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A Constituição de Weimar e os direitos fundamentais sociais:
  a preponderância da Constituição da República Alemã de 1919 na inauguração do constitucionalismo social, à luz da Constituição mexicana de 1917

 

 

 

Maria Cláudia Bucchianeri Pinheiro*

*Bacharela em Direito e Relações Internacionais, mestranda em Direito e Estado pela Universidade de São Paulo (USP), professora de Teoria Geral do Estado e Direito Constitucional do Instituto de Ensino Superior de Brasília (IESB), assessora de Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)

 

 

INTRODUÇÃO

            O tema relativo aos direitos fundamentais tem recebido grande destaque e atenção, modernamente, por parte dos estudiosos do Direito. À análise da origem, da evolução histórica, da natureza, dos fundamentos e da concretização de tais direitos – tidos como elementos fundantes das ordens jurídicas nacionais, da ordem jurídica internacional e, no caso da Europa, também da ordem jurídica comunitária – têm sido dedicadas inúmeras monografias e páginas de doutrina, o que põe em evidência a circunstância de que é no respeito à dignidade da pessoa humana que reside o fundamento último das mais variadas formas de organização social.

            Na realidade, a grande atenção que hoje se confere à garantia de tais direitos prende-se à percepção de que os direitos fundamentais mantêm, com o próprio conceito de democracia, uma relação de recíproca interação, pois o efetivo respeito aos direitos fundamentais dos indivíduos representa um dos principais parâmetros de aferição do grau de democracia de uma sociedade, ao mesmo tempo em que a concreta e real existência de uma sociedade democrática revela-se como pressuposto indissociável à plena eficácia dos direitos fundamentais [01].

            Essa é a razão pela qual os conceitos de democracia e de direitos fundamentais caminham sempre juntos [02], valendo referir que a origem dos direitos fundamentais remonta a resistência dos povos contra governos opressores e que a evolução histórica de tais direitos coincide, em seus pontos essenciais, com a própria criação e evolução do Estado e com o advento do constitucionalismo moderno [03].

            Cumpre referir, neste ponto, que as expressões direitos do homem, direitos humanos e direitos fundamentais serão utilizadas, no presente trabalho, com noções conceituais próprias e diversas, razão pela qual impõe-se, na presente introdução, e até mesmo para que se mantenha um mínimo de rigor terminológico, proceder a uma breve definição de cada um desses termos [04].

            Na linha do magistério doutrinário de Ingo Sarlet [05], os três termos acima mencionados devem ser diferenciados de acordo com um critério de concreção positiva ou de concretização normativa.

            Partindo dessa linha de classificação, a expressão direitos do homem é utilizada para designar, de maneira mais abstrata e "com contornos mais amplos e imprecisos" [06], aqueles direitos naturais ainda não positivados. Já o termo direitos humanos representaria aqueles direitos já positivados na esfera internacional, enquanto que o termo direitos fundamentais abrangeria aqueles direitos cujo reconhecimento e proteção estão assegurados em sede constitucional [07].

            Essa distinção [08], longe de possuir utilidade unicamente acadêmica, assume vital importância quando se analisa, por exemplo, a questão relativa aos elementos caracterizadores dos direitos fundamentais. Desse modo, por exemplo, pode-se falar na universalidade dos direitos do homem (vez que inerentes ao indivíduo enquanto tal) e na pretendida universalização dos direitos humanos (tenta-se implementar, em toda a comunidade internacional, a garantia dos direitos assegurados nas Declarações, embora se saiba que tal concretização global, na prática, ainda resta incompleta, permanecendo no campo das legítimas expectativas). Ao contrário disso tudo, não se pode pretender a universalidade dos direitos fundamentais, eis que, enquanto valores reconhecidos e positivados por cada ordenamento constitucional, os direitos fundamentais necessariamente variarão, em termos de sua abrangência e do grau de sua proteção, conforme a cultura predominante em cada uma das nações [09].

            Daí porque se pode afirmar, como precedentemente referido, que a evolução histórica ou (parafraseando o Prof. Fabio Konder Comparato) que a "afirmação histórica" dos direitos fundamentais se confunde, em suas linhas mestras, com a evolução do conceito e da função do Estado e, também – já que o instrumento formal da Constituição consubstancia o núcleo essencial das decisões políticas delineadoras do Estado –, mistura-se com o próprio advento do constitucionalismo moderno e, posteriormente, com o início do constitucionalismo social.

            Todas essas considerações se fazem relevantes eis que o presente trabalho tem como pretensão discutir, através de uma análise dos textos constitucionais de Weimar (1919) e do México (1917) e dos direitos fundamentais sociais neles positivados, a inicialidade do constitucionalismo social. Não se falará, portanto, no presente trabalho, de direitos do homem ou de direitos naturais. Também não serão abordados – não obstante sua importância – os inúmeros e expressivos documentos internacionais de reconhecimento e proteção dos direitos humanos, limitando-se, desse modo, o objeto do presente estudo, à análise de direitos e valores revestidos da nota da fundamentalidade, por efeito de sua positivação em sede constitucional.

            Com efeito, o início da idéia de direitos fundamentais – repita-se, de direitos e valores reconhecidos em sede constitucional – remonta o advento do Estado e das teorias contratualistas dos séculos XVII e XVIII que, com o objetivo específico de justificar e legitimar a criação da figura estatal, acentuavam que o soberano deveria exercer sua autoridade com submissão aos direitos de cada homem, o que simbolizava o advento da importantíssima idéia da supremacia do indivíduo sobre o Estado.

            Nesse contexto, surgiram os Estado liberais [10] – modernos – que, no contexto de proteção do cidadão contra indevidas ingerências do poder estatal, asseguraram uma esfera indevassável de proteção ao indivíduo, através da criação dos chamados direitos fundamentais de primeira dimensão (ou direitos da liberdade ou liberdades públicas), que, por isso mesmo, representam direitos e prerrogativas a serem exercidos contra o Estado.

            Incluem-se, entre outros, no rol das liberdades públicas, os direitos à propriedade privada, à intimidade, à privacidade, à liberdade de reunião, de associação e à livre manifestação do pensamento, ou seja, direitos que têm como elemento central a relação – essencialmente desigual – entre soberano e indivíduo e, como princípios norteadores, o liberalismo (quaisquer intervenções estatais são tidas como nocivas), o individualismo, a liberdade e a segurança.

            Ocorre, no entanto, que o passar do tempo e a alteração da realidade social fizeram com que a mera garantia de direitos a serem exercidos contra o Estado não fosse mais suficiente para permitir a plena realização do indivíduo em seu ambiente social.

            Na realidade, muitos dos direitos à liberdade então previstos nos ordenamentos constitucionais – tal como ocorria, por exemplo, com o direito à propriedade – somente eram exercidos por alguns membros da coletividade eis que, para os outros, faltavam meios que permitissem adquirir tais prerrogativas.

            A incipiente industrialização da sociedade (decorrente da Revolução Industrial, que teve início na Inglaterra do século XVIII, mas que posteriormente produziu efeitos – em maior ou menor grau – em todo o mundo) e a conseqüente ampliação e mudança de perfil do mercado de trabalho (antes eminentemente agrário e, agora, marcadamente industrial e urbano) trouxeram novas demandas que restavam desatendidas pelas Cartas Constitucionais de modelo clássico.

            A antecipada falência do modelo do constitucionalismo clássico começou a tornar-se mais evidente a partir do fim da primeira-guerra e, notadamente, a partir de 1917, quando o sucesso da Revolução Russa e o modo de produção socialista passaram a inspirar e motivar a classe trabalhadora de todo o mundo.

            E é exatamente neste período que se situam os dois diplomas constitucionais, que, por suas disposições de conteúdo eminentemente social, são tidos como marcos do constitucionalismo social (Constituição Mexicana de 1917 e Constituição de Weimar de 1919).

            Na realidade, grande parte da doutrina, ao se referir ao advento do constitucionalismo social, menciona, de maneira genérica, como momentos iniciais dessa nova fase constitucional, tanto o advento da Constituição do México como a promulgação da Constituição de Weimar, deixando de fazer qualquer menção individualizadora àquilo que cada um desses textos, per se, trouxe de original e inovador ao corpo das concernentes Cartas Políticas.

            Busca-se, portanto, através desse breve estudo, trazer alguns questionamentos sobre essa fase inicial do Estado Providência, pretendendo-se responder à indagação sobre se a Constituição de Weimar de 1919, apesar de cronologicamente posterior à Carta Constitucional Mexicana de 1917, poderia, ou não, ser considerada como decisivamente precursora do constitucionalismo social.

            Frise-se, neste ponto, por oportuno, que não se desconhece que disposições tópicas, relativas a um ou outro direito social, já constavam de textos constitucionais anteriores tanto à Constituição Mexicana quanto à Constituição de Weimar [11].

            Tal, no entanto, não assume relevância quando se tratar, como no presente caso, de estudo relativo ao início do constitucionalismo social, entendido este não apenas como a inserção isolada, em Cartas de índole eminentemente liberal, de dispositivos de natureza social, mas, sim, como o reconhecimento, pelo Estado – e através da inserção, nos respectivos textos constitucionais, de inúmeros artigos, posicionados de forma sistematizada, e relativos às inúmeras dimensões em que se projeta a vida do indivíduo em sociedade – de que, além de uma conduta negativa a ser assumida em tema de liberdades públicas, deve, o Poder Público, intervir no seio da coletividade para, mediante ação positiva, promover a igualdade material e permitir que todos exerçam, em iguais oportunidades, todos os direitos previstos em sede constitucional.

            Irretocável, sob tal aspecto, a advertência de Floriano Corrêa Vaz da Silva, que, ao versar o tema relativo ao advento do constitucionalismo social, assim se pronunciou [12]:

            "... seria uma esquematização simplista a afirmação de que as Constituições do século XIX foram todas puramente liberais e as Constituições do século XX marcadamente sociais. Em quaisquer Constituições, nas mais diversas épocas, podem ser encontrados e pesquisados dispositivos concernentes à ordem social e econômica, cláusulas que explícita ou implicitamente definem o regime econômico-social pretendido pelos constituintes. A própria ausência de cláusulas sociais numa Constituição traduz a opção por determinado sistema. E esta ausência, é claro, não impede uma lenta construção jurisprudencial, nem emendas constitucionais, nem legislação ordinária – que irão, pouco a pouco, delinear, dentro do sistema constitucional, uma série de direitos sociais e trabalhistas, que passam a integrar o arcabouço econômico-social do país. De qualquer modo, o fato é que as Constituições do século XIX foram, de um modo geral, Constituições liberais (...) pouco ou nada diziam explicitamente quanto aos direitos sociais, limitando-se, quase sempre, apenas à organização política. Apenas em algumas Constituições surgem normas que se relacionam com o chamado problema social....".

            No presente trabalho, portanto, tomar-se-á como premissa a circunstância de que a previsão pontual, em sede constitucional, de específico ou específicos dispositivos, isolado (s), relativo a um determinado direito de índole social não basta, por si só, para conferir à referida Constituição a natureza de Texto Constitucional Social.

            A contrario senso, a mera previsão, em sede constitucional, das chamadas liberdades públicas também não confere, ipso facto, à Carta Política, a qualidade de Texto Constitucional Liberal – mesmo porque o advento do constitucionalismo social não se deu mediante substituição das liberdades negativas pelos direitos prestacionais, mas, sim, mediante complementação (somatório) dos direitos de liberdade (indivíduo contra o Estado) com os direitos de natureza social (indivíduo enquanto membro de uma coletividade, exercendo direitos através do Estado).

            Vê-se, portanto, que o que confere natureza social a determinado ordenamento constitucional é o reconhecimento manifestado pelo Estado – e expresso no texto de sua Lei Fundamental – no sentido de que, além de garantir, aos cidadãos, o respeito às liberdades clássicas de que são titulares, a sua intervenção no seio sociedade é desejada e necessária para que os indivíduos possam melhor desfrutar de seus direitos e de suas garantias [13].

            Daí porque comumente se tem entendido que a fase do Constitucionalismo Social tem seu início marcado pelas Constituições Mexicana e de Weimar.

            Cumpre advertir, neste ponto, que não será considerada, no presente trabalho e para efeito comparatório, a Declaração Soviética dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado (1918) e a posterior Lei Fundamental Soviética (10/07/1918).

            É que, apesar da forte inspiração social de tais diplomas (eis que consubstanciavam os ideais motivadores da Revolução Socialista de 1917) eles, a pretexto concretizar avanços em tema de direitos sociais, culminaram por aniquilar os direitos de liberdade, cuja conquista levou séculos para efetivar-se [14].

