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Anotações sobre as mais recentes alterações ao Código de Processo Civil

 

Caetano Lagrasta Neto

 

Juiz do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo e Secretário-Executivo do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais

 

Palestra proferida no dia 15-3-2002, em Campinas, a convite do Centro de Estudos da Associação Paulista dos Magistrados, por seu Diretor, Dr. Richard Pae Kim

I - Comentários à Lei n. 10.352, de 26 de dezembro de 2001

A Reforma, realizada de forma tópica, pretende deixar caracterizado um novo sistema de recursos, minimizando os efeitos de um processamento formalista e moroso que, ao menos nos Tribunais Civis do Estado de São Paulo, vem permitindo o represamento de 300.000 feitos - dados de dezembro de 2001. Anote-se, ainda, que o ano de 2001 apresentou fator sazonal que irá interferir na estatística, qual seja, o movimento grevista de seus funcionários.

Por outro lado, os Tribunais Superiores e os juízes federais, como um todo, não se apresentam em situação melhor, revelando-se em torno de 6.000 processos nos gabinetes de cada um dos desembargadores federais, em São Paulo. Resta saber se a Lei n. 10.259/01, que criou os Juizados Especiais Federais, irá minimizar o problema do acúmulo, ao menos para as ações cíveis, até o valor de sessenta salários mínimos (art. 3.º), excluídos os executivos fiscais (§ 1.º).

Crêem alguns que a razão desses represamentos esteja na proliferação dos agravos de instrumento; no excessivo número de recursos; no pagamento de custas irrisórias para recorrer; outros, ao contrário, entendem que a razão está no processamento burocrático dos feitos, sendo que bastaria a automação dos prazos e do processamento para reduzir o Tempo do Processo (Walter Ceneviva, 2002).

Antes de apresentar estas anotações, cabe reafirmar a lição de Kazuo Watanabe (1999) quando, ao examinar a combinação das várias modalidades de cognição, antecipa características da Reforma atual, no sentido de que: "... as limitações ao direito do contraditório e, por via de conseqüência, da cognição do juiz, sejam as estabelecidas em lei processual ou em lei material, se impossibilitam a efetiva tutela jurisdicional do direito contra qualquer forma de denegação da justiça, ferem o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional e por isso são inconstitucionais (ofensa ao inc. XXXV do art. 5.º da CF 88; na anterior, art. 153, § 4.º)". Extrai, ademais, da tutela constitucional do processo, uma tríade baseada na busca de resultados efetivos na vida das pessoas (efetividade), na agilização dos prazos (tempestividade), um direito que seja justo aos cidadãos (justiça), para concluir que sem esses predicados o sistema processual de qualquer país torna-se ilegítimo.

Sob o pálio dessas lições, iniciam-se estas breves anotações à Reforma:

Art. 475 (Remessa obrigatória)

Sujeitam-se ao duplo grau de jurisdição as sentenças proferidas contra a União, Estados e, doravante, Distrito Federal, Município, autarquias e fundações de direito público, revogado o inciso I, que a determinava na anulatória de casamento, sem justificativa plausível após promulgada a lei do divórcio, conforme aponta o atual Ministro da Justiça, em sua Mensagem.

De qualquer modo, essa esdrúxula remessa - que não é recurso! - não se coaduna com as novas conquistas da ciência processual, revelando-se demasia protecionista que contradiz os princípios de economia e celeridade processuais, incentivando tratamento desigual às partes. Proteção que vem sendo reiterada através de Súmulas (45 STJ) ou mesmo da atividade de Procuradores-Gerais da União, desde os tempos do governo Collor, com restrições à concessão de medidas cautelares; ampliação às Fazendas do prazo da rescisória ou diante da concessão de efeitos suspensivos, sempre à margem da lei processual. Aqui reside, talvez, a explicação para a timidez do reformador, já que a exclusão deste artigo poderia inviabilizar a própria Reforma.

O alcance da expressão "proferida contra" abrange as decisões de extinção do processo, sem apreciação meritória, acreditando-se que seu verdadeiro sentido seja: "decisão contrária", aos entes enumerados, quer se apresentem no processo na condição de autores ou réus (Gomes Júnior, 2002). Enquanto a ampliação, visando autarquias e fundações de direito público, repete o dispositivos da Lei n. 9.469/97.

Cândido Dinamarco (2001), ao examinar a liquidação de sentença e a supressão do cálculo do contador, alertava para o fato de que o juiz não deve arvorar-se em "defensor da Fazenda Pública", que "...já tem tantos privilégios tipo fascista no processo brasileiro", que não seria demasia desobrigar as partes à manifestação sobre a conta, antes da citação. Sob todos os aspectos, contudo, é excessiva a precaução de duplo grau obrigatório, uma vez que possuem as Fazendas Públicas, bem como Estados, Municípios e Distrito Federal e suas autarquias e fundações, com raras exceções, corpo de procuradores, concursados, para fiscalizarem o andamento processual, ao contrário da maioria da população, que deve recorrer à assistência judiciária. Assim, essa ampliação nada mais é do que novo protecionismo, digno da legislação trabalhista do Estado Novo, origem para o apelido: "fascista".

O inciso III do art. 475 dizia: "julgar improcedente a execução da dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI)"; agora alterada para: "julgar procedentes os embargos à execução", em redação aprimorada).

O § 1º existia na redação anterior - parágrafo único - com o mesmo caráter impositivo e avocatório, apenas que acrescido agora da expressão "haja ou não apelação", suprimido-se o último vocábulo (voluntária), realmente inócuo.

Bastante razoável, dentro do sistema acolhido, a redação do § 2º, já que veda a aplicação obrigatória do duplo grau se a dívida não exceder a 60 (sessenta) salários mínimos - aqui, sem interferência da Lei n. 10.259/2001 - e,  fixados no momento da sentença, ainda que de maior valor, no momento do ajuizamento (Gomes Júnior, 2002), ou nos casos de procedência dos embargos do devedor, dentro do mesmo limite de 60 salários mínimos.

No § 3º, talvez, a explicação para a publicação da Lei, durante os festejos natalinos: inserem-se, de forma sub-reptícia, duas questões não pacificadas: a) da jurisprudência dominante, nos Tribunais superiores e b) de suas súmulas (vinculantes), impostas como razão de decidir. Apesar de voltadas exclusivamente às Fazendas Públicas, não resta dúvida de que a estratificação da jurisprudência, ou de interpretações sumuladas, poderá se constituir em retrocesso, ao menos no nosso sistema civilista, codificado. Trata-se de conseqüência plausível no da Common Law, em que a evolução dos costumes é acompanhada por decisões sistematicamente adaptadas (leading cases), a título de precedentes - com caráter legislativo. No sistema adotado pela doutrina brasileira apresenta-se, desde logo, como dificuldade até mesmo ao ensino jurídico, especialmente diante da inexpressiva aplicação do instituto da uniformização da jurisprudência, agora retomado, através da remessa ao órgão superior (art. 555, infra). Resta saber se, a partir do excessivo número de recursos, poderá ocorrer ou um reiterado e pernicioso acomodamento ou o puro e simples cerceamento de defesa, diante dos interesses do contribuinte e da convicção dos juízes.

