inegavelmente é instrumentalizar o processo, sem torná-lo escopo final da lide,
com prejuízo da apreciação do próprio direito material.
Aos críticos
(Silva, 2002), parece suficiente o retorno, para nova apreciação em 1.º grau,
por ter o magistrado optado pela solução processual, quando, na verdade, o
duplo grau é pressuposto do devido processo legal, desde que não existam os
impedimentos mencionados e sem que o acesso à Justiça acabe submetido a
trôpegos formalismos. Ante a morosidade e acúmulo de recursos nos Tribunais, o
retorno ao l.º grau representará sempre - pois que sairá da fila de
represamento, voltando em último lugar - quebra do princípio do acesso a uma
ordem jurídica justa, lembrado por Kazuo Watanabe (supra).
Art. 520, VII
(Efeitos da apelação)
O art. 520,
inciso VII, determina o recebimento da decisão que confirma a antecipação dos
efeitos da tutela, apenas no efeito devolutivo. Esperava-se, contudo
(Dinamarco e Mancuso, lembrados por Gomes Júnior, op. cit.) fosse este a regra
geral, permitida a execução provisória, ante a evidente morosidade do
processo, cujos princípios imbuem-se, cada vez mais, de ultrapassada retórica.
Reside o risco em que os tribunais continuem abarrotados por recursos buscando
o efeito suspensivo. Silvânio Covas (idem), em lúcida lição, mostra a incoerência
do legislador ao permitir, na antecipação da tutela em cognição parcial, a
execução sumária, enquanto que à sentença, de conhecimento exauriente, não!
Cândido
Dinamarco (2001) apontara, ante o sistema do art. 273, não ser outra a
conclusão, quanto aos efeitos de apelação interposta de decisão que antecipa a
tutela, diante da probabilidade de se evitar um mal
maior, devendo os juízes estar atentos às concessões liminares, que,
cassadas, poderão conduzir ao descrédito crescente da atividade do Poder
Judiciário. Ademais, ensina que, havendo concessão definitiva da tutela, na
mesma oportunidade do sentenciamento meritório, aquela será fato do passado,
que já precluiu, cabendo unicamente apelação, por se constituir em capítulo
da sentença, sem que haja qualquer possibilidade de interposição conjunta
de agravo.
Art. 523, §§ 2º
e 4º (Unifica prazos e disciplina o agravo retido)
A Reforma vai,
aos poucos, extirpando lacunas e equívocos, unificando prazos, como conseqüência
da intervenção legislativa tópica num sistema fechado. A nova feição do Agravo,
interposto diretamente às Cortes, espelha uma garantia superior aos direitos do
credor e enfatiza as obrigações do devedor, mostrando o equívoco do prazo de
cinco dias para ouvir-se o agravado, que afastava o tratamento igualitário das
partes no processo.
Por outro lado,
com referir a expressão "ouvido o agravado", enfatiza o legislador o
disposto no art. 526, que impõe ao agravante, diante da nova redação do seu parágrafo
único, o dever de, em três dias, requerer a juntada, aos autos principais, de
cópia da petição de agravo, bem como o comprovante de sua interposição e
relação de documentos que o instruam, sob pena de inadmissibilidade, desde que
o agravado requeira e comprove.
A partir de
1994, entendeu-se que essa atribuição seria mera faculdade - com algumas
exceções interpretativas, de doutrinadores e juízes; neste sentido,
o critério adotado pelo Primeiro Tribunal de Alçada Civil e pela maioria dos
componentes do STJ, conforme decidido no REsp 18135/SP, RSTJ 115:383, em que o
relator, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, também um dos responsáveis pela
Reforma, evidenciava revestir-se a determinação legal "de caráter
cogente", não ainda como requisito, mas como oportunidade de reapreciação
do decidido, pelo magistrado da decisão agravada e capaz de propiciar, à parte
contrária, o conhecimento da integralidade do recurso. Hoje, o não-cumprimento
dessa determinação importa em inadmissibilidade do recurso, não mais se
cogitando de mera formalidade. Ao acolher aquelas críticas, construtivas,
optou-se pela manifestação do magistrado, também como requisito para a
reapreciação pelo Tribunal, pois que, em sendo reformada a decisão, com
comunicação obrigatória ao Relator, impede-se o conhecimento do agravo,
desafogando os tribunais.
Resumindo, há
uma retomada parcial dos anteriores requisitos do recurso de Agravo,
permanecendo a dúvida sobre a rapidez e instrumentalidade apregoadas. Neste
sentido alguns processualistas entendem tímida a manutenção do
agravo, apenas mitigada pela conversão em retido, pois, no dizer de Dinamarco
(AASP, 2002) dever-se-ia: impedir o agravo em matéria de prova, qualquer que
fosse o procedimento; apenar o agravante que interpusesse o recurso proibido;
ou voltar ao conceito de irrecorribilidade das interlocutórias.