            Na realidade, os avanços obtidos em tema de direitos sociais – se é que os houve – culminaram por ser ofuscados diante das opressões manipuladas por uma auto-reconhecida ditadura (ditadura do proletariado) que, nas linhas defendias por Schmitt, buscava a fusão entre Estado e sociedade, mediante a supressão das liberdades públicas.

            Não se pode atribuir, pois, o caráter de vanguarda em tema de proteção a direitos fundamentais a uma Carta que, além de ter significado um retrocesso no que se refere à liberdade pública de seus cidadãos, simbolizou típico instrumento de tratamento discriminatório e excludente entre o proletariado e as "classes possuidoras" [15].

            No sentido do caráter excludente das declarações soviéticas, a manifestação de Fabio Konder Comparato [16], para quem:

            "Entre a Constituição mexicana e a Weimarer Verfassung, eclode a Revolução Russa, um acontecimento decisivo na evolução da humanidade do século XX.O III Congresso Pan-Russo dos Sovietes, de Deputados Operários, Soldados e Camponeses, reunidos em Moscou, adotou, em 4 de janeiro de 1918, portanto antes do término da 1ª Guerra Mundial, a Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado. Nesse documento são afirmadas e levadas às suas conseqüências, agora com apoio da doutrina marxista, várias medidas constantes da Constituição mexicana, tanto no campo sócio-econômico quanto no político (...).

            Mas aí, como se vê, já se está fora do quadro dos direitos humanos, fundados no princípio da igualdade essencial entre todos, de qualquer grupo ou classe social. Desde o seu ensaio juvenil sobre a Questão Judiciária, publicado em 1843, Marx criticou a concepção francesa de Direitos dos Homens, separados dos direitos do cidadão, como consagradora da grande separação burguesa entre sociedade política e sociedade civil, dicotomia essa fundada na propriedade privada. Os direitos do homem não passariam de barreiras ou marcos divisórios entre os indivíduos, em tudo e por tudo semelhante aos limites da propriedade territorial. E os direitos do cidadão, sobretudo numa época de sufrágio censitário, nada mais seriam do que autênticos privilégios dos burgueses, em exclusão da classe operária. Na sociedade comunista, cujas linhas-mestras foram esboçadas no Manifesto do Partido Comunista, cinco anos mais tarde, só os trabalhadores têm direitos e só eles constituem o povo, titular da soberania política.

            Sem dúvida, na Constituição Mexicana de 1917 não se fazem as exclusões sociais próprias do marxismo: o povo mexicano não é reduzido unicamente à classe trabalhadora..."

            Também irretocáveis, neste ponto, as palavras de Vieira de Andrade, que coloca em destaque o caráter "subversivo" de algumas doutrinas do "movimento socializante", no que concerne ao conceito de direitos fundamentais [17]:

            "O movimento socializante modificou profundamente o sistema dos direitos fundamentais, mas, para além disso, alterou a própria ‘filosofia’ que lhes estava subjacente.

            Este movimento trouxe consigo doutrinas e teorias que, por modos diversos, representam um entendimento ‘subversivo’ da concepção liberal dos direitos fundamentais: a estatização fascista, que corporativizou os direitos; a massificação e o racismo nacional-socialista, que os destruíram por completo; a funcionalização marxista-leninista, que os expropriou e pôs a serviço de um projecto de sociedade.

            Apesar disso, pode afirmar-se que a tradição liberal ocidental não foi dissolvida. Ela ‘passa de uma maneira natural e perfeitamente coerente dos direitos de liberdade aos direitos políticos e depois aos direitos econômicos e sociais’ (...)".

            Na realidade, a percepção que se busca em tema de concretização dos direitos fundamentais deve colocar em evidência não um aspecto de mera sucessividade, mas, sim, um aspecto revelador da complementaridade [18].

            Em atenção ao viés substitutivo que foi conferido, às várias espécies de direitos fundamentais, pelas ditaduras socialistas, no sentido de que os direitos sociais sobrepõem-se e substituem-se às liberdades clássicas, muitos autores têm preferido utilizar o termo "dimensão", ao invés do termo "geração", para efeito de classificação dos direitos de liberdade (primeira dimensão), direitos sociais (segunda dimensão), direitos de solidariedade (terceira dimensão) e, até mesmo, dos direitos à democracia (quarta dimensão).

            Paulo Bonavides, um dos primeiros a sustentar, entre nós, a impropriedade da expressão "geração de direitos", assim manifestou seu entendimento:

            " Força é dirimir, a esta algura, um eventual equívoco de linguagem: o vocábulo "dimensão" substitui, com vantagem lógica e qualitativa, o termo "geração", caso este último venha a induzir apenas sucessão cronológica e, portanto, suposta caducidade dos direitos das gerações antecedentes, o que não é verdade. Ao contrário, os direitos da primeira geração, direitos individuais, os da segunda, direitos sociais, e os da terceira, direitos ao desenvolvimento, ao meio-ambiente, à paz e à fraternidade, permanecem eficazes, são infra-estruturas, formam a pirâmide cujo ápice é o direito à democracia..." [19].

            A crítica ao termo "gerações" de direitos fundamentais também é feita por Jorge Miranda, que, ao enfatizar a falsa impressão de alternância que ele pode gerar, profere o seguinte magistério:

            "Conquanto esta maneira de ver possa ajudar a apreender os diferentes momentos históricos de aparecimento dos direitos, o termo geração, geração de direitos, afigura-se enganador por sugerir uma sucessão de categorias de direitos, umas substituindo-se às outras – quando, pelo contrário, o que se verifica em Estado social de direito é o enriquecimento crescente em resposta às novas exigências das pessoas e das sociedades. Nem se trata de um mero somatório, mas sim de uma interpretação mútua, com a conseqüente necessidade de harmonia e concordância prática" [20].

            De fato, revela-se efetivamente mais adequada a utilização da expressão "dimensões" de direitos fundamentais [21], pois na medida em que novas prerrogativas são reconhecidas aos indivíduos, estas, longe de excluírem, devem sempre vir a complementar as demais prerrogativas já conquistadas. Mais do que isso, as dimensões mais recentes e os direitos fundamentais já tradicionalmente assegurados não só coexistem, como mantêm entre si uma relação de recíproca interação, influenciando-se mutuamente e fazendo com que o entendimento de cada um dos direitos fundamentais seja sempre interpretado (ou reinterpretado) em conformidade com o contexto global da totalidade das dimensões de direitos já reconhecidas.

            O novo entendimento que foi dado às liberdades clássicas, em função do advento dos direitos sociais, é um bom exemplo de reinterpretação de direitos em face do advento de uma nova dimensão de direitos fundamentais.

            Hoje, e em face do advento do constitucionalismo social, são extraídos dos direitos de primeira dimensão (tradicionalmente concebidos como direitos de índole negativa) um viés positivo que impõe, ao Poder Público, não apenas o dever de abstenção, mas, também, uma obrigação de fazer. Do direito à vida, portanto (direito de primeira dimensão), derivam, hoje, interpretando-se o direito à vida como o direito à uma existência digna, o direito à saúde, à assistência social e ao lazer (direitos de segunda dimensão) e, também, o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado (terceira dimensão) [22].

            É por essa razão que não se pode incluir, sob a denominação de constitucionalismo social, a Declaração de Direitos do Povo Trabalhador e Explorado e a Lei Fundamental Soviética de 1918 (10/07/1918), pois, para que se possa falar, propriamente, em constitucionalismo social, é preciso que se tenha, sob a égide de um Estado Democrático de Direito, a expressa positivação, em texto constitucional, da solene intenção estatal de consagrar, para além da igualdade formal e da liberdade individual, também a igualdade material e os demais direitos sociais dela decorrentes [23].

            Daí, portanto, o presente trabalho, que, ao perquirir sobre a inicialidade do constitucionalismo social, pretende, mediante cotejo analítico da Constituição Mexicana de 1917 e da Constituição de Weimar de 1919 (excluída, pois, pelas razões acima expostas, a Constituição Soviética [24]), revelar quais foram as inovações de cada um desses textos, buscando responder à indagação sobre se seria possível atribuir, a um desses diplomas, a qualidade de documento precursor do constitucionalismo social.


1.A CONSTITUIÇÃO MEXICANA DE 31 DE JANEIRO DE 1917

            1.1.antecedentes históricos

            A Constituição do México configura o reconhecimento e a positivação, em sede constitucional, das reivindicações e dos princípios inspiradores da Revolução Mexicana, iniciada em 1910. Por essa razão, tornar-se-ia despida de sentido qualquer análise do texto constitucional mexicano (ainda em vigor, não obstante objeto de emendas) que deixasse de examinar, mesmo que em linhas gerais, os antecedentes históricos que culminaram com a promulgação, em 31/01/1917, da Constituição de Querétaro.

            Essa estrita correspondência do texto constitucional mexicano com os pleitos constantes da Revolução Mexicana foi enfatizado pelo constitucionalista e ex-presidente da Corte Constitucional Fix-Zamudio, para quem "Nustra Constitución actual entronca directamente con la Revolución mexicana. Cierto que en un principio este movimiento no llevó como objetivo hacer una nueva Constitución. Se encabezó inicialmente por Madero contra la dictadura de Díaz, y después por Carranza para restaurar el orden constitucional quebrantado por Huerta, pero el desarrollo mismo de los acontecimientos condujo finalmente a la expedición de una nueva ley fundamental" [25].

            Também neste sentido, irretocáveis as palavras de Daniel Moreno [26], que, ao referir-se à Assembléia Constituinte convocada para elaboração da Constituição Mexicana de 1917, assim se manifestou:

            "Poucas vezes o pensamento jurídico foi devedor de forma tão determinante da realidade social e das idéias postas em jogo, como no caso da mencionada Assembléia. Foram assinaladas como causas fundamentais algumas de tipo econômico, sobretudo a dura exploração que sofriam os camponeses e as paupérrimas condições em que viviam os operários".

            Na realidade, apesar de a elaboração de um novo texto constitucional não ter sido, de fato, um dos objetivos da Revolução Mexicana, não é menos exato afirmar que o texto constitucional que sobreveio à dita revolução deu expressão máxima às aspirações por ela reivindicadas.

            Com efeito, a revolução mexicana iniciou-se em 1910, e o período de agitações sociais e políticas no México estendeu-se por quase 23 (vinte e três) anos após da promulgação da Carta Política de 1917 [27].

            A revolução mexicana mobilizou, em seu processo, milhões de camponeses e índios (estes, despojados que foram dos "ejidos" [28]) e se insurgia, essencialmente, contra a ditadura do Presidente Porfírio Díaz, que perdurou de 1876 a 1911 e que ficou conhecida como "porfiriato".

            Porfírio Diaz era apoiado, em seu governo, pelo exército, que possuía o poder de polícia do Estado, pela Igreja Católica, que tinha ampla liberdade de ação, por grandes empresas privadas (inclusive de origem estrangeira) e pelos grandes proprietários de terra, que haviam sido beneficiados com a política de extinção dos "ejidos". Daí que as principais reivindicações revolucionárias consistiam na proibição da reeleição do Presidente da República [29], no retorno dos "ejidos" e devolução das respectivas terras às comunidades indígenas, na nacionalização das grandes empresas e bancos, na consolidação de direitos trabalhistas à classe média emergente e na separação radical entre Igreja e Estado.

            O crescente autoritarismo de Porfírio Díaz passa à insustentabilidade, marcando o início do processo revolucionário que canalizou as insatisfações nacionais, nas eleições presidenciais de 1910, quando o latifundiário liberal Francisco Madero, líder do movimento que se opunha à reeleição do ditado é preso. Candidato único, Díaz é considerado eleito, uma vez mais.

            Francisco Madero, ao fugir da prisão, exila-se nos Estados Unidos, lança uma conclamação à rebelião armada destinada a derrubar Díaz e promete que, em havendo um novo governo, seria elaborada uma reforma eleitoral e seriam distribuídas terras aos camponeses.

            A resposta mexicana à proposta de Madero é entusiástica e, rapidamente, a revolta se alastra pelo país. Ao sul, o chefe camponês de maior relevância é Emiliano Zapata, que comanda 20 (vinte) mil homens na "Legião da Morte", armados com fuzis e facões utilizados para o corte de cana de açúcar. Ao norte, por sua vez, destacam-se como líderes Pancho Villa e Pascual Orozco.

            Com o recrudescimento do levante camponês, Porfírio Díaz renuncia e foge em 1911 e Madero é eleito novo Presidente.