Consuma-se, assim, de forma abrandada, a adoção das súmulas vinculantes, sem que haja garantia efetiva à diminuição do número de recursos dirigidos às instâncias federais, mesmo aqueles de caráter interno (agravos regimentais), por absoluta falta de pesquisas, baseadas em dados confiáveis.

Em breve parêntese, recordam-se a título de exemplo os recentes posicionamentos do STJ, quanto ao alcance do Código de Trânsito Brasileiro, especialmente no que dizia ao art. 32 da LCP, em que apenas a persistência dos juízes acabou por derrubar jurisprudência iterativa que insistia em considerar a falta de habilitação, como infração penal, além de administrativa; ou mesmo o teor da Súmula n. 174 do STJ (v.g., arma de brinquedo), revogada.

Sob esses aspectos, sempre oportuna a lição de Vítor Nunes Leal, ao definir súmula como: "...um método de trabalho, um instrumento de autodisciplina do Supremo Tribunal Federal...", que poderá servir para racionalizar os serviços judiciários. E só! Não se admitindo possa tornar-se requisito para o manejo de recursos ou, o que seria pior, para conduzir a convicção das Cortes estaduais ou dos juízes de 1º grau.

Da mesma forma, o conceito de jurisprudência dominante é fator que oscila, conforme a composição do Tribunal e de seus órgãos fracionários: o que é dominante hoje, não terá sido ontem e não o será amanhã. É necessário que a jurisprudência seja cambiante, para não refletir apenas o desejo do Executivo; servir de respaldo à instabilidade econômica do país ou impedir a evolução dos costumes de um povo etc. O divórcio, ontem execrado, hoje é permitido, até mais de uma vez. O grande exemplo da inutilidade da jurisprudência dominante ou de uma interpretação engessada - digo, sumulada - deve ser buscado no posicionamento de juízes como Edgard de Moura Bittencourt, especialmente no que diz respeito ao concubinato, admitido, hoje, constitucionalmente, a título de entidade familiar, de companheirismo. Por fim, anote-se que os votos vencidos, raramente admitidos em publicações oficiais, ou por "comissões de jurisprudência" dos Tribunais, vem submetendo as decisões inovadoras a um verdadeiro controle ideológico. O colegiado, quando atuante, reflete as diferenças de entendimento, que, em hipótese alguma, podem ser confundidas com teimosia inútil.

Crê-se, pois, que o posicionamento de alguns magistrados, contrário ao julgamento vinculante ou à jurisprudência dominante, acabe por se constituir na única forma de apreciar o teor duvidoso e, até mesmo, ditatorial da maioria das Medidas Provisórias, usurpadoras da função legislativa, invasiva da atividade judiciária ou à sanha legiferante do Executivo, que obriga constantes interpretações.

O que engessa a jurisprudência - tornando-a usurpadora e dominante - também é a estratificação dos tribunais, com a excessiva permanência de seus membros, às vezes, por mais de vinte anos! De outro lado, o que permite os avanços jurisprudenciais é a modificação de composição de seus órgãos fracionários, o seu arejamento.

Art. 498 (Recursos ordinário e extraordinário. Prazo comum, e embargos infringentes)

A nova redação merece aplausos, pois vem dirimir dúvidas e interpretações restritivas, quase sempre ocorrentes. Na anterior, interpostos embargos, simultâneo aos recursos extraordinário e especial, ficavam estes sobrestados até o julgamento daqueles. Pelo novo dispositivo, "apenas após o julgamento dos embargos e conseqüente publicação do acórdão será iniciada a contagem dos prazos para os recursos extraordinário e especial, abrangendo todo o julgado", inclusive na matéria não impugnada pelo embargante (Lenzi, 2002).

Ademais, o acréscimo do parágrafo único evidencia que, em havendo decisão parcial de unanimidade, não interpostos embargos infringentes, ao julgamento por maioria, a data do trânsito destes será a inicial para interposição dos recursos.

Art. 515, § 3º (Apelação - Conhecimento)

Extinto o feito sem julgamento do mérito (art. 267), "o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar sobre questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento".

Dirão alguns que dificilmente o feito estará pronto para imediato julgamento e que sempre haverá o risco da supressão de instância, quer o tribunal o faça em situações de instrução incompleta, quer diante de causa que não esteja madura para o julgamento. Ocorre que o juiz singular, ao sentenciar, acolhendo preliminar, nos casos elencados no art. 267, examina a matéria, preliminar e de mérito, e sua discussão, isto é, desde que colocada a matéria como questão. Não assim quando do indeferimento da inicial ou pendente a possibilidade de apresentação de provas ou testemunhos.

Aponta Dinamarco (2001) que, podendo ser concedida tutela antecipatória, a qualquer tempo, "...inclusive no momento de decidir a causa ou até mesmo depois da sentença, estando ainda o processo perante o juiz de primeiro grau", há que se sujeitar a regra do exaurimento da competência a uma outra "soberanamente superior, que é a garantia do acesso à justiça" (p. 348 e 350). Também na hipótese do artigo em discussão, o acesso a uma ordem jurídica justa é garantia que sobreleva àquela do duplo grau, atendidos os princípios processuais da celeridade e economia, e sem desatender aos do devido processo legal e do contraditório. Anote-se, ademais, que o princípio do duplo grau não se inscreve na Constituição como garantia.

Ainda na lição de Dinamarco (desde "Fundamentos" até o recentíssimo, "Instituições"), examinados os pressupostos processuais e os requisitos de regularidade do processo, existe o que ele denomina pretensão bifronte, no julgamento, com ou sem apreciação do mérito, ou seja, negada a pretensão ao julgamento de mérito, restará apreciar a outra pretensão, qual seja, a do bem da vida. A satisfação daquela é dada pelo Estado-juiz, enquanto a desta, pela parte. Assim, a pretensão insatisfeita - pelo não-ressarcimento ao bem da vida - não pode estar submetida à exclusiva apreciação da pretensão ao julgamento de mérito, negada em 1.º grau, e que, diante da integral apreciação,  irá atender à pretensão ao bem da vida, que, em 2.ª instância desobrigará o retorno, determinado para preencher mera formalidade.