Com relação ao
§ 4º, a nova redação, ampliativa, impede que as decisões proferidas em
audiência, bem como as anteriormente previstas, posteriores à sentença, possam
ser objeto de agravo de instrumento, que deve permanecer retido. Retornam,
dessa forma, os mesmos requisitos de apreciação preliminar pelo Tribunal a
implicar em pedido expresso, enquanto a manifestação de interposição deve ser
escrita - ditadas e transcritas, no termo da Audiência agravada, ou grafadas
por certidão de inteiro teor pelo Cartório, quando se tratar de decisão
posterior à sentença; de qualquer forma, sem interferir na redação do item III
do art. 280, que já previa, no procedimento sumário, a forma retida ao
recurso.
Acresce-se que
poderá o relator converter o agravo de instrumento em retido, assim que
recebido aquele, salvo nas hipóteses excepcionadas (art. 527, II), de
dano de difícil e incerta reparação (ou nas de inadmitir-se apelação e, por
fim, quanto aos efeitos em que recebida esta).
Parece difícil
a ocorrência de decisões interlocutórias, proferidas em audiência, que produzam
males à pessoa, impedindo-a de receber o bem que lhe é devido, sendo
mais prováveis na hipótese em que o mal é causado diretamente ao processo
e só atingem indiretamente o sujeito (Dinamarco, 2001, p. 333). Essa lição,
ao enfatizar, talvez, a inaplicabilidade do agravo de instrumento que: a) ou
interrompe o fluxo procedimental; ou b) poderá ocasionar o perigo da dupla
decisão, conhecida a do agravo após proferida a sentença, em absoluto tumulto
processual, estaria propondo um retorno à irrecorribilidade das
interlocutórias, salvo na hipótese da decisão ocasionar um mal à pessoa?
Releva,
contudo, notar que a opção pelo agravo retido submete-o à regra geral dos
demais incisos do art. 527, passível também do agravo inominado (de Regimento, infra),
sob o risco de manejarem as partes o Mandado de Segurança.
Arts. 526 e 527
(Agravos e Requisitos - Poderes do Juiz)
A distribuição incontinenti
ao Relator proporciona razões de reclamação, por parte dos membros dos
Tribunais, no sentido de que têm o tempo, quase que por inteiro, tomado pela
apreciação e julgamento de Agravos, impedido o das Apelações. Esse fato
somente pode ser empiricamente observado, uma vez que não existem dados
estatísticos confiáveis, ou sequer lançamentos oficiais, que possam embasar
pesquisas ou estudos direcionados a essa assertiva ou a seus contrários, como,
por exemplo, a redução do número excessivo de mandados de segurança, com
caráter de recurso, além de outras matérias afetas ao funcionamento do Poder
Judiciário, capazes de justificar ou, simplesmente, evidenciar outras razões
para a morosidade da Justiça.
Ampliaram-se os
poderes do Relator, que poderá negar seguimento liminar ao agravo, nas
hipóteses do art. 557, cabendo, no dizer de Lenzi (2002), quando: a) manifestamente
inadmissível, já que não preenche os requisitos "necessários à
propositura, cabimento, legitimação, interesse, tempestividade, regularidade
formal e preparo"; b) improcedente (contra o entendimento
majoritário da Corte ou deduz matéria de cunho protelatório); e, por fim, prejudicado,
pois que perdido o objeto, reformada a decisão em primeiro grau ou por ter sido
a principal desistida, cabendo, se não conhecido ou se negado provimento, o
agravo inominado, previsto no seu § 1.º. A interposição desse recurso
(agravo de regimento) será dirigida à Câmara competente para o conhecimento. E,
se negado, liminarmente, pelo Relator (art. 798, RITJESP), caberia novo agravo
regimental ao Órgão Especial (art. 423, V, e 177, XII, ambos do RITJESP)?
Kazuo Watanabe entende que a única hipótese seria a de impetração de Mandado de
Segurança, sempre em casos excepcionalíssimos, e perante o próprio Tribunal.
A hipótese do inciso
II do art. 527 - conversão do agravo de instrumento em retido - deverá
ser usada com moderação e de forma justificada, salvo exceções (provisão de
urgência ou perigo de lesão) - pois implicam a remessa do recurso para
apensamento aos autos principais, no Juízo de origem; dessa decisão igualmente caberá
agravo regimental, na forma explicitada e, eventualmente, ao Órgão
Especial etc. (supra). Essas circunstâncias demonstram a
possibilidade (remota ou absurda) de ser o agravo - em qualquer de suas formas
- objeto da decisão de reforma, em 1º grau, e de até três apreciações
liminares, em 2a. instância.
Adequada se
mostra a redação do inciso III, que permite ao Relator atribuir efeito
suspensivo aos recursos previstos nas hipóteses do art. 558 (prisão civil,
adjudicação, remição de bens, levantamento de dinheiro sem caução etc.), desde
que requerido pelo agravante, além dos casos previstos no art. 520 (efeitos do
recebimento da apelação), ora acrescido do inciso VII (supra). Ademais,
poderá determinar a suspensão do cumprimento da decisão agravada até
pronunciamento definitivo da Câmara ou Turma, se igualmente requerido.