            Ao contrário do esperado, no entanto, Madero não promove as prometidas alterações no aparelho estatal, o que gera profunda insatisfação dos líderes camponeses que o apoiaram, notadamente de Emiliano Zapata, que se recusa a desarmar seus homens e exige a reforma agrária negada pelo novo Presidente.

            Desatendido, Zapata promove, agora com o apoio de Pancho Villa, uma rebelião contra Madero e lança, em novembro de 1911, o célebre Plano Ayala, que dispunha sobre a distribuição de terra dos latifúndios para os camponeses.

            O Presidente Madero, em reação, envia o general Victoriano Huerta para derrotar Zapata, que repele a ofensiva do exército e passa a ser tido como um prestigiado líder das camadas mais pobres [30].

            Em fevereiro de 1913, enquanto a luta prossegue no Norte e no Sul, o general Huerta assassina Madero e se torna o novo Presidente, o que levou à instauração de uma passageira frente da oposição, com participação de Zapata e Villa, chefiada pelo liberal Venustiano Carranza, que proclama o Plano de Reconstrução Constitucional.

            Sob pressão das forças revolucionárias, em julho de 1914 o general Huerta renuncia, passando o poder para Carranza que, depois de 3 (três) anos de rebelião, dá início ao processo de construção das novas instituições mexicanas, o que apenas se consolidará mais de cinco anos mais tarde.

            Vitoriosos, os revolucionários dividem-se, agora, em constitucionalistas (Carranza e Álvaro Obregón), que propõem, simplesmente, a reforma da Constituição Liberal de 1857, e em convencionistas (Emiliano Zapata e Pancho Villa), que desejam implementar as propostas de transformações radicais da convenção de Aguascalientes (1914) [31].

            Nas regiões controladas por Zapata começam a ser colocadas em prática as reformas do Plano de Ayala, que prevê a devolução da terra às comunidades indígenas, expropriação de um terço das terras dos grandes proprietários para distribuição aos camponeses sem terra, fundação de um Banco Agrícola Nacional e de um Partido Agrário e confisco total das terras de quem se opusesse às reformas.

            As medidas colocadas em prática por Emiliano Zapata, no entanto, são mais radicais e vão além daquilo que foi proposto no texto original do Plano Ayala. Além da reforma agrária, formam-se escolas técnicas, fábricas de ferramentas e um banco de crédito rural.

            Venustiano Carranza, insatisfeito com as concretizações promovidas por Zapata, deseja institucionalizar e regulamentar as reivindicações revolucionárias, e, em 1917, promulga a nova Constituição Mexicana, inspirada pela doutrina anarcossindicalista de Bakunin [32].

            Dois anos mais tarde, a nova Constituição ainda era completamente ignorada pelo Governo, Zapata era assassinado à mando de Carranza (1919) e o país prossegue em guerra civil até que, em 1920, Carranza é deposto e assassinado, e assume a Presidência o general Álvaro Obregón, que, enfim, consolida a revolução. Pancho Villa abandona a luta em 1920 e é assassinado três anos depois. Em 1929 é fundado o Partido Revolucionário Nacional (PRN), rebatizado, em 1938, de Partido Revolucionário do México e, em 1946, de Partido Revolucionário Institucional (PRI), que se torna, por décadas, o virtual partido único no país [33].

            1.2.os debates da Constituinte

            Apesar de desnecessárias, algumas anotações referentes à Assembléia Constituinte ou aos debates nela travados serão, por sua peculiaridade, registradas no presente trabalho.

            Cabe referir, neste ponto, que todas as referências que ora se faz à Constituinte Mexicana foram extraídas da magnífica obra – já mencionada neste estudo na nota de rodapé nº 26 – El Constitucionalismo Social Mexicano – La integración constitucional de México (1808-1988), de Jorge Sayeg Elú.

            A primeira curiosidade que se gostaria de enfatizar refere-se ao fato de que os militares não só formavam a maioria da constituinte, mas também eram os portadores das idéias mais radicais ali suscitadas [34].

            Outro dado interessante refere-se ao curtíssimo espaço de tempo utilizado na discussão e aprovação do novo texto constitucional, já que a Assembléia Constituinte foi aberta em 01/12/1916 e a Constituição promulgada em 31/01/1917, ou seja, apenas dois meses depois [35].

            De fato, tal como já se enfatizou quando da análise dos antecedentes históricos da Constituição Mexicana, não havia, entre os próprios revolucionários, posição uniforme sobre a necessidade de proceder-se a uma mera revisão do texto constitucional liberal de 1857 ou de confeccionar-se um novo texto constitucional.

            Tanto é assim que no dia da abertura da Constituinte, o Presidente Carranza (que depois viria a matar Emiliano Zapata) apresentou ao Congresso seu projeto de "Constitución Reformada" [36].

            Apesar de se auto-reconhecer animado pelo melhor espírito de implementar as reivindicações revolucionárias, o projeto apresentado por Carranza foi tido como deficiente [37], tendo se expressado, no que toca "a las reformas sociales (...) en fórmulas amplias, casi abstractas, y reservaba su reglamentación efectiva a la ley secundaria" [38].

            No que se refere às freqüentes remessas, ao legislador ordinário, muito ocorrentes na Constituição Brasileira de 1988, e constantes do projeto de Constituição Reformada por Carranza, assim se pronunciou Helú [39]:

            "Mucho confió Carranza em el acierto de los legisladores ordinários, al pretender dejar a su cuidado el dictar las leyes reclamadas por el pueblo en los campos de batalla; por fortuna, empero, quienes acertaron fueron los legisladores constituyentes, al haber dado el paso decisivo, logrando romper aquel tabú que les impedia dar cabida dentro de la Constitución a las fórmulas sociales que una depurada técnica constitucional les aconsejaba a no incorporar a ella".

            Feitos esses breves registros sobre alguns aspectos interessantes, relativos à Assembléia Constituinte Mexicana, deve-se, agora, analisar em que medida os direitos constitucionais por ela consagrados efetivamente inovaram em tema de concretização de direitos fundamentais sociais, examinando-se, também, se, em face das prescrições constantes da Constituição Mexicana de 1917, pode, esse documento, ser tido como o precursor do constitucionalismo social, que iria influenciar grande parte das Constituições do pós-segunda guerra.

            1.3.o texto da Constituição Mexicana de 1917

            A Constituição Mexicana promulgada em 31/01/1917 – e que entraria em vigor em 01/05/1917 – compunha-se de 136 artigos (a maioria deles, longos e com vários incisos), além das disposições transitórias. Esses 136 artigos foram sistematizados em IX Títulos, que podiam, por sua vez, dividir-se em capítulos e seções. O Título I da Constituição Mexicana de 1917 era formado por IV Capítulos, quais sejam: Das Garantias Individuais (Cap. I), Dos Mexicanos (Cap. II), Dos Estrangeiros (Cap. III) e Dos Cidadãos Mexicanos (Cap. IV). O Título II possuía apenas dois Capítulos: Da Soberania Nacional e da Forma de Governo (Cap. I) e Das Partes Integrantes da Federação e do Território Nacional (Cap. II). O Título III organizava-se em quatro Capítulos: Da Divisão dos Poderes (Cap. I), Do Poder Legislativo (Cap. II) – este último capítulo dividia-se em IV Seções: Da eleição e da instalação do Congresso; Da iniciativa e da formação das leis; Da competência do Congresso e Da Comissão Permanente –, Do Poder Executivo (Cap. III) e Do Poder Judicial (Cap. IV). O Título IV tratava, unicamente, Das Responsabilidades dos Funcionários Públicos, o Título V, Dos Estados e da Federação, o Título VI (composto exclusivamente pelo célebre artigo 123), Do Trabalho e da Previdência Social. O Título VII tratava Das Disposições Gerais, O Título VIII, das Reformas da Constituição e, finalmente, o Título IX cuidava Da Inviolabilidade da Constituição.

            Da análise de cada um dos dispositivos constantes do texto constitucional mexicano, observa-se que a Constituição de 1917 não se limitou a consagrar, em seu corpo, as aspirações e reivindicações veiculadas pela Revolução, garantindo, também, ao lado das determinações de índole social, em seu Capítulo I (Das Garantias Individuales), inúmeros direitos clássicos à liberdade.

            Dentre o extenso rol de direitos de primeira dimensão constantes do Capítulo I, do Título I, da Constituição Mexicana, destacam-se os seguintes: proibição da escravidão (art. 2º); igualdade entre os sexos (art. 4º); liberdade de expressão e de informação (art. 6º); vedação à censura prévia (art.. 7º); direito de petição (art. 8º); liberdade de reunião e de associação (art. 9º); direito à livre circulação (art. 11); princípio do juiz natural e proibição de juízo de exceção (art. 13); irretroatividade das leis prejudiciais aos cidadãos (art. 14); devido processo (art. 14, § 1º); legalidade em matéria penal (art. 14, § 2º); vedação à extradição por crimes políticos (art. 15); inviolabilidade de domicílio (art. 16); sigilo de correspondências (art. 16, § 2º); vedação ao exercício arbitrário das próprias razões (art. 17); acesso gratuito ao Poder Judiciário ( art. 17, § 1º); vedação de prisão por dívida (art. 17, § 3º); garantias do acusado (art. 20 – frise-se, no ponto, que o sistema penal mexicano funda-se sobre a "base do trabalho"); vedação de penas cruéis (art. 22); princípio do non bis in idem (art.23); liberdade religiosa (art. 24); mandato de seis anos conferido ao Presidente da República, "que por nenhum motivo poderá voltar a desempenhar este posto" [40] (art. 83 – direito à alternância política) e separação Estado/Igreja (art. 130).

            Ao lado dos direitos de liberdade acima referidos, a Constituição Mexicana de 1917 previu, também, direitos e garantias de segunda dimensão. Estes – apesar de constantes, em sua essencialidade, nos arts. 27 e 123 – não se concentram em um único Capítulo da Constituição, apresentando-se, ao contrário, dispersos ao longo de todo o texto da Carta Política.

            Sob tal aspecto, deve-se destacar as seguintes previsões: proteção à família (art. 4º) [41], direito à saúde, de incumbência da Federação e das entidades federativas (art. 4º, § 2º), direito à moradia digna, a ser concretizado por meio de apoio Estatal (art. 4º, § 3º), proteção pública dos menores (art. 4º, § 4º), direito ao trabalho e ao produto que dele resulta (art. 5º), proibição de contratos que importem na perda de liberdade do indivíduo (art. 5º, § 4º) [42] e a vedação à constituição de monopólios (art. 28 – direito este de natureza eminentemente econômica).

            Além de tais direitos de segunda dimensão, a Constituição Mexicana previu, em linhas gerais, em seu artigo 27 (pertinente à questão agrária no México e tido como um dos pilares da consagração, no texto constitucional, das idéias fulcrais da Revolução), a propriedade da nação relativamente às terras e águas (que podiam, ou não, ser transmitidas a particulares, mediante propriedade privada), a possibilidade de desapropriação de terras por utilidade pública, mediante indenização, a proteção da pequena propriedade (art. 27, XV) e a função social da propriedade.

            Ao lado questão agrária, tratada no art. 27 da Constituição, o artigo 123 (que compunha o Título VI: Del Trabajo e de Prevision Social) consubstanciava o outro pilar sustentador da consagração das aspirações revolucionárias em sede constitucional. Destaca-se, neste dispositivo – tido por alguns doutrinadores como inaugurador do Direito Constitucional do Trabalho – as seguintes prescrições: direito ao emprego e correlata obrigação do Estado de promover a criação de postos de trabalho (art. 123, "caput"); jornada de trabalho máxima de 8 (oito) horas (I); jornada noturna de 6 (seis) horas (II); proibição do trabalho aos menores de 14 e jornada máxima de 6 (seis) horas aos maiores de 14 e menores de 16 (III); um dia de descanso para cada 6 dias trabalhados (IV); direitos das gestantes (V); salário mínimo digno (VI), a ser estabelecido com uma comissão nacional formada por representantes dos trabalhadores, patrões e do governo; direito a salários iguais aos que exercem iguais funções, sem discriminação de gênero ou nacionalidade (VII); participação dos trabalhadores nos lucros das empresas (IX); horas extras limitadas a três diárias, realizadas no máximo três dias consecutivos, e acrescidas de 100% (XI); criação de um fundo nacional de habitação, a ser administrado pelo Governo Federal, pelos trabalhadores e pelos patrões (XII, § 1º); direito à capacitação ao trabalho (XIII); responsabilidade do empregador por acidente de trabalho (XIV); direito à formação de sindicatos (XVI); direito de greve, reconhecido inclusive em favor dos patrões e em favor dos funcionário públicos (art. XVII); criação das juntas de conciliação, formada por igual número de representantes dos trabalhadores e dos patrões e por um representante do governo (XX); direito à indenização em caso de demissão sem justa causa (XXII) e reconhecimento da utilidade pública da Lei de Seguro Social, que compreenderá "seguros por invalidez, por velhice, seguros de vida, de interrupção involuntária do trabalho, de enfermidades e acidentes de trabalho e qualquer outro seguro destinado à proteção e ao bem-estar dos trabalhadores, dos camponeses, dos não-assalariados e de outros setores sociais e respectivos familiares" (XXIX – traduzi).

