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Ives Gandra da Silva Martins*
*Professor Emérito das Universidades
Mackenzie, UNIFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, Presidente
do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São
Paulo e do Centro de Extensão Universitária – CEU.
O Presidente Lula apresentou, para um grupo
de representantes da OAB, a idéia de convocação de uma Constituinte Exclusiva,
com o apoio de alguns juristas e advogados, e pesadas críticas de políticos,
operadores de direito, jornalistas e formadores de opinião.
Pessoalmente, sou favorável à idéia, desde que alicerçada em dois
pré-requisitos, a saber: 1) a aprovação por emenda constitucional da convocação
com previsão de um plebiscito (no caso de tratar-se apenas da autorização para
convocação) ou de um referendo (se os termos da convocação já constarem da
própria Emenda Constitucional); 2) que a Constituinte seja exclusiva, podendo
concorrer para compô-la, em eleições livres, qualquer cidadão brasileiro, sem
necessidade de filiar-se a partido político, exceção feita àqueles que
pretendam disputar as eleições seguintes ou estejam no exercício de mandato
eletivo.
Seria, portanto, uma Constituinte exclusiva.
A solução do plebiscito ou referendo, de rigor, equacionaria problemas maiores,
como vício de legitimidade ou de inconstitucionalidade.
Tenho defendido que não há cláusulas pétreas, no que diz respeito a regimes
jurídicos ou políticos, sempre que a sociedade, por uma das formas de exercício
direto de soberania popular, decida alterar o que constituintes pretéritos
entenderam fosse o melhor para o país. Nunca admiti, como professor titular de
direito constitucional da Universidade Mackenzie e comentarista da Constituição
Brasileira, que brasileiros do passado pudessem engessar o futuro da nação,
tornando imodificável disciplina que, no momento da elaboração da Carta
Política, entenderam ser a melhor para o País. Os povos evoluem e cada geração
tem o direito, em regime democrático, de decidir seu próprio destino.
Por esta razão, para mim, se, mediante plebiscito ou referendo, o povo optar
pela alteração de disposições relativas a regimes jurídicos ou políticos,
democraticamente, isso será legítimo, podendo até mesmo a alteração atingir
normas pétreas institucionais. Só não admito alteração no que concerne a
direitos fundamentais do ser humano, pois tais direitos são inerentes ao
indivíduo, não cabendo ao Estado “instituir” normas a respeito, mas apenas
“reconhecê-los”.
O plebiscito ou o referendo, conforme o teor da Emenda a ser aprovada,
representa a vontade popular, em determinado período histórico, valendo, a meu
ver, mais que a vontade dos constituintes passados. É a concretização da norma
contida no § único do art. 1º da lei suprema, ao afirmar que “todo o poder
emana do povo, que poderá exercê-lo, diretamente”, nos termos do art. 14,
incisos I, II e III.
Afastado o óbice da inconstitucionalidade, se a sociedade assim desejar, nada
mais legítimo que se convoque uma Constituinte exclusiva.
Apenas, no modelo que idealizei quando presidente do IASP, em 85/86 - encampado
pelo atual Ministro do Tribunal Superior Militar, o então deputado Flávio
Bierrenbach - a Constituinte teria que ser exclusiva e sem a participação de
políticos ou cidadãos que pretendessem concorrer a cargo eletivo durante pelo
menos o prazo de um mandato após a promulgação do texto supremo, com o que,
encerradas suas atividades, voltariam os constituintes para suas atividades
normais.
Desta forma, temas essenciais e que os políticos deixaram de votar, por não
terem interesse em aprovar medidas que impliquem perda de poder - como “voto
distrital”, “fidelidade partidária”, “definição principiológica na conformação
dos partidos”, “equilíbrio da representação popular” e outros temas - poderiam
ser examinados por juristas, formadores de opinião, e demais elementos da
população, que concorreriam a uma vaga na Constituinte, apontando
exclusivamente o modelo constitucional que desejariam. O número de vagas para a
Constituinte corresponderia à soma das atualmente existentes para Senado e
Câmara, em cada Estado, no que concerne a deputados e senadores.
Estou convencido de que, se fosse exclusiva, os constituintes é que formatariam
a atuação dos políticos no interesse da nação, e não os políticos que
formatariam a Constituição segundo seu próprio interesse.
É de se lembrar que há inúmeros projetos de emenda constitucional para adoção
do voto distrital ou da fidelidade partidária, que não são apreciados pelo
Congresso, como poder constituinte derivado, pois tais matérias não são do
interesse dos atuais detentores do poder no parlamento.
Apesar das divergências que mantenho com o Presidente Lula em muitos pontos,
neste, ele tem a minha adesão, condicionada aos dois pré-requisitos acima
mencionados.
MARTINS, Ives Gandra da Silva. A Constituinte Exclusiva. Disponível em: http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/22198. Acesso em: 4 out. 2006.