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Educação
à luz do Direito
Nelson Joaquim *
Sumário: INTRODUÇÃO;, Capítulo I: EDUCAÇÃO E
DIREITO, 1. ACEPÇÕES DA EDUCAÇÃO, 2. BREVE ANÁLISE HISTÓRICO-CONCEITUAL, 3.
O EDUCADOR E O JURISTA, Capítulo II: DIREITO E DIREITO EDUCACIONAL, 1.
NOÇÕES E CONCEPÇÕES, 2. CONCEITUAÇÃO DE DIREITO EDUCACIONAL, Capítulo III: FONTES
DE DIREITO E DO DIREITO EDUCACIONAL, 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS, 2. FONTES
FORMAIS DO DIREITO, 2.1. Lei, 2.2. Costumes, 2.3. Jurisprudência, 2.4.
Doutrina, 3. PRINCÍPIOS DO DIREITO, Capítulo IV: DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO, 1.
BREVES CONSIDERAÇÕES, 2. DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO, 3. DIREITO À EDUCAÇÃO, 4.
INSTRUMENTOS DE TUTELA À EDUCAÇÃO, CONSIDERAÇÕES FINAIS, REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
Resumo
Como o direito tem visto e contribuído para a educação
brasileira? Esta dissertação pretende demonstrar as relações existentes entre
educação e direito, analisando as contribuições de educadores, juristas e da
ciência jurídica para a superação da fase legislativa da educação.
Para tanto, num primeiro momento o autor realiza um
esforço de sistematização das relações entre educação e direito. Utilizando uma
metodologia de caráter interdisciplinar, introduz na investigação as
tradicionais fontes do direito e examina as concepções modernas dos princípios
do direito em matéria educacional.
Num segundo momento, trata de uma questão básica, que
consiste na discussão da doutrina sobre o direito público subjetivo à educação.
Segundo o autor, coube ao jurista Pontes de Miranda a importante contribuição
na defesa do direito à educação como direito subjetivo, e os legisladores
constitucional (Constituição de 1988) e infraconstitucional (Lei de Diretrizes
e Bases da Educação, de 1996) incluíram, nos respectivos textos legais, a
obrigação de educar, como norma cogente e de ordem pública. Acrescente-se que,
nesta investigação, também foram arrolados os instrumentos e mecanismos
colocados à disposição do cidadão comum e dos operadores do direito para
facilitar o acesso à justiça nas relações jurídico-pedagógicas.
Finalmente, num contexto de argumentação de ordem teórica
e prática, demonstra como se aplica e se realiza o direito educacional, para,
em seguida, propor uma possível especialização e autonomia do direito
educacional.
Abstract
How has
education been regarded by the Law in
First,
the author attempts at systematising the relations between education and the
Law. He uses, in this case an interdisciplinary methodology, introducing the
traditional sources of Law in the investigation and reviewing the modern
conceptions of Law principles as applied to educational issues.
Secondly,
he deals with a basic issue, consisting of the discussion of the doctrine on
the public right to education. Here, according to the author, the Brazilian
jurist Pontes de Miranda has made the important contribution in defence of the
right to education. And the legislators did include the duty to educate as
cogent and public order norm in the legal texts both at constitutional
(Brazilian 1988 Constitution ) and statutory (1996 Law of Guidelines and Bases
for Education) levels. In this investigation, a survey of the instruments and
mechanisms available to the common citizen and to legal operators, for the
purpose of facilitating the legal access in the juridical-pedagogical
relations, is added.
Finally,
within a context of theoretical and practical arguing, he demonstrates how
Educational Law is applied and carried out. In the following he proposes a
possible specialisation and autonomy for Educational Law.
INTRODUÇÃO
Este trabalho é uma dissertação para obter o grau de
Mestre em Direito pela UGF, dentro da Área de Concentração "Estado e
Cidadania", orientada no sentido de contribuir para a investigação e a
sistematização das relações entre educação e direito. Cabe destacar que a
escolha do tema direito educacional no terceiro milênio se justifica por
ser o direito educacional pouco explorado na literatura jurídica brasileira, o
que confere um caráter inovador a sua análise. Este é o momento de nos
indagarmos: e o direito, como tem visto a educação brasileira e como tem
contribuído para ela? O presente trabalho visa a atingir tanto a comunidade
jurídica e como os educadores, porém, pretende atingir sobretudo a primeira,
trazendo uma contribuição efetiva para a sistematização do direito educacional.
Neste trabalho científico acadêmico, pela própria natureza
do campo investigado, buscou-se utilizar uma metodologia de caráter
interdisciplinar. Por isto, é nítida a preferência e o esforço no sentido de
incorporar as diferentes concepções de educação no contexto da estrutura
tradicional do direito. No entanto devido à carência de obras especializadas na
literatura brasileira, enfrentamos certa dificuldade para o levantamento bibliográfico
a respeito da matéria. Estas dificuldades decorrem em grande parte da
existência de poucas obras sistematizadas sobre direito educacional na
literatura brasileira. Assim, este trabalho não seria possível sem a conjugação
de esforços de várias pessoas e instituições.
Em relação à bibliografia sobre o direito educacional
propriamente dito, em que pesem algumas publicações esparsas, temos poucas
obras específicas sobre a matéria. Aliás, a discussão dos juristas e educadores
em relação ao direito educacional iniciou-se, em termos efetivos, em outubro de
1977, no 1º Seminário de Direito Educacional, realizado
No que diz respeito às instituições, não podemos deixar de
mencionar: a Biblioteca do Senado Federal, como a publicação das revistas de
informação legislativa e o acesso ao site sobre direito educacional; e o
Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação, no Rio de Janeiro, que lançou a Revista
do Direito Educacional. Este instituto vem contribuindo para a divulgação
do direito educacional, além de promover seminários e congressos acerca do
tema.
Na exposição deste trabalho, e mais por conveniência
metodológico-didática, optamos por dividi-lo em capítulos metodologicamente
articulados. No primeiro capítulo, pela própria natureza do campo investigado,
buscou-se sobretudo o enfoque interdisciplinar. Para tanto, numa perspectiva
histórico-conceitual e filosófico-jurídica, utilizamos como paradigmas a
concepção democrática de educação do filósofo e educador americano John Dewey,
do educador Anísio Teixeira e do jurista e filósofo Pontes de Miranda. Aqui, a
dissertação exigiu a adoção de uma perspectiva histórica contextualizada do
direito educacional, mas, devido as dificuldades de tempo e os propósitos de
ordem epistemológica, nos limitamos a apresentar uma breve análise
histórico-conceitual das relações entre direito e educação.