            Interessante notar que, não obstante seja o rol de direitos conferidos ao trabalhador de notável abrangência e extensão (deixando de observar, por isso mesmo, a melhor técnica constitucional [43] ao estabelecer, em sede constitucional, prescrições de índole eminentemente infraconstitucional [44]), não foi a classe trabalhadora relevante no processo revolucionário mexicano, pois, consoante já assinalado, a população mexicana que, em 1910, deu início ao movimento contrário ao ditador Porfírio Díaz, era eminentemente composta por camponeses já que o México ainda não tinha experimentado um processo de industrialização que o permitisse contar com uma numerosa classe operária.

            Daí porque parece ser o artigo 27 – pertinente à questão agrária mexicana – aquele que incorporou, de uma maneira mais fiel, as legítimas reivindicações constantes da revolução e aquele que atendeu, de maneira mais imediata, os pedidos que mais afetavam, diretamente, a vida dos mexicanos.

            Nesse sentido, manifesta-se Ary Brandão de Oliveira [45], que, citando Nestor de Buen [46], e ao colocar em destaque o viés eminentemente camponês da revolução mexicana, afirma que "A questão operária ainda não se fazia sentir em um país que apenas iniciava seu processo de industrialização. Por outro lado, a sensibilidade dos jovens generais e chefes revolucionários orientava-se no sentido da adoção de soluções enérgicas na ordem jurídica laboral".

            Mário de la Cueva, ao enfatizar a importância do art. 123 da Constituição Mexicana e ao investigar as origens do movimento em prol de uma legislação trabalhista no México, adverte que a ingerência no desenvolvimento do direito do trabalho mexicano deve-se, unicamente, ao governo presidencialista, não tendo assumido, a classe operária, nenhuma participação nesse processo [47].

            Registre-se, finalmente, um aspecto pouco referido da Constituição Mexicana de 1917: a sua nítida integração, ao lado dos direitos de primeira e de segunda dimensão, de direitos fundamentais de terceira dimensão.

            Com efeito, como se sabe, os direitos de terceira geração são aqueles que protegem não o homem, considerado isoladamente, mas, sim, a coletividade como um todo, razão pela qual trata-se de direitos de titularidade difusa, fundados nos princípios da fraternidade ou da solidariedade. No rol dos direitos fundamentais de terceira dimensão incluem-se, por exemplo, o direito a um meio ambiente equilibrado, o direito à paz, à autodeterminação dos povos e à preservação do patrimônio histórico e cultural [48].

            O artigo 3º das Constituição Mexicana, ao versar sobre o sistema público de educação, afirma que este deverá promover, além de todas as faculdades do ser humano, "a consciência da solidariedade internacional", em claro beneplácito ao princípio inspirador dos direitos de terceira dimensão e com nítida percepção de que determinados valores devem ser protegidos não apenas em relação ao indivíduo (primeira dimensão) ou a uma coletividade nacional (segunda dimensão), mas, sobretudo, em face de toda a comunidade (terceira dimensão).

            Já no artigo 25, que trata sobre a intervenção do Estado no domínio econômico, afirma-se que os setores sociais e privados da economia sujeitam-se aos interesses públicos e ao uso, em benefício geral, dos recursos produtivos, devendo-se cuidar, portanto, de "su conservación y el médio ambiente" (art. 25, § 4º).

            No artigo 27, por sua vez, ao serem disciplinados a reforma agrária o modo de organização dos assentamentos, reconhece-se a necessidade de se editar medidas para "preservar y restaurar el equilibrio ecológico" e, também, para "evitar la destrucción de los elementos naturales".

            Da análise dessas três passagens constantes do texto constitucional mexicano, poder-se concluir que tal diploma não apenas reconheceu e positivou direitos de terceira dimensão, mas, também – ao colocá-los em relação de recíproca interação e mútua influência com outros direitos fundamentais, como, por exemplo, o direito à propriedade (1ª dimensão) e a função social da propriedade (2ª dimensão) – teve nítida percepção do caráter complementar que lhes é inerente.


2.A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE WEIMAR (1919)

            2.1.antecedentes históricos

            Assim como a Constituição Mexicana que cronologicamente lhe antecedeu, também a Constituição de Weimar nasceu num período de profundas perturbações sociais.

            Para analisar o contexto histórico em que se deu o advento da Constituição de Weimar, deve-se remeter à vitória alemã, liderada por Bismarck, na Guerra Franco-Prussiana (1870) e no estímulo que esta vitória representou para o início da luta de unificação federalizada dos principados e das cidades livres de língua alemã na Confederação Germânica.

            Concretizada, sob o reinado do Kaiser Guilherme II, a criação do Primeiro Reich, a Alemanha experimentou um notável crescimento urbano-industrial, o que gerou um aumento em sua classe operária militante e, consequentemente, nas reivindicações por ela manifestadas.

            Essa realidade de prosperidade interna representou, também, um dos fatores que impulsionaram a Alemanha a tomar parte na acirrada disputa Européia por fatias de mercado consumidor e, consequentemente, a participar da Primeira Grande Guerra, da qual saiu como grande derrotada.

            A entrada da Alemanha na Primeira Guerra, no entanto, trouxe profundas conseqüências internas, causadas pelo elevado número de mortos e feridos [49] e, também, pela profunda crise econômica que se abateu sobre um país totalmente voltado a atividades bélicas [50].

            Marco Aurélio Peri Guedes, em sua dissertação de mestrado, afirma que "A guerra começou em 4 de agosto de 1914, sem que a Alemanha estivesse economicamente preparada. Na verdade – prossegue ele – os militares e os políticos esperavam que a guerra fosse vencida em poucas semanas. Não houve qualquer preocupação governamental em estocar alimentos para uma guerra em longo prazo, até porque tudo estava concentrado no esforço de guerra" [51].

Nos últimos anos de guerra, a situação interna na Alemanha é de profundo caos, o que também foi agravado pelo intenso bloqueio naval inglês, que trouxe escassez de alimentos à população e conseqüente inflação de preços [52]. Nesse contexto, levantes começam a eclodir em toda a Alemanha, levantes estes que, agora, além de decorrerem da miséria e da crise social internas, eram também inspirados pelo recente e próximo exemplo da União Soviética [53].

            Iniciou-se uma verdadeira revolução bolchevista no seio do Reich. Os partidos de extrema esquerda – espartaquistas e socialistas independentes – exigiam a dissolução das instituições parlamentares alemãs [54]. Em novembro de 1918 eclodiu na Alemanha uma rebelião naval que culminou por transformar-se numa guerra civil [55]. Tal revolta, iniciada em 1918, no porto de Kiel, foi assim descrita por Lionel Richard [56]:

            "Os marinheiros se haviam recusado a seguir os oficiais que queriam continuar a guerra no mar. As más condições de vida fizeram o resto: a bandeira vermelha foi hasteada nos navios e 20.000 marujos armados ocuparam o porto. Desarmaram oficiais, libertaram os prisioneiros nos quartéis, elegeram um conselho de soldados. Com esse exemplo, interromperam o trabalho nas fábricas. Os grevistas formaram um conselho de operários. Após Kiel, o processo se repetiu em Stuttgart e Hamburgo. As estações foram ocupadas, as tropas levantaram contra os oficiais, os comandantes militares foram substituídos, os meios de transporte requisitados por soldados em revolta. Símbolos de séculos de opressão, as insígnias foram por toda parte destruídas; bandeiras vermelhas foram hasteadas; organizaram-se conselhos de operários e de soldados..."

            A reforma constitucional do texto alemão, de 03/11/1918, que determinou a parlamentarização da Alemanha e que passou o poder ao Príncipe Max von Baden [57] (que também estava incumbido de celebrar o armistício com os Estados Unidos) foram, portanto, tardias e não contiveram o fluxo das agitações sociais [58]. Na linha do relato histórico feito por Comparato [59], tem-se que logo após tal reforma constitucional, já em 08/11/1918, uma República "Democrática e Socialista" era proclamada na Baviera.

            Sentindo que a esquerda mais radical – especialmente o grupo Spartak, liderado por Karl Liebknecht – ganhava o apoio das lideranças populares, os sociais democratas (integrantes do partido socialista majoritário) abandonam definitivamente o governo e convocam uma greve geral.

            O Príncipe Marx, então, anuncia a abdicação do Imperador, designa Friederich Ebert (líder dos social-democratas) para exercer as funções de chanceler, propondo, ainda, a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte. Precipitando-se, no entanto, Philip Scheidemann, ministro integrante da social-democracia, anuncia, no mesmo dia, no balcão da chancelaria em Berlim, a proclamação da República [60].

            Formou-se, então, um governo provisório (Conselho dos Delegados do Povo), chefiado por Ebert e que compreendia três integrantes da social-democracia (SPD) e outros três integrantes do Partido Social Democrático Independente (USPD) [61]. Esse governo provisório, no entanto, tinha objetivos divergentes [62] pretendendo, o SPD, a convocação de Assembléia Constituinte e o estabelecimento de uma democracia parlamentar, enquanto que o USPD buscava o imediato estabelecimento de uma ditadura do proletariado, com a completa socialização da economia nos moldes soviéticos.

            Essa divergência foi solucionada mediante a convocação de um congresso de representantes das diferentes províncias integrantes do Reich, que, reunido em Berlim, em 20/01/1919, deliberou, por ampla maioria, no sentido da convocação de uma assembléia constituinte.

            O local escolhido para sediar a Assembléia Constituinte foi Weimar eis que, além de trazer a inspiração de Goethe, que ali vivera, ficava afastava das lutas travadas em Berlim em função do levante spartakista [63]. É que dias antes (entre 6 e 15 de janeiro), as forças militares alemãs travaram violentos conflitos em Berlim contra os militantes Spartak, do que resultou o assassinato de seus líderes Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht.

            Convocadas as eleições para a Assembléia Constituinte, antecipava-se aquilo que seria uma das causa da ruptura de Weimar: a absoluta fragmentação política e ausência de maioria positiva no Parlamento [64]. Sob tal aspecto, irretocáveis as palavras de Bourthoumieux [65]:

            Cette dissociation du pouvoir réel et du pouvouir legal caractérise dés le début la période nouvelle et marque ce qui en será la loi constante: necessite de réaliser et de maintenir um compromis entre des forces naturellement divergentes. Ce compromis, uniquement imposé par la crainte commune de la Révolution n’est qu’une tréve momentanée pour les adversaires de la République. Il ne suppose aucun accord sur les questions politiques et sociales. Cet accord n’exist même pas dans la coalition républicaine des socialistes, des democrats et du centre. Dés les premières séances de l’Assemblée nationale, il fut visible que seuls les discourses qui exaltaient l’heroisme des armées et repoussaient toute responsabilité du Reich dans la guerre étaient capable de faire l’unnanimité".

            Os membros do SPD obtiveram a maioria da cadeiras [66], mas não sua maioria absoluta (163, num total de 414). As demais cadeiras restaram pulverizadas entre partidos de tendências diversas, restando, o USPD, com apenas 22 representantes. Os spartak [67] não participaram da Assembléia Constituinte [68].

            O projeto da Constituição de Weimar foi redigido por Hugo Preuss, professor de origem judaica adepto do comunitarismo, até então alijado do centro acadêmico alemão [69], discípulo de Otto v. Gierke e influenciado por Weber, que era considerado um dos poucos juristas de tendências de esquerda [70].

            Em 9 de julho de 1919, a Assembléia ratificaria o Tratado de Versalhes (verdadeiro Diktat) – que, pelas duras penalidades e indenizações econômicas que impôs à Alemanha, representaria um outro fator determinante do colapso de Weimar em 1933 (após o golpe final desferido pela Crise de 1929) – e, em 11 de agosto de 1919, restava promulgado o novo texto constitucional da república alemã (agora, uma República Federativa, formada por 17 Länder).

