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A Constitucionalização dos direitos humano(*)

 

 

Evanna Soares(**)



 

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.  

2.
VISÃO HISTÓRICA SOBRE OS DIREITOS HUMANOS.       
  2.1.
Os Direitos Humanos na antiguidade.     
  2.2.
O Direito Natural como fonte dos Direitos Humanos.  2.4. A tese realista.
  2.5.
Antecedentes.    
    2.5.1.
Magna Carta de 1215.         
    2.5.2.
Ato de "Habeas-Corpus" de 1679.   
    2.5.3.
"Bill of Rights" de 1688.        
    2.5.4.
Foros e Cartas de franquias medievais.         
    2.6 O.
Movimento Constitucionalista e as Declarações de Direitos.
    2.6.1.
Declarações Americanas de Direitos no Século XVIII.         
    2.6.2.
Declaração Francesa de 1789.         

3.
O PROCESSO DE POSITIVAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS.      
  3.1.
Os níveis de positivação constitucional: legislativo, executivo e judicial.  
  3.2.
A importância da constitucionalização dos Direitos Humanos.    
  3.3.
A positivação internacional.       
  3.4.
O valor da Declaração Universal dos Direitos do Homem.        
  3.5
Pacto de São José da Costa Rica.          
  3.6.
Os Direitos Humanos nas Constituições dos Países do Mercosul.          
  3.7.
"Evolução" dos Direitos Fundamentais: as gerações de Direitos.

4. PERSPECTIVAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: PROTEÇÃO E EXEQÜIBILIDADE.

5.
CONCLUSÃO.     

6.
REPERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

 

1. INTRODUÇÃO

A expressão direitos humanos, como ressalta Antonio Enrique PÉREZ LUÑO 1 , é ambígua, o que dificulta a compreensão do cidadão médio, posto que, em princípio, ela se explica por si mesma, dispensando, para sua conceituação, outras palavras, considerada a evidência de que cada pessoa dispõe de direitos próprios.

Quando se procura definir os direitos humanos ou direitos do homem, constata-se que isso vem sendo feito de modo vago e insatisfatório, ainda mais quando se busca para eles um fundamento absoluto, único - como enfatiza Norberto BOBBI0 2 - levando a definições tautológicas ("direitos do homem são os que cabem ao homem enquanto homem"), as quais não indicam qualquer elemento que os caracterize; ou formais, desprovidas de conteúdo e meramente portadoras do estatuto proposto para esses direitos ("direitos do homem são aqueles que pertencem, ou deveriam pertencer, a todos os homens, ou dos quais nenhum homem pode ser despojado"); ou, ainda, a definições teleológicas, que, embora tragam alguma menção ao conteúdo, pecam pela introdução de termos avaliativos, ao sabor da ideologia do intérprete, como "direitos do homem são aqueles cujo reconhecimento é condição necessária para o aperfeiçoamento da pessoa humana, ou para o desenvolvimento da civilização, etc., etc.". Então, segundo BOBBIO, esses direitos de noção imprecisa somente encontrarão nitidez e êxito se forem considerados seus "vários fundamentos possíveis", escorados no "estudo das condições, dos meios e das situações nas quais este ou aquele direito pode ser realizado", em cada caso concreto 3.

Inspirado na afirmação de que os direitos humanos se voltam contra a onipotência do poder, conforme a função política expressa na Declaração de Direitos de Virginia (1776), PÉREZ LUÑO explica que tais direitos são "um conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico, concretizam as exigências da dignidade, liberdade e igualdade humanas, as quais devem ser reconhecidas positivamente pelos ordenamentos jurídicos a nível nacional e internacional" 4 .

É relevante, quando do estudo dos direitos humanos e o processo de sua positivação, notadamente em nível constitucional, examinar-se, também, o sentido das expressões afins: direitos fundamentais, direitos subjetivos, direitos públicos subjetivos, direitos individuais e liberdades públicas, delimitando o alcance de cada uma, visto que, não raramente, por equívoco, são empregadas como sinônimos.

Por direitos fundamentais - expressão surgida na França ("droits fondamentaux") por ocasião do movimento político-cultural que redundou na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) - entende a maioria da doutrina, segundo PÉREZ LUNO, que são os direitos humanos positivados nas Constituições dos Estados. Embora não seja muito clara a distinção entre as duas fórmulas, existe a tendência de denominar direitos fundamentais os direitos humanos inseridos no direito positivo interno, e de utilizar direitos humanos para as declarações e convenções internacionais 5.

Outra expressão cuja noção muito se aproxima de direitos humanos são os direitos subjetivos. Representam, no entanto, a proteção jurídica às prerrogativas ou vantagens deferidas ou acrescidas ao patrimônio dos particulares, por lei ou contrato, considerado o princípio da autonomia da vontade, que podem ser objeto de expressa renúncia. Como exemplo os direitos reais estabelecidos diretamente pela lei (usufruto e hipoteca legal, etc), as marcas registradas de fábrica ou comércio, entre outros. Os direitos subjetivos, em suma, constituem bens incorpóreos, criados pela organização jurídica em consonância com determinadas regras de direito privado, os quais podem ser cedidos ou transmitidos à vontade do titular, além de viabilizar outras situações em seu proveito 6.

Os direitos públicos subjetivos, por seu turno, constituem "uma tentativa de explanação sistemática dos direitos das pessoas perante as entidades públicas (e das próprias entidades públicas) ... como uma reacção contra o Direito natural", pela doutrina alemã, em meados do Século XIX, traduzindo a visão positivista das normas de direito público que condicionam e amarram tais direitos, desaconselhada, entretanto, sua utilização como sinônimo de direitos fundamentais, eis que cuidam, propriamente, das situações ativas das pessoas diante do Estado, bem assim dos direitos dos administrados, contribuintes, litigantes, enfim, das relações de direito público interno" 7 .

Trata-se de formula em desuso, ultrapassada pela sistemática econômico-social atual, em que o gozo de qualquer direito fundamental necessita de uma política jurídica (e até econômica) dos poderes públicos 8 .

Outra expressão que se acha fora de uso é direitos individuais correspondentes às liberdades civis ou direitos civis dos anglo-saxões embora tenha sido empregada como sinônimo de direitos humanos, no passado, quando considerados no sentido eminentemente das prestações negativas do Estado (não ingerência estatal). Não se afina com as exigências sociais contemporâneas, como arremata PEREZ LUNO, recordando a lição de Pablo Lucas VERDU 9 .

Quanto às liberdades públicas ("libertés publiques") - expressão francesa surgida no final do Século XVIII - são fruto da limitação do Estado, reconhecendo-se aos indivíduos um campo de atuação privada - uma zona de domínio impenetrável pelo Estado. A essa concepção tradicional combina-se, atualmente, a idéia de tolerar, em determinadas circunstâncias, a intervenção estatal, desde que benéfica aos indivíduos 10 . Mas não se confundem, essas liberdades públicas, com os direitos humanos porque não abrangem os direitos humanos sociais" 11.

Os direitos humanos, fruto do liberalismo e das idéias iluministas, acham-se intimamente ligados ao moderno Estado de Direito, como proteção do homem diante do Estado, e, a partir do Século XVIII, apresentam-se como elemento de inspiração a medida de todas as instituições político-jurídicas. O movimento constitucionalista deflagrado com a Declaração de Virginia (1776) e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão aprovada pela Assembléia Nacional da França em 1789 deu início ao processo de constitucionalização dos direitos humanos, a ponto de a Constituição da França de 1791 - traduzindo o novo conceito de Estado encarnado pela Revolução Francesa que "fez triunfar, como conquista da humanidade, a soberania popular e o reconhecimento dos direitos do homem " 12 - reconhecer que somente a sociedade que assegurar os direitos do homem e determinar a separação de poderes é que possuirá Constituição (artigo 16) 13.