Prossegue
relevante a discussão sobre a concessão do efeito suspensivo ativo, pelo
relator, que suspende os efeitos da decisão agravada ou concede medida de
urgência de antecipação de tutela recursal (cf. Dinamarco, Lenzi e Gomes
Júnior, op. cit.), já que o STJ vinha entendendo que a decisão que
denega liminar não tem conteúdo executório mandamental, sendo de nenhuma valia
conferir-se efeito suspensivo a tal agravo; porém a jurisprudência o admitia,
ante o raciocínio, dentre outros, de que o que era possível ao juiz singular
não poderia ser negado ao colegiado, pois a decisão deste "torna positiva
a pretensão denegada" (TJSP - Ag. Inst. n. 52.168-4-SP, Rel. Des. Octávio Helene, j. 4-9-1997, JTJ
203:238).
A recusa em
conceder efeito suspensivo afasta o manuseio do mandado de segurança? Ou
contraria flagrantemente o espírito da Reforma, ainda que não mais se revista
de eficácia e rapidez, ante o represamento de feitos, nos Tribunais de São
Paulo?
A requisição
facultativa de informações, ao Juízo a quo, reveste-se de importância
ante a nova redação do art. 526 (supra), praticamente tornando-a
obrigatória, podendo a morosidade ser afastada pela utilização de todos os
meios eletrônicos possíveis, em análise extensiva da Lei n. 9.800/99 (Lei do
Fax).
As
circunstâncias expressas nos incisos II e V referem providências de caráter
instrumental, úteis à intimação e processamento, enquanto o item VI reitera a
obrigatoriedade de manifestação do MP (art. 82 do CPC), sob pena de nulidade.
Art. 530
(Embargos Infringentes)
Em recente
palestra, Cândido Dinamarco (2002) manifestou-se absolutamente contrário a que
se mantivesse o recurso de Embargos Infringentes, uma vez que estabelece uma terceira
instância ordinária. No dizer de outros (Cavalcanti, 2002), basicamente, a
Reforma retoma o disposto no art. 833 do Código de Processo de 1939, alterado
pelo Decreto-Lei n. 8.570/46, quando a modificação da sentença, por maioria,
deixou de ser requisito aos Embargos, prevalecendo apenas a falta de
unanimidade da decisão colegiada, em sede de apelação, ou nos casos de
procedência da ação rescisória, também aceita pelo Código de 1973,
desprezando-se a hipótese de, ao examinar apelação, confirmar sentença, por
maioria, havendo, então, duas decisões no mesmo sentido. Agora, além de ser
interposto contra sentença de mérito, será necessário que o Acórdão embargado a
reforme. Contra julgado confirmatório de sentença, mesmo de mérito, não serão
cabíveis embargos infrigentes, ou que dêem pela procedência da rescisória.
No dizer de
Gomes Júnior (2002), é claro o sentido de prestigiar o Juiz a quo,
visto que, no sistema anterior, somando-se à sentença dois votos concordantes,
apenas o dissonante era suficiente ao manejo dos Embargos. Doravante, a
dissonância há que se refletir na reforma meritória da sentença para utilização
do recurso ou na improcedência da rescisória.
Prestigia-se o
julgador de 1.º grau no exame do mérito, afastadas as intermináveis discussões
de teses processuais, sempre utilizadas em prejuízo do direito material das
partes. Acresce observar a nova redação do art. 531: "Interpostos os
embargos, abrir-se-á vista ao recorrido para contra-razões; após, o relator do
acórdão embargado apreciará a admissibilidade do recurso", providências
que, se de um lado instituem sadio juízo de admissibilidade, que melhor
resguarda o tratamento igualitário às partes e ao contraditório recursal, de
outro implicarão maior atraso do julgamento definitivo em 2.º grau, através da
intimação dos advogados (ou das partes?), com prazo para manifestação,
controlado pelas unidades judiciárias, sobrecarregadas.
Admitidos os
embargos, o processamento (arts. 533, 534 e 542) e julgamento dar-se-ão na
forma e com a composição determinada pelo respectivo Regimento Interno do
Tribunal, o mesmo ocorrendo com a intimação do recorrido.
Art. 544
(Agravo, diante da inadmissão de recursos extraordinário e especial)
Ao elencar os
requisitos instrutórios do agravo, avulta a autenticação das peças por declaração
dos próprios advogados, evidente que permitida a impugnação da parte
contrária sobre a autenticidade, em petição dirigida ao presidente da Corte e
independente do pagamento de custas ou despesas postais, já adiantadas quando
da interposição do recurso (art. 511 do CPC). A autenticação pelo próprio
advogado representa um avanço na direção de uma visão publicista do processo,
em detrimento daquela privatista, sempre mais formal e distante dos interesses
de ordem pública, e que obriga um repensar da atividade dos lidadores do
Direito, a partir da boa-fé, presumida (como no caso de inquirição de
testemunhas, pelos próprios advogados ou pelos membros do Ministério Público,
ante o progresso dos meios de comunicação e reprodução - vídeos etc.).
O § 2.º impõe a
imediata resposta do agravado e não depende de qualquer juízo de
admissibilidade pelo Presidente do Tribunal estadual, para a subida do recurso
ao Tribunal superior, onde será processado: mesmo quando, p. ex., seja
intempestivo o recurso?