Por outro lado, a vontade do legislador, de alguma forma, vem de encontro aos anseios de muitos juízes, obrigados que estavam, ante a procedência do recurso, a novo julgamento, após vencidos na preliminar, contrário ao próprio convencimento. E, nada garante que, ao retorno, possa encontrar-se modificada a composição da câmara ou turma e, por absurdo, antepor-se com nova contradição preliminar entre os componentes.

A apreciação do recurso é devolvida ao tribunal, por inteiro, desde que se trate de matéria de direito, não padeça de exame qualquer fato pendente e esteja pronta para o julgamento (não falte prova alguma), cabível o julgamento de mérito. Nada há no sistema processual que impeça tal atividade, conforme se extrai da redação do § 2.º, do art. 515, visto que ao pedido ou a defesa, manejados em mais de um fundamento, se acolhido apenas um, devolve a apelação o conhecimento dos demais e, nada obstante não tenham sido objeto de apreciação meritória, acabam apreciados pelo Tribunal, sem que se cogite de supressão de instância.

Ademais, não procedem as críticas de que haja conflito entre este § 3.º e o caput do art. 515, pois a matéria foi discutida, contestado o mérito, o juiz a ambos examinou, concretizando o julgamento apenas da questão preliminar. Assim, o pedido existe e foi examinado, não se tratando, à evidência, de decisão além ou fora do pedido, em que não exercido o contraditório (arts. 128 e 460). No caso, o mérito não foi acolhido, nada obstante impugnado. O que se busca inegavelmente é instrumentalizar o processo, sem torná-lo escopo final da lide, com prejuízo da apreciação do próprio direito material.

Aos críticos (Silva, 2002), parece suficiente o retorno, para nova apreciação em 1.º grau, por ter o magistrado optado pela solução processual, quando, na verdade, o duplo grau é pressuposto do devido processo legal, desde que não existam os impedimentos mencionados e sem que o acesso à Justiça acabe submetido a trôpegos formalismos. Ante a morosidade e acúmulo de recursos nos Tribunais, o retorno ao l.º grau representará sempre - pois que sairá da fila de represamento, voltando em último lugar - quebra do princípio do acesso a uma ordem jurídica justa, lembrado por Kazuo Watanabe (supra).

Art. 520, VII (Efeitos da apelação)

O art. 520, inciso VII, determina o recebimento da decisão que confirma a antecipação dos efeitos da tutela, apenas no efeito devolutivo. Esperava-se, contudo (Dinamarco e Mancuso, lembrados por Gomes Júnior, op. cit.) fosse este a regra geral, permitida a execução provisória, ante a evidente morosidade do processo, cujos princípios imbuem-se, cada vez mais, de ultrapassada retórica. Reside o risco em que os tribunais continuem abarrotados por recursos buscando o efeito suspensivo. Silvânio Covas (idem), em lúcida lição, mostra a incoerência do legislador ao permitir, na antecipação da tutela em cognição parcial, a execução sumária, enquanto que à sentença, de conhecimento exauriente, não!

Cândido Dinamarco (2001) apontara, ante o sistema do art. 273, não ser outra a conclusão, quanto aos efeitos de apelação interposta de decisão que antecipa a tutela, diante da  probabilidade de se evitar um mal maior, devendo os juízes estar atentos às concessões liminares, que, cassadas, poderão conduzir ao descrédito crescente da atividade do Poder Judiciário. Ademais, ensina que, havendo concessão definitiva da tutela, na mesma oportunidade do sentenciamento meritório, aquela será fato do passado, que já precluiu, cabendo unicamente apelação, por se constituir em capítulo da sentença, sem que haja qualquer possibilidade de interposição conjunta de agravo.

Art. 523, §§ 2º e 4º (Unifica prazos e disciplina o agravo retido)

A Reforma vai, aos poucos, extirpando lacunas e equívocos, unificando prazos, como conseqüência da intervenção legislativa tópica num sistema fechado. A nova feição do Agravo, interposto diretamente às Cortes, espelha uma garantia superior aos direitos do credor e enfatiza as obrigações do devedor, mostrando o equívoco do prazo de cinco dias para ouvir-se o agravado, que afastava o tratamento igualitário das partes no processo.

Por outro lado, com referir a expressão "ouvido o agravado", enfatiza o legislador o disposto no art. 526, que impõe ao agravante, diante da nova redação do seu parágrafo único, o dever de, em três dias, requerer a juntada, aos autos principais, de cópia da petição de agravo, bem como o comprovante de sua interposição e relação de documentos que o instruam, sob pena de inadmissibilidade, desde que o agravado requeira e comprove.

A partir de 1994, entendeu-se que essa atribuição seria mera faculdade - com algumas exceções interpretativas, de doutrinadores  e juízes;  neste sentido, o critério adotado pelo Primeiro Tribunal de Alçada Civil e pela maioria dos componentes do STJ, conforme decidido no REsp 18135/SP, RSTJ 115:383, em que o relator, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, também um dos responsáveis pela Reforma, evidenciava revestir-se a determinação legal "de caráter cogente", não ainda como requisito, mas como oportunidade de reapreciação do decidido, pelo magistrado da decisão agravada e capaz de propiciar, à parte contrária, o conhecimento da integralidade do recurso. Hoje, o não-cumprimento dessa determinação importa em inadmissibilidade do recurso, não mais se cogitando de mera formalidade. Ao acolher aquelas críticas, construtivas, optou-se pela manifestação do magistrado, também como requisito para a reapreciação pelo Tribunal, pois que, em sendo reformada a decisão, com comunicação obrigatória ao Relator, impede-se o conhecimento do agravo, desafogando os tribunais.

Resumindo, há uma retomada parcial dos anteriores requisitos do recurso de Agravo, permanecendo a dúvida sobre a rapidez e instrumentalidade apregoadas. Neste sentido alguns processualistas entendem tímida a manutenção do agravo, apenas mitigada pela conversão em retido, pois, no dizer de Dinamarco (AASP, 2002) dever-se-ia: impedir o agravo em matéria de prova, qualquer que fosse o procedimento; apenar o agravante que interpusesse o recurso proibido; ou voltar ao conceito de irrecorribilidade das interlocutórias.

Com relação ao § 4º, a nova redação, ampliativa, impede que as decisões proferidas em audiência, bem como as anteriormente previstas, posteriores à sentença, possam ser objeto de agravo de instrumento, que deve permanecer retido. Retornam, dessa forma, os mesmos requisitos de apreciação preliminar pelo Tribunal a implicar em pedido expresso, enquanto a manifestação de interposição deve ser escrita - ditadas e transcritas, no termo da Audiência agravada, ou grafadas por certidão de inteiro teor pelo Cartório, quando se tratar de decisão posterior à sentença; de qualquer forma, sem interferir na redação do item III do art. 280, que já previa, no procedimento sumário,  a forma retida ao recurso.