Influenciadas por essas idéias, as Constituições, notadamente as dos Estados democráticos ocidentais, passaram a consagrar os direitos humanos, seguindo as necessidades e os momentos históricos e políticos de cada povo. Além da positivação interna, a partir da Declaração Universal de Direitos Humanos proclamada pela Assembléia Geral da ONU em 1948, esses direitos vêm sendo reconhecidos por declarações e convenções internacionais.

As necessidades de cada sociedade ao longo do tempo têm demandado o reconhecimento de novas categorias de direitos humanos. A exigência da primeira geração desses direitos quanto às prestações negativas ou um não-agir estatal (direitos de liberdade) foi seguida pela necessidade de uma ação positiva do Estado (direitos sociais - a segunda geração), verificando-se que, como ressalta BOBBIO 14, munidos de tais direitos os particulares ora visam a obstar os malefícios causados pelos poderes constituídos, ora a obter deles benefícios - situação que se constata também no que tange aos direitos de terceira geração (direitos de solidariedade) e a uma anunciada quarta geração de direitos (patrimônio genético).

Reconhecidos e positivados os direitos humanos pelo Estado, outro desafio lhes tem sido apresentado, mormente no que se refere aos direitos que demandam prestações positivas dos poderes públicos, como os direitos sociais - em que a maior parte não saiu do papel, apesar de exuberantemente proclamados em todas as declarações nacionais 15 - para que sejam efetivamente garantidos e realizados.

O presente estudo ingressa, assim, considerada a necessidade de positivação dos direitos humanos, nos aspectos da declaração a da consagração constitucional, para que possam ser exigidas pelo homem as prestações do Estado, na busca da efetiva garantia e realização daqueles direitos.

2. VISÃO HISTÓRICA SOBRE OS DIREITOS HUMANOS
2.1 OS DIREITOS HUMANOS NA ANTIGUIDADE

Ressalta Jorge MIRANDA que "somente há direitos fundamentais ... quando o Estado e a pessoa, a autoridade e a liberdade se distinguem e até, em maior ou menor medida, se contrapõem" 16. Então, os direitos das pessoas devem ser examinados ao longo dos períodos de formação, aproveitando a fórmula de Benjamin CONSTANT, que distingue a liberdade dos antigos da liberdade dos modernos, de sorte que, no primeiro caso, a liberdade se concretizava mediante a influência na vida da cidade, e, no segundo, o que se coloca como prioridade é a "realização da vida pessoal" 17.

Na Grécia e Roma antigas o indivíduo não era considerado autonomamente, sobressaindo-se o sentimento de coletividade. Assim, em princípio, não se vê compatibilidade entre o reconhecimento de direitos do homem frente aos governantes 18 a não ser uma liberdade incipiente, inconsciente, especial, verificada quando o indivíduo participava das tumultuadas assembléias realizadas pela coletividade 19

Adverte J. J. Comes CANOTILHO 20, porém, que "a antiguidade clássica não se quedou numa completa cegueira em relação à idéia de direitos fundamentais", observando que os sofistas, considerando a natureza comum biológica dos homens, aproximaram-se do sentido da igualdade natural e de humanidade, tendo o pensamento estóico dado relevo ao princípio da igualdade, vislumbrando-se aí a "idéia de universalização ou planetarização dos direitos do homem".

2.2 O DIREITO NATURAL COMO FONTE DOS DIREITOS HUMANOS

A doutrina dos direitos humanos, tal como concebida pelos iluministas e consagrada nas Declarações de Direito da América e da França, é fruto da filosofia jusnaturalista. Então, tais direitos essenciais (vida, sobrevivência, propriedade e algumas liberdades negativas) existem e pertencem ao homem por força da natureza, sem intervenção do Estado 21 . Assim, esses direitos chegam ao homem independente de criação ou de legislação, derivando apenas da natureza humana - como lembra Manoel Gonçalves FERREIRA FILH0 22, citando GRÓCIO - e o seu mais remoto ancestral é encontrado nas palavras de SÓFOCLES, através de Antígona ("estas leis não são de hoje, nem de ontem, vivem eternamente e ninguém sabe a que passado pertencem"), ou seja, um direito superior dado aos homens pelos deuses 23.

Salvador Maria LOZADA bem exprime a doutrina do direito natural como fonte dos direitos humanos, ao asseverar que "todo ser humano tem o direito natural ao devido respeito a sua pessoa, à boa reputação, à liberdade para buscar a verdade e, dentro dos limites da ordem moral e do bem comum, para manifestar e defender suas idéias, para cultivar qualquer arte e, finalmente, para ter uma objetiva informação dos sucessos públicos". Desse direito oriundo da própria natureza humana nascem outros, como o de participar dos bens da cultura, representado pelo direito à instrução fundamental. Alinha, ainda, outros direitos recebidos pelo homem da natureza, tais os direitos de professar religião, de escolher estado e formar família, arrematando que os direitos naturais são indestrutíveis e inseparáveis de seu detentor, correspondendo a cada direito um dever, como exemplo, para o direito à existência existe a obrigação de conservar a vida, posto que é a força moral da lei natural quem alimenta os direitos fundamentais 24.

No Brasil, defende a origem jusnaturalista dos direitos humanos, entre outros, Inezil PENNA MARINHO, que formulou, inspirado na doutrina de BELIME a CONSENTINI, os pressupostos naturais do que denomina uma Sociedade Justa: pressupostos naturais do homem, como ser individual, os direitos à vida, à liberdade, à alimentação e à habitação; como ser social, os direitos à educação, ao trabalho a lazer, à eleição e à segurança. Por sua vez, os pressupostos naturais do meio ambiente consubstanciam-se na ecologia terráquea (equilíbrio interno) a na ecologia universal (equilíbrio cósmico) 25.

2.3. A CORRENTE POSITIVISTA

Os positivistas, no entanto, não aceitam o direito natural como fonte dos direitos humanos, mesmo porque apontam diversos fundamentos para esses direitos 26. De acordo com essa linha de pensamento, os direitos do homem concebidos como dádiva da natureza, sem positivação, não saem do plano metafísico, o que é inaceitável. Conforme BENTHAM, citado por PEREZLUÑO 27, "onde não existem leis positivas nem Estado não há nenhum direito". Os direitos do homem, sem que se achem positivados, não reúnem condições para ser cobrados do Estado, mesmo porque não reconhecidos por ele, e, em sendo assim, não são direitos, mas apenas declarações de caráter moral, sem força coercitiva, inexigíveis.

É o positivismo jurídico o responsável pela fundamentação do processo de positivação dos direitos humanos, a PÉREZ LUNG, mencionando interessante estudo de MÜLLER, realça que esse processo não encarna meramente uma declaração do direito natural, ratificando seus postulados. Na verdade, é através da positivação que se constitui e se dá vida a um conjunto de normas jurídicas no ordenamento 28.

2.4 A TESE REALISTA

Para a doutrina realista - assim denominada por PÉREZ LUN0 29 o processo de positivação não tem significado declarativo de direitos preexistentes, como defendem os jusnaturalistas, nem constitutivo, como entendem os positivistas. Esse processo supõe um requisito a mais e tem em conta a efetivação e o gozo desses direitos. Então, a positivação não é um fim, mas sim uma condição para o desenvolvimento das vias de proteção dos direitos fundamentais - o que verdadeiramente define seu conteúdo.

Aqui não se admite que os direitos humanos fiquem no plano da abstração, nem que se resumam a meras fórmulas desprovidas de conteúdo, de sorte que não apenas no direito positivo se devem buscar tais direitos, mas também nas "relações de poder que lhes sirvam de suporte e que obedeçam a determinadas condições sociais, econômicas e culturais", como realçado por Carl MARX, citado por PÉREZ LUNG - evidenciada a estreita relação da tese realista com o movimento socialista 30.