Art. 547
(Descentralização do protocolo recursal)
A modificação
incluída no Capítulo "Da Ordem dos Processos no Tribunal" demonstra
que o acréscimo ao art. 547 permite a criação extensiva de serviços de
protocolo recursal, mediante delegação a ofícios de justiça, em 1º grau. A
medida vem facilitar a interposição de recursos, ampliando o acesso à Justiça,
especialmente para advogados de comarcas interioranas ou mesmo residentes nas
grandes capitais. A descentralização é sadia e, em Comarcas populosas ou
Estados de larga extensão, poderá ampliar-se aos foros regionais e distritais.
Ocorre, porém, que a interposição deve ser objeto de imediata e eficaz remessa
ou comunicação ao Tribunal estadual, evitando-se seja certificado o trânsito em
julgado, havendo recurso pendente, aqui também por aplicação e regulamentação
racional da Lei do Fax, pelos Tribunais.
Art. 555
(Composição e julgamento da Apelação e do Agravo - Remessa a órgão superior)
A composição
para o julgamento de apelação ou agravo, por três juízes, sem especificar a
presença de revisor, conforme constava da redação anterior, parece salutar,
pois não há por que considerar o agravo menos importante. Contudo, a experiência
de judicar em 2.º grau demonstra que a credibilidade, entrosamento e
confiança, inerentes ao julgamento colegiado, podem encaminhar à rapidez
ou, dependendo da composição, obrigar ao sistemático pedido de vista de
autos, com prejuízo à celeridade.
Nas hipóteses
do § 1.º, já previstas em Regimentos Internos dos tribunais, retorna-se à
uniformização de jurisprudência, desprestigiada por sua complexidade e
minudência (art. 644 usque 656 do RITJESP). A simplificação determinada
poderá facilitar uma verdadeira uniformização, desde que não sirva a escusos
interesses de retardamento ou preguiça - com inútil paralisação do feito, ante
a remessa ao órgão superior (Especial, onde houver, ou Plenário) por parte de
relatores desavisados.
A atenção
especial, dispensada à questão relevante, é endereçada àquela que
repercute não só no próprio Judiciário como perante a sociedade, a partir de
interpretação constitucional ou ao tentar prevenir divergências entre as
Câmaras ou Turmas dos tribunais, impondo-se a decisão "como precedente
jurisprudencial, o qual deverá ser levado em conta nas matérias homogêneas
subseqüentes" (Lenzi, op. cit.). Aqui seria conveniente recordar as ações
que envolvem professores; policiais militares; ações coletivas de meio
ambiente e consumidores; aquelas com extensa repercussão na Economia, etc. O interesse
público obriga a presença do Ministério Público, sob pena de nulidade.
Trata-se de
iniciativa exclusiva do relator, podendo a parte requerer ou sugerir, em
preliminar, a apreciação do recurso. Negado, não caberá qualquer recurso,
inexistindo juízo de admissibilidade à Câmara ou Turma.
No Estado de
São Paulo, será dirigido às Seções de Direito Privado ou Público, sendo que, em
matéria processual, conveniente será a união de ambas para fixar orientação
dominante, como nas hipóteses de argüição de incidente de inconstitucionalidade
(Erasmo Valladão França, 2002).
Tratar-se-ia de
uniformização que antecede a formação de jurisprudência dominante ou de súmula?
Sua regulamentação regimental não pode ser semelhante, v.g., à do
Tribunal de Justiça de São Paulo, já que, sem dúvida, ocorrerá retardamento à
decisão e formalismos insuperáveis. A devolução ao órgão originário, mantido o
relator, deve ser objeto de regulamentação objetiva e rigorosa, admitido o
juízo prévio de admissibilidade, pelo relator designado, junto ao órgão
superior, em prazo exíguo.
Direito
Intertemporal
Alerta Cândido
Dinamarco (2001), sobre "a preservação das situações jurídicas consumadas
sob o império da lei antiga" mas, também, quanto a "eficácia dos atos
já realizados no processo" (p. 59, g.n.), a nortear os
aplicadores da Reforma, além do que, em matéria de processo, está-se no campo
da ordem pública e não no da disponibilidade das partes ou do juiz, porque sua
aplicação diz respeito ao funcionamento do próprio Poder Judiciário.
O mesmo autor
exemplifica com retroatividade legítima, p. ex., nas disposições que
impedem a remessa obrigatória, e ilegítima, naquelas que impõem sanção
ou multa.
II -
Comentários à Lei n. 10.358, de 27 de dezembro de 2001
Alfredo Buzaid
já advertira, na Exposição de Motivos do Código de 1973, que: "Posto que o
processo civil seja, de sua índole, eminentemente dialético, é reprovável que
as partes se sirvam dele, faltando ao dever da verdade, agindo com deslealdade
e empregando artifícios fraudulentos, porque tal conduta não se compadece com a
dignidade de um instrumento que o Estado põe à disposição dos contendores para
atuação do direito e realização da justiça". Dessa forma, impunha-se
ou pretendia-se um regime de austeridade não só às partes como a seus
procuradores e a todos os lidadores do direito.
Assim, no
processo de conhecimento, o conceito de litigância de má-fé, com aplicação de
multa, retira-lhe o caráter de indenização - que permanece nos arts. 16 a 18, a
título de perdas e danos - que a tornava inexeqüível, pois, quando e se
aplicada pelos juízes, via-se constantemente reformada pelos tribunais.