Já no segundo capítulo, priorizando a relação conceitual
entre direito e direito educacional, com o objetivo de superar a fase
legislativa da educação, apresentamos, então, o direito como ciência jurídica e
as diferentes concepções de direito, justificando a escolha da expressão direito
educacional, bem como ressaltando as dificuldades para sua conceituação.
Trata-se, em síntese, do estudo do direito educacional do ponto de vista
conceitual, mas destacando a importância do ordenamento jurídico e da
construção teórica e sistematizada. A propósito, quando nos referimos ao
direito educacional, estamos examinando a questão da norma, da lei reguladora
das relações entre Estado, instituição de ensino, aluno e professor. Ao mesmo
tempo, analisamos o direito educacional enquanto teoria, ou seja, como ciência
jurídica educacional.
O capítulo III, o mais extenso do presente trabalho, trata
de um assunto que reúne a base e a essência do estudo do direito – ou seja, as
fontes tradicionais do direito e do direito educacional – e que nos permitiu
delimitar um quadro científico do direito educacional. Neste caso, de certo
modo conseguimos, por um lado, sistematizar toda a bibliografia recente sobre
direito educacional e, de outro, avançamos no propósito de contribuir para a
sistematização do direito educacional.
Vale lembrar que essas contribuições devem-se ao fato de
assumirmos a tese da doutrina como fonte jurídica fundamental do direito
educacional. Contudo, a utilização de uma concepção tradicional das fontes formais
do direito não dificultou o nosso propósito de apresentar uma concepção
moderna dos princípios do direito, intitulada tendência pós-positivista,
que entende os princípios como normas jurídicas vinculantes, dotadas de efetiva
juridicidade, e, por isto, mais compatível com os princípios do direito
educacional inseridos na Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação, de 1996. Pretendemos, em suma, aglutinar essa parte dispersa das
fontes formais do direito, como contribuição para a superação da fase
legislativa da educação, com o propósito de construir doutrinas mais homogêneas
e métodos próprios do direito educacional.
No último capítulo, a questão fundamental consistiu na
discussão sobre a educação como direito público subjetivo. Coube, neste caso,
ao jurista Pontes de Miranda a importante contribuição na defesa do direito à
educação como direito subjetivo. Tais discussões doutrinárias encontram-se,
inicialmente, em sua obra clássica Direito à educação, publicada em
1933, nos comentários à Constituição de 1946 e de 1967 e na conferência
proferida na Ordem dos Advogados, em 1965, sob o título O acesso à cultura
como direito de todos, em que sustenta "que se crie para todos o
direito subjetivo à educação no sentido de que arme o cidadão de uma ação capaz
de exigir do Estado a prestação educacional". Aqui, a doutrina
brasileira recepcionou longa discussão sobre a educação como direito subjetivo,
exigindo do legislador constitucional (Constituição de 1988) e do legislador
infraconstitucional (Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996) incluir a
obrigação de educar, como norma cogente, coercitiva e de ordem pública (art.
208 § 1º e § 2º da Constituição Federal). Do mesmo modo, as referidas
legislações introduziram mecanismos jurídicos próprios de tutela à educação.
Além disso, diferentes legislações contêm normas jurídicas para defesa do
direito à educação (Código de Defesa do Consumidor – Lei nº 8.078, de 11 de
setembro de 1990; Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei nº 8.069, de 13 de
julho de 1990). Acrescente-se a importância do Ministério Público, da Ação
Civil Pública e dos Juizados Especiais Cíveis como mecanismos eficazes para o
acesso à justiça em matéria educacional. De outra parte, nesse capítulo, a
pesquisa é falha na omissão de uma análise mais ampla e profunda sobre os
demais dispositivos constitucionais no âmbito do direito educacional (educação
nas Constituições brasileiras).
Por fim, no contexto educacional brasileiro, que exige uma
análise histórica mais profunda, o poder público não priorizou políticas
públicas, tampouco construiu uma ordem jurídica educacional homogênea e eficaz.
Por tanto, de certo modo justifica-se esta pesquisa, empreendida como tentativa
de dupla contribuição: de uma parte contribuição à sistematização do direito
educacional e, de outra, contribuição para o aperfeiçoamento profissional
dos operadores do direito e educadores, para possível especialização em
direito educacional.
CAPÍTULO I
EDUCAÇÃO E DIREITO
Sumário: 1. Acepções da educação; 2. Breve análise
histórico-conceitual; 3. O educador e o jurista.
Trataremos neste capítulo inicial das relações entre
educação e direito do ponto de vista conceitual, filosófico, pedagógico,
psicológico, histórico e sociológico. [01] Para tanto, vamos apresentar
as diferentes acepções da educação e um breve histórico – conceitual,
utilizando como paradigma a concepção democrática da educação do filósofo e
educador americano John Dewey – obra clássica – Democracia e educação.
[02] No caso brasileiro, vamos destacar os ensinamentos de dois
importantes pensadores: o educador Anísio Teixeira e o jurista Pontes de
Miranda, como precursores do estudo da relação interdisciplinar entre o
educacional e o jurídico–político.
1. Acepções da educação
A dificuldade inicial para conceituar educação deve-se ao
fato da existência de diferentes acepções de educação no processo histórico.
Resultado, também, dos diferentes modos de conhecer, tais como vulgar,
teológico, filosófico e, ainda, pelas ciências, tais como a psicologia,
pedagogia, biologia, filosofia da educação, sociologia, direito, política etc.
Contudo, o conceito como uma idéia prévia, que se dirige a
realidade, é necessário, muito embora não se tenha um conceito único de
educação, tampouco de direito.
Sócrates (469-
Para Aristóteles (384-
Na primeira obra clássica sobre didática, Didática
magna, de 1657, assim se expressa João Amós Comenius: [05]
"Educar prudentemente a juventude é procurar que
sua alma se preserve da corrupção do mundo. É favorecer, com bons e contínuos
conselhos e exemplos, a germinação das sementes e da honestidade, que já estão
plantadas (…) E ainda: educar retamente a juventude não é enchê-la de palavras,
frases, sentenças e opiniões tomadas dos outros, mas abrir sua inteligência às
coisas para que dela brotem rios como de uma fonte viva, flores e frutos; e
cada ano que passa tornem a germinar." [06]
Comenius acreditava, como Sócrates, que o homem só pecava
por ignorância. Daí o ponto de partida de sua Didática ser
"Conhece-te a ti mesmo". Ele defendeu a tese central de que a escola
não é somente lugar de instrução, mas de educação.