Nessa linha de raciocínio, BOBBIO enfatiza que "não há direito sem obrigação; e não há nem direito nem obrigação sem uma norma de conduta" 31, e que”os direitos ditos humanos são o produto não da natureza, mas sim da civilização humana", mesmo porque "suscetíveis de transformação e de ampliação" para atender às necessidades dos indivíduos 32. Assim, por exemplo, as Constituições contemporâneas proclamam o direito à instrução, como direito fundamental, mas ele não é visto no estado da natureza, nem se fez presente na primeira geração de direitos; as exigências da sociedade que se seguiram às doutrinas do direito natural e à proclamação das liberdades negativas é que realçaram a instrução como direito fundamental, a partir de uma sociedade mais evoluída. Direitos da espécie, resultado das exigências sociais, confirmam a socialidade, a não-naturalidade dos direitos humanos, merecendo não só o reconhecimento pelo direito positivo, como também a efetiva implementação que permita seu gozo, sob pena de tornarem-se meras obrigações morais ou políticas 33.

2.5. ANTECEDENTES
2.5.1 MAGNA CARTA DE 1215

A Magna Carta, redigida e imposta pelos barões burgueses ingleses ao Rei João Sem Terra em 1215, ao contrário do que imaginam alguns, não constitui a primeira declaração de direitos do homem, porque desprovida do sentido original de direitos fundamentais, como evidencia Carl SCHIMITT 34.

Esse estatuto, baseado em um programa para reparação de agravos da Carta de Henrique I, decorreu da insatisfação com o estado de anarquia instalado pela inabilidade E incapacidade do rei, que foi péssimo governante apesar de bom soldado, e se valia de "exações extorsivas e práticas opressivas para fazer cumprir as obrigações de arrendamentos e o confisco arbitrário e ilegal de propriedades para uso próprio" 35 . Contém dispositivos acerca do respeito à liberdade de it e vir, propriedade privada, sucessão hereditária, matrimônio, viúvas, menores, créditos, penas pecuniárias, solução das questões jurídicas, serviço militar, entre outros. Em resumo, a Magna Carta, que é a base do constitucionalismo inglês, preocupa-se com o direito dos ingleses, não com os direitos do homem, e enumera as prerrogativas dos súditos, de sorte que o reconhecimento de direitos significa limitação do poder real 36 .

Destaca-se nela a garantia real de que ninguém seria detido, preso, exilado, despojado de seus bens, costumes e liberdades, ou punido de outro modo, senão em decorrência de julgamento de seus pares, de conformidade com as leis do país - vislumbrando-se, aqui, um dos primados do Estado de Direito, qual seja, a judicialidade.

Embora não seja a primeira declaração de direitos, a Magna Carta é, sem dúvida, importante antecedente histórico dos diplomas dessa natureza.

2.5.2 ATO DE "HABEAS-CORPUS" DE 1679

Outro instrumento que merece destaque como precursor das primeiras declarações de direitos humanos é o Ato de "Habeas-Corpus", nada obstante o instituto do "Habeas-Corpus" seja encontrado no Direito Romano ("interdictum de libero homine exhibendo") e na própria Magna Carta. Foi instituído no reinado de Carlos II, da Inglaterra, como "remédio judicial destinado a evitar ou a fazer cessar violência ou coação na liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder 37.

Sua relevância consiste na proteção do súdito inglês contra as prisões arbitrárias e no direito de ser ouvido por um juiz.

2.5.3 "BILL OF RIGHTS" DE 1688

Outro diploma importante que antecedeu as primeiras declarações de direitos humanos é o "Bill of Rights", promulgado pelas Câmaras e sancionado em 1688 pelo Príncipe Guilherme de Orange (mais tarde, Rei Guilherme III), e que encerrou esse ciclo de documentos ou pactos que positivaram direitos dos ingleses. Consta de um contrato entre o Parlamento, na função de representante da unidade política inglesa, e o Príncipe, e contém treze preceitos contrários ao abuso do poder real, vislumbrando-se nele, como salienta Carl SCHIMITT, determinações legal-constitucionais no sentido moderno 38.

2.5.4 FOROS E CARTAS DE FRANQUIAS MEDIEVAIS

Não se pode esquecer de mencionar, na história da positivação dos direitos humanos mediante pactos, fora do mundo inglês, embora também não possuam natureza de declaração de direitos do homem, as cartas de franquias e foros em que são reconhecidos alguns direitos a quem integrasse determinado grupo ou estamento, como o direito à vida e à integridade física, o direito de não ser preso sem motivo legal, o direito à propriedade, à escolha do local para domicílio e sua inviolabilidade. Destacam-se os Pactos celebrados nas Cortes de Leão entre Alfonso IX e o reino (1188), e a Monarquia Castelhana-Leonesa e o Privilégio Geral outorgado por Pedro III nas Cortes de Zaragoza (1283), os quais são tidos como base legal das liberdades da Coroa de Aragão 39 .

2.6 O MOVIMENTO CONSTITUCIONALISTA E AS DECLARAÇÕES DE DIREITOS
2.6.1 DECLARAÇÕES AMERICANAS DE DIREITOS NO SÉCULO XVIII

Ao contrário desses instrumentos antigos, que representavam concessões reais ou imposições aos governantes traduzindo mera promessa de respeito a algumas normas, as Declarações de Direitos significam o próprio reconhecimento de direitos, isento de limitações no tempo ou no espaço, a todos os homens, independente da vontade do órgão governante 40 .

As primeiras Declarações de. Direitos do homem - dando início, propriamente, à história dos direitos fundamentais, vieram no bojo do movimento constitucionalista influenciado pelas idéias iluministas - foram as Declarações efetuadas pelos Estados americanos no Século XVIII, quando se avizinhava a independência das Colônias relativamente à Inglaterra, inaugurando, assim, a era democrática (liberal) e o moderno Estado de Direito liberal-burguês 41. Começou pela Declaração do Estado de Virginia, de 12 de junho de 1776, seguindo-se as da Pensilvânia, Maryland e Carolina do Norte, no mesmo ano, Vermont (1777), Massachussetts (1780) a New Hampshire (1783). Os direitos fundamentais mais importantes reconhecidos pelas Declarações Americanas, cabendo ao Estado a função de assegurá-los, foram a liberdade, propriedade privada, segurança, direito de resistência e liberdades de consciência e religião. Tais direitos, mediante emendas, em 1791, foram incorporados à Constituição dos Estados Unidos da América, servindo de modelo para as novas constituições dos Estados 42.

As Declarações de Direitos americanas têm importância não apenas cronológica no processo de positivação dos direitos humanos. Serviram de exemplo concreto para os franceses e influenciaram a elaboração da sua Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) - também fruto das idéias iluministas. Tiveram o "mérito de armar o indivíduo com instrumentos de garantias de seus direitos, o que não ocorre com a declaração francesa " 43.

2.6.2 DECLARAÇÃO FRANCESA DE 1789

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão veio para atender à reivindicação popular de que tais direitos humanos fossem reconhecidos solenemente, e, depois de estudos, projetos e amplos debates, foi aprovada pelos representantes do povo francês reunidos em Assembléia Geral em 26 de agosto de 1789.

Em seus dezessete artigos, tal qual a Declaração de Direitos de Virginia, a Declaração Francesa apresenta verdadeiro breviário de Constitucionalismo 44, e, considerados o "esplendor das fórmulas e da língua, a generosidade de seu universalismo ... foi preferida e copiada, ainda que freqüentemente seus direitos ficassem letra morta" 45.

Os mais importantes direitos declarados pelos franceses são liberdade, propriedade, segurança e direito de resistência. Diferentemente das Declarações Americanas, que ergueram um novo Estado sobre novas bases, a Declaração Francesa tem como pressuposto o conceito de cidadão, dando continuidade a um Estado nacional, e recorda (declara), solenemente, a todos os membros da comunidade, seus direitos e deveres 46, mesmo porque, consoante o pensamento iluminista que a influenciou, os direitos humanos têm fonte no direito natural, de sorte que não precisavam de ser criados pela Declaração, mas tão-somente relembrados.

A finalidade da Declaração Francesa não poderia deixar de ser a de proteger o homem diante dos atos estatais, a os direitos reconhecidos – de matiz natural - são inalienáveis, imprescritíveis, individuais e universais, ou seja, deles não se pode abrir mão, não se exaurem com o passar do tempo, e pertencem a cada ser humano e a todos os homens, indistintamente.