            2.2.o texto da Constituição de Weimar de 1919

            A Constituição Alemã de 1919 era composta por 165 artigos (excetuando-se as disposições transitórias), divididos em dois livros: Livro I, relativo à "Estrutura e Fins da República" e o Livro II, pertinente aos "Direitos e Deveres Fundamentais do Cidadão Alemão". O Livro I, por sua vez, ao dispor sobre a estrutura e as finalidades da República, dividia-se em 7 (sete) capítulos, quais sejam: Capítulo I (A República e os estados); Capítulo II (O Parlamento); Capítulo III (O Presidente da República e o Governo Federal); Capítulo IV (O Conselho da República); Capítulo V (A Legislação da República), Capítulo VI (A Administração de República) e Capítulo VII (A Administração da Justiça).

            Já o Livro II do texto constitucional de Weimar, que estabelecia os direitos e os deveres fundamentais do cidadão alemão, possuía os seguintes capítulos: Capítulo I (A pessoa individual); Capítulo II (A vida social); Capítulo III (Religião e agrupamentos religioso); Capítulo IV (Educação e escola) e Capítulo V (A vida econômica).

            O Livro I, enquanto veiculador da organização do Estado, da estruturação de seus órgãos e dos limites de atuação dos Länder em face do Reich e de cada um dos Poderes Políticos em relação aos demais, não traz maiores inovações eis que, em regra, os textos políticos destinam-se a estabelecer prescrições de tal natureza [71].

            Foi sobre livro II, no entanto (que compreende os artigos 109 a 165), que incidiu maior parte da atenção dos estudiosos. Não faltaram críticas aos direitos e garantias nele constantes. Técnicas de hermenêutica foram aprimoradas para permitir que os direitos fundamentais conferidos por estes dispositivos ao povo alemão pudessem alcançar nível mais elevado de concretização. Chegou-se também a sustentar que a Constituição alemã possuía uma contradição absoluta entre seus dois livros, que estabeleciam uma organização liberal de Estado, de um lado, e conferiam direitos de natureza socialista, de outro (Schmitt).

            O fato, no entanto, é que o rol sistematizado de direitos constante do Livro II da Constituição de Weimar, ao garantir tanto liberdades públicas como prerrogativas de índole social, notabilizou e celebrizou a Constituição Alemã de 1919, que, não obstante suas imperfeições – inerentes à toda obra humana –, inspirou textos constitucionais por todo o mundo, inclusive no Brasil (Constituição de 1934).

            Não obstante seja o Livro II dividido em cinco capítulos temáticos (A pessoa individual; A vida social; Religião e agrupamentos religiosos; Educação e escola e A vida econômica), revela-se incompleto o estudo que, partindo apenas da análise dos respectivos títulos, pretenda classificar, a priori, quais as dimensões de direitos fundamentais foram contempladas em cada um desses capítulos.

            É que o Capítulo II, por exemplo – que tem como tema central "A vida social" –, não apenas dispõe, ao contrário do que pode parecer, sobre direitos fundamentais de índole social, possuindo, também, prescrições de natureza eminentemente liberal, consagradoras das chamadas liberdades públicas, tal como aquela referente ao direito de petição (Capítulo II, art. 126).

            Desse modo, apesar de a Constituição de Weimar possuir, como característica, a organização e sistematização de seus preceitos (ao contrário do que se verifica na Constituição Mexicana), ainda assim as diversas espécies de direitos fundamentais encontram-se dispersas no corpo do texto constitucional, devendo-se, portanto, para identificá-las, proceder a um exame de cada um dos 165 artigos da referida Carta Política.

            Desse modo, dentre o extenso rol de direitos fundamentais de primeira geração constantes da Constituição de Weimar, destacam-se os seguintes: direito à igualdade (art. 109); igualdade cívica entre homens e mulheres (art. 109, § 1º); direito à nacionalidade (art. 110); liberdade de circulação no território e para fora dele (arts. 111 e 112); direito das minorias de língua estrangeira (art.113); inviolabilidade de domicílio (art. 115); irretroatividade da lei penal (art. 116); sigilo de correspondência e de dados telegráficos ou telefônicos (art. 117); liberdade de manifestação do pensamento (art. 118); vedação à censura, exceto para proteger a juventude e para combater a pornografia e a obscenidade [72] (art. 118, § 1º); proteção ao matrimônio e à família (art. 119) [73]; igualdade jurídica entre os cônjuges (art. 119); igualdade entre filhos havidos na constância ou fora do matrimônio (art. 121); liberdade de reunião (art. 123); liberdade de associação (art. 124); direito ao voto secreto (art. 125); direito de petição ao Poder Público (art. 126); igualdade de acesso aos cargos públicos (art. 128); direito adquirido e reivindicáveis perante o Poder Judiciário, em tema aspirações patrimoniais de servidores públicos e soldados de carreira (art. 129, "caput" e § 3º); liberdade de consciência e crença religiosa (art. 135); separação Estado/Igreja (art. 137); liberdade de associação religiosa (art. 137, § 1º) e liberdade de sindicalização (art. 159).

            Dentre os direitos de segunda dimensão – que conferem o caráter social à Constituição de Weimar – devem-se destacar as seguintes garantias: proteção e assistência à maternidade (arts. 119, § 2º e 161); direito à educação da prole (art. 120); proteção moral, espiritual e corporal à juventude (art. 122); direito à pensão para família em caso de falecimento e direito à aposentadoria, em tema de servidor público (art. 129); direito ao ensino de arte e ciência (art. 142); ensino obrigatório, público e gratuito (art. 145); gratuidade do material escolar (art. 145); direito a "bolsa estudos", ou seja, à "adequada subvenção aos pais dos alunos considerados aptos para seguir os estudos secundários e superiores, afim de que possam cobrir a despesa, especialmente de educação, até o término de seus estudos" (art. 146, § 2º); função social da propriedade [74]; desapropriação de terras, mediante indenização, para satisfação do bem comum (art. 153, § 1º); direito a uma habitação sadia (art. 155); direito ao trabalho (arts. 157 e art.162); proteção ao direito autoral do inventor e do artista (art. 158); proteção à maternidade, à velhice, às debilidades e aos acasos da vida, mediante sistema de seguros, com a direta colaboração dos segurados (Art. 161 - previdência social); direito da classe operária a "um mínimo geral de direitos sociais" (art. 162); seguro desemprego (art. 163, § 1º) e direito à participação, mediante Conselhos – Conselhos Operários e Conselhos Econômicos –, no ajuste das condições de trabalho e do salário e no total desenvolvimento econômico das forças produtivas, inclusive mediante apresentação de projeto de lei (art. 165).

            Registre-se, por oportuno, que, tal como ocorre com a Constituição Mexicana de 1917, também um aspecto da Constituição de Weimar costuma ser desconsiderado pela doutrina: a existência, no corpo de seu texto, de dispositivo destinado, unicamente, a contemplar direitos fundamentais de terceira dimensão.

            Com efeito, o art. 150 da Constituição da República Alemã de 1919, ao dispor que "Os monumentos de arte, históricos e naturais, bem como a paisagem, gozam da proteção e incentivo estatais", positivou, em sede constitucional, típicos direitos de terceira dimensão, titularizados por toda a coletividade, e consistentes na garantia de preservação do meio ambiente ("monumentos naturais" e "paisagem") e de conservação dos patrimônios históricos e culturais ("monumentos históricos" e "monumentos de arte").


3.UMA ANÁLISE COMPARATIVA DOS TEXTOS DA CONSTITUIÇÃO MEXICANA E DA CONSTITUIÇÃO DE WEIMAR

            Inicialmente, procederemos a um cotejo das disposições constantes de cada uma dessas Cartas Políticas, relativamente aos direitos fundamentais de primeira dimensão:

            Direitos Fundamentais de Primeira Dimensão.

            Constituição Mexicana de 1917

            Constituição de Weimar de 1919

            Direito à igualdade

            Art. 4º

            Art. 109

            Liberdade de circulação no território nacional e para fora ele

            Art. 11

            Arts. 111 e 112

            Direitos das minorias

            _

            Art. 113

            Inviolabilidade de domicílio

            Art. 16

            Art. 115

            Irretroatividade da lei penal

            Art.14

            Art. 116

            Sigilo de correspondências

            Art. 16 § 2º

            Art. 117 (incluídos os sigilos aos dados telegráficos e telefônicos)

            Liberdade de manifestação do pensamento

            Art. 6º

            Art. 118

            Vedação à censura

            Art. 7º

            Art. 118, § 2º (exceto na proteção à juventude e no combate à pornografia)

            Proteção ao matrimônio e à família (garantias institucionais)

            _

            Art. 119

            Igualdade jurídica entre cônjuges

            _

            Art. 119

            Igualdade jurídica entre filhos havidos na constância ou fora do matrimônio

            _

            Art. 121

            Liberdade de reunião e associação

            Art. 9º

            Arts. 123 e 124

            Direito de petição ao Poder Público

            Art. 8º

            Art. 126

            Igualdade de acesso aos cargos públicos

            -

            Art. 128

            Direitos adquiridos

            _

            Art. 129, "caput" e § 3º (relativamente a pretensões pecuniárias relativas a servidores públicos e soldados de carreia

            Liberdade de consciência e crença religiosa

            Art. 24

            Art. 135

            Separação Estado/Igreja

            Art.130

            Art. 137

            Proibição à escravidão

            Art 2º

            _

            Princípio do juiz natural e proibição de juízo de exceção

            Art. 13

            _

            Devido processo

            Art. 14 § 1º

            _

            Vedação ao exercício arbitrário das próprias razões

            Art. 17

            _

            Acesso gratuito ao Poder Judiciário

            Art. 17 § 1º

            _

            Vedação de prisão por dívida

            Art. 17, § 3º

            _

            Princípio do "non bis in idem" em matéria criminal

            Art. 23

            _

Do exame do quadro acima, pode-se perceber que as duas Constituições tiveram percepção semelhante no que se refere à necessidade de não apenas abranger-se a proteção constitucional aos direitos de índole social, mas, também, de se preservar-se o conteúdo das liberdades públicas já alcançadas.

            Não há nada de discrepante entre os dois textos constitucionais em exame (Constituição Mexicana de 1917 e Constituição de Weimar de 1919) que indique que qualquer um desses diplomas (frutos, respectivamente, de uma revolução camponesa e de uma assembléia constituinte convocada em meio à profunda crise econômica e a perturbações sociais também imputáveis à ameaça socialista) tendesse, desde seu início, à instituição de regimes autoritários.

            Pelo contrário, o quadro acima reflete que o rol das liberdades públicas foi ampliado nos textos Mexicanos e de Weimar, cabendo destacar, por sua vanguarda, dispositivo da Constituição de Weimar que assegurava a igualdade entre filhos, havidos na constância do matrimônio ou não.

            Chama a atenção, no entanto, a ausência, no texto de Weimar, de dispositivos integrantes do chamado "direito processual constitucional", consistentes nos princípios básicos do devido processo legal e do juiz natural. Nada há, no entanto, como já acentuado, que indique o caráter proposital dessa "lacuna".

            Já no que se refere aos direitos de segunda dimensão, pode-se perceber uma nítida diferenciação entre os dois textos, no que se refere aos temas sociais prioritários, eleitos pelos diplomas Constitucionais para os fins de outorgar-se especial proteção.

            Com efeito, pode-se observar que a Constituição Mexicana – apesar de ter reconhecido outros direitos, como o direito à educação (art. 3º), à saúde (art. 4º, § 2º) e o direito à moradia (art. 4º, § 3º) – concentrou-se, de maneira sensível – e até mesmo em razão de sua origem –, na solução das questões agrárias (art. 27) e dos direitos trabalhistas (art. 123).

            Os direitos sociais fulcrais no ordenamento jurídico mexicano são o reconhecimento da função social da propriedade e da possibilidade de esta ser distribuída através de desapropriação, de um lado, e a outorga de especial proteção ao trabalhador, inclusive mediante a instalação de um regime de previdência social, de outro.

            Na realidade, uma análise dos textos constantes dos arts. 27 e 123 revelam que todos os demais direitos ali elencados decorrem, materialmente, do direito de proteção ao trabalho, de um lado, e da função social da propriedade, de outro.