A educação do homem, já em Locke, é uma educação para a
razão. Ela deve antes ter por alvo o ambiente ou o grupo social a que o
indivíduo pertence: [07] não pode ser, segundo Locke, a educação de
um indivíduo abstraído dos seus vínculos com a sociedade. Admito que o ler, o
escrever e a cultura sejam necessários, diz Locke, mas não que sejam coisa mais
importante. Creio que consideraríeis muito estúpido quem não estimasse
infinitamente mais um homem virtuoso do que um grande erudito. A educação deve
capacitar o indivíduo a julgar e criticar as opiniões, os costumes, as
superstições do ambiente a que pertence. Neste caso, a tarefa fundamental da
educação é a de preparar o indivíduo a fazer prevalecer, nos seus
comportamentos, as exigências da razão. [08]
Rousseau (1712-1778), com a sua obra clássica Emílio ou
da educação, apresenta uma nova concepção de educação, baseada nas
necessidades e interesses imediatos da criança. Segundo ele: "nascemos
fracos, precisamos de força; nascemos estúpidos, precisamos de juízo. Tudo o
que não temos ao nascer, e de que precisamos adultos, é-nos dado pela
educação". [09]
Distingue, desde as primeiras páginas dessa obra, três
tipos de educação: a da natureza, a dos homens e a das coisas.
O desenvolvimento interno de nossas faculdades e de nosso órgãos é a da
educação da natureza; o uso que se nos ensina a fazer deste desenvolvimento é a
educação dos homens e a aquisição das coisas. Destas três educações, a primeira
não depende de nós, a terceira depende parcialmente e só a Segunda está
inteiramente em nossas mãos. [10]
Hegel, em 1821, na sua obra Princípios de filosofia do
direito, deixa de considerar a educação como fenômeno religioso ou moral,
para considerá-la um direito novo. Ele identifica o princípio do direito da
criança à educação como conceito jurídico:
"A exigência de ser educada existe na criança na
forma daquele sentimento, que lhe é próprio, de não estar satisfeita em ser
aquilo que é. É a tendência para pertencer ao mundo das pessoas adultas, que
ela adivinha superior, o desejo de ser grande. A pedagogia do jogo trata o
elemento pueril como algo de valioso em si, assim o apresenta às crianças e
para elas degrada o que é sério, ela mesma reveste uma forma pueril que as
crianças menosprezam." [11]
As conclusões do biólogo, psicólogo e educador Jean Piaget
provocaram, também, uma revolução nos antigos conceitos relacionados à
aprendizagem e à educação. Em 1896, ele chamou a atenção para o estado atual
dos problemas em função das recentes tendências da educação, ressaltando o
seguinte:
"O direito à educação intelectual e moral implica
algo mais que um direito a adquirir conhecimentos, ou escutar, e algo mais que
uma obrigação a cumprir: trata-se de um direito a forjar determinados
instrumentos espirituais, mais preciosos que quaisquer outros, e cuja
construção requer uma ambiência social específica, constituída não apenas de
submissão." [12]
"A educação é, por conseguinte, não apenas um
formação, mas uma condição formadora necessária ao próprio desenvolvimento
natural. Proclamar que toda pessoa humana tem o direito à educação não é pois
unicamente sugerir, tal como o supõe a psicologia individualista tributária do
senso comum, que todo indivíduo, garantido por sua natureza psicobiológica ao
atingir um nível de desenvolvimento já elevado, possui além disso o direito de
receber da sociedade a iniciação às tradições culturais e morais; é pelo
contrário e muito mais aprofundadamente, afirmar que o indivíduo não poderia
adquirir suas estruturas mentais mais essenciais sem uma contribuição exterior,
a exigir um certo meio social de formação, e que em todos os níveis (desde o
mais elementares até os mais latos) o fator social ou educativo constitui uma
condição do desenvolvimento." [13]
Num clássico da sociologia, [14] T. H.
Marshall, por volta de 1956, expressou sua concepção de educação:
"O direito à educação é um direito social de
cidadania genuíno porque o objetivo da educação durante a infância é moldar o
adulto
A pedagogia moderna, [16] considerada a ciência
da educação, concebe que:
"A educação é um fenômeno social e universal,
sendo uma atividade humana necessária a existência e funcionamento de todas as
sociedades. Cada sociedade precisa cuidar da formação dos indivíduos, auxiliar
no desenvolvimento de suas capacidades físicas e espirituais, prepará-los para
a participação ativa e transformadora nas várias instâncias da vida social (…)
Em sentido amplo, a educação compreende os processos formativos que ocorrem no
meio social, nos quais os indivíduos estão envolvidos de modo necessário e
inevitável pelo simples fato de existirem socialmente. Em sentido estrito, a
educação ocorre em instituições específicas, escolares ou não, com finalidades
explícitas de instrução e ensino mediante uma ação consciente, deliberada e
planificada." [17]
"A aprendizagem é a assimilação ativa de
conhecimentos e de operações mentais, para compreendê-los e aplicá-los
consciente e autonomamente. A aprendizagem é uma forma do conhecimento humano –
relação cognitiva entre aluno e matéria de estudo – desenvolvendo-se sob as
condições especificadas do processo de ensino. O ensino não existe por si
mesmo, mas na relação com a aprendizagem. A unidade entre ensino e aprendizagem
fica comprometida quando o ensino se caracteriza pela memorização, quando o
professor concentra na sua pessoa a exposição da matéria, quando não suscita o
envolvimento ativo dos alunos. O processo ensino-aprendizagem deve estabelecer
exigências e expectativas que e os alunos possam cumprir e, com isso, mobilizem
suas energias." [18]
Na realidade, muito embora a educação, instrução e ensino
sejam objetos de estudo da pedagogia, o caráter interdisciplinar nas relações
jurídico-educacionais nos permite utilizá-las. Convém, também, esclarecer que
os referidos termos tem significados e sentidos diferentes.
De tratamento sociológico e biopsicológico, educação
é o processo que visa capacitar o indivíduo a agir conscientemente diante de
situações novas de vida, com aproveitamento da experiência anterior, tendo em
vista a integração, a continuidade e o progresso sociais, segundo a realidade
de cada um, para serem atendidas as necessidades individuais e coletivas. A instrução
se refere aos aspectos informativos, menos complexos e de domínio de certo
nível de conhecimento sistematizado. Há uma relação de subordinação da
instrução à educação, uma vez que o processo e o resultado da instrução são
orientados para o desenvolvimento das qualidades específicas da personalidade.