Importante registrar, como salienta BOBBI0 47, que os franceses pretenderam "afirmar primária a exclusivamente os direitos dos indivíduos", ao passo que os americanos, nas suas Declarações, "relacionaram os direitos do indivíduo ao bem da sociedade".

Apesar das críticas endereçadas à Declaração Francesa de 1789, entre outras a abstração dogmática e a proteção aos burgueses, é inegável que ela representa o mais importante estatuto de reconhecimento dos direitos humanos, tendo influenciado todo o processo de positivação desses direitos, que se seguiu nas democracias ocidentais, bem assim a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão.

No Brasil, essa influência é marcante já na primeira Constituição, de 1824, que, seguindo as idéias do liberalismo, criou um Estado democrático constitucional representativo, embora monárquico, com divisão dos Poderes e eleições, e consagrou os direitos individuais assegurados pelo Estado apenas aos cidadãos brasileiros, constantes de largo rol que espelhava as idéias mais liberais da época 48.

Na Argentina, antecedentes constitucionais também registram o reconhecimento de direitos dos particulares, conforme a seção quinta da Constituição de 1819 - que não chegou a entrar em vigência 49 - e a Constituição de 1853 teve capítulo dedicado à declaração de direitos e garantias 50 . Há de se destacar que a nação argentina, desde os primórdios, apesar dos conflitos verificados ao longo de sua história, preocupa-se com os direitos humanos, que começaram a ser reconhecidos em 1810, encontrando-se um Decreto de 1811 que ressalvava a liberdade de imprensa e a segurança individual, reconhecendo que "todo cidadão tem um direito sagrado à proteção de sua vida e de sua honra, de sua liberdade e de suas propriedades" - como destaca TRAVIES0 51, para quem, sem esquecer os sucessos da organização britânica e da revolução americana, os objetivos da Declaração Francesa, ou seja, positivação é racionalização, é que tiveram o mérito de universalizar os direitos humanos, cabendo aos franceses explica-los didaticamente 52.

3. O PROCESSO DE POSITIVAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS
3.1 OS NÍVEIS DE POSITIVAÇÃO CONSTITUCIONAL: LEGISLATIVO, EXECUTIVO E JUDICIAL

A declaração solene de direitos do homem significa, histórica e juridicamente, conforme SCHIMITT 53, "o estabelecimento de princípios sobre os quais se apóia a unidade importante do surgimento e formação incessante dessa unidade", dando margem à integração estatal. Essa declaração pode decorrer de um grande êxito político, ou de uma revolução em que se crie um novo Estado ou um princípio completamente novo para aquela integração, como ocorreu na América do Norte e na França.

Mas as Declarações de Direitos não são direitos, como enfatizam, com propriedade, HERRENDORF e BIDART CAMPOS 54, posto que as Declarações - fenômeno moderno - são meras formas normativas situadas nas Constituições escritas, leis ou tratados internacionais, dizendo "algo de outro algo" (dos direitos), ou seja, que devem ser respeitados, defendidos, promovidos, punidas suas violações, etc. Os direitos, por sua vez, repousam no plano jurídico, na dimensão sociológica da conduta humana.

Na verdade, a positivação desses direitos, segundo ALEXY, relativamente a todos os Poderes do Estado, significa "uma abertura do sistema jurídico frente ao sistema da moral, abertura que é razoável e que pode ser levada a cabo com meios racionais 55.

A positivação constitucional dos direitos humanos - que se iniciou com as Declarações Americanas - dá-se em três níveis, conforme PEREZ LUNO 56: legislativo, executivo e judicial.

Tem-se a positivação constitucional quando os direitos do homem são incorporados formalmente em normas básicas, excluída a possibilidade de atuação do legislador ordinário, segundo STOURZH, citado por CANOTILHO 57.

Uma vez efetivada a positivação jurídico-constitucional dos direitos do homem, ou seja, dos direitos das pessoas diante do Estado, mais acertado é denominá-los direitos fundamentais 58.

O nível legislativo da positivação dos direitos humanos tem a ver com a atuação do Poder Legislativo, como porta-voz da vontade geral, expressando-se através da lei, sem ingerência do Executivo, atrelado, porém, às técnicas de positivação constitucional de tais direitos, de sorte a protege-los do arbítrio do próprio Legislativo, em consonância com o princípio da legalidade. Refere-se, também, à competência legislativa 59.

O nível executivo de constitucionalização desses direitos, embora seja visto com receio, é aceito na medida em que não mais se pode recusar a constatação de que grande parte do desenvolvimento do sistema de liberdades públicas é fruto da Administração, anotando-se, outrossim, sua competência regulamentar residual dos direitos 60 .

A atuação do Poder Judiciário na positivação constitucional dos direitos fundamentais, porém, é situação mais recente. O pensamento liberal não concebia o juiz como legislador, mas apenas como aplicador das normas preexistentes. No entanto, não se negava a importância de suas funções quando das decisões envolvendo tais direitos diante dos órgãos estatais. Com o passar do tempo e a crise do positivismo jurídico, ascendeu o reconhecimento da função criadora da jurisprudência, notadamente nos países que adotam o "Common Law", consagrando-se os direitos fundamentais através dos precedentes jurisprudenciais. Mas, na verdade, como observa PÉREZ LUN0 61, o nível judicial da constitucionalização dos direitos fundamentais tem muito mais a ver com a proteção do que com a sua criação. Merece ser ressaltado que, na Alemanha, esse papel é da Corte Constitucional, que controla a constitucionalidade das leis, exercitando uma integração criadora do ordenamento jurídico em determinadas situações e negando vigência à lei ordinária que contrastar com disposição fundamental 62.

Vistos esses níveis de positivação, não se pode deixar de concluir que, de regra, os direitos humanos devem ser positivados pelo legislador constituinte, ou Legislativo, cabendo ao Executivo e ao Judiciário um papel subsidiário de preencher lacunas acaso verificadas, sem, no entanto, afastar-se dos princípios consagrados constitucionalmente.

3.2 A IMPORTÃNCIA DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

Como visto, os direitos humanos, uma vez positivados nas Constituições, galgam o "status" de direitos fundamentais. CANOTILH0 63, citando STERN e CRUZ VILLALON, evidencia que:

"sem esta positivação jurídico-constitucional, os direitos do homem são esperanças, aspirações, idéias, impulsos, ou, até, por vezes, mera retórica política, mas não direitos protegidos sob a forma de normas regras e princípios) de direito constitucional".

E prossegue:

"Onde não existir constituição não haverá direitos fundamentais, existirão outras coisas, seguramente mais importantes, direitos humanos, dignidade da pessoa; existirão coisas parecidas, igualmente importantes, como as liberdades públicas francesas, os direitos subjectivos públicos dos alemães; haverá, enfim, coisas distintas como foros ou privilégios".

Somente o reconhecimento dos direitos fundamentais nas Constituições é que os torna direitos fundamentais, produzindo, daí, conseqüências jurídicas.

Não se pode, porém, dar a tais assertivas um caráter positivista fechado, como adverte o próprio CANOTILH0 64, posto que não basta reconhecer os direitos fundamentais no texto constitucional para torná-los "realidades jurídicas efectivas", nem a constitucionalização lhes retira o traço jusnaturalista, muito menos deles subtrai o caráter "fundamentante”.

A inserção constitucional desses direitos, uma vez situando-se a Constituição no topo da escala normativa, confere-lhes a própria supremacia da Constituição, principalmente a rigidez, de sorte que não podem ser desfigurados ou modificados pelo processo legislativo ordinário 65 . E pouco importa, para conferir juridicidade positiva aos direitos fundamentais, que a declaração de tais direitos conste do articulado, do preâmbulo ou de texto em separado com o mesmo "status" da Constituição 66.

