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ACM
e a democracia
Sérgio Ricardo
Marques Gonçalves *
É lamentável que neste final de século o Brasil esteja à mercê de
políticos que apenas enxergam os próprios interesses e não tem o menor pudor em
arrastar até a berlinda temas sérios para, em seguida, pintá-los de cores
errôneas e exageradas, visando desvirtuar a atenção do povo do que realmente
interessa e, de quebra, eliminar a resistência (ainda que da lei), aos seus
projetos e intenções espúrias.
É legítimo que o presidente do Senado Federal comente temas que estejam
sendo discutidos pelas casas do legislativo, mas as palavras de Antônio Carlos
Magalhães no último dia 14 de junho revelaram, mais uma vez, a maneira
dantesca, arrogante e truculenta, pouco afeita ao debate democrático, com que
ele trata os assuntos nacionais. Ao afirmar que o tema (Reforma do Judiciário)
não é assunto para ser tratado por advogados, ele, um médico, demonstra, além
de ignorância, um preconceito intolerável com nossa classe, como se advogados
fossem todos, aéticos e contrários ao que é justo e perfeito. Afinal, um dos
motivos da atual situação brasileira é a péssima atuação dos nossos
legisladores, que em geral não possuem bagagem jurídica capaz de embasar as
leis que produzem. Aliás, o próprio ilustre Senador, que mantém-se nos altos
escalões de governo há décadas e apregoa ser um paladino do "resgate da
ética", é o primeiro a fazer ataques pessoais, tendo como alvo o Deputado
paulista Michel Temer quando deveria, se pudesse, manifestar-se com argumentos.
Pratica, na verdade, o conceito de ética do atual governo, no qual
(comenta-se), manda mais que o Presidente da República. Atualmente, o estado
democrático de direito vem sendo constantemente ameaçado pelo governo federal
que legisla reiteradamente por instrumentos como medidas provisórias e propõe
leis para, até mesmo, tentar calar o Ministério Público, Delegados e
Magistrados, tentando esconder da população graves fatos que dioturnamente,
batem às portas do Judiciário.
Pois bem, o momento é grave em nosso país: debatemos (ou pensamos que
sim) atualmente, as reformas no Judiciário e em nosso sistema tributário, mas
tudo o que nossos políticos querem, é fazer CPI´s e desviar os olhares do
"respeitável público". Pobre povo brasileiro... ele pensa que estas
CPI´s no legislativo salvarão nosso país das mazelas que possui, punindo
efetivamente os criminosos. Não o farão! Não é este o fôro adequado para se
apurar crimes, ainda mais que ao contrário do judiciário, onde os processos andam
nos limites da lei, nas CPI´s é comum que se trilhem caminhos pouco
recomendáveis, nos quais fabricam-se resultados pífios, como os da CPI da máfia
dos fiscais em São Paulo e a atual CPI dos bancos, em que os relatórios finais
tendem a deixar as acusações ao Ministério Público, ou seja, toda a
responsabilidade pela real apuração dos fatos não fica na esfera da CPI que
quer é empurrar tudo para baixo do tapete. Ora, então porquê toda esta
panacéia? Para que o povo seja levado a pensar que os políticos estão
interessados em mudar este "status quo"!
É preciso mais senhores... Cresce em nossa população um sentimento de
inutilidade da classe política. Para quem não acredita, basta sair e perguntar
ao povo. Pior do que uma ditadura de homens fardados, identificáveis para se
combater, é uma de homens que vestem ternos e fingem ser democratas. Estejamos
atentos, o Brasil está passando por um momento delicado e nosso sistema
jurídico será todo revisado. Julgando-se pelos últimos exemplos de atuação de
nossos legisladores, convém redobrar nossa atenção!
Em tempo: o Senador Antônio Carlos Magalhães diz: "nunca vi nenhum
livro dele (Temer) ou soube de algum aluno importante". Esclareço-lhe
então: O Deputado Michel Temer, Doutor em Direito Constitucional e Professor desta
matéria na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (nunca soube de nenhum
aluno importante da PUC-SP, Senador?), várias vezes Procurador Geral do Estado
de São Paulo e também constituinte, é sim autor de obras jurídicas, entre elas
"Elementos de Direito Constitucional", obra básica, fácilmente
encontrada nas mãos de alunos dos primeiros anos dos cursos jurídicos!
Ah, me desculpe, o Senador é médico....
* Advogado em Taubaté (SP).
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1920>. Acesso em: 25 jul. 2006.