Na execução
forçada, o princípio dos atos atentatórios à jurisdição, que impedia a parte de
falar nos autos, molestava a observância do devido processo legal e do
contraditório. As Leis n. 8.952 e 8.953/94, além da 9.668/98, mitigaram tais
excessos, modificando os arts. 18, caput, e § 2.º, e 601, tendo
Dinamarco (2001) saudado a inclusão de "norma processual", que tornou
explícita a efetivação dessa responsabilidade (p. 63). Na atual redação do art.
600, a substituição por multa, fixada pelo Juiz e que reverte, desde logo, ao
exequente, é exigível nos próprios autos, o que tornará a punição imediata e
eficaz.
Art. 14,
inciso V e parágrafo único (Litigância de má-fé. Procedimento)
Seria correto
interpretar que a Reforma afasta o advogado, expressamente, dos deveres
elencados no art. 14, indicando-lhe o caminho - previsto na nova redação do seu
parágrafo único - de mera submissão aos "estatutos da OAB", ou será
que, ao ampliar (caput) o alcance para "todos aqueles que de
qualquer forma participam do processo", prevaleceria, apesar de absurda,
apenas ressalvada a hipótese do inciso V?
A interpretação
do Código é produto de um sistema, assim como o é a redação de qualquer artigo
de lei. Quando o art. 14 envolve a todos os lidadores do
Direito, o faz com extensão aos advogados e procuradores, sem excluir terceiros
intervenientes (assistentes simples); representante legal de incapaz e pessoas
jurídicas ou advogados que recebem por substabelecimento poderes de
representação (Moreira Reis, 2002).
Abrange, assim,
as "autoridades" dos demais Poderes, que de forma reiterada
desrespeitam impunemente as decisões judiciais (Hage, 2002).
Enquanto a
multa de até 20% sobre o valor da causa, no inadimplemento, acaba inscrita como
dívida ativa e será cobrada com as facilidades do Executivo Fiscal, sem omitir
outras sanções e com extensão aos agentes públicos.
O inciso V
admite expressamente a existência de provimentos mandamentais
(Watanabe, 2002), expressão que abrange as eficácias cognitiva e executiva, no
dizer de Moreira Reis (2002), fazendo-as conviver "...num só comando, de
sorte que a decisão mandamental, sobre valer como título executivo, legitima
desde logo o uso de meios coercitivos contra o obrigado, para que este cumpra
imediatamente o decidido". Evidente, ademais, que nestas se inclui a tutela
antecipatória dos efeitos da sentença. Assim, as partes têm o dever de cumprir
os provimentos mandamentais e sentenças, enquanto que todos têm o
dever de não embaraçar o andamento processual, como furtar-se ao dever de
depor e cumprir determinações judiciais, não podendo postular de forma ilegal
ou tumultuar o procedimento.
Desarrazoado,
então, pensar estivessem excluídos os advogados dos preceitos do art. 14, e seu
parágrafo único, pois que, a com isto se concordar, ao órgão de classe caberia
julgar os atos praticados no processo pelo litigante de má-fé, à evidência, de
forma invasiva à mera atividade administrativa e ética que lhe é deferida pelo
sistema estatutário, delegado pelos membros da classe, enquanto os demais
lidadores, nestes incluídos juízes e promotores de justiça, estariam submetidos
à punição processual, determinada pelo Estado.
Os atos do
processo e da audiência permanecem sob o controle dos juízes, caso contrário os
deveres estariam integralmente despidos de sanção - tornando a lei inexeqüível
e inócua.
O princípio do
art. 133 da CF determina que o advogado é indispensável à administração da
justiça e "inviolável por seus atos e manifestações no exercício da
profissão, nos limites da lei". Logo, ele é partícipe obrigatório do
processo, ainda que não responda pelos atos do mandante (art. 1.313 do CC).
Abrem-se contudo ressalvas se os pratica por iniciativa própria, como nos casos
do art. 34, VI, X, XIV e XVII, do Estatuto dos Advogados. A interpretação
corrente, ademais, posiciona-se no sentido de que a inviolabilidade se aplica à
própria atividade de defesa dos interesses do cliente, quando não poderá ver-se
tolhido na defesa de seu constituinte, nada obstante suas manifestações -
conquanto essenciais à administração da Justiça - tenham como parâmetro não
invadir a esfera do ilícito penal ou da agressão à honra de terceiros,
sendo-lhe vedada a instalação do tumulto cartorário ou no processo, ou o
desrespeito aos provimentos mandamentais. Considerados, reitere-se, como
atentatórios à jurisdição, sem prejuízo da aplicação de outras sanções:
criminais, civis e processuais, que, por suposto jamais poderiam ser aplicadas
pelo respectivo órgão de classe.
O que se
pretende com a ressalva do parágrafo único - crê-se - é impedir que os
advogados, na transgressão ética, possam ser submetidos a atos correcionais,
impostos por magistrados, atos que poderiam ser passíveis de constituir
manifestações de mesquinharia ou vingança. Enfatiza o legislador que, sob este
aspecto, submetem-se exclusivamente ao respectivo Estatuto.