3.3 A POSITIVAÇÃO INTERNACIONAL

Neste século, os acontecimentos políticos exigiram que a positivação dos direitos humanos, antes restrita ao direito interno, galgasse o direito internacional, resultando no reconhecimento dos direitos fundamentais em escala internacional, flexibilizando-se o princípio da soberania estatal diante da possibilidade de violação desses direitos por parte do Estado.

Como precedentes dessa positivação internacional encontram-se as próprias Declarações Americanas e Francesa do Século XVIII, com seus termos de generosa amplitude, e convênios reconhecedores da liberdade religiosa. No Século XIX, destacam-se os acordos, em especial a partir do Congresso de Viena, no sentido da abolição da escravatura.

O passo mais importante nesse processo deu-se com o surgimento da Sociedade das Nações (Tratado de Versalhes, 1919) logo após o fim da Primeira Guerra Mundial. Isso possibilitou a redação de normas protetoras de minorias religiosas, lingüísticas e étnicas, bem assim o surgimento do "Bureau International du Travail", responsável pela positivação, no plano internacional, dos direitos econômicos e sociais, vindo a se tornar organismo das Nações Unidas, com a denominação de Organização Internacional do Trabalho 67.

O modelo, inspirado nas idéias de KANT, como salienta PÉREZ LUN0 68, consistente de um Estado universal, com cidadãos universais submetidos à lei suprema garantidora da paz perpétua, teve seu processo interrompido pela Segunda Guerra Mundial, na qual se verificaram horrores que levaram os Estados Aliados à certeza da necessidade de proteção aos direitos humanos não apenas no direito positivo interno de cada um, mas também internacionalmente. Vieram, então, durante a Guerra, declarações e documentos dando ênfase ao reconhecimento internacional dos direitos humanos como requisito inafastável para a paz e o progresso das nações (Carta do Atlântico em 1941, Declaração das Nações Unidas em 1942, Propostas de Dumbarton Oaks em 1944 e Conferência de Yalta em 1945). Em 1945, com a Carta de São Francisco, deu-se vida às Nações Unidas, reafirmando-se, com destaque, conforme seu Preâmbulo, "a fé nos direitos fundamentais do homem, e na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos de homens e mulheres".

Merecem registro, ainda, nesse processo de positivação internacional, além da Declaração Universal de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas - de destacada importância - a Resolução XL de proteção internacional dos direitos essenciais do homem, produto da Conferência Interamericana (México, 1945) e a Declaração expedida em Bogotá, em 1948 por ocasião da IX Conferência Interamericana, confirmada em Caracas, em 1954, pela X Conferência dos Estados Americanos.

Na Europa, o Conselho criado em Londres em 1949 foi responsável pela Convenção para salvaguarda dos direitos humanos e das liberdades fundamentais (Roma,1950), equivalente ao Pacto Internacional da ONU de direitos civis e políticos, completada por cinco Protocolos contendo largo catálogo de liberdades públicas fundamentais. Em 1961, em Turim, o Conselho de Europa promulgou a Carta Social Européia reconhecendo direitos de relevância social, como a remuneração equivalente ao trabalho, liberdade de trabalho, sindicalização, negociação coletiva e seguridade social. Na Europa, visando a fazer valer os direitos fundamentais no plano jurisdicional, tem-se o Tribunal Europeu de Direitos Humanos e a Comissão Européia de Direitos Humanos, entre outros órgãos.

Deve ser destacada a tripla relevância da evolução da positivação internacional dos direitos humanos, conforme PÉREZ LUNO no plano da fundamentação tem-se um retorno à reivindicação do seu caráter universal e supraestatal (jusnaturalismo), livrando-os do arbítrio da jurisdição doméstica de cada Estado, democratizando-se o Direito Internacional, e tendo-se tais direitos como pressuposto para a pacífica convivência entre as nações. No que tange à titularidade, ampliaram-se os sujeitos ativos, de sorte a proteger não apenas os cidadãos de determinado Estado, mas todos os homens, como o faz a Declaração Universal da ONU, dando, outrossim, quanto a determinados direitos, uma titularidade não somente individual, como também social, alcançando coletividades, grupos e minorias. e do ponto de vista da natureza jurídica, verifica-se nesse processo de positivação internacional também a preocupação com a tutela e garantia desses direitos 69.

A atividade jurídico-positivista dos diversos organismos internacionais tem procurado acompanhar as necessidades sociais e históricas dos povos, aperfeiçoando direitos existentes, desenvolvendo-os e os complementando mediante novos documentos, como exemplos a Declaração dos Direitos da Criança (1959), a Convenção sobre os Direitos Políticos da Mulher (1952), a Declaração, seguida de Convenção, sobre Discriminação Racial (1963), a Declaração sobre Concessão da Independência aos Países e Povos Coloniais (1960) e a Convenção para a Prevenção e Repressão do Genocídio (1958).

Nesse contexto, releva perquirir a natureza das atividades implementadas pelos organismos internacionais. Observa BOBBIO 70 que essa tutela dos direitos humanos é feita mediante promoção, controle e garantia.

A promoção se dá desde quando tais organismos induzem "os Estados que não têm uma disciplina específica para a tutela dos direitos do homem e introduzi-la", e, aos que já a têm, "a aperfeiçoá-la, seja com relação ao direito substancial (número e qualidade dos direitos a tutelar), seja com relação aos procedimentos (número e qualidade dos controles jurisdicionais)". A atividade de controle tem a ver com a verificação do cumprimento e o nível de respeito das recomendações e convenções internacionais pelos Estados membros do organismo. A garantia, por sua vez, corresponde a verdadeira tutela jurisdicional de nível internacional, em substituição à local.

3.4 O VALOR DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM

Terminada a Segunda Guerra Mundial, com a retomada do processo de positivação internacional dos direitos humanos, a Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1948, proclamou a Declaração Universal dos Direitos do Homem. Faziam eco, ainda, as palavras do Presidente norte-americano Franklin Roosevelt acerca da necessidade de que em todos os lugares vigorasse as quatro liberdades: liberdade de expressão, liberdade de cultos, libertação da necessidade e libertação do temor 71.

A Declaração Universal, composta de Preâmbulo e trinta artigos onde se sente o sabor naturalista - como ressalta Recasens SICHES, citado por PENNA MARINHO 72 - "veio para consagrar o anseio de liberdade, como ainda assegurar direitos fundamentais à sobrevivência e à dignidade do homem, expressando os mesmos termos fundamentais da Carta da Organização das Nações Unidas" 73 - para quem a defesa dos direitos humanos tem caráter constitucional 74.

Destaca LOPEZ 75 que a particularidade dessa Declaração repousa no fato de não se haver limitado a reproduzir direitos individuais contemporâneos à primeira fase do constitucionalismo, cuidando de prever, também, os direitos sociais caracterizadores do constitucionalismo social. Portanto, além dos direitos à vida, liberdade, igualdade, defesa, livre circulação, reunião, associação, livre expressão, liberdade de culto e direitos políticos, a Declaração Universal tratou dos direitos econômicos, sociais e culturais também como indispensáveis à dignidade do homem.

Essa Declaração veio para consolidar a idéia de que os direitos humanos não são uma questão doméstica de cada Estado, mas sim internacional, e, apesar de carecer da efetividade desejada, teve o efeito de catalisar o pensamento da época atual sobre a matéria tratada 76.

A doutrina discute, porém, acerca da natureza jurídico-positiva da Declaração sob referência - como salienta PÉREZ LUNO 77. Há quem impugne o caráter jurídico-internacional da Declaração Universal (KELSEN, entre outros), por não enxergar nela autoridade jurídica, somente moral, não passando de uma exposição de princípios gerais. Outros afirmam a autoridade jurídica indireta da Declaração, como LAUTERPACH, considerando os termos utilizados no texto, bem assim a intenção da ONU. Há, ainda, uma terceira corrente que defende o caráter jurídico, capitaneada por René CASSIN, escorada no argumento de que a Declaração constitui verdadeiro tratado dotado de força jurídica para todos os Estados-membros da Organização.