            Esse aspecto, por óbvio, não pode, de maneira alguma (e nem aqui se pretende isso), desqualificar o texto constitucional mexicano, indubitavelmente a Constituição que, cronologicamente, instaurou a fase do constitucionalismo social, ao prever, em seu corpo, ao lado das liberdades clássicas, direitos fundados na essencial igualdade material dos indivíduos, garantindo, aos camponeses, a possibilidade de obtenção de terra mediante sua redistribuição pelo Governo e o respeito à pequena propriedade rural e assegurando, aos trabalhadores, direitos mínimos, como aqueles relativos à jornada de trabalho, à fixação de um salário mínimo, à especial proteção conferida aos ambientes de trabalho periculosos ou insalubres, à participação nos lucros das empresas, à proteção à trabalhadora gestante e à possibilidade de se submeter as controvérsias decorrentes do contrato de trabalho a um órgão de julgamento neutro, composto por igual número de representantes de trabalhadores e patrões e por um membro do governo. Os avanços alcançados pela Constituição Mexicana de 1917 em tema de direito agrário e de direito do trabalhador são, portanto, irrecusavelmente notáveis.

            Deve-se destacar, no entanto, que apesar da primazia cronológica mexicana em tema de positivação constitucional de direitos de natureza social, a abrangência e a extensão nas quais esses direitos foram consagrados (com enfoque nas questões agrárias e trabalhistas) fizeram com o exemplo Mexicano, não obstante inspirador, culminasse por configurar um modelo de referência quase que regional, muito adequado à realidade daquele país, mas pouco universalizante.

            Com efeito, as reivindicações concernentes à necessidade de se conferir especial proteção aos trabalhadores em geral, consoante se observou do breve relato do contexto histórico do pós-guerra, eram praticamente global, ao menos em tema de mundo ocidental (até mesmo em face do exemplo e da ameaça soviéticas).

            O advento de uma nova classe operária, mais organizada em função de seus interesses, foi conseqüência de um processo de industrialização da produção que, em uma ou outra medida e em graus diversos de intensidade, atingiu a quase totalidade dos países europeus e americanos, o que fez com que reivindicações de direitos trabalhistas fossem uma constante na época.

            Sob tal aspecto, a Constituição Mexicana desempenhou papel de vital importância, pois, não apenas reconheceu direitos, mas, também, conferiu-lhes estatura constitucional, tudo a significar a especial proteção de que seriam titulares.

            Irretocáveis, no ponto, as palavras de Karl Loewenstein [75]:

            "Como postulados expressamente formulados, os Direitos Fundamentais socioeconômicos não são absolutamente novos: alguns deles, como o direito ao trabalho, foram inscritos nas Constituições Francesas de 1793 e 1848. Mas foi apenas em nosso século, depois da primeira e, em maior grau ainda, depois da segunda guerra mundial, que se converteram no equipamento-padrão do constitucionalismo. Foram proclamados pela primeira vez na Constituição Mexicana de 1917, que, com um salto, se poupou todo o caminho para realizá-los: todas as riquezas naturais foram nacionalizadas e o Estado assumiu completamente, pelo menos no papel, a responsabilidade social para garantir uma existência digna a cada um de seus cidadãos".

            Deve-se registrar, no entanto, a advertência de Mario de la Cueva, que, ao colocar em destaque a falta de originalidade do art. 123 da Constituição Mexicana, afirma que a maioria das disposições ali contidas já eram conhecidas de outros povos.O legislador mexicano, segundo ele, inspirava-se visivelmente nas experiências de países como França, Bélgica, Itália, Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia [76].

            A circunstância de que o conteúdo material das prescrições trabalhistas veiculadas pela Constituição Mexicana já havia sido contemplado em outros textos legais europeus, associado, ainda, ao fato de que, na Europa, a questão agrária, de longe, não assumia as feições com que ela se registrava no México, culminaram por fazer com que a Constituição Mexicana tivesse, ela própria, pouca influência na confecção das outras constituições que aderiram ao modelo do constitucionalismo social.

            Utilizando-se de expressão constante do texto de Loewenstein, pode-se afirmar que a Constituição Mexicana, apesar de cronologicamente pioneira, culminou por não assumir a condição de "equipamento-padrão", inspirador e conformador dos textos constitucionais posteriores.

            A questão dos direitos trabalhistas, de grande relevância na época, não era nova nos países Europeus (não obstante tais prescrições não contivessem, tão detalhadamente, de textos constitucionais). Também o tratamento dado à questão agrária mexicana, por peculiar, não poderia ser estendido, de maneira irrestrita, às futuras Constituições.

            Adicione-se a isso, ainda, a existência, à época, de poucos doutrinadores mexicanos que, ao analisarem a Constituição de 1917, difundissem, por suas obras, as conquistas sociais alcançadas em continente americano. Como resultado, tem-se a pouca repercussão, fora daquele país, do texto constitucional mexicano.

            Ao contrário disso tudo, a Constituição de Weimar, que nascia dois anos após, previa, ao lado dos direitos dos trabalhadores e do estabelecimento da função social da propriedade, um rol sistematizado de outros direitos, do qual se destacam, por exemplo, o avançado sistema de educação pública, obrigatória e gratuita, que previa, inclusive, a gratuidade do material escolar e a subvenção de famílias carentes para que seus filhos possam ir à escola (arts. 145 e 146). O sistema de previdência social, por sua vez, foi estabelecido de maneira mais organizada e explícita, com previsão de participação do segurado (art. 161), sendo, ainda, dividido em regime de previdência do setor público – para funcionários públicos (art. 129) – e regime geral de previdência (art. 161). Estabeleceu-se, também, como meio de incentivo à pesquisa, o direito à proteção autoral do inventor e do artista (art. 158).

            O Capítulo V da Constituição de Weimar, por sua vez, ao tratar sobre "A vida econômica",estabeleceu, ao lado de prescrições como a pertinente à função social da propriedade (art. 153) e à criação de um regime previdenciário (art. 161), um sistema de participação de empregados ("de todos os grupos profissionais importantes") na condução das políticas de "desenvolvimento econômico das forças produtivas". (art. 165).

            Essa participação era concretizada através dos celebrizados Conselhos Operários (que se organizavam, em termos de abrangência, da seguinte maneira: conselho operário de empresa, conselho operário de circunscrição e Conselho Supremo do Trabalho, além dos Conselhos Econômicos de circunscrição e do Conselho Supremo de Economia).

            Nos termos da Constituição Alemã, "todos os projetos de leis político-sociais ou político-econômicos, de importância fundamental, devem passar pelo conhecimento do Conselho Supremo de Economia, antes de serem apresentados" (art. 165, § 2º). O Conselho Superior de Economia, ele próprio, também tinha poderes para apresentar projetos de lei de sua iniciativa.

            Através da instituição dos Conselhos, a Constituição de Weimar reconheceu não apenas a necessidade de intervenção estatal em determinadas esferas, para os fins de viabilizar a fruição, por um maior número de pessoas, dos direitos fundamentais por ela previstos, mas estabeleceu, também, que os termos, as medidas e os modos com os quais essa intervenção se efetivaria deveriam contar com o apoio, o respaldo e a opinião das categorias econômicas envolvidas.

            As prescrições de direitos fundamentais sociais constantes da Constituição de Weimar, desse modo, parecem concretizar preocupações de caráter menos regional e mais abstratas e universalizantes [77], mais adaptáveis, portanto, à realidade de outros países e, por isso mesmo, mais inspiradora.

            Adicione-se a isso tudo, o fato de que a Constituição de Weimar veio acompanhada e enriquecida por um intenso debate, travado entre nomes de peso (como, por exemplo, Schmitt, Kelsen, Heller, Anschütz, Smend, entre outros tantos), que, seja criticando, seja preservando, culminou por dar expressão e divulgar a experiência alemã para o restante do mundo.

            Parecem irretocáveis, desse modo, as palavras de Ary Brandão de Oliveira, que, o tratar referir-se à Constituição Mexicana de 1917, assim se pronunciou [78]:

            Efetivamente, seria faltar à verdade afirmar uma repercussão que inexistiu. Em termos genéricos, a Europa desconheceu a legislação mexicana. As atenções do mundo jurídico se voltaram para a Constituição alemã de Weimar, a cuja promulgação seguiu-se vigorosa literatura. Nesse particular, a avançada posição mexicana viu-se prejudicada pela escassez de estudos doutrinários a seu respeito".

            Também nessa linha é o entendimento de Dario José Kist [79], para quem embora seja a Constituição Mexicana "um dos primeiros marcos da legislação social", a "principal das legislações constitucionais de cunho social que apareceram foi a Constituição Alemã de 1919", eis que o advento do diploma constitucional mexicano se deu "sem maiores expressões e influências fora do México".


4.CONCLUSÃO

            De todo o exposto, conclui-se que a Constituição Mexicana de 1917 e a Constituição de Weimar de 1919 devem sempre ser lembradas, ambas, como os primeiros textos constitucionais que efetivamente concretizaram, ao lado das liberdades públicas, dispositivos expressos, impositivos de uma conduta ativa por parte do Estado, para que este viabilize a plena fruição, por todos os cidadãos, dos direitos fundamentais de que são titulares.

            Um outro aspecto importante e pouco lembrado das Constituições Mexicana e Alemã (1919) é a expressa referência, delas constante, à garantia de direitos fundamentais de terceira dimensão, como aqueles pertinentes à proteção ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural.

            A importância desses dois textos constitucionais, portanto, é notável, vez que dão início a uma nova fase do constitucionalismo (fase esta ainda em discussão e novamente posta em questionamento), que é a fase do constitucionalismo social.

            Advirta-se, por oportuno, que nenhum desses textos deve ser analisado pelos resultados que efetivamente gerou, eis que, como se sabe, a Constituição de Weimar teve vida breve (até 1933), tendo assistido ao advento do regime nazista, e o diploma Mexicano, embora em regime de plena vigência, têm questionados, por alguns doutrinadores, seus atributos de identidade e rigidez constitucional, ante a numerosa quantidade de reformas a que já foi submetido.

            Feitas essas considerações, e não deixando de colocar em destaque a importância histórica e política dessas duas notáveis Constituições, não se pode deixar de atribuir à Weimar a qualidade de texto constitucional preponderante em tema de inauguração da fase do constitucionalismo social.

            Na realidade, coube a Weimar ser o "equipamento-padrão" [80] que motivou, influenciou e conformou a elaboração de Constituições, que, por todo o mundo, passaram, agora, a sistematizar, em seus textos, disposições pertinentes aos direitos econômicos e sociais dos indivíduos, bem assim relativas à maneira como deve atuar o Estado na implementação de tais garantias.

            Essa preponderância de Weimar sobre a Constituição Mexicana, cronologicamente anterior, deve-se não apenas à circunstância de se tratar de uma constituição promulgada em solo europeu (e não em longínquas terras americanas), mas, também, à natureza mais abstrata e menos "local" de suas prescrições e à força, autoridade e vivacidade da doutrina constitucional alemã da época, que fez correr pelo mundo as vitórias e as vicissitudes do novo texto republicano de 1919.


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NOTAS

            01GONET BRANCO, Paulo Gustavo, in: MENDES, Gilmar Ferreira/ COELHO, Inocêncio Mártires/ GONET BRANCO, Paulo Gustavo, Hermenêutica constitucional e direitos fundamentais, 1ª ed., 2º tir., Brasília, Brasília Jurídica, 2002, p. 104.

            02 Na realidade, tal como enfatizaremos no corpo do presente trabalho, e até mesmo em função da complementaridade que é inerente às diversas categorias de direitos fundamentais, tais direitos – para que sejam reais e efetivos, e não apenas abstratos – sempre devem vir acompanhados da noção de Estado Democrático. É por tal razão que não se considerará, no presente estudo, e em tema de constitucionalismo social, as diversas Constituições outorgadas no âmbito da União Soviética, nas quais, a pretexto de se proteger direitos de índole social, aniquilaram-se as liberdades públicas dos cidadãos.

            03 MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional, 3ª ed., Coimbra, Coimbra Editora, 2000, tomo IV, p. 22. Nesse mesmo sentido: MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais, 5ª ed., São Paulo, Atlas, 2003. Segundo Afonso Arinos de Mello Franco (Curso de direito constitucional brasileiro, Rio de Janeiro, Forense, 1958, vol. I, p. 188), "não se pode separar o reconhecimento dos direitos individuais da verdadeira democracia...".