Acresce-se que poderá o relator converter o agravo de instrumento em retido, assim que recebido aquele, salvo nas hipóteses excepcionadas (art. 527, II),  de dano de difícil e incerta reparação (ou nas de inadmitir-se apelação e, por fim, quanto aos efeitos em que recebida esta).

Parece difícil a ocorrência de decisões interlocutórias, proferidas em audiência, que produzam males à pessoa, impedindo-a de receber o bem que lhe é devido, sendo mais prováveis na hipótese em que o mal é causado diretamente ao processo e só atingem indiretamente o sujeito (Dinamarco, 2001, p. 333). Essa lição, ao enfatizar, talvez, a inaplicabilidade do agravo de instrumento que: a) ou interrompe o fluxo procedimental; ou b) poderá ocasionar o perigo da dupla decisão, conhecida a do agravo após proferida a sentença, em absoluto tumulto processual, estaria propondo um retorno à irrecorribilidade das interlocutórias, salvo na hipótese da decisão ocasionar um mal à pessoa?

Releva, contudo, notar que a opção pelo agravo retido submete-o à regra geral dos demais incisos do art. 527, passível também do agravo inominado (de Regimento, infra), sob o risco de manejarem as partes o Mandado de Segurança.

Arts. 526 e 527 (Agravos e Requisitos - Poderes do Juiz)

A distribuição incontinenti ao Relator proporciona razões de reclamação, por parte dos membros dos Tribunais, no sentido de que têm o tempo, quase que por inteiro, tomado pela apreciação e julgamento de Agravos, impedido o das Apelações. Esse fato somente pode ser empiricamente observado, uma vez que não existem dados estatísticos confiáveis, ou sequer lançamentos oficiais, que possam embasar pesquisas ou estudos direcionados a essa assertiva ou a seus contrários, como, por exemplo, a redução do número excessivo de mandados de segurança, com caráter de recurso, além de outras matérias afetas ao funcionamento do Poder Judiciário, capazes de justificar ou, simplesmente, evidenciar outras razões para a morosidade da Justiça.

Ampliaram-se os poderes do Relator, que poderá negar seguimento liminar ao agravo, nas hipóteses do art. 557, cabendo, no dizer de Lenzi (2002), quando: a) manifestamente inadmissível, já que não preenche os requisitos "necessários à propositura, cabimento, legitimação, interesse, tempestividade, regularidade formal e preparo"; b) improcedente (contra o entendimento majoritário da Corte ou deduz matéria de cunho protelatório); e, por fim, prejudicado, pois que perdido o objeto, reformada a decisão em primeiro grau ou por ter sido a principal desistida, cabendo, se não conhecido ou se negado provimento, o agravo inominado, previsto no seu § 1.º. A interposição desse recurso (agravo de regimento) será dirigida à Câmara competente para o conhecimento. E, se negado, liminarmente, pelo Relator (art. 798, RITJESP), caberia novo agravo regimental ao Órgão Especial (art. 423, V, e 177, XII, ambos do RITJESP)? Kazuo Watanabe entende que a única hipótese seria a de impetração de Mandado de Segurança, sempre em casos excepcionalíssimos, e perante o próprio Tribunal.

A hipótese do inciso II do art. 527 - conversão do agravo de instrumento em retido - deverá ser usada com moderação e de forma justificada, salvo exceções (provisão de urgência ou perigo de lesão) - pois implicam a remessa do recurso para apensamento aos autos principais, no Juízo de origem; dessa decisão igualmente caberá agravo regimental, na forma explicitada e, eventualmente, ao Órgão Especial etc. (supra). Essas circunstâncias demonstram a possibilidade (remota ou absurda) de ser o agravo - em qualquer de suas formas - objeto da decisão de reforma, em 1º grau, e de até três apreciações liminares, em 2a. instância.

Adequada se mostra a redação do inciso III, que permite ao Relator atribuir efeito suspensivo aos recursos previstos nas hipóteses do art. 558 (prisão civil, adjudicação, remição de bens, levantamento de dinheiro sem caução etc.), desde que requerido pelo agravante, além dos casos previstos no art. 520 (efeitos do recebimento da apelação), ora acrescido do inciso VII (supra). Ademais, poderá determinar a suspensão do cumprimento da decisão agravada até pronunciamento definitivo da Câmara ou Turma, se igualmente requerido.

Prossegue relevante a discussão sobre a concessão do efeito suspensivo ativo, pelo relator, que suspende os efeitos da decisão agravada ou concede medida de urgência de antecipação de tutela recursal (cf. Dinamarco, Lenzi e Gomes Júnior, op. cit.), já que o STJ vinha entendendo que a decisão que denega liminar não tem conteúdo executório mandamental, sendo de nenhuma valia conferir-se efeito suspensivo a tal agravo; porém a jurisprudência o admitia, ante o raciocínio, dentre outros, de que o que era possível ao juiz singular não poderia ser negado ao colegiado, pois a decisão deste "torna positiva a pretensão denegada" (TJSP - Ag. Inst. n. 52.168-4-SP, Rel. Des. Octávio Helene, j. 4-9-1997, JTJ 203:238).

A recusa em conceder efeito suspensivo afasta o manuseio do mandado de segurança? Ou contraria flagrantemente o espírito da Reforma, ainda que não mais se revista de eficácia e rapidez, ante o represamento de feitos, nos Tribunais de São Paulo?

A requisição facultativa de informações, ao Juízo a quo, reveste-se de importância ante a nova redação do art. 526 (supra), praticamente tornando-a obrigatória, podendo a morosidade ser afastada pela utilização de todos os meios eletrônicos possíveis, em análise extensiva da Lei n. 9.800/99 (Lei do Fax).

As circunstâncias expressas nos incisos II e V referem providências de caráter instrumental, úteis à intimação e processamento, enquanto o item VI reitera a obrigatoriedade de manifestação do MP (art. 82 do CPC), sob pena de nulidade.

Art. 530 (Embargos Infringentes)

Em recente palestra, Cândido Dinamarco (2002) manifestou-se absolutamente contrário a que se mantivesse o recurso de Embargos Infringentes, uma vez que estabelece uma terceira instância ordinária. No dizer de outros (Cavalcanti, 2002), basicamente, a Reforma retoma o disposto no art. 833 do Código de Processo de 1939, alterado pelo Decreto-Lei n. 8.570/46, quando a modificação da sentença, por maioria, deixou de ser requisito aos Embargos, prevalecendo apenas a falta de unanimidade da decisão colegiada, em sede de apelação, ou nos casos de procedência da ação rescisória, também aceita pelo Código de 1973, desprezando-se a hipótese de, ao examinar apelação, confirmar sentença, por maioria, havendo, então, duas decisões no mesmo sentido. Agora, além de ser interposto contra sentença de mérito, será necessário que o Acórdão embargado a reforme. Contra julgado confirmatório de sentença, mesmo de mérito, não serão cabíveis embargos infrigentes, ou que dêem pela procedência da rescisória.