Mas é inegável que a Declaração Universal de 1948, como ressalta BOBBIO, representa a terceira e última fase do processo de declaração solene dos direitos do homem, e sua característica é a afirmação, concomitante, universal e positiva, desses direitos 78.

3.5 PACTO DE SÃO JOSE DA COSTA RICA

A Organização dos Estados Americanos aprovou em 1969, para vigorar a partir de 1978, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, conhecida como Pacto de São Jose da Costa Rica. Faz parte do sistema interamericano de proteção dos direitos humanos e decorre de projeto comum dos países membros, que acentuaram sua preocupação com a proteção dos direitos essenciais do homem logo após a Segunda Guerra Mundial 79.

A Convenção Americana apresenta-se como verdadeiro modelo de esquema constitucional acerca da matéria. Sua característica, conforme HITTERS 80, é de um sistema regional americano destinado "a satisfazer as necessidades próprias desse setor continental", calcado na idéia de coexistência, em cotejo com o modelo universal das Nações Unidas, sendo que, em vez de se contraporem, complementam-se.

Os Estados-partes, como sujeitos passivos dos direitos humanos, têm a obrigação de respeitar os direitos e liberdades reconhecidos na Convenção, e de garantir a fruição de fato pelos jurisdicionados. São obrigados, outrossim, à adoção de disposições no direito interno, para que os direitos sejam efetivados no seu território.

COLAUTTI 81 ressalta, nesse Pacto, a regência sobre o direito à vida e as restrições à aplicação da pena de morte. A proteção à vida é feita desde a concepção, conforme artigo 4º, item 1.

Para garantir as regras constantes da Convenção Americana, integralmente, na medida do possível, de conformidade com o modelo ajustado pelos Estados signatários, instituiu-se a Corte Interamericana de Direitos Humanos, com feição de órgão jurisdicional, incumbindo-lhe dizer se um Estado violou, ou não, os direitos dos particulares. Suas sentenças, se condenatórias, devem determinar a cessação da violação ao direito ou a determinação para que seja restituída a liberdade cerceada, admitindo-se a fixação de indenizações a serem executadas segundo as leis domésticas de cada Estado 82.

Firmaram e depositaram a ratificação do Pacto referenciado, ate 1992, consoante registro de HITTERS 83, os seguintes países: Argentina, Barbados, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, EI Salvador, Grenada, Guatemala, Haiti, Honduras, Jamaica, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Suriname, Uruguai, Venezuela e Nicarágua. Os Estados Unidos, apesar de terem firmado o Pacto, não o ratificaram, considerada a legalidade do aborto em alguns de seus Estados-membros. E o Brasil fez a ratificação em 25 de setembro de 1992, não se submetendo, porém, à jurisdição internacional 84.

Os quatro países integrantes do Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) são signatários e ratificaram o Pacto de São Jose da Costa Rica. Daí a importância do seu estudo na região.

Como explica PINARD, o Pacto distribui seus oitenta e dois artigos em três partes. Na primeira, abriga os deveres dos Estados e os direitos protegidos, ou seja, os direitos humanos, aí compreendidos os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, havendo disciplina, inclusive, para as circunstâncias extraordinárias que determinarem a suspensão desses direitos, bem assim para a escorreita relação entre direitos e deveres. Na segunda parte, acham-se organizados os dispositivos de proteção dos direitos, a cargo da Comissão e da Corte Interamericana de Direitos Humanos. A terceira contempla as disposições gerais e transitórias 85 .

3.6 OS DIREITOS HUMANOS NAS CONSTITUIÇÕES DOS PAÍSES DO MERCOSUL

Harmonizando-se com o moderno constitucionalismo, as Constituições que regem Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai "têm uma manifestação de direitos em sua parte dogmática, acoplando um conjunto de garantias e seguranças, às quais se somam outras outorgadas pela forma de governo adotada e o princípio da divisão dos poderes" 86.

A Constituição argentina de 1853 tratava das declarações, direitos e garantias e, com a Reforma de 1994, não podendo tais disposições ser alteradas, por força de limitação imposta ao reformador, criou-se um novo capítulo, no qual se reconhece, com eficácia constitucional, os tratados internacionais que tratam da matéria 87.

O Brasil consagra na Constituição de 1988, além dos Princípios Fundamentais da República - entre outros a cidadania e a dignidade da pessoa humana (artigo 1°, II e III), os Direitos e Garantias Individuais, compreendendo os Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, os Direitos Sociais, a Nacionalidade, os Direitos Políticos e os Partidos Políticos (artigos 5°e 17).

A Constituição paraguaia contempla as Declarações Fundamentais, divididas em Declarações fundamentais dos direitos, dos deveres e das garantias.

No Uruguai, a Constituição de 1967, reformada em 1997, traz os direitos, deveres e garantias distribuídos entre os artigos 7° e 72, que não excluem outros próprios da pessoa humana ou derivados da forma republicana de governo. Assegura, também, os direitos de cidadania e sufrágio (artigos 73 a 81).

Nessas Constituições é importante perquirir a força do reconhecimento dos direitos, isto é, se são auto-executáveis ou dependem de regulamentação. Gustavo PINARD observa que, na Argentina, a jurisprudência reformulou-se para asseverar que inexiste distinção entre cláusulas operativas e pragmáticas, tendendo para a operatividade. O Uruguai se acha na mesma situação. Quanto ao Brasil, expressamente diz o artigo 5°, parágrafo primeiro, que "as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata", ou seja, dispensam regulamentação infraconstitucional. Quanto ao Paraguai, a redação confusa do artigo 45 dá a entender que há necessidade de lei regulamentadora dos direitos e garantias, mas a sua falta não impedirá sejam usufruídos 88.

3.7 "EVOLUÇÂO" DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: AS GERAÇÕES DE DIREITOS

No início do processo de positivação em nível constitucional dos direitos humanos, refletiam-se nos textos constitucionais os direitos inspirados pelo direito natural - as liberdades individuais - direitos que exigem um não-agir por parte do Estado, tais: liberdade, igualdade formal, segurança, propriedade, resistência à opressão. Depois, veio a fase do reconhecimento dos direitos econômicos e sociais, conseqüentes da nova realidade produzida pela Revolução Industrial, e que demandam prestações positivas do Estado para que possam ser gozados, daí serem conhecidos como direitos concretos . A evolução social a tecnológica deu margem a outras exigências, que, por sua vez, demandaram a consagração de outros direitos e a reformulação de antigos, para atender a direitos e interesses coletivos e individuais, direitos de reprodução e de manipulação genética, entre outros.

Surgiu a primeira geração de direitos fundamentais, formada pelos direitos de liberdade, isto é, os direitos civis e políticos, que "têm por titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa e ostentam uma subjetividade que é seu traço mais característico; enfim, são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado" 89. Esses direitos valorizam, em primeiro lugar, o "homem singular, o homem das liberdades abstratas, o homem da sociedade mecanicista que compõe a chamada sociedade civil, na linguagem jurídica mais usual" 90.

A segunda geração é composta pelos "direitos sociais, culturais e econômicos bem como os direitos coletivos ou de coletividades" a se firmaram com o antiliberalismo reinante no Século XX, tendo sofrido, porém, "um ciclo de baixa normatividade ou ... eficácia duvidosa" posto que se tratam de direitos que, pela sua natureza, demandam do "Estado determinadas prestações materiais nem sempre resgatáveis por exigüidade, carência ou limitação essencial de meios e recursos", dando-lhes conotação de direitos meramente programáticos 91.

O aparecimento dessa geração de direitos fundamentais deve-se ao fato de não mais estarem satisfazendo às necessidades do homem as prestações negativas do Estado, que marcaram a primeira geração. São garantias que não consideram o homem isoladamente, mas sim o interesse coletivo em primeiro plano, como conseqüência do princípio da igualdade, redimensionando o alcance dos direitos referenciados.