Multas e
sanções por perdas e danos serão aplicadas às partes, independentemente do
resultado da demanda, podendo aquelas ser aplicadas em qualquer grau de
jurisdição, pelo juiz singular ou pelo relator, em exame preliminar, ou como sugestão
à Câmara ou Grupo.
Art. 253
(Competência Funcional - Distribuição do feito, por dependência)
A medida é
ética e moralizadora, por basear-se na igualdade de todos perante a
lei e o processo, visto ser corrente nos fóruns a prática de manobras espúrias
visando afastar o juiz natural, ao distribuir o litigante desleal inúmeras
ações idênticas até atingir-se, através da concessão de liminar ou ante a
desistência das Varas indesejadas, a "coincidência" da distribuição
ao juízo que melhor atenda aos interesses das partes, ou seus advogados. Essa
circunstância é comum, inclusive, junto aos tribunais, apesar do uso, na
generalidade, do sorteio eletrônico.
Trata-se de
fazer valer o princípio do juiz natural e, não apenas, de atender às hipóteses
de conexão, para evitar decisões conflitantes. Neste sentido, já se antecipara
a Instrução Normativa n. 22, de 21 de agosto de 2000, do Tribunal Regional
Federal da 1.ª Região. Por outro lado, exemplifica-se com a ocorrência da
distribuição simultânea de diversas ações, todas sem procuração ou recolhimento
de custas, havendo despacho pelo juízo do interesse, quando, então, nem
sequer será necessário desistir das demais, ante a obrigatoriedade do decreto
de extinção (Lima, 2002). Crê-se, no entanto, que a rigorosa fiscalização e a
automação centralizada da distribuição poderão evidenciar a competência
precedente, além da má-fé, visando preencher "a casa" indesejada,
considerada como atentatória à jurisdição.
A interpretação
dos incisos I e II, obrigando a distribuição por dependência, quando sejam as
ações conexas (comum o objeto ou a causa de pedir - art. 103); ou em que haja
continência (identidade de partes e causa de pedir, podendo ser o objeto de
uma, mais amplo, abrangendo o das outras - art. 104) ou onde ocorra a desistência,
sendo o pedido reiterado, tornam evidente tratar-se de competência absoluta,
suscitável a qualquer tempo, declarando-a o juiz, de ofício, visto que
implica, mesmo havendo litisconsortes, na dependência. Essas circunstâncias
obrigam redobrada atenção da parte ré, se argüida a incompetência, aliás
desnecessária.
Caberá, também,
nos casos de abandono da causa (art. 267, III), dificilmente
verificável, antes de atingir-se o objetivo vedado.
Está o
Distribuidor obrigado - passível de sanção pecuniária, por ato atentatório à
jurisdição - a informar qual a primeira ação distribuída e qual o Juízo
prevento para a apreciação das demais, pois que, ao sortear será possível criar
mecanismos que indiquem o juízo que aos demais precede.
Art. 407 (Da
produção de prova testemunhal)
Melhor
regulamentado o prazo para apresentação do rol de testemunhas, com tempo
suficiente para o cumprimento de eventual intimação por Oficial de Justiça e
para que o advogado - em contato com a parte - possa aparelhar sua defesa, ou
impugnar e contestar qualquer dos testemunhos arrolados.
Esse ato não
poderá ser praticado no dia do início - leia-se dia de encerramento,
dia limite - através do protocolo integrado. Se assim concretizado, no dia
limite do prazo de dez dias, importa verificar se a juntada se deu com menos de
dez dias antes da audiência e, portanto, sem condições para que o Cartório
possa intimar as testemunhas. Os dez dias são integrais, especialmente para
providências cartorárias, como expedição de mandado e seu cumprimento, não
podendo ser reduzido por expediente da parte, que dele irá beneficiar-se ante o
adiamento, vez que os prazos tratam de matéria de ordem pública, não submetida
à vontade ou ao interesse das partes ou do juiz. Exemplo: protocolada em
Cartório a petição no dia 17 e designada audiência para o dia 27, o prazo
terá sido rigorosamente observado.
Não havendo
tempo hábil - isto é dez dias integrais - para aquelas
providências, ou bem são as testemunhas apresentadas pela parte,
independentemente de intimação, ou a prova corre o risco de ser declarada
preclusa.
Arts. 431;
431-B e 433 (Da Prova Pericial)
Restabelece-se
o contraditório - que restara prejudicado, ante a revogação dos arts. 430 e
431, pela Lei n. 8.455/92, sendo que o primeiro previa a conferência entre
peritos e assistentes, para lavratura de laudo unânime, enquanto o 431
estipulava condutas, no caso de haver divergência entre eles. Ambos
revelaram-se inócuos, porém a pura e simples revogação amesquinhara o princípio
do devido processo e o exercício regular do contraditório.
A atual redação
apresenta oportunidade para que os interessados participem, desde o início, da
colheita de prova, em diligência designada pelo Juiz, ou indicação de data e
local pelo perito.