No dizer de Gomes Júnior (2002), é claro o sentido de prestigiar o Juiz a quo, visto que, no sistema anterior, somando-se à sentença dois votos concordantes, apenas o dissonante era suficiente ao manejo dos Embargos. Doravante, a dissonância há que se refletir na reforma meritória da sentença para utilização do recurso ou na improcedência da rescisória.

Prestigia-se o julgador de 1.º grau no exame do mérito, afastadas as intermináveis discussões de teses processuais, sempre utilizadas em prejuízo do direito material das partes. Acresce observar a nova redação do art. 531: "Interpostos os embargos, abrir-se-á vista ao recorrido para contra-razões; após, o relator do acórdão embargado apreciará a admissibilidade do recurso", providências que, se de um lado instituem sadio juízo de admissibilidade, que melhor resguarda o tratamento igualitário às partes e ao contraditório recursal, de outro implicarão maior atraso do julgamento definitivo em 2.º grau, através da intimação dos advogados (ou das partes?), com prazo para manifestação, controlado pelas unidades judiciárias, sobrecarregadas.

Admitidos os embargos, o processamento (arts. 533, 534 e 542) e julgamento dar-se-ão na forma e com a composição determinada pelo respectivo Regimento Interno do Tribunal, o mesmo ocorrendo com a intimação do recorrido.

Art. 544 (Agravo, diante da inadmissão de recursos extraordinário e especial)

Ao elencar os requisitos instrutórios do agravo, avulta a autenticação das peças por declaração dos próprios advogados, evidente que permitida a impugnação da parte contrária sobre a autenticidade, em petição dirigida ao presidente da Corte e independente do pagamento de custas ou despesas postais, já adiantadas quando da interposição do recurso (art. 511 do CPC). A autenticação pelo próprio advogado representa um avanço na direção de uma visão publicista do processo, em detrimento daquela privatista, sempre mais formal e distante dos interesses de ordem pública, e que obriga um repensar da atividade dos lidadores do Direito, a partir da boa-fé,  presumida (como no caso de inquirição de testemunhas, pelos próprios advogados ou pelos membros do Ministério Público, ante o progresso dos meios de comunicação e reprodução - vídeos etc.).

O § 2.º impõe a imediata resposta do agravado e não depende de  qualquer juízo de admissibilidade pelo Presidente do Tribunal estadual, para a subida do recurso ao Tribunal superior, onde será processado: mesmo quando, p. ex., seja intempestivo o recurso?

Art. 547 (Descentralização do protocolo recursal)

A modificação incluída no Capítulo "Da Ordem dos Processos no Tribunal" demonstra que o acréscimo ao art. 547 permite a criação extensiva de serviços de protocolo recursal, mediante delegação a ofícios de justiça, em 1º grau. A medida vem facilitar a interposição de recursos, ampliando o acesso à Justiça, especialmente para advogados de comarcas interioranas ou mesmo residentes nas grandes capitais. A descentralização é sadia e, em Comarcas populosas ou Estados de larga extensão, poderá ampliar-se aos foros regionais e distritais. Ocorre, porém, que a interposição deve ser objeto de imediata e eficaz remessa ou comunicação ao Tribunal estadual, evitando-se seja certificado o trânsito em julgado, havendo recurso pendente, aqui também por aplicação e regulamentação racional da Lei do Fax, pelos Tribunais.

Art. 555 (Composição e julgamento da Apelação e do Agravo - Remessa a órgão superior)

A composição para o julgamento de apelação ou agravo, por três juízes, sem especificar a presença de revisor, conforme constava da redação anterior, parece salutar, pois não há por que considerar o agravo menos importante. Contudo, a experiência de judicar em 2.º grau demonstra que a credibilidade, entrosamento e confiança, inerentes ao julgamento colegiado, podem encaminhar à rapidez ou, dependendo da composição, obrigar ao sistemático pedido de vista de autos, com prejuízo à celeridade.

Nas hipóteses do § 1.º, já previstas em Regimentos Internos dos tribunais, retorna-se à uniformização de jurisprudência, desprestigiada por sua complexidade e minudência (art. 644 usque 656 do RITJESP). A simplificação determinada poderá facilitar uma verdadeira uniformização, desde que não sirva a escusos interesses de retardamento ou preguiça - com inútil paralisação do feito, ante a remessa ao órgão superior (Especial, onde houver, ou Plenário) por parte de relatores desavisados.

A atenção especial, dispensada à questão relevante, é endereçada àquela que repercute não só no próprio Judiciário como perante a sociedade, a partir de interpretação constitucional ou ao tentar prevenir divergências entre as Câmaras ou Turmas dos tribunais, impondo-se a decisão "como precedente jurisprudencial, o qual deverá ser levado em conta nas matérias homogêneas subseqüentes" (Lenzi, op. cit.). Aqui seria conveniente recordar as ações que envolvem professores; policiais militares; ações coletivas de meio ambiente e consumidores; aquelas com extensa repercussão na Economia, etc. O interesse público obriga a presença do Ministério Público, sob pena de nulidade.

Trata-se de iniciativa exclusiva do relator, podendo a parte requerer ou sugerir, em preliminar, a apreciação do recurso. Negado, não caberá qualquer recurso, inexistindo juízo de admissibilidade à Câmara ou Turma.

No Estado de São Paulo, será dirigido às Seções de Direito Privado ou Público, sendo que, em matéria processual, conveniente será a união de ambas para fixar orientação dominante, como nas hipóteses de argüição de incidente de inconstitucionalidade (Erasmo Valladão França, 2002).

Tratar-se-ia de uniformização que antecede a formação de jurisprudência dominante ou de súmula? Sua regulamentação regimental não pode ser semelhante, v.g., à do Tribunal de Justiça de São Paulo, já que, sem dúvida, ocorrerá retardamento à decisão e formalismos insuperáveis. A devolução ao órgão originário, mantido o relator, deve ser objeto de regulamentação objetiva e rigorosa, admitido o juízo prévio de admissibilidade, pelo relator designado, junto ao órgão superior, em prazo exíguo.