A função principal dos direitos sociais, como observa PÉREZ LUN0 92, é "assegurar a participação nos recursos sociais aos distintos membros da comunidade". Conseqüentemente, no sentido objetivo, tem-se que tais direitos são "o conjunto de normas através das quais o Estado leva a cabo sua função equilibradora e moderadora das desigualdades sociais", e, no sentido subjetivo, são "as faculdades dos indivíduos e dos grupos a participar dos benefícios da vida social, o que se traduz em determinados direitos e prestações, diretas ou indiretas, por parte dos poderes públicos", situando-se, sempre, em torno do homem coletivamente considerado. 93

Nessa segunda geração, portanto, os direitos fundamentais deixam de ser apenas liberdades de ação e se convertem em prestações positivas e liberdades de participação.

Emergiram, em seguida, os direitos de terceira geração, contendo uma nova dimensão dos direitos fundamentais, "que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado", mas sim, prioritariamente, "ao gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta", e dizem respeito "ao desenvolvimento, à paz, ao meio-ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade" 94

Os direitos de terceira geração, também chamados direitos de solidariedade, conforme Celso LAFER, citado por BOBBI0 95, compreendem "direitos cujo sujeito não são os indivíduos mas os grupos humanos, como a família, o povo, a nação e a própria humanidade".

Enxerga-se, nos dias atuais, a formação de uma quarta geração de direitos fundamentais, provocada pelas pesquisas biológicas, considerada a necessidade de assegurar os direitos do indivíduo diante das manipulações do patrimônio genético 96.

Importante considerar, nesse quadro das gerações de direitos fundamentais, que o aparecimento de uma nova não exclui outra já formada, pois se trata de um processo qualitativo e cumulativo, decorrente da necessidade histórica de serem satisfeitas as necessidades do homem diante do progresso técnico ou de novas ameaças à sua liberdade.

4 PERSPECTIVAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: PROTEÇÃO E EXEQÜIBILIDADE

A consagração dos direitos fundamentais pelo ordenamento constitucional representa o coroamento do processo de positivação no direito interno.

Mas essa constitucionalização, por si só, não efetiva os direitos, notadamente aqueles que precisam de ações do poder público para se implementarem, sejam os direitos sociais, sejam outros que demandem a regulamentação interna e a instrumentalização processual para que possibilitem ao ser humano a ressalva do bem jurídico.

Deve-se buscar vigência sociológica junto às condutas humanas para os direitos positivados 97.

Proclamar direitos é tarefa fácil. O difícil é dar condições para que sejam desfrutados efetivamente. Por isso BOBBIO chama atenção para o problema da inexeqüibilidade, particularmente dos direitos sociais 98, ressaltando que o grande obstáculo dos direitos do homem, nos dias atuais, não é mais buscar seus fundamentos, mas sim protegê-los:

"Com efeito, o problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados" 99.

O Brasil é pródigo em exemplos desse problema. A Constituição da República de 1988, no artigo 6°, afirma que são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, e a assistência aos desamparados. No entanto, as crises econômicas, a péssima distribuição de renda (a segunda pior do mundo), a falta de vontade política, as administrações ruins, entre outros, não conseguem trazer para a prática os direitos sociais proclamados, e o que se vê no dia-a-dia é a negação desses direitos, verificando-se alto percentual de analfabetismo, os sistemas de saúde e de previdência social falidos, a elevação dos índices de desemprego e a precarização das relações de trabalho, a violência urbana e no campo, e o abandono da infância com milhares de crianças vivendo nas ruas, sem acesso à escola ou exploradas precocemente no trabalho.

Retomando o pensamento de BOBBIO, é preciso empenho para criar condições visando à ampla realização dos direitos consagrados. Para tanto, há necessidade da conscientização "de que a realização dos direitos do homem é uma meta desejável", e, para a efetivação de determinados direitos, exige-se muito mais que a boa vontade dos governantes, como exemplo, a proteção dos direitos atinentes às relações de trabalho, que somente será possível mediante a transformação industrial em um país 100 .

A solução para o problema da "efetivação de uma maior proteção dos direitos do homem está ligada ao desenvolvimento global da civilização humana" 101 .

Um outro aspecto atinente ao êxito da garantia dos direitos humanos tem a ver com a jurisdição internacional, de sorte a permitir ao sujeito ativo desses direitos o acesso a um tribunal que os ressalve.

Nos primórdios do processo de positivação desses direitos não se concebia a idéia dessa jurisdição 102, mesmo porque se partia da premissa de que as normas internas já gozavam de efetividade, com a quase certeza de que seriam cumpridas - o que, na prática, não se verificou.

Há uma tendência no constitucionalismo contemporâneo a que as Constituições se refiram, expressamente, aos tratados de direitos humanos, inserindo-os no ordenamento jurídico interno com "status" constitucional. Disso, alias, é exemplo a Constituição argentina.

Mas nem sempre os países que adotam esses tratados o fazem integralmente, inclusive a aceitação da competência dos órgãos internacionais de proteção.

Deve haver uma mudança de mentalidade, segundo CANÇADO TRINDADE, para que os direitos humanos, notadamente os proclamados nos tratados a instrumentos internacionais, possam beneficiar os próprios indivíduos, com o "acesso direto das supostas vítimas aos tribunais internacionais de direitos humanos (Cortes Européia e Interamericana de Direitos Humanos)" 103. Deve ser aceita a jurisdicionalização incondicional dessas Cortes, como meio mais evoluído de proteção dos direitos sob comento, interagindo com os órgãos internos, sejam do Poder Executivo, sejam do Judiciário - a quem compete interpretar corretamente as "normas internacionais e nacionais de modo a realizar a proteção do ser humano (pro victima), sejam tais normas de origem internacional ou nacional" 104 .

A lição bem se aplica ao Brasil, que, apesar de ter ratificado o Pacto de São José da Costa Rica, reservou-se o direito de não submeter-se à jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Assim, outra perspectiva que se tem no sentido da garantia efetiva dos direitos humanos é que os Estados se submetam às Cortes internacionais, o que, na prática, permitirá ao cidadão agredido acionar diretamente o órgão, que sentenciará visando à reparação ou restauração do direito violado, cabendo ao Estado "réu" cumprir a sentença.

5 CONCLUSÃO

A doutrina dos direitos humanos ganhou vida com o liberalismo e as idéias iluministas, achando-se umbilicalmente ligada ao Estado de Direito implantado no Século XVIII.

As Revoluções Francesa e Americanas, que marcaram aquele século, deflagraram o movimento constitucionalista, no qual uma das características é a proclamação dos direitos fundamentais do homem, dotando o indivíduo de garantias frente ao Estado.

Neste século, especialmente como conseqüência das duas Guerras Mundiais, as nações ocidentais compreenderam que os direitos do homem precisavam de reconhecimento, também, no plano internacional, criando-se, então, organismos internacionais e providenciando-se Declarações de Direitos, achando-se no ápice desse processo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, formulada pela Organização das Nações Unidas, em 1948.

Nas Américas, sobressai?se o Pacto de São José da Costa Rica, de significativa importância porque trata da matéria voltando-se para os problemas típicos dos países americanos, sem afastar-se do modelo da Declaração Universal, e que foi subscrito e ratificado pelos quatro Estados integrantes do Mercosul.

As necessidades históricas do homem em si considerado e em sociedade demandaram o reconhecimento de sucessivas e cumulativas gerações de direitos, começando pelos direitos de liberdades, passando para os direitos sociais, seguindo-se os direitos de solidariedade e, mais recentemente, os direitos de reprodução.

Os direitos humanos inseridos nas Constituições galgam o "status" de direitos fundamentais, aos quais os Estados, com tão elevada proclamação no direito interno, comprometem-se a respeitar, garantir e dar efetividade. Sem essa positivação os direitos são meras esperanças - no máximo direitos de resistência - sem condições de ser cobrados dos governos.

No entanto, a própria crise do positivismo, a natureza de determinados direitos, como os sociais - que exigem prestações positivas do Estado - e as crises políticas e econômicas que afetam praticamente todas as nações, impedem a plena efetividade dós direitos fundamentais, não bastando o reconhecimento constitucional.