Da mesma forma, há uma unidade entre educação e instrução, embora sejam
processos diferentes. A propósito, pode-se instruir sem educar, e educar sem
instruir; conhecer os conteúdos de uma matéria, conhecer os princípios morais e
normais de conduta não leva necessariamente a praticá-los. Ensino
corresponde a ações, o principal meio e condições – ainda que não o único –
para realização da instrução e educação. [19]
Enfim, a ciência da educação privilegia o processo ensino-aprendizagem,
como núcleo central e gerador das relações jus-educacionais, e o reconhecimento
formal do direito à educação. A propósito, ao tratarmos nos capítulos III e IV
do Regime Jurídico da Educação na Constituição de 1988, vamos observar que,
apesar do emprego do vocábulo "Educação" (caput do art. 205),
o texto constitucional utilizou mais freqüentemente "Ensino", ou
seja, educação escolarizada (arts. 206 e 208).
2. Breve análise histórico-conceitual
Percebe-se que o conceito de educação foi marcado por
diferentes concepções. Em um tratado de educação – a obra Clássica
democracia e educação – o filósofo e educador americano John Dewey
(1859-1952) relaciona as questões educacionais, científicas e filosóficas.
Define a filosofia como a teoria geral de educação. Neste sentido, segundo ele,
estando a filosofia vinculada à formação humana, está diretamente relacionada à
educação ou ao processo educacional. [20]
John Dewey desenvolve e mostra nessa obra a concepção
democrática da educação de três épocas diferentes, quando era importante o
alcance social da educação.
1º a filosofia educacional platônica;
2º o ideal "individualista" do século XVIII;
3º a educação sob o ponto de vista racional e social.
Trata-se de um breve histórico-conceitual das teorias
educacionais que se desenvolveram em três momentos. A primeira é a de Platão,
que concebeu o ideal de uma educação que conciliasse o cultivo da
individualidade com a coerção e estabilidade sociais. Para John Dewey, ninguém
exprimiu melhor que Platão o fato de que uma sociedade se acha organizada
estavelmente, quando cada indivíduo faz aquilo para o que tem especial aptidão,
de modo a ser útil aos outros (ou a contribuir em benefício do todo a que
pertence) e que a tarefa da educação se limita a descobrir estas aptidões e a
executá-las progressivamente para seu uso social. Muito do que se tem dito a
respeito é tomado de empréstimo das idéias que, primeiro que todos, Platão
ensinou coincidentemente ao mundo. Mas as condições sociais que ele não podia
modificar levaram-no a restringir estas idéias em sua aplicação. Nunca chegou a
poder conceber a pluralidade indefinida das espécies de atividade que podem
caracterizar um indivíduo ou um grupo social – e, consequentemente, restringiu
sua idéias a limitado número de categorias de aplicações e de organizações
sociais. [21]
Quando Platão afirmou incisivamente que o lugar do
indivíduo na sociedade não deveria ser determinado pelo nascimento ou pela
riqueza, ou por qualquer norma convencional e sim por sua própria natureza descoberta
no processo da educação, ele não percebia a desigualdade das características
dos indivíduos, o caráter único de cada indivíduo. Para Platão os indivíduos se
classificam naturalmente em casta e só em pequeníssimo número destas. Por
conseguinte, a função das provas selecionadoras da educação será a de revelar
unicamente a qual das três castas platônicas um indivíduo pertence. Não se
reconhecendo a verdade de que cada indivíduo constitui sua própria casta, não
se poderia reconhecer a existência da infinita variedade de tendências ativas e
de combinações dessas tendências que um indivíduo é capaz de apresentar. Os
indivíduos eram unicamente dotados de três tipos de faculdades ou aptidões. Por
isso a educação logo atingiria um limite estático em cada classe, pois só a
diversidade cria a mutação e o progresso. [22]
Contudo, John Dewey sustenta a tese que o progresso dos
conhecimentos fez-nos ver a superficialidade da idéia platônica de acumular os
indivíduos e sua aptidões naturais em poucas classes bem determinadas; aquele
progresso ensinou-nos que as aptidões originárias são indefinidamente numerosas
e variáveis. E a conseqüência deste fato é reconhecer-se que, à proporção que a
sociedade se torna democrática, a verdadeira organização social está na utilização
daquelas qualidades peculiares e variáveis do indivíduo e não na sua
estratificação em classes. [23]
A segunda teoria da educação, que se desenvolveu como o
ideal "individualista" do século XVIII, adotou uma concepção
altamente individualista na forma, mas era uma concepção de uma sociedade mais
ampla e livre – para o cosmopolitismo. O ideal colimador era a humanidade.
Platão exerceu grande influência
Toda tarefa de Rousseau se apóia numa idéia, num valor a
ser preservado a qualquer custo: a liberdade. E desta decorre, de maneira
imediata, outra: a igualdade, "Renunciar à sua liberdade – afirma Rousseau
no cap. IV do livro I – é renunciar à sua qualidade de homem, aos direitos da
humanidade e até mesmo a seus deveres. Não há qualquer compensação possível
para quem quer que renuncie a tudo. Tal renúncia é incompatível com a natureza
do homem e equivale a despir suas ações de toda a moralidade como a despir de
toda sua vontade". [25] A propósito, além disso, explica o Discurso
sobre a origem da desigualdade:
"Concebo, na espécie humana, duas espécies de
desigualdade: uma a que chamo natural ou física, por ser estabelecida pela
natureza, e que consiste na diferença das idades, da saúde, das forças do corpo
e das qualidades do espirito ou da alma; a outra, a que se pode chamar
desigualdade moral ou política, por depender de uma espécie de convenção a ser
estabelecida, ou pele menos autorizada, pelo consentimento dos homens. Esta
consiste nos diferentes privilégios que alguns usufruem em prejuízo dos outros,
como serem mais ricos, mais reverenciados e mais poderosos do que eles, ou
mesmo em se fazerem obedecer por eles." [26]
Para assegurar uma sociedade mais social, segundo John
Dewey, julgava-se que o primeiro passo era uma educação de acordo com a
natureza. Preservando-se, neste caso, a liberdade e igualdade. E via-se claro
que as limitações, devido as desigualdades políticas, econômicas ou moral, em
última análise, dependiam da educação. [27] Ao comentar sobre a tese
de uma educação de acordo com a natureza, assim se expressa John Dewey:
"… confiar-se simplesmente tudo à natureza era,
afinal de contas, negar-se a própria idéia de educação, e entrega-la aos acasos
das circunstâncias. Não só se precisava de um método, como também de algum
órgão próprio, de alguma instituição administrativa que efetuasse o trabalho da
instituição…" [28]
Rousseau, na realidade, não colocou em prática suas idéias
e nem elaborou uma teoria de ensino. Como afirma Libâneo, [29] essa
tarefa coube ao pedagogo suíço Johann Heinrich Pestalozzi, que, lendo a obra Emile
de Rousseau sem interesse apostólico, procurou divulgá-la e aplicá-la na
instrução das crianças pobres. [30] Ele deu uma grande importância
ao ensino como meio de educação e desenvolvimento das capacidades humanas.