Direito Intertemporal

Alerta Cândido Dinamarco (2001), sobre "a preservação das situações jurídicas consumadas sob o império da lei antiga" mas, também, quanto a "eficácia dos atos já realizados no processo" (p. 59, g.n.), a nortear os aplicadores da Reforma, além do que, em matéria de processo, está-se no campo da ordem pública e não no da disponibilidade das partes ou do juiz, porque sua aplicação diz respeito ao funcionamento do próprio Poder Judiciário.

O mesmo autor exemplifica com retroatividade legítima, p. ex., nas disposições que impedem a remessa obrigatória, e ilegítima, naquelas que impõem sanção ou multa.

II - Comentários à Lei n. 10.358, de 27 de dezembro de 2001

Alfredo Buzaid já advertira, na Exposição de Motivos do Código de 1973, que: "Posto que o processo civil seja, de sua índole, eminentemente dialético, é reprovável que as partes se sirvam dele, faltando ao dever da verdade, agindo com deslealdade e empregando artifícios fraudulentos, porque tal conduta não se compadece com a dignidade de um instrumento que o Estado põe à disposição dos contendores para atuação do direito e realização da  justiça". Dessa forma, impunha-se ou pretendia-se um regime de austeridade não só às partes como a seus procuradores e a todos os lidadores do direito.

Assim, no processo de conhecimento, o conceito de litigância de má-fé, com aplicação de multa, retira-lhe o caráter de indenização - que permanece nos arts. 16 a 18, a título de perdas e danos - que a tornava inexeqüível, pois, quando e se aplicada pelos juízes, via-se constantemente reformada pelos tribunais.

Na execução forçada, o princípio dos atos atentatórios à jurisdição, que impedia a parte de falar nos autos, molestava a observância do devido processo legal e do contraditório. As Leis n. 8.952 e 8.953/94, além da 9.668/98, mitigaram tais excessos, modificando os arts. 18, caput, e § 2.º, e 601, tendo Dinamarco (2001) saudado a inclusão de "norma processual", que tornou explícita a efetivação dessa responsabilidade (p. 63). Na atual redação do art. 600, a substituição por multa, fixada pelo Juiz e que reverte, desde logo, ao exequente, é exigível nos próprios autos, o que tornará a punição imediata e eficaz.

Art. 14,  inciso V e parágrafo único (Litigância de má-fé. Procedimento)

Seria correto interpretar que a Reforma afasta o advogado, expressamente, dos deveres elencados no art. 14, indicando-lhe o caminho - previsto na nova redação do seu parágrafo único - de mera submissão aos "estatutos da OAB", ou será que, ao ampliar (caput) o alcance para "todos aqueles que de qualquer forma participam do processo", prevaleceria, apesar de absurda, apenas ressalvada a hipótese do inciso V?

A interpretação do Código é produto de um sistema, assim como o é a redação de qualquer artigo de lei.  Quando o art. 14 envolve a todos os lidadores do Direito, o faz com extensão aos advogados e procuradores, sem excluir terceiros intervenientes (assistentes simples); representante legal de incapaz e pessoas jurídicas ou advogados que recebem por substabelecimento poderes de representação (Moreira Reis, 2002).

Abrange, assim, as "autoridades" dos demais Poderes, que de forma reiterada desrespeitam impunemente as decisões judiciais (Hage, 2002).

Enquanto a multa de até 20% sobre o valor da causa, no inadimplemento, acaba inscrita como dívida ativa e será cobrada com as facilidades do Executivo Fiscal, sem omitir outras sanções e com extensão aos agentes públicos.

O inciso V admite expressamente a existência de provimentos mandamentais (Watanabe, 2002), expressão que abrange as eficácias cognitiva e executiva, no dizer de Moreira Reis (2002), fazendo-as conviver "...num só comando, de sorte que a decisão mandamental, sobre valer como título executivo, legitima desde logo o uso de meios coercitivos contra o obrigado, para que este cumpra imediatamente o decidido". Evidente, ademais, que nestas se inclui a tutela antecipatória dos efeitos da sentença. Assim, as partes têm o dever de cumprir os provimentos mandamentais e sentenças, enquanto que todos têm o dever  de não embaraçar o andamento processual, como furtar-se ao dever de depor e cumprir determinações judiciais, não podendo postular de forma ilegal ou tumultuar o procedimento.

Desarrazoado, então, pensar estivessem excluídos os advogados dos preceitos do art. 14, e seu parágrafo único, pois que, a com isto se concordar, ao órgão de classe caberia julgar os atos praticados no processo pelo litigante de má-fé, à evidência, de forma invasiva à mera atividade administrativa e ética que lhe é deferida pelo sistema estatutário, delegado pelos membros da classe, enquanto os demais lidadores, nestes incluídos juízes e promotores de justiça, estariam submetidos à punição processual, determinada pelo Estado.

Os atos do processo e da audiência permanecem sob o controle dos juízes, caso contrário os deveres estariam integralmente despidos de sanção - tornando a lei inexeqüível e inócua.

O princípio do art. 133 da CF determina que o advogado é indispensável à administração da justiça e "inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei". Logo, ele é partícipe obrigatório do processo, ainda que não responda pelos atos do mandante (art. 1.313 do CC). Abrem-se contudo ressalvas se os pratica por iniciativa própria, como nos casos do art. 34, VI, X, XIV e XVII, do Estatuto dos Advogados. A interpretação corrente, ademais, posiciona-se no sentido de que a inviolabilidade se aplica à própria atividade de defesa dos interesses do cliente, quando não poderá ver-se tolhido na defesa de seu constituinte, nada obstante suas manifestações -  conquanto essenciais à administração da Justiça - tenham como parâmetro não invadir a esfera do ilícito penal ou da agressão à honra de terceiros, sendo-lhe vedada a instalação do tumulto cartorário ou no processo, ou o desrespeito aos provimentos mandamentais. Considerados, reitere-se, como atentatórios à jurisdição, sem prejuízo da aplicação de outras sanções: criminais, civis e processuais, que, por suposto jamais poderiam ser aplicadas pelo respectivo órgão de classe. 

O que se pretende com a ressalva do parágrafo único - crê-se - é impedir que os advogados, na transgressão ética, possam ser submetidos a atos correcionais, impostos por magistrados, atos que poderiam ser passíveis de constituir manifestações de mesquinharia ou vingança. Enfatiza o legislador que, sob este aspecto, submetem-se exclusivamente ao respectivo Estatuto.

Multas e sanções por perdas e danos serão aplicadas às partes, independentemente do resultado da demanda, podendo aquelas ser aplicadas em qualquer grau de jurisdição, pelo juiz singular ou pelo relator, em exame preliminar, ou como sugestão à Câmara ou Grupo.