Nesse contexto, nos dias atuais, tem-se que o grande desafio dos direitos humanos é a efetiva fruição, proteção, exeqüibilidade.

Para que se tente e superação desse problema vislumbra-se a necessidade de os governos criarem condições internas para a realização dos direitos reconhecidos, mormente condições econômicas e sociais. E os direitos fundamentais que exigem prestações positivas dos Estados carecem, antes de tudo, de políticas públicas para serem implementados.

Outra saída que se apresenta para a garantia dos direitos humanos é a submissão incondicional dos Estados às Cortes de justiça internacionais, abrindo-se o acesso direto ao indivíduo vitimado para que acione o tribunal e possa receber a sentença reparando ou restaurando seus direitos humanos violados, a ser cumprida pelo Estado infrator.

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1 'Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución, p. 21.       

2 A Era dos Direitos, p.17.     

3
Ob. cit., p. 24.         

4 Ob. cit., p.48.          

5 Ob. cit., p.31           

6 ROUBIER,Paul - Droits Subjectives et Situations Juridiques, P.22-26.       

7 MIRANDA, Jorge - Manual de Direito Constitucional, Tomo IV, p.53-55.            

8
PÉREZ LUÑO, Antonio Enrique - Ob.cit.,p.34.     

9 Ob. cit., p.35.          

10 DUVERGER, Maurice - Droit Public, p.37.          

11 PÉREZ LUÑO, Antonio Herique - Ob. cit., p.37.

12 OMMATI, Fides Angélica de C.V.Mendes - Estudos sobre a constitutição..., p.16.         

13
Id., ib., p.47.         

14 Ob. cit., p.6.          

15 BOBBIO, Noberto-Ob. cit., p.9.  

16
Ob. cit., p.12.

17 Ob. cit., p.13-14.

18 BONNAVIDES, Paulo - Do estado Liberal..., p.153.      

19 Id., Ib., p.501-502            

20 Direito Constitucional, p.501-502.

21 BOBBIO, Norberto - Ob. cit., p.73.         

22 Direitos Humanos Fundamentais, p.10.      

23 FERREIRA FILHO, Mnoel Gonçalves - Ob. cit., p.9.      

24 Instituciones de Derecho Público, p.315-316.       

25 Contribuição do Direito Natural para a Declaração..., p.19.

26 PEREZ LUÑO, Antonio Enrique - Ob. cit., p.30.

27 Ob. cit., p.56.        

28 Ob. cit., p.59.        

29 Ob. cit., p.59.        

30 PEREZ LUÑO, Antonio Henrique - Ob. cit., p.59-60.     

31 Ob.cit., p.8.           

32 BOBBIO, Noberto - Ob. cit., p.32.          

33
Id. Ib, p.75-78.     

34 Teoría de la Constitucuión, p.164.

35 POUND, Roscoe - Liberdade e Garantias Constitucionais, p.17. 36 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves - Ob. cit., p.22.     

37 PENNA MARINHO, Inezil - Ob. cit., p.22.         

38
Ob. cit., p.68.        

39 PEREZ LUÑO, Antonio Henrique - Ob. cit., p.111-112.

40 LÓPEZ, Mario Justo - Ob. cit., p.26.        

41
SCHITT, Carl - Ob. cit., p.164.    

42 LÓPEZ, Mario justo - Ob. cit., p.27-28.   

43 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves - Ob. cit., p.20.  

44 LÓPEZ, Mario Justo - Ob. cit., p.29.        

45 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves - p.20.    

46
SCHIMITT, Carl - Ob. cit., p.166.           

47 Ob. cit., p.90.        

48 OMMATI, Fides Angélica de C.V.M. - Ob. cit., p.77-80.           

49 LOZADA, Salvador Maria - Ob. cit., p.101.        

50
TRAVIESO, Juan Antonio - Historia de los Derechos Humanos..., p.367.            

51 Ob. cit., p.363.      

52 Ob. cit., p.150.      

53 Ob. cit., p.167.      

54 Principios de Derechos Humanos e Garantías, p.200.        

55 Teoría de los Derechos Fundamentales, p.25.        

56 Ob. cit., p.65.        

57 Ob. cit., p.498.      

58 MIRANDA, Jorge - Ob. cit., p.48.           

59
PÉREZ LUÑO, Antonio Enrique - Ob. cit., p.97-98.        

60 Id. Ib., p.100-103.            

61 Ob. cit., p.104.      

62 PÉREZ LUÑO,Antonio Enrique - Ob. cit., p.105.            

63 Ib. cit., p.497.        

64 Ob. cit., p.497-498.          

65 HERRENDORF, Daniel E. e BIDART CAMPOS, German - Ob. cit., p.201.      

66 PÉREZ LUÑO, Antonio Henrique - Ob. cit., p.77.           

67 PÉREZ LUÑO, Antonio Henrique - Ob. cit., p.125-126.

68 Ob. cit., p.126.      

69 Ob. cit., p.129.      

70 Ob. cit., p.39-41.  

71 LÓPEZ, Mario Justo - Ob. cit., p.30.        

72
Ob. cit., p.29-30.  

73 PENNA MARINHO, Inezil - Ob. cit., p.77.         

74
PÉREZ LUÑO, Antonio Henrique - Ob. cit., p.77.           

75 Ob. cit., p.30.        

76 LÓPEZ, Mario Justo - Ob. cit.,p.30.         

77
Ob. cit., p.78-82.  

78 BOBBIO, Noberto - Ob. cit., p.30.          

79
HITTERS, Juan Carlos - Derecho Internacional de los..., p.11-14.           

80 Ob. cit., p.42-44.  

81 COLAUTTI Carlos E. - Derechos Humanos, p.37.          

82 PINARD, Gustavo E. - Los Derechos Humanos en las..., p.158.

83 Ob. cit., p.52.        

84 PINARD, Gustavo E. - Ob. cit., p.115.

85 Ob. cit., p.156-158.

86 PINARD, Gustavo E. - Ob. cit., p.183.

87 Id. Ib., p.171-172.

88 Ob. cit., p.176-178.

89 BONAVIDES, Paulo - Curso de Direito Constitucional, p.517.

90
Id. Ib., p.518.

91 Id. Ib., p.518.

92 Ob. cit., p.84.

93 PÉREZ LUÑO, Antonio Enrique - Ob. cit., p. 84.

94 BONAVIDES, Paulo - Curso de..., p. 523, inspirado em Karel VASAK.

95
Ob. cit., p.12.

96 BOBBIO, Norberto - Ob. cit., p.6.

97 HERRENDORF, Daniel F. e BIDART CAMPOS, German J. - Ob.cit., p.201.

98 Ob.cit., p.24.

99 BOBBIO, Noberto -Ob.cit., p.25.            

100
Ob. cit.,23.          

101 BOBBIO, Norberto - Ob. cit., p.45.       

102 TRAVIESO, Juan Antonio - Ob. cit., p.200.       

103 TRINDADE, Antonio Augusto Cançado - Memorial em prol de uma..., p.58.

104
Id. ib., p.60.

 

(*) Trabalho de conclusão da disciplina Seminário III (Direito Público) , Curso de Doutorado em Ciências Jurídicas e Sociais , Faculdade de Ciências Políticas, Jurídicas e Econômicas,Universidade do Museu Social Argentino. Prof. Dr. Gerardo Ancarola.


(**) Doutoranda em Ciências Jurídicas e Sociais (UMSA); membro do Ministério Público da União/Ministério Público do Trabalho - Procuradora Regional do Trabalho-Piauí, Chefe da Procuradoria Regional do Trabalho da 22ª Região.

 

SOARES, Evanna. A Constitucionalização dos direitos humano.

Disponível em <http://www.pgm.fortaleza.ce.gov.br/revistaPGM/vol07/05Constitucionalizacao.htm>. Acesso em 23 de agosto de 2006.