[31]
Contudo, nas palavras de John Dewey, um Pestalozzi poderia
fazer experiências e exortar a seguir seu exemplo as pessoas inclinadas à
filantropia e possuidoras de riqueza e poderio; mas o próprio Pestalozzi
reconheceu que um eficaz empreendimento baseado no novo ideal educativo exigia
o amparo dos poderes públicos. [32]
Surgiu, então, uma terceira concepção de educação –
concepção social – com movimentos a favor do ideal democrático de educação para
criação de escolas públicas. Trata-se de educação sob o ponto de vista nacional
e social, com a forte presença das filosofias idealistas institucionais do
século XIX. [33] Neste sentido, o Estado substituiu a humanidade; o
cosmopolitismo cedeu o lugar ao nacionalismo. Formar o cidadão, e não o homem,
tornou-se a meta da educação. [34]
A teoria individualista recuou para um plano afastado. A
educação passou a ser considerada como um adestramento disciplinar do que como
meio de desenvolvimento pessoal. Como, entretanto, persistia o ideal da cultura
como desenvolvimento completo da personalidade, a filosofia educacional tentou
conciliar as duas idéias. A conciliação, neste caso, se fundou na concepção de
caráter "orgânico" do estudo. O indivíduo isolado nada é; só mediante
a assimilação das aspirações e da significação das instituições organizadas
atinge ele a verdadeira personalidade. Aliás, os filósofos da época exprimiram
a idéia de que a principal função do Estado é a educativa. Nesse
sentido, Vanilda Paiva reafirma a "idéia da educação como dever do
Estado", na citação a seguir:
"A idéia da educação como dever do Estado, se
difunde e se firma dentro do processo de emancipação política e fortalecimento
dos Estados nacionais e da ordem burguesa; os enciclopedistas e os pensadores
liberais arrancam a discussão relativa à educação das massas do plano religioso
para o plano laico e estatal. E a formação do cidadão e a realização da
declamatória igualdade burguesa através da democratização do ensino (igualdade
de oportunidades entre seres formalmente iguais na ordem competitiva) aparecem
no pensamento burguês em versões que vão desde o radicalismo rousseauniano à
proposta clara de uma educação dual por Locke." [35]
Para Anísio Teixeira, passada a fase do puro Estado
liberal, o problema comum das nações democráticas passou a ser o desta
transformação do sistema educacional de natureza dual em um sistema de educação
comum e contínuo para todos, destinado à formação e à distribuição dos
cidadãos, de acordo com a capacidade de cada um, pelas diversas espécies de
trabalho de uma sociedade variada e complexa, mas unificada. [36]
A Alemanha, como afirma John Dewey, foi o primeiro país a
empreender um sistema de educação pública, geral e obrigatória, que se estendia
desde a escola primária até a universidade, e a submeter à regulamentação e
fiscalização de um Estado cioso de suas prerrogativas todos os institutos
particulares da educação. A propósito, como é sabido de todos, no caso da
Alemanha, o reerguimento nacional deve-se, em grande parte, à educação dirigida
de acordo com o interesse do Estado. [37]
O amor da democracia pela educação é um fato sabido de
todos. A explicação é que um governo que se funda no sufrágio popular não pode
ser eficiente se aqueles que o elegem e lhe obedecem não forem convenientemente
educados. Nesse sentido, uma sociedade é democrática na proporção em que
prepara todos os seus membros para com igualdade aquinhoarem de seus benefícios
e em que assegura o maleável reajustamento de suas instituições por meio da
interação das diversas formas da vida associada. Essa sociedade deve adotar um
tipo de educação que proporcione aos indivíduos um interesse pessoal nas
relações e direção sociais, e hábitos de espírito que permitam mudanças sociais
sem o ocasionamento de desordens. [38]
Por fim, as idéias do filósofo e educador americano John
Dewey, numa perspectiva instrumental e pragmática, [39] exerceram
uma significativa influência no movimento da Escola Nova na América Latina e,
particularmente, no Brasil.
3. O educador e o jurista
No Brasil, é importante destacar a presença de dois
pensadores, com seus ensinamentos filosóficos, nas áreas educacional e
jurídica, que efetivamente contribuíram para construção do direito à educação.
De um lado, o filósofo da educação Anísio Teixeira, [40] que seguiu
a perspectiva do pragmatismo filosófico e educacional de John Dewey, junto a
quem fizera seus estudos de pós graduação nos Estados Unidos da América no
final da década de 20. Para Anísio Teixeira, o pragmatismo, instrumentalismo ou
experimentalismo buscou resolver o velho antagonismo entre teoria e prática,
tendo como referência justamente a idéia de conhecimento experimental
desenvolvido pela ciência moderna. [41] Ele trouxera, também, de
suas experiências de estudos com Dewey a convicção de que só se conseguiria uma
efetiva renovação educacional se esta fosse fundamentada em rigorosas bases
científicas.
A obra escrita pelo educador Anísio Teixeira, Educação
é um direito, publicada em 1968, é marcada pelo estudo da educação
brasileira, tendo sido influenciada por fatores históricos e pelas legislações
a respeito da educação. Ele ressalta em sua obra que, quando o Estado liberal
cogita da educação para todos, não visa tanto um direito de cada um, mas a
conveniência de preparar o homem para a indústria, até porque a sociedade já
era fundada no saber e no conhecimento. A ênfase em educação técnica,
profissional, industrial, em oposição à educação acadêmica e intelectual,
refletia ainda o velho dualismo, em que os poucos seriam longamente educados
para si mesmos e para as suas funções especializadas e os muitos receberiam
apenas o treino necessário ao trabalho a que se destinavam. Em seguida, o
educador brasileiro, com muita propriedade, sustenta que:
"O direito à educação faz-se um direito de todos,
porque a educação já não é um processo de especialização de alguns para certas
funções na sociedade, mas a formação de cada um e de todos para a sua
contribuição à sociedade integrada e nacional, que se está constituindo com a
modificação do tipo de trabalho e do tipo de relações humanas. Dizer-se que a
educação é um interesse público a ser promovido pela lei." [42]
Do ponto de vista constitucional, segundo Anísio Teixeira
o direito à educação tornar-se-ia efetivo com a criação definitiva de uma
organização múltipla, mas singela, para o seu desempenho, organização em que as
forças locais e regionais e o espírito nacional mutuamente se fecundariam para
a promoção de um sistema educacional múltiplo, diversificado e uno, como convém
às proporções continentais do nosso país e à natureza democrática de sua
Constituição. [43]
De outro lado, está o jurista e filósofo do direito
Pontes de Miranda, que em 1933 publicou uma obra de tema inédito na área de
sociologia jurídica com o título Direito à educação. Ele sustenta,
nessa monografia, a importância da escola única e de todos – a escola que o
povo deve exigir. Inicia, também, a luta pelo direito público subjetivo à
educação. Propõe, ainda, que a política e o direito reconheçam os novos
direitos do homem: direito à subsistência; direito ao trabalho; direito à
educação; direito à assistência; e o direito ao ideal. [44]
Parece-nos, afirma o renomado jurista, que os cinco
direitos têm de ser executados simultaneamente, em sistema harmônico, em duplo
programa de "economia de plano" e de "educação de plano".