Art. 253 (Competência Funcional - Distribuição do feito, por dependência)

A medida é ética e moralizadora, por basear-se na igualdade de todos perante a lei e o processo, visto ser corrente nos fóruns a prática de manobras espúrias visando afastar o juiz natural, ao distribuir o litigante desleal inúmeras ações idênticas até atingir-se, através da concessão de liminar ou ante a desistência das Varas indesejadas, a "coincidência" da distribuição ao juízo que melhor atenda aos interesses das partes, ou seus advogados. Essa circunstância é comum, inclusive, junto aos tribunais, apesar do uso, na generalidade, do sorteio eletrônico.

Trata-se de fazer valer o princípio do juiz natural e, não apenas, de atender às hipóteses de conexão, para evitar decisões conflitantes. Neste sentido, já se antecipara a Instrução Normativa n. 22, de 21 de agosto de 2000, do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região. Por outro lado, exemplifica-se com a ocorrência da distribuição simultânea de diversas ações, todas sem procuração ou recolhimento de custas, havendo despacho pelo juízo do interesse, quando, então, nem sequer será necessário desistir das demais, ante a obrigatoriedade do decreto de extinção (Lima, 2002). Crê-se, no entanto, que a rigorosa fiscalização e a automação centralizada da distribuição poderão evidenciar a competência precedente, além da má-fé, visando preencher "a casa" indesejada, considerada como atentatória à jurisdição.

A interpretação dos incisos I e II, obrigando a distribuição por dependência, quando sejam as ações conexas (comum o objeto ou a causa de pedir - art. 103); ou em que haja continência (identidade de partes e causa de pedir, podendo ser o objeto de uma, mais amplo, abrangendo o das outras - art. 104) ou onde ocorra a desistência, sendo o pedido reiterado, tornam evidente tratar-se de competência absoluta, suscitável  a qualquer tempo, declarando-a o juiz, de ofício, visto que implica, mesmo havendo litisconsortes, na dependência. Essas circunstâncias obrigam redobrada atenção da parte ré, se argüida a incompetência, aliás desnecessária.

Caberá, também, nos casos de abandono da causa (art. 267, III), dificilmente verificável, antes de atingir-se o objetivo vedado.

Está o Distribuidor obrigado - passível de sanção pecuniária, por ato atentatório à jurisdição - a informar qual a primeira ação distribuída e qual o Juízo prevento para a apreciação das demais, pois que, ao sortear será possível criar mecanismos que indiquem o juízo que aos demais precede.

Art. 407 (Da produção de prova testemunhal)

Melhor regulamentado o prazo para apresentação do rol de testemunhas, com tempo suficiente para o cumprimento de eventual intimação por Oficial de Justiça e para que o advogado - em contato com a parte - possa aparelhar sua defesa, ou impugnar e contestar qualquer dos testemunhos arrolados.

Esse ato não poderá ser praticado no dia do início - leia-se dia de encerramento, dia limite - através do protocolo integrado. Se assim concretizado, no dia limite do prazo de dez dias, importa verificar se a juntada se deu com menos de dez dias antes da audiência e, portanto, sem condições para que o Cartório possa intimar as testemunhas. Os dez dias são integrais, especialmente para providências cartorárias, como expedição de mandado e seu cumprimento, não podendo ser reduzido por expediente da parte, que dele irá beneficiar-se ante o adiamento, vez que os prazos tratam de matéria de ordem pública, não submetida à vontade ou ao interesse das partes ou do juiz. Exemplo: protocolada em Cartório a petição no dia 17 e designada audiência para o dia 27, o prazo terá sido rigorosamente observado.

Não havendo tempo hábil - isto é dez dias integrais - para aquelas  providências, ou bem são as testemunhas apresentadas pela parte, independentemente de intimação, ou a prova corre o risco de ser declarada preclusa.

Arts. 431; 431-B e 433  (Da Prova Pericial)

Restabelece-se o contraditório - que restara prejudicado, ante a revogação dos arts. 430 e 431, pela Lei n. 8.455/92, sendo que o primeiro previa a conferência entre peritos e assistentes, para lavratura de laudo unânime, enquanto o 431 estipulava condutas, no caso de haver divergência entre eles. Ambos revelaram-se inócuos, porém a pura e simples revogação amesquinhara o princípio do devido processo e o exercício regular do contraditório.

A atual redação apresenta oportunidade para que os interessados participem, desde o início, da colheita de prova, em diligência designada pelo Juiz, ou indicação de data e local pelo perito.

É verdade que o art. 425 poderia ter sido revogado, pois representa retardo e formalismo excessivos, uma vez que se prevista a possibilidade de acompanhar diligência de produção da prova, com a apresentação de quesitos diretamente ao perito, inegável que as partes ficam, desde logo, cientes.

Da mesma forma, a possibilidade, agora admitida expressamente, de tantas perícias quantas forem as matérias ou sua complexidade, era expediente adotado pelos juízes e resultava de apreciação cuidadosa das questões debatidas. Coloca-se apenas a dificuldade de, ante diversos peritos, chegar-se a um consenso sobre datas para início de diligências - acrescidas do rigor formal do citado art. 425.

A designação de data pelo Juiz, quando possível e consultados os peritos, virá solucionar, ao menos em parte, essa espécie de dificuldade, devendo ser evitada a prática de atos dependentes da burocracia dos cartórios, atualmente sobrecarregados pelo número assustador - ao menos nas Capitais e Comarcas de porte - de ações em curso (em torno de 7.000, nas Varas Cíveis da Capital). Ademais, deverá ser incentivada a aplicação do art. 427, que estende os poderes do Juiz na dispensa da prova pericial, substituindo-a por parecer técnico ou prova documental.

Ao cabo, não está impedida a colheita de prova em Juízo, designando o magistrado data para realização em Cartório (p. ex., coleta de sangue para exame de paternidade; prova grafotécnica etc.).

A nova redação do parágrafo único do art. 433 retoma o compromisso do legislador com as garantias da ampla defesa e do contraditório, substituindo-se a diligência das partes pela intimação para que se manifestem sobre a apresentação do laudo. Esta providência, dependendo da natureza ou complexidade da prova pericial pode ser objeto de determinação do perito, comunicada aos assistentes sobre a data e horário da entrega do laudo em Cartório, que, por sua vez, comunicarão aos patronos das partes, sempre observado o prazo fixado pelo Juiz para audiência e os vinte dias que a antecedem.

A instrumentalidade do processo - princípio enaltecido por doutrinadores e acolhida pela jurisprudência - representa um compromisso de todos com a agilização, economia e boa-fé processuais, pois que todos são responsáveis pela dignidade da Justiça e operosidade da jurisdição. Inadmissível, dessa forma, seja a prática de atos processuais revestida de excessivas cautelas, capaz de tisnar a dignidade de seus lidadores. A palavra do perito, sobre ter efetivado a comunicação da diligência aos assistentes, não pode implicar a desconfiança de que estes deixem de se comunicar com os respectivos patronos das partes. A facilidade de comunicação, por telefonia celular, gravações, meios eletrônicos e outras conquistas da modernidade, deve ser utilizada com rigor e emprestar credibilidade ao desenvolvimento dos atos processuais, o que seria facilmente desburocratizado pela "automação dos prazos".