            04 Deve-se destacar que nem todos os autores distinguem o conceito desses três termos. Paulo Gustavo Gonet Branco, p. ex., distingue apenas os direitos humanos dos direitos fundamentais, aqueles primeiros sendo sinônimos dos direitos do homem. GONET BRANCO, Paulo Gustavo, opus cit., p. 125. Alexandre de Moraes (MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais, 5ª ed., São Paulo, Atlas, 2003) e Manoel Gonçalves Ferreira Filho (FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos Humanos Fundamentais, São Paulo, Saraiva, 1996), por sua vez, preferem, como bem o dizem os títulos de suas respectivas obras, a expressão direitos humanos fundamentais. Canotilho fala em "direitos fundamentais formalmente constitucionais" e "direitos materialmente fundamentais", representando, aqueles, os direitos reconhecidos e consagrados por normas de estatura constitucional e, estes últimos, os outros direitos fundamentais, constantes de outras leis ou de atos internacionais (GOMES CANOTILHO, Joaquim José. Direito Constitucional, 6ª ed.,Coimbra, Almedina, 1996, p. 528). José Afonso da Silva, de seu turno, entende que a expressão ideal seria "direitos fundamentais do homem" (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 12ª ed., São Paulo, Malheiros, 1996, p. 176).

            05 SARLET, Ingo. A eficácia dos Direitos Fundamentais, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 1998, p. 32.

            06 Após uma análise sobre as diversas posições no tema, Bruno Galindo culmina apenas por distinguir direitos humanos (ou direitos do homem) e direitos fundamentais, estes últimos representando todos os direitos e garantias positivados seja em sede constitucional doméstica, seja no âmbito internacional: GALINDO, Bruno. Direitos Fundamentais: análise de sua concretização constitucional, Curitiba, Juruá, 2003, p.47/49.

 07 Cf. também, sobre o assunto, Jorge Miranda: ".. . a locução ‘direitos fundamentais’ remonta principalmente a Constituição de Weimar e tende agora a generalizar-se. Usam-na entre tantas, Constituições como a alemã (...), a moçambicana (...), a angolana (...), a espanhola (...) ou a búlgara (...) – assim como a portuguesa (...). Explicam esse fenômeno o ultrapassar da concepção oitocentista dos direitos e liberdades individuais e, sobretudo, o enlace entre direitos e Constituição. Porque constantes da Lei Fundamental, são os direitos fundamentais aqueles direitos que assumem também a específica função que a Constituição vem adquirindo na Europa e no resto do mundo, ao longo dos últimos cinqüenta anos – em resultado de preceitos expressos, do papel proveniente da justiça constitucional e de uma crescente consciência difundida na comunidade jurídica" (MIRANDA, Jorge. opus cit., p. 51/52).

            08 Em sentido contrário ao do texto, o Professor Sérgio Resende de Barros expressamente rejeita a distinção terminológica ora proposta. BARROS, Sérgio Resende de. Direitos Humanos. Paradoxo da Civilização, Belo Horizonte, Del Rey, 2003, p. 37/38.

            09 Frise-se, por relevante, que essa distinção não faz com que os três referidos conceitos sejam estanques. Há interação. Os direitos humanos internacionais muitas vezes encontram matizes nos direitos consagrados pelos Estados e estes, por sua vez, muitas vezes positivam em suas constituições normas de direitos relativos à pessoa humana constantes de diplomas internacionais. Daí a importância, por exemplo, da Declaração Universal de 1948, que inspirou muitas constituições do pós-guerra.

            10. Constituição Norte-Americana de 1787 e Constituição Francesa de 1791. Não se ignora a importância de documentos como Magna Carta (1215), a Petition Right (1628), a Habeas Corpus Act, (1679) e a Bill of Rights (1689). Repita-se, no entanto, que os objetivos – limitados, é certo – do presente trabalho centram-se na análise de textos constitucionais, para, a partir deles, estudar-se a passagem do constitucionalismo liberal para o constitucionalismo social.

            11 Basta apenas lembrar, para tanto, por exemplo, que a Constituição Imperial do Brasil, de 1824, já previa o direito à educação, típico direito de natureza social.

            12. VAZ DA SILVA, Floriano Corrêa. Direito Constitucional do Trabalho, São Paulo, LTR, 1977, p. 35.

            13 Alguns exemplos de Constituições Liberais que continham dipositivos sociais: Constituição da Venezuela de 1812 (Constituição da Província de Barcelona), art. 23 (proteção ao trabalho e "seguro-desemprego"), Constituição Francesa de 1848, art. 13 (assegurou o direito ao trabalho e a garantia ao trabalho), Constituição Suíça de 1874, art. 34 (previa o direito da Confederação, e não dos Cantões, de editar normas uniformes sobre o trabalho das crianças nas fábricas, jornada de trabalho dos adultos e proteção ao trabalhador nas hipóteses de exercício de atividade perigosa ou insalubre). Cf., sobre o direito ao trabalho na Constituição Francesa de 1848: LAVIGNE, Pierre. Le Travail dans les Constitutions Françaises 1789-1945, Paris, Recuel Sirey, 1939; MORAES, Alexandre de. opus cit., p. 29.

            14 Alexandre de Moraes, ao analisar a Lei Fundamental Soviética, afirma que "apesar desses direitos, a citada Lei Fundamental Soviética, em determinadas normas, avança em sentido oposto à evolução dos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana...". MORAES, Alexandre de. opus cit., p. 31.

            15 Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado, art. 5º.

            16 COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos Direitos Humanos, 2ª ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 184/186.

            17 VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, Coimbra, Almedina, 1987, p. 53.

            18 Cf., sobre o atributo da complementaridade dos direitos fundamentais: MORAES, Alexandre de. opus cit., p. 41; FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves/ GRINOVER, Ada Pellegrini/ CUNHA FERRAZ, Anna Cândida. Liberdades Públicas – parte geral, São Paulo, Saraiva, 1978, p. 80.

            19 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 12ª ed., São Paulo, Malheiros, 2002, p. 525.

            20 MIRANDA, Jorge. opus cit., p. 32.

            21 No sentido do texto: SARLET, Ingo. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 1998, p. 47; GALINDO, Bruno. opus cit., p. 58. GUERRA FILHO, Willis Santiago. A dimensão processual dos direitos fundamentais e da Constituição, in Revista de Informação Legislativa, nº. 137, Janeiro/Março, 1998, p. 14.

            22 Outro bom exemplo da recíproca interação verificada entre as sucessivas gerações de direito é dada por Willis Santiago Guerra Filho. Segundo ele, o direito de propriedade, hoje, (direito de primeira dimensão), deve exercer sua função social (interpretação segundo os direitos de segunda dimensão), cuidando-se, ainda, de atender à preservação do meio-ambiente (interpretação conforme os direitos de terceira dimensão). GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo Constitucional e Direitos Fundamentais, São Paulo, Celso Bastos, 1999, p. 40.

            23 Neste sentido, irretocáveis as palavras de Vieira de Andrade: "(...) as idéias de igualdade e de fraternidade, em parte significativa introduzidas na luta histórica pela crítica marxista e socialista do regime econômico e social do capitalismo e pelo pensamento social cristão, desenvolveram-se, impuseram-se e, harmonizadas com a liberdade fundamental, deram origem a uma ‘concepção liberal moderna’ ou concepção social dos direitos fundamentais, que corresponde à realidade vigente na generalidade dos países da Europa Ocidental, a que se convencionou chamar ‘Estado-de-Direito Social’". VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. opus cit., p. 54 (grifo nosso).

            24 Interessante observar que o Professor Jorge Miranda, em obra por ele organizada (MIRANDA, Jorge. Textos Históricos do Direito Constitucional, 2ª ed., Lisboa, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1990, p. 247/293 e 295/317), incluiu, no capítulo destinado à "Transição para o Estado Social de Direito" (Capítulo VI), unicamente, as Constituições Mexicana e de Weimar, tendo sido dedicado, à Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado e à primeira Constituição Soviética, um capítulo à parte (Capítulo VII), intitulado "A Revolução Soviética".

            25 FIX-ZAMUDIO, Héctor/ CARMONA, Salvador Valencia. Derecho Constitucional Mexicano y Comparado, 2ª ed., México/DF, 2001, Porrúa, p. 89/90. Cf., também, Néstor de Buen (BUEN, Néstor de. Derecho del Trabajo, México, Porrúa, 1977, vol. I, p. 232), que afirma não poder a Constituição Mexicana ser dissociada da "filosofia da Revolução que lhe deu vida".

            26 MORENO, Daniel. Derecho Constitucional Mexicano, Cidade do México, Porrúa, 1973, p. 227.

            27 Para breve relato histórico da Revolução Mexicana, Cf. COMPARATO, Fábio Konder. opus cit., p. 183/184. Para aprofundado relato sobre os antecedentes históricos de todas as Constituições Mexicanas: HELÚ, Jorge Sayeg. El Constitucionalismo Social Mexicano – La integración constitucional de México (1808-1988), México, Fondo de Cultura Económica, 1991.

            28 Propriedades coletivas de origem indígena.

            29 Não obstante a luta revolucionária tenha se insurgido contra a ditadura presidencial de Díaz, a Constituição Mexicana de 1917 culminou por conferir amplíssimos poderes à figura do Presidente da República. Miguel Carbonell (CARBONELL, Miguel. Estado Constitucional y Fuentes del Derecho en México: notas para su estudio", in Revista Quadrimestrale Sociología del Diritto, nº 02/2003, p.88) afirma que o Presidente Mexicano dispõe de poderes que "en otro país serían propias de un cuasi-dictador", e cita o seguinte trecho de discurso, proferido na tribuna da Assembléia Constituinte: "en España, señores, a pesar de que hay un rey, yo creo sinceramente que aquel rey había de querer ser presidente de la República Mexicana, porque aquí tiene más poder el presidente que un rey, que un emperador".

            30 Tornou-se célebre o lance ousado de Zapata, que vai disfarçado à Cidade do México para uma audiência com o Presidente, na busca de obter a legalização de seu Exército de Libertação do Sul. O Presidente Madero, no entanto, recusou-se a negociar.

            31 FIX-ZAMUDIO, Héctor/CARMONA, Salvador Valencia. opus cit., p. 91.

            32 Sobre a influência anarcossindicalista da Constituição Mexicana de 1917, cf: COMPARATO, Fabio Konder. opus cit., p. 183; KIST, Dario José. O Estado Social e o surgimento dos Direitos Fundamentais de Segunda Geração, in Revista da AJURIS n° 80/2000, p. 95.

            33 "A transformação desse ideário em normas constitucionais, no entanto, produziu um efeito político exatamente contrário ao objetivo visado, pela primeira vez, na movimentada história do caudilhismo mexicano, criou-se uma sólida estrutura estatal, independente da figura do chefe de Estado, ainda que a Constituição o tenha dotado de poderes incomensuravelmente maiores do que o texto constitucional norte-americano atribuiu ao presidente da república. O ideário anarquista de destruição de todos os centros de poder engendrou contraditoriamente, a partir da fundação do Partido Revolucionário Institucional em 1929, uma estrutura monocrática nacional em substituição à multiplicidade de caudilhos locais". COMPARATO, Fabio Konder., opus cit., p. 183/184".

            34 HELÚ, Jorge Sayeg. opus cit., p. 600.

            35 HELÚ, Jorge Sayeg., opus cit., p. 604.

            36 Idem ibidem.

            37 HELÚ, Jorge Sayeg., opus cit., p. 605.

            38 HELÚ, Jorge Sayeg., opus cit., p. 606.

            39 HELÚ, Jorge Sayeg. opus cit., p. 607.

            40 A questão relativa não apenas à proibição de reeleição (que pressupõe a recondução no cargo sem solução de continuidade), mas referente, também, à impossibilidade de que aquele que foi Presidente volte a desempenhar este mesmo cargo reflete, como já analisado, as angústias revolucionárias contra o "porifiriato".

            41 Garantia institucional, na linha de Schmitt, eis que não protege o indivíduo enquanto tal, mas, unicamente, enquanto membro de determinada instituição, esta sim, protegida imediatamente.Sobre o pensamento de Schmitt sobre as garantias institucionais, Cf. SCHMITT, Carl. Teoria de la Constitutión, Madrid, Alianza Editorial, 1982. O tema també é analisado, entre outros, por Gilberto Bercovici (BERCOVICI, Gilberto. Entre o Estado Total e o Estado Social. Atualidade do debate sobre direito, Estado e economia na República de Weimar. Tese de Livre-Docência apresentada ao Departamento de Direito Econômico e Financeiro da Faculdade de Direito da USP, São Paulo, 2003, p. 18/19) e Paulo Bonavides. opus cit., p. 494/496).