Neste caso, o direito à educação é o terceiro dos novos direitos do homem. Sem
o direito à educação, tudo fora dele que se prometer é paliativo, engodo para
retardar a inevitável recomposição social dos povos dignos de vida. Dêem
tudo mais, e não dêem com igualdade escola para todos – aí não deram nada.
A ausência do direito voltará. Além disso, uma coisa é dizer que haverá escolas
públicas e outra, que todos terão escolas públicas. Aliás, onde há escolas
públicas o aluno se matricula gratuitamente. Porém, onde não há escolas
públicas, ou onde não há vagas? Aqui ficam os indivíduos em idade escolar sem
escola. Infelizmente, o Estado liberal constitucional deixou sem sanção certos
direitos declarados, inclusive o direito à educação. A solução, que é urgente
para o Brasil, é, afirma Pontes de Miranda:
"… considerar o direito à educação direito
público subjetivo, como fim preciso do Estado; permitir ação do indivíduo
contra o Estado e o plano de educação como essencial à existência do Estado, em
cujo fim único está incluída a função técnica de educar." [45]
Os juristas inseridos no contexto educacional e os
educadores inseridos no contexto jurídico, percebem a existência de relações
jurídico-pedagógicas. A propósito, a educadora e jurista Esther de Figueiredo
Ferraz, ao discorrer sobre educação e direito, no 1º Seminário de
Direito Educacional, realizado em Campinas em outubro de 1977, esclareceu que
"todos nós que colaboramos na área da Educação e do Direito sentimos a
necessidade de juntar esses dois elementos porque percebemos perfeitamente que
a Educação é uma área que deva ser cultivada também pelo Direito".
[46]
Acrescente-se, também, que essas afirmações não estão
muito distantes da proposta do saudoso e brilhante jurista San Tiago Dantas,
apresentada na aula inaugural dos cursos da Faculdade Nacional de Direito em
1955, com o título Educação jurídica e a crise brasileira:
"Pela educação jurídica é que uma sociedade
assegura o predomínio dos valores éticos perenes na conduta dos indivíduos e
sobretudo dos órgãos do poder público. Pela educação jurídica é que a vida
social consegue ordenar-se segundo uma hierarquia de valores, em que a posição
suprema compete àqueles que dão à vida humana sentido e finalidade. Pela
educação jurídica é que se imprime no comportamento social os hábitos, as
relações espontâneas, os elementos coativos, que orientam as atividades de
todos para as grandes aspirações comuns…" [47]
Para nós, da mesma forma que as demais ciências humanas
contribuem para as diferentes acepções de educação, assim também o direito tem
todas as condições de contribuir para a educação.
CAPÍTULO II
DIREITO E DIREITO
EDUCACIONAL
Sumário:
1. Noções e concepções; 2. Conceituação de direito educacional.
Este capítulo inicialmente pretende apresentar a noção de
direito como ciência jurídica e as diferentes concepções de direito. Neste
caso, para facilitar a compreensão das relações entre educação e direito, vamos
adotar a teoria tradicional do direito e aplicá-la ao direito educacional. Em
seguida, vamos examinar as dificuldades na escolha desta expressão para,
afinal, optar pelo termo. Acrescente-se a apresentação de incipientes conceitos
de direito educacional na investigação e sistematização da relação entre
educação e direito.
1. Noções e concepções
A concepção do direito, como nos ensina Rudolf Von
Ihering, é prática, resulta da vida social e da luta contínua como meio de
realização do direito. [48] Todavia, parece-nos que o direito é
sobretudo um fenômeno histórico-cultural, no sentido de que se forma ao longo
do tempo e sob a influência de fatores culturais, o que vale dizer que é
mutável. A propósito, segundo Benjamim de Oliveira Filho:
"A ciência jurídica é eminentemente social, pois o
fenômeno jurídico se desenvolve na sociedade, tendo como condição de existência
a vida social, que, por seu turno, não subsistiria, nem atingiria seus fins,
sem o estabelecimento de normas de conduta, formadas em seu seio, dentre as
quais sobrelevam as normas jurídicas, disciplinando a vida de relação entre os
homens." [49]
É certo, como veremos a seguir, que não há um conceito
unitário de ciência do direito, por depender sua conceituação de diferentes
pressupostos filosóficos adotados pelos juristas. O direito, de certo modo,
possui vários aspectos, conotações, acepções, sentidos, diferentes significados
e critérios que, pelas limitações e objetivos deste trabalho, não serão
aprofundados.
Uma noção elementar e provisória do direito, mas sobretudo
consagrada pela prática do direito e pelo homem comum, considera que o direito
é lei e ordem. Isto significa, nas palavras de Miguel Reale, que direito é um
conjunto de regras obrigatórias que garante a convivência social graças ao
estabelecimento de limites à ação de cada um de seus membros. Assim sendo, quem
age de conformidade com essas regras comporta-se direito; quem não o faz, age
torto. [50] Além disso, o direito, antes de tudo, consiste numa
norma de conduta que, no processo histórico, se separou, assumindo
características próprias. Apresenta-se o direito, como regra, disciplina do
proceder humano, norma agendi, preceito e mandamento. [51]
Aliás, para Hegel, o que o direito é em si afirma-se na sua existência
objetiva. Ele é conhecido como o que, com justiça, é e vale: é a lei. Tal
direito, neste caso, é o direito positivo em geral; o que é direito deve vir a
ser lei para adquirir não só a forma de sua universalidade, mas também a sua
verdadeira determinação. [52] Vê-se, então, que o direito positivo é
a lei, o direito objetivo, a normatividade jurídica, tal como estabelecida na
sociedade e considerada em sua relação prática.
Todavia, nos limites deste capítulo, pretendemos tratar o
direito como ciência jurídica. Quer seja como teoria ou na condição de teoria
da norma. Tércio Sampaio Ferraz Jr., na sua obra A ciência do direito,
apresenta algumas considerações sobre as dificuldades preliminares na
conceituação da ciência do direito. [53] Igualmente Maria Helena
Diniz afirma que o termo ciência não é unívoco, porque há uma surpreendente
pluralidade de concepções epistemológico-jurídicas que pretendem dar uma visão
da ciência jurídica, cada qual sob um critério diferente. [54]
Kelsen, a propósito, muito bem distingue direito e ciência do direito.