Arts. 575, IV, e 584, III e VI - Juízo Arbitral

O legislador processual sacramenta a figura do Juízo Arbitral, previsto na Lei n. 9.307/97, ao consagrar o caráter de título executivo à sentença do árbitro, o que já antes fora previsto pelo art. 31 da citada lei, remetendo-se a execução de sentença arbitral ao juízo cível competente; a nova redação do art. 575, unifica a sistemática dos incisos (III, revogado, e IV, atual).

O reconhecimento pelo STF da constitucionalidade, ainda que por estreita margem de um voto, do art. 18 daquela lei, que considerou o árbitro juiz de fato e de direito, representa decisivo passo na direção da quebra do monopólio da jurisdição, antes que a busca de meio alternativo à solução de litígios. Cabe lembrar na oportunidade o tumulto - até recente data - da admissão dos "juízes" classistas, cuja atividade nefasta se faz sentir não apenas na inutilidade de suas presenças, como junto ao Tesouro, pois que, logo adquiriram as vantagens da magistratura, de seus vencimentos, não, jamais, de sua operosidade!

Fatos rumorosos começam, desde logo, a envolver a aplicação daquela lei, constatados pela confecção de títulos e carteiras funcionais falsas, adquiridas por elevado custo e com tipificação de estelionato, por pessoas que pretendem assumir a categoria de juiz, sem demonstrar a mínima capacitação, verificável por concurso público, constitucionalmente previsto.

Nada obstante possa, ao longo do tempo, surgir como panacéia para desafogar as instâncias, especialmente para as contendas entre empresas transnacionais que, de há muito, não mais recorrem à jurisdição ordinária, uma última observação merece destaque, neste momento em que diversos segmentos da sociedade se arvoram em controladores do Judiciário: quem irá controlar o árbitro e garantir tratamento igual e desinteressado às partes? Os próprios demandantes? E se houver entre eles enorme diferença de poder econômico?, para evidenciar o menos...

O art. 584, inciso III, recebe redação ampliativa e admite o reconhecimento de título executivo às homologatórias de conciliação - previstas na Lei n. 9.099/95, dos Juizados Especiais (art. 57) - e às de transação, ainda quando versarem matéria não posta em Juízo. As decisões homologatórias de conciliação e transação representam avanço no atingir-se a desejada instrumentalidade do processo, sem que se apresentem, ao contrário da arbitragem, como invasivas às atribuições próprias da jurisdição, uma vez que são atividades que se desenvolvem, até mesmo com o auxílio de leigos, sempre submetidas à fiscalização pelo Poder Judiciário.

Por fim, a inclusão da sentença arbitral, acrescida pelo item VI do art. 584, igualmente, representa o reconhecimento oficial da atividade, no sistema processual.

  Conclusão

As reformas serão sempre bem-vindas. Assim foi com a Lei dos Juizados de Pequenas Causas e prossegue com a dos Juizados Especiais. Releva contudo notar que, ao menos no Estado de São Paulo, para instrumentaliza-las é necessário que o Tribunal de Justiça regulamente seu funcionamento, criando infra-estrutura cartorária adequada e incentivos à carreira dos magistrados que desenvolvem sua atividade após o período normal de exercício nas Varas.

De pouco adiantará a vontade do legislador, dirigida à simplificação dos procedimentos e dos recursos, se novas investidas tumultuárias e de interpretação insistirem em amesquinhar o caráter de agilização e economia processuais. Se o Executivo prosseguir legislando através de Medidas Provisórias, incentivadoras da litigância e dos recursos, e se não houver a tão aguardada mudança de mentalidade dos juízes, que passa, antes de mais nada, pelo reconhecimento de que o direito material tem sido relegado a plano inferior, diante das questões processuais, tornando eficaz o acesso à Justiça, prosseguirão inutilmente as discussões, como a da possibilidade do julgamento meritório, permanecendo sentenças e acórdãos nas fímbrias das preliminares, com a denegação pura e simples de Justiça, que melhor atende ao caos do represamento de recursos em 2.º grau. Este será considerado, durante muito tempo ainda, a razão primeira da morosidade e do descrédito da Justiça, apresentando-se como fator essencial à retomada da litigiosidade contida e, via de conseqüência, do incentivo à violência.

A busca de meios alternativos, a automação dos prazos, a multa ou a punição do litigante que atenta contra a jurisdição, a cobrança de justas custas ao recurso, dentre outras, são ou poderiam se constituir em tentativas de melhorar a prestação jurisdicional, porém mais necessário e urgente será garantir efetivo acesso a uma ordem jurídica justa, através da interpretação desarmada das novas leis. Dentre estas, somam-se as que se identificam como de interregno às reformas. A de n. 9.800/99 dirige-se ao aproveitamento processual dos meios eletrônicos (no Tribunal de Alçada Criminal de SP são aceitas impetração e informações em habeas corpus, por fax, enquanto o veto aposto à ampliação do art. 154 do CPC, fundado na Medida Provisória n. 2.200 (Chaves Públicas), impediu as intimações e citações através de meios eletrônicos); por sua vez, a Lei n. 10.173/2001 dispôs, de forma justa, sobre a preferência concedida aos idosos para consumação dos atos processuais.

Por fim, a mudança de mentalidade passa, obrigatoriamente, pelas Escolas de Profissionais, quer na formação quer no aperfeiçoamento dos lidadores do Direito. A criação de Juizados Especiais junto às Universidades representa um primeiro passo para a modernização do ensino jurídico, e este é um dos objetivos que devemos buscar, de forma incessante.

Nota Bibliográfica

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Dinamarco, Cândido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil. 5.ª ed., São Paulo, Malheiros Ed.

________. Instituições de direito processual civil. 1.ª ed., São Paulo, Malheiros Ed. 

________. Fundamentos do processo civil moderno. 2.ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais.

Lenzi, C. A. Silveira. Novas alterações no CPC - in www.teiajuridica.com/mz/novaltr.htm.

Silva, Mathias Magalhães. Lei n. 10.352: Introdução do § 3.º ao art. 515 do Código de Processo Civil. Conflito normativo com as disposições concernentes ao recurso de apelação e a supressão do duplo grau de jurisdição - Jus Navigandi, n. 54 (internet) http://www1.jus.com.br.

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Retirado de: www.saraivajur.com.br