É verdade que o
art. 425 poderia ter sido revogado, pois representa retardo e formalismo
excessivos, uma vez que se prevista a possibilidade de acompanhar diligência de
produção da prova, com a apresentação de quesitos diretamente ao perito,
inegável que as partes ficam, desde logo, cientes.
Da mesma forma,
a possibilidade, agora admitida expressamente, de tantas perícias quantas forem
as matérias ou sua complexidade, era expediente adotado pelos juízes e
resultava de apreciação cuidadosa das questões debatidas. Coloca-se apenas a
dificuldade de, ante diversos peritos, chegar-se a um consenso sobre datas para
início de diligências - acrescidas do rigor formal do citado art. 425.
A designação de
data pelo Juiz, quando possível e consultados os peritos, virá solucionar, ao
menos em parte, essa espécie de dificuldade, devendo ser evitada a prática de
atos dependentes da burocracia dos cartórios, atualmente sobrecarregados pelo
número assustador - ao menos nas Capitais e Comarcas de porte - de ações em
curso (em torno de 7.000, nas Varas Cíveis da Capital). Ademais, deverá ser
incentivada a aplicação do art. 427, que estende os poderes do Juiz na
dispensa da prova pericial, substituindo-a por parecer técnico ou prova
documental.
Ao cabo, não
está impedida a colheita de prova em Juízo, designando o magistrado data para
realização em Cartório (p. ex., coleta de sangue para exame de paternidade;
prova grafotécnica etc.).
A nova redação
do parágrafo único do art. 433 retoma o compromisso do legislador com as
garantias da ampla defesa e do contraditório, substituindo-se a diligência das
partes pela intimação para que se manifestem sobre a apresentação do laudo.
Esta providência, dependendo da natureza ou complexidade da prova pericial pode
ser objeto de determinação do perito, comunicada aos assistentes sobre a data e
horário da entrega do laudo em Cartório, que, por sua vez, comunicarão aos
patronos das partes, sempre observado o prazo fixado pelo Juiz para audiência e
os vinte dias que a antecedem.
A instrumentalidade
do processo - princípio enaltecido por doutrinadores e acolhida pela
jurisprudência - representa um compromisso de todos com a agilização,
economia e boa-fé processuais, pois que todos são responsáveis pela
dignidade da Justiça e operosidade da jurisdição. Inadmissível, dessa forma,
seja a prática de atos processuais revestida de excessivas cautelas, capaz de
tisnar a dignidade de seus lidadores. A palavra do perito, sobre ter efetivado
a comunicação da diligência aos assistentes, não pode implicar a desconfiança
de que estes deixem de se comunicar com os respectivos patronos das partes. A
facilidade de comunicação, por telefonia celular, gravações, meios eletrônicos
e outras conquistas da modernidade, deve ser utilizada com rigor e emprestar
credibilidade ao desenvolvimento dos atos processuais, o que seria facilmente
desburocratizado pela "automação dos prazos".
Arts. 575, IV, e 584, III e VI
- Juízo Arbitral
O legislador
processual sacramenta a figura do Juízo Arbitral, previsto na Lei n. 9.307/97,
ao consagrar o caráter de título executivo à sentença do árbitro, o que
já antes fora previsto pelo art. 31 da citada lei, remetendo-se a execução de
sentença arbitral ao juízo cível competente; a nova redação do art. 575,
unifica a sistemática dos incisos (III, revogado, e IV, atual).
O
reconhecimento pelo STF da constitucionalidade, ainda que por estreita margem
de um voto, do art. 18 daquela lei, que considerou o árbitro juiz de fato e
de direito, representa decisivo passo na direção da quebra do monopólio da
jurisdição, antes que a busca de meio alternativo à solução de litígios. Cabe
lembrar na oportunidade o tumulto - até recente data - da admissão dos
"juízes" classistas, cuja atividade nefasta se faz sentir não apenas
na inutilidade de suas presenças, como junto ao Tesouro, pois que, logo
adquiriram as vantagens da magistratura, de seus vencimentos, não, jamais, de
sua operosidade!
Fatos rumorosos
começam, desde logo, a envolver a aplicação daquela lei, constatados pela
confecção de títulos e carteiras funcionais falsas, adquiridas por elevado
custo e com tipificação de estelionato, por pessoas que pretendem assumir a
categoria de juiz, sem demonstrar a mínima capacitação, verificável por
concurso público, constitucionalmente previsto.
Nada obstante
possa, ao longo do tempo, surgir como panacéia para desafogar as instâncias,
especialmente para as contendas entre empresas transnacionais que, de há muito,
não mais recorrem à jurisdição ordinária, uma última observação merece
destaque, neste momento em que diversos segmentos da sociedade se arvoram em
controladores do Judiciário: quem irá controlar o árbitro e garantir tratamento
igual e desinteressado às partes? Os próprios demandantes? E se houver entre
eles enorme diferença de poder econômico?, para evidenciar o menos...
O art. 584,
inciso III, recebe redação ampliativa e admite o reconhecimento de título
executivo às homologatórias de conciliação - previstas na Lei n. 9.099/95, dos
Juizados Especiais (art. 57) - e às de transação, ainda quando versarem matéria
não posta em Juízo. As decisões homologatórias de conciliação e transação
representam avanço no atingir-se a desejada instrumentalidade do processo, sem
que se apresentem, ao contrário da arbitragem, como invasivas às atribuições próprias
da jurisdição, uma vez que são atividades que se desenvolvem, até mesmo com o
auxílio de leigos, sempre submetidas à fiscalização pelo Poder Judiciário.