[55]
Contudo, a concepção culturalista do direito advoga que a
ciência jurídica é uma ciência cultural que estuda o direito, como objeto
cultural, isto é, como uma realização do espirito humano, com um substrato e um
sentido. [56] A ciência do direito, para Miguel Reale, é uma ciência
histórico-cultural e compreensivo-normativa, por ter por objeto a experiência
social na medida, enquanto esta normativamente se desenvolve em função de fatos
e valores para a realização ordenada da convivência humana. [57] A
respeito, Miguel Reale assim preleciona:
"A Ciência do Direito, ou Jurisprudência – tomada
esta palavra na sua acepção clássica – tem por objeto o fenômeno jurídico tal
como ele se encontra historicamente realizado. (…) A Ciência do Direito estuda
o fenômeno jurídico tal como ele se concretiza no espaço e no tempo, isto é, é
sempre uma ciência de um Direito positivo, enquanto a Filosofia do Direito
indaga das condições mediante as quais essa concretização é possível." [58]
A escola histórica, como leciona Tércio Sampaio Ferraz
Jr., teve o grande mérito de por a si a questão do caráter cientifico da
ciência do direito. A expressão juris scientia é criação sua, como é seu
empenho dar-lhe este caráter, mediante um método próprio de natureza histórica.
[59] A. L. Machado Neto esclarece-nos, também, que a ciência do direito,
igualmente denominada apenas direito, dogmática jurídica e jurisprudência, é a
especial ciência cultural que constitui, por oposição à história do direito, à
sociologia jurídica e à filosofia jurídica, a temática específica do jurista.
[60] É certo, também, que, não obstante o fato de a ciência jurídica não
produzir normas, ela pode influir na evolução do direito, pois nada obsta que,
através dos órgãos criadores e aplicadores do direito positivo, ou da
elaboração de direito novo, as teses científicas passem do descritivo para o prescritivo.
[61] Pontes de Miranda, indagando-se o que é a ciência positiva do
direito, responde:
"A ciência positiva do direto é a sistematização dos
conhecimentos positivos das relações sociais, como função do desenvolvimento
geral das investigações científicas em todos os ramos do saber. É, pois, a
cúpula da ciência (…). No direito, se queremos estudá-lo cientificamente como
ramo positivo do conhecimento, quase todas as ciências são convocadas pelo
cientista. A extrema complexidade dos fenômenos implica a diversidade do saber.
As matemáticas, a geometria, a física e a química, a biologia, a geologia, a
zoologia, a botânica, a climatologia, a astrologia e a etnografia, a
pré-história em geral, a história, a sociologia, a economia política e tantas
outras constituem mananciais em que o sábio da ciência jurídica bebe o que lhe
é mister." [62]
Nesse sentido, mas referindo-nos ao direito educacional
como disciplina nova, afirmamos que tudo em relação à ciência do direito deve
ser aplicado para tornar o direito educacional mais vinculado à dogmática
jurídica e à prática processual. Acrescentem-se os ensinamentos de Pontes de
Miranda: "se queremos estudar cientificamente o direito como ramo
positivo do conhecimento, quase todas as ciências devem ser convocadas pelo
cientista". [63] Neste caso, a nosso ver a ciência da
educação deve ser convocada para se vincular à ciência jurídica, para efetiva
sistematização e autonomia da direito educacional.
Na lição de Miguel Reale, com a palavra direito
acontece o que sempre se dá quando um vocábulo, ligado inteiramente às
vicissitudes da experiência humana, passa a ser usado séculos a fio, adquirindo
muitas acepções, que devem ser cuidadosamente discriminadas. [64]
Para Maria Helena Diniz, a expressão ciência do direito
vem sendo empregada em sentido amplo e em sentido estrito. Em sentido amplo, o
termo ciência do direito indica qualquer estudo metódico, sistemático e
fundamentado dirigido ao direito, abrangendo nesta acepção as disciplinas
jurídicas, tidas como ciências do direito – como a sociologia jurídica e a
história do direito; em sentido estrito, o vocábulo abrange a ciência do
direito propriamente dita, a dogmática jurídica. [65] Miguel Reale
afirma, ainda, com inegável clareza que:
" ‘Direito’ significa tanto o ordenamento
jurídico, ou seja o sistema de normas ou regras jurídicas que traça aos homens
determinadas formas de comportamento, conferindo-lhes possibilidades de agir,
como o tipo de ciência que o estuda, a Ciência do Direito ou
Jurisprudência." [66]
O termo direito, no caso, emprega-se em dúplice sentido:
ora para denotar o fato da existência de normas que disciplinam condutas, ora
para denotar o conhecimento científico a que se submetem tais normas, cujos
conteúdos são diversificados (econômicos, políticos, finanças públicas,
educativos, meio ambiente etc.). [67] Como se vê, de um lado temos o
direito-norma, que se compõe da legislação em vigor, ou seja, o direito
positivo; de outro lado, a presença do direito-ciência, desenvolvido pelo
doutrinadores que procuram sistematizar os conhecimentos jurídicos e explicar
os sistemas legais, abrindo caminhos às transformações.
No caso do direito educacional, segundo o jurista Lourival
Vilanova, a questão crucial é a da possibilidade desse novo ramo da ciência
jurídica desdobrar-se em duas questões correlacionadas. Uma, a da existência de
normas cujo conteúdo é dado pelas relações sociais na espécie de relação
educacional; outra, a da construção sistematizada de conhecimentos que tenham
por objeto tais normas. Vilanova sustenta, ainda, que há relações sociais
educacionais como há relações econômicas de produção, de consumo, de trabalho,
de família e de poder, quer sob a forma de relações de administração dos grupos
não-políticos, ou relações de administração e governo nos grupos políticos.
