® BuscaLegis.ccj.ufsc.br
Larguem
dos meus pobres
Luciano Schauffert de
Amorim *
FHC diz que é o pai, o Senador Suplicy alega que já o
concebeu há muito tempo e ACM, o "Todo-Poderoso", afirmou, categoricamente,
que o filho é dele e ninguém o toma de suas mãos. Mas que criança rebelde é
essa? E mais, quem será a mãe?
O tal menino (creio que nasceu com o sexo masculino) é o projeto
de erradicação da pobreza no Brasil. A sua fórmula é simples: com o aumento,
e criação, de impostos, a serem cobrados dos ricos, irá se criar um fundo
patrimonial de combate à miséria no país. Cada pobre receberá seu dinheirinho e
deixará sua condição de pobreza para o passado. Meus amigos, isso é muito
melhor que o milagre da multiplicação dos pães por Jesus Cristo, na Galiléia
bíblica.
Hipocrisia pura! Vamos lembrar o caso atual da CPMF, que
nos é cobrada (suspensa a cobrança em alguns Estados, por força de liminar
judicial) a cada transação bancária que fazemos. O destino do montante
arrecadado com tal cobrança seria providenciar auxílio ao nosso falido sistema
de saúde. Estou desconfiado de que para o SUS esse dinheiro não foi. A saúde
pública continua um caos. É absurdo perceber que morrem pessoas em imensas
filas de hospitais conveniados com o SUS, por falta de atendimento médico. E
isso simplesmente porque não são essas pessoas portadoras de voz alta para
gritar contra essa torpeza. Mas não teria problema se fosse rico. Não morreria,
se pagasse o plano de saúde e pronto.
Legal, a pobreza terá um fim no Brasil! E com fórmula
matemática precisa: damos uns "trocados aos miseráveis e pronto... a
pobreza some..." Já escrevi uma vez e repito agora: Êta populismo barato.
É, no mínimo, ridículo ver homens públicos discutindo nesse nível um problema
tão grave como esse, oferecendo soluções que beiram o escárnio. Caridade não
resolve o desvio social sistêmico que existe no nosso país.
Pobreza se combate com desenvolvimento econômico-social. O
fomento a novos postos de trabalho, com o aquecimento da industria, setor de
serviços, etc., acarreta em contribuição para a erradicação da miséria. Mais
trabalho, é disso que o povo precisa!
Só que não adianta incentivar a produção de novos
empregos, de forma isolada. Esse é somente o primeiro passo a ser dado. Setores
sociais deficientes, defasados por más administrações públicas, devem ser
repensados em sua destinação de atendimento. A saúde, educação, e outros tantos
serviços públicos, aos quais a população carente tem o direito de acessar, precisam
voltar, ou começar, a funcionar efetivamente, em termos de quantidade e
qualidade. O Estado não presta favor ao cidadão, ao contrário, deve respeito
aos seus direitos.
Os pobres de nosso país não têm perspectivas de emprego,
não têm acesso à boa educação, nem tampouco têm dignidade no atendimento
médico. Em resumo, os pobres brasileiros, "brasileiros pobres" que
são, não são portadores de cidadania. É particularmente triste acessar os meios
de comunicação e presenciar as reais condições de sobrevida (porque,
definitivamente, vida plena de sentido não é) das pessoas rotuladas como
miseráveis.
Aí fica fácil fazer caridade. Funciona assim: "Olha,
miserável, eu, o político "Todo-Poderoso", estou criando um fundo
patrimonial para te tirar do teu estado de pobreza absoluta. Te dou uns
trocados. Que favorzão que eu estou te fazendo, hein..."
E o povo brasileiro, necessitado de milagres que está, vai
aceitar pacificamente essa caridade, tapa-buraco de discussões reais e
honestas, sem retrucar ou questionar seu caráter populista. Mas o pobre , sem
cultura, educação, ou mesmo cidadania, não tem culpa: ele só quer sobreviver,
nem que seja com alguma esmola dada pelos políticos. Culpa temos nós, que temos
voz ativa para questionarmos mais essa vergonha, mas ficamos calados por
conveniência. Aceitamos que exista essa falta de planejamento social, que
perverte o combate aos imensos desvios de nossa sociedade, e que se disfarça
com políticas populistas e sem funcionalidade nenhuma.
* Advogado em Videira (SC).
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1913>. Acesso em: 25 jul. 2006.