Por fim, a
inclusão da sentença arbitral, acrescida pelo item VI do art. 584, igualmente,
representa o reconhecimento oficial da atividade, no sistema processual.
Conclusão
As reformas
serão sempre bem-vindas. Assim foi com a Lei dos Juizados de Pequenas Causas e
prossegue com a dos Juizados Especiais. Releva contudo notar que, ao menos no
Estado de São Paulo, para instrumentaliza-las é necessário que o Tribunal de
Justiça regulamente seu funcionamento, criando infra-estrutura cartorária
adequada e incentivos à carreira dos magistrados que desenvolvem sua atividade
após o período normal de exercício nas Varas.
De pouco
adiantará a vontade do legislador, dirigida à simplificação dos procedimentos e
dos recursos, se novas investidas tumultuárias e de interpretação insistirem em
amesquinhar o caráter de agilização e economia processuais. Se o Executivo
prosseguir legislando através de Medidas Provisórias, incentivadoras da
litigância e dos recursos, e se não houver a tão aguardada mudança de
mentalidade dos juízes, que passa, antes de mais nada, pelo reconhecimento de
que o direito material tem sido relegado a plano inferior, diante das questões
processuais, tornando eficaz o acesso à Justiça, prosseguirão inutilmente as
discussões, como a da possibilidade do julgamento meritório, permanecendo
sentenças e acórdãos nas fímbrias das preliminares, com a denegação pura e
simples de Justiça, que melhor atende ao caos do represamento de recursos em
2.º grau. Este será considerado, durante muito tempo ainda, a razão primeira da
morosidade e do descrédito da Justiça, apresentando-se como fator
essencial à retomada da litigiosidade contida e, via de conseqüência, do
incentivo à violência.
A busca de
meios alternativos, a automação dos prazos, a multa ou a punição do litigante
que atenta contra a jurisdição, a cobrança de justas custas ao recurso, dentre
outras, são ou poderiam se constituir em tentativas de melhorar a prestação
jurisdicional, porém mais necessário e urgente será garantir efetivo acesso a
uma ordem jurídica justa, através da interpretação desarmada das novas leis.
Dentre estas, somam-se as que se identificam como de interregno às
reformas. A de n. 9.800/99 dirige-se ao aproveitamento processual dos meios
eletrônicos (no Tribunal de Alçada Criminal de SP são aceitas impetração e
informações em habeas corpus, por fax, enquanto o veto aposto à
ampliação do art. 154 do CPC, fundado na Medida Provisória n. 2.200 (Chaves
Públicas), impediu as intimações e citações através de meios eletrônicos); por
sua vez, a Lei n. 10.173/2001 dispôs, de forma justa, sobre a preferência
concedida aos idosos para consumação dos atos processuais.
Por fim, a
mudança de mentalidade passa, obrigatoriamente, pelas Escolas de Profissionais,
quer na formação quer no aperfeiçoamento dos lidadores do Direito. A criação de
Juizados Especiais junto às Universidades representa um primeiro passo para a
modernização do ensino jurídico, e este é um dos objetivos que devemos buscar,
de forma incessante.
Nota Bibliográfica
Watanabe, Kazuo. Da cognição no
processo civil. 2. ed. CEBEPEJ/Central de Publicações Jurídicas, 1999, p.
118.
Gomes Júnior, Luiz Manoel. A lei n.
10.352, de 26.12.01 - Reforma do CPC - Alterações na remessa obrigatória e no
processamento dos recursos cíveis. Repertório de Jurisprudência IOB, n.
2/2002 - Rio de Janeiro, Caderno 3, p. 56 e s.
Dinamarco, Cândido Rangel. A reforma
do Código de Processo Civil. 5.ª ed., São Paulo, Malheiros Ed.
________. Instituições de direito
processual civil. 1.ª ed., São Paulo, Malheiros Ed.
________. Fundamentos do processo
civil moderno. 2.ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais.
Lenzi, C. A. Silveira. Novas
alterações no CPC - in www.teiajuridica.com/mz/novaltr.htm.
Silva, Mathias Magalhães. Lei n. 10.352:
Introdução do § 3.º ao art. 515 do Código de Processo Civil. Conflito normativo
com as disposições concernentes ao recurso de apelação e a supressão do duplo
grau de jurisdição - Jus Navigandi, n. 54 (internet)
http://www1.jus.com.br.
Moreira Reis, Nazareno César. As
inovações processuais da Lei n. 10.358/01, Jus Navigandi, n.54
(internet) http:// www1.jus.com.br.
Hage, Jorge. Lei n. 10.358: ações
mandamentais e "contempt of court" no CPC - in www.
teiajuridica.com/mz/refart14.htm
Lima, George Marmelstein. A livre
distribuição à luz da lei n.10.358/01, Jus Navigandi, n.54 (internet)
http://www1.jus.com.br.
Retirado de: www.saraivajur.com.br