[68]
Noutro passo, não se pode negar que o direito é um sistema
de normas e que a ciência do direito consiste, também, de uma teoria da norma
jurídica, até porque o direito, como vimos, é uma ciência normativa. Contudo,
norma jurídica não é sinônimo de lei. Esta pode conter várias normas, como
ocorre com o Código Civil. [69]
Para Tércio Sampaio Ferraz Jr., o conceito de normas
jurídicas aparece hoje, mais do que nunca, como uma noção integradora capaz de
determinar o objeto e o âmbito da ciência do direito. [70] Há
inúmeras noções de normas jurídicas, embora uma definição exemplar, e que
atravessa o tempo na consciência média do jurista e do "homem comum"
(sic), será encontrada
"A definição usual de direito reza: direito é o
conjunto de normas coativas válidas num Estado, e esta definição a meu ver
atingiu perfeitamente o essencial. Os dois fatores que ela inclui são o da
norma e o da realização através de coação (…) o conceito da norma é um
pensamento, uma proposição (proposição jurídica), mas uma proposição de
natureza prática, isto é, uma orientação para a ação humana; a norma é,
portanto, uma regra, conforme a qual nós devemos guiar." [71]
A norma jurídica, como leciona Maria Helena Diniz, é a
"coluna vertebral do corpo social". Pode parecer à primeira vista que
a norma jurídica se opõe ao poder, mas tal não ocorre, pois sem poder ela não
existe; só é jurídica, na realidade, a norma que for declarada pelo poder. Tem,
como poder político, a função de organizar as atividades inter-relacionadas das
criaturas racionais que compõem determinadas comunidades. Além disso, o fato de
toda norma jurídica envolver a decisão do poder por uma conduta revela o que há
de essencial na relação entre norma e poder. É óbvio que a norma jurídica
decorre de um ato decisório do poder (constituinte, legislativo, judiciário,
executivo, comunitário ou coletivo e individual). A norma só será jurídica,
como vimos, no momento em que for declarada como tal pelo órgão incumbido de
levar o grupo a seus fins e se estiver entrosada com o ordenamento jurídico da
sociedade política. [72]
A ciência jurídica, por outro lado, diz que todo e
qualquer comportamento humano pode ser visto como cumprimento ou descumprimento
de normas jurídicas, caso contrário, é tido como juridicamente irrelevante.
[73] É a teoria jurídica analisando a própria norma jurídica, por seu
turno presente nos diferentes ramos do direito. Convém ressaltar o entendimento
de Maria Helena Diniz, nas observações de Tércio Sampaio Ferraz Jr., de
"que a oposição entre norma jurídica e realidade, que vai marca a
dogmática jurídica, significa, além disso, a consciência de uma necessidade
constante de rever o pensamento dogmático, pois o direito, não repousando
apenas nas suas normas, mas tendo outras dimensões, vai exigir da dogmática
jurídica [74] uma reformulação dos sues próprios conceitos".
[75]
O direito educacional, por seu turno, embora novo, já
exige o agrupamento de teorias para transformar, contribuir e vincular-se à
ciência do direito. É certo, por outro lado, que a legislação sobre matéria
educacional dispersa-se em vários planos do ordenamento jurídico brasileiro:
está em nível constitucional, em nível de lei ordinária, em decretos e
regulamentos e em outros níveis normativos. É necessário, portanto, reunir o
disperso, isto é, sistematizar o direito educacional do ponto de vista
normativo e teórico, para facilitar a interpretação e aplicação da norma
jurídica. [76]
Tudo isso se obtém, no magister de Lourival Vilanova, de
uma parte com o mínimo de coordenação normativa. Por outra parte, obtém-se com
auxílio da ciência do direito. É justamente a ciência jurídica que fornece os
conceitos fundamentais para recolher o material disperso em classe, em tipos,
em categorias. [77] Há legislações e normas jurídicas educacionais
específicas, [78] embora dispersas, o que exige sistematização
legislativa.
Para se respeitar o direito à educação, segundo o
professor Pedro Sancho da Silva, ter-se-á de acionar o direito educacional,
especialmente, por meio dos instrumentos processuais, para que se consiga a
efetivação do direito subjetivo à Educação. [79] Acrescente-se que
somente pela via da "qualificação normativa do factício", como
sustenta Lourival Vilanova, é que se reconhece ao indivíduo o direito subjetivo
público à educação, seja por entidades particulares ou por entes públicos.
[80] Neste caso, como veremos a seguir, o direito subjetivo é uma
construção normativa.
Tradicionalmente, o direito se nos apresenta sob dois
aspectos: de preceito, ou regra, e de faculdade, ou poder. De um lado, o
direito objetivo, norma agendi, norma de conduta, de outro, o direito
subjetivo, facultas agendi, faculdade de agir. [81] Nesse
sentido, Tércio Sampaio Ferraz Jr. esclarece:
"A doutrina, tradicionalmente, costuma distinguir
entre direito objetivo enquanto o conjunto das normas que regulam a ação
humana; portanto, o direito enquanto regra de conduta (norma agendi), a
que se opõe o direito subjetivo, significando uma certa prerrogativa
estabelecida ou reconhecida pelo direito objetivo em favor de um indivíduo ou
de uma coletividade e que faz deles sujeito de direito." [82]
Contudo, a terminologia, norma agendi e facultas
agendi, que nos veio da tradição romana, segundo Benjamim de Oliveira Filho
posto sugestiva, é imperfeita como noção. Norma de conduta não é apenas, o
direito; a regra moral também nos concede uma faculdade de agir. Nem o direito
subjetivo é, propriamente, faculdade de agir. [83] A matéria é fonte
de numerosas controvérsias e divergências, daí não pretendermos discuti-la
amplamente, e sim considerar duas situações.
Em primeiro lugar, na linguagem corrente, os dois aspectos
facilmente se distinguem, pelo sentido da frase, ora reportando-se ao preceito
em si, à regra jurídica, ora ao próprio poder ou faculdade reconhecida ao
indivíduo. Nesse sentido, o direito à educação, o direito do proprietário, o
direito do credor, o direito do consumidor, o direito de voto são faculdades
concedidas ao indivíduo, ao passo que o direito educacional, o direito civil, o
direito penal, o direito de defesa do consumidor, o direito eleitoral, o
direito do trabalho manifestamente se referem à norma, à lei reguladora das
ações humanas, estabelecendo uma ordenação de caráter objetivo, existindo fora
de nós e dominando nossa conduta, inclusive o exercício dos direitos. [84]
Em segundo lugar, considerando que o direito subjetivo é
mais do que um conceito técnico utilizado para facilitar a aplicação do
direito, tendo uma relação direta com o direito à educação. Neste
primeiro momento, é importante ressaltar que a noção tradicional de que o
direito subjetivo é faculdade, a facultas agendi, tornou-se
insustentável a partir do instante em que a verdadeira noção de faculdade se
introduziu na ciência do direito. [85]
Para Goffredo Telles Jr., os direitos subjetivos podem ser
definidos, sinteticamente, com estes precisos termos: "são permissões
jurídicas". [86] Igualmente, para Maria Helena Diniz o
direito subjetivo é sempre a permissão que tem o ser humano de agir conforme o
direito objetivo. Um não pode existir sem o outro. O direito objetivo existe em
razão do subjetivo, para revelar a permissão de praticar atos. O direito
subjetivo, por sua vez, constitui-se de permissões dadas por meio do direito
objetivo. [87]