            42 O dispositivo mencionado possui a seguinte redação (traduzi): "O Estado não pode permitir que se leve a efeito nenhum contrato, pacto ou convênio que tenha por objeto o menoscabo, a perda ou o irrevogável sacrifício da liberdade da pessoa (...)". Esse artigo, e também as hipóteses de nulidades contratuais absolutas, previstas no inciso XXVII, do art. 123, s.m.j., possuem caráter pioneiro em tema de positivação, em sede constitucional, do princípio da aplicação horizontal dos direitos fundamentais, até hoje ainda muito discutido na doutrina e muito questionado em alguns países, como aqueles que possuem larga tradição em tema de liberdade de contratar (os Estados Unidos, p. ex.). Cf., sobre aplicação horizontal dos direitos fundamentais: GONET BRANCO, Paulo Gustavo. opus cit., p. 169/180; NUNES ABRANTES; José João. A vinculação das Entidades Privadas aos Direitos Fundamentais, Lisboa, AAFDL, 1990; BILBAO UBILLOS, Juan Maria. La eficácia de los Drechos Fundamentales frente a particulares, Madri, CEPC, 1997; VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. opus cit., p. 278; HESSE, Konrad. Derecho Constitucional y Derecho Privado, Madri, Civitas, 1995; SARLET, Ingo Wolfgang. A Constituição Concretizada. Construindo pontes com Público e o Privado, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2002.

            43 COMPARATO, Fabio Konder. opus cit., p. 186 ("nem todos os direitos trabalhistas lá consagrados podem ser considerados, objetivamente, como direitos humanos")

            44 Mario de la Cueva põe em destaque a falta de originalidade do art. 123 da Constituição Mexicana, afirmando que a maioria das disposições ali contidas já eram conhecidas de outros povos. Enfatiza, no entanto, referido doutrinador, que o caráter inovador da Constituição Mexicana consiste em que pela primeira vez os direitos do trabalhador já reconhecidos receberam a estatura de norma constitucional. CUEVA, Mario de la. Derecho Mexicano del Trabajo, México, Porrúa, 1960, vol. I.

            45 OLIVEIRA, Ary Brandão de. A Constitucionalização do Direito do Trabalho, in Revista do TRT/8ª Região, v. 24, nº 46/1991, p. 66.

            46 BUEN, Nestor de. Derecho del Trabajo, México, Porrúa, vol. I, p. 232.

            47 CUEVA, Mario de la. Derecho Mexicano del Trabajo, México, Porrúa, 1960, vol. I.

            48 Sobre direitos fundamentais de terceira dimensão, inclusive sobre os questionamentos relativos à fundamentalidade, ou não, de tais direitos: GONET BRANCO, Paulo Gustavo. opus cit., p. 111/112; LUÑO, Perez. Los Derechos Fundamentales, Madri, Tecnos, 1993, p. 215; MORAES, Alexandre de. opus cit., p. 45/46; FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. opus cit., p. 57; LAFER, Celso. A Reconstrução dos Direitos Humanos – Um Diálogo com o Pensamento de Hannah Arendt, São Paulo, Cia das Letras, 1988; SARLET, Ingo. opus cit., p 51; BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos, Rio, Editora Campus, 1992, p. 9; BONAVIDES, Paulo. opus cit., p. 522/524.

            49 Segundo Comparato, 10% da população masculina da Alemanha faleceu (ou desapareceu) durante a Primeira Guerra. COMPARATO, Fabio Konder. opus cit., p. 195.

            50 Sobre as condições de vida na Alemanha durante a Primeira Guerra, Cf: BESSEL, Richard. Germany after the first world war, New York, Oxford University Press, 1995, cap. I.

            51 PERI GUEDES, Marco Aurélio. Estado e Ordem Econômica e Social – A experiência constitucional da República de Weimar e a Constituição Brasileira de 1934, Rio de Janeiro, Renovar, 1998, p. 35.

            52PERI GUEDES, Marco Aurélio. opus cit., p. 37.

            53 Cf., também, sobre o contexto social da Alemanha durante a Primeira Guerra: CARR William. A History of Germany 1815- 1990, London, Edward Arnold, 1991.

            54 VAZ DA SILVA, Floriano Corrêa. Constitucionalismo Social, in Curso de Direito Constitucional do Trabalho – Estudos em Homenagem ao Professor Amauri Mascaro Nascimento, LTR, vol. I, p. 42.

            55 COMPARATO, Fabio Konder. opus cit., p. 196.

            56 RICHARD, Lionel. A República de Weimar (1919-1933), São Paulo, Cia das Letras, 1988, p. 29/31.

            57 Segundo Comparato, a abdicação do Kaiser Guilherme II e a nomeação de seu filho, Max de Baden, foram tentativas de "abrir mão tão-só da coroa imperial, permanecendo como rei da Prússia". COMPARATO, Fábio Konder. opus cit., p. 196.

            58 BRUNET, René. La Constitution Allemande du 11 aout 1919, Paris, Payot & Cie, 1921, p. 32/33.

            59 COMPARATO, Fábio Koder. opus cit., p. 196/198.

            60 Para Dietrich Orlow (ORLOW, Dietrich. A History of Modern Germany – 1871 to present, 3ª ed., New Jersey, Prentice Hall, 1995, p. 121/122, apud PERI GUEDES, Marco Aurélio. opus cit., p. 42, nota nº. 80), tanto a nomeação de Ebert quanto a proclamação da República foram inconstitucionais.

            61 Marco Aurélio Peri Guedes esclarece que o USPD (Partido Social Democrata Independente da Alemanha) foi uma dissidência do SPD (Partido Social Democrata da Alemanha), ocorrida em 1917. O USPD representava a ala marxista mais sectária do partido social democrata, este último também conhecido como socialista majoritário ou moderado. PERI GUEDES, Marco Aurélio. opus cit., p. 43.

            62 Nesse sentido: COMPARATO, Fabio Konder. opus cit., p. 197; THALMANN, Rita. A República de Weimar, Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1988, p. 11.

            63 Sobre a escolha de Weimar para sediar a Constituinte: PERI GUEDES, Marco Aurélio. opus cit., p. 52/53; JAMIL CURY, Carlos Roberto. A Constituição de Weimar: Um capítulo para a educação, in Revista Quadrimestral de Ciência da Educação, nº 63/1998, p.86; KIST, José Dario. opus cit., p. 96.

            64 Nesse sentido, Gilberto Bercovici, segundo o qual "A Constituição de Weimar foi elaborada em um contexto político cujo equilíbrio era precário e instável". BERCOVICI, Gilberto. opus cit., p. 11.

            65 BOURTHOUMIEUX, Ch. Fédéralisme et Démocratie dans la Constitution de Weimar et la Loi Fondamentale de Bonn. in Revue Internationale de Droit Comparé, janeiro/março de 1950, p. 28.

            66 Sobre o mau desempenho da esquerda nas eleições para a Constituinte: MISES, Ludwig von. Omnipotent Government, in www.mises.org/etexts: " At the begining of 1919 the communists were already much less numerous than their leaders believed…".

            67 Sobre a liga spartakista, Cf.: HOLBORN, Hajo. History of Modern Germany 1840-1945, Princeton: Princeton University Press, 1981, p. 523, apud PERI GUEDES, Marco Aurélio. opus cit., p. 51. Marco Aurelio Peri Guedes afirma que a liga Spartakus ou Sapartakista foi uma dissidência do Partido Comunista Alemão (KPD). Tal dissidência foi promovida sob a liderança de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo e buscava uma maior fidelidade ao marxismo. O movimento spartakus sempre foi um grupo político marginal, que só se tornou conhecido com o levante spartakista em Berlim, do qual resultou a morte de ambos os líderes, ordenada por Gustav Noske. PERI GUEDES, Marco Aurélio. opus cit., p. 51.

            68 Para participação na Assembléia Constituinte, elegeram-se 421 representantes de 6 partidos: 44 membros da direita conservadora, 19 membros da direita populista, 91 membros do partido católico, 75 membros do partido centrista, 165 membros da social-democracia e 22 membros da social-democracia independente. Constata-se, pois, a absoluta fragmentação política da Assembléia, bem assim a derrota dos partidos de esquerda. Nesse sentido: VAZ DA SILVA, Floriano Corrêa. opus cit., p. 43; THALMANN, Rita. opus cit., p. 15; BRUNET, René. opus cit., p. 47. Carlos Roberto Jamil Cury prefere a menção a percentuais, afirmando que as esquerdas moderadas (o partido comunista não participou das eleições) obtiveram 45% das cadeiras, a centro-direita 33,3% e a direita 14,7%. Trinta e sete mulheres foram eleitas para a Constituinte. JAMIL CURY, Carlos Roberto. opus cit., p. 86.

            69 Nesse sentido: JACOBSON, Arthur J./SCHLINK, Bernhard. Weimar a Jurisprudence of Crises, University of Califonia Press, 2002, p.110/111: "During the Empire, Preuss had been an outsider among fellow scholars of the law of the state – unlike, for example, Gerhard Anschütz, one of his generation’s few other pro-republican scholars of state of law. Preuss was never offered a professorship at a German university; political and scholarly reservations as well as anti-Semitic prejudice kept him from the centers of scholarly life in the Empire. It was not an accident that he taught at the far less respected Berlin College of Commerce, a private school founded by the Berlin business community...".

            70 A questão de a escolha de Preuss ter se fundado em sua suposta proximidade com a esquerda da época foi enfatizada por Walter Jellinek. Apud BERCOVICI, Gilberto. opus cit., p. 14.

            71 Não se ignora que algumas instituições já tradicionais possam ter recebido tratamento inovador por parte da Constituição de Weimar. Ao Parlamento, por exemplo, foi concedido o direito de instalação de Comissões de Investigação (como uma CPI, hoje), tendo sido previsto, ainda, o funcionamento de Comissões Permanentes destinadas ao estudo de específicas matérias (arts. 34 e 35). O foco do presente estudo, no entanto, situa-se na identificação das novas instituições que, somente após da Constituição Alemã de 1919, passaram a constar das Cartas Políticas modernas.

            72 Interessante observar que este dispositivo da Constituição de Weimar já prevê uma situação de colisão entre direitos fundamentais, tal como ocorre nas hipóteses em que se opõem a liberdade de manifestação do pensamento, de um lado, e a dignidade da pessoa humana, de outro (muitas vezes ofendida nas hipóteses de pornografia). Admite-se, pois, que não há direitos fundamentais absolutos, devendo-se, na hipótese de confronto entre eles, estabelecer restrições que conciliem os dois valores em situação de conflituosidade. Ou seja, fixa-se a regra no sentido da impossibilidade da censura (o que põe em destaque a liberdade de expressão), admitindo-se, excepcionalmente, que, nas hipóteses de combate à pornografia, tal instrumento possa ser utilizado. Cf., sobre o conflito entre liberdade de expressão e o combate à pornografia e ao "hate speach" (discursos de ódio racial): FISS, Owen. The Irony of Free Speech. Cambridge,. Harvard University Press, 1996.

            73 Cf., sobre "garantias institucionais" idealizadas por Carl Schmitt, nota de rodapé nº41.

            74 Art. 153, § 2º: "A propriedade impõe obrigações. Seu uso deve constituir, ao mesmo tempo, um serviço para o mais alto interesse comum".

            75 LOEWENSTEIN, Karl. Teoria de la Constitución, 2ª ed., Barcelona, Ariel, 1970, p. 401.

            76 CUEVA, Mario de la. Derecho Mexicano del Trabajo, México, Porrúa, 1960, vol. I.

            77 Como já referido, Carl Schmitt chega, inclusive, partindo de uma distinção entre Constituição e lei constitucional, a afirmar que os direitos constantes do Livro II da Constituição de Weimar, por sua abstração e generalidade (e, segundo ele, pela ausência do elemento "decisão") não fariam parte do que ele convencionou definir como Constituição, atribuindo-lhes o caráter de meros compromissos dilatórios. Foi também Carl Schmitt quem afirmou que a Constituição de Weimar possuía uma profunda contradição material entre seus dois livros: o primeiro consagrando instituições liberais e o segundo positivando ideais socialistas.

            78 OLIVEIRA, Ary Brandão de. opus cit., p. 67

            79 KIST, Dario José. opus cit., p. 95/96.

            80 LOEWENSTEIN, Karl. opus cit., p. 401

 

 

 

PINHEIRO, Maria Cláudia Bucchianeri. A Constituição de Weimar e os direitos fundamentais sociais: a preponderância da Constituição da República Alemã de 1919 na inauguração do constitucionalismo social, à luz da Constituição mexicana de 1917. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9014. Acesso em: 17 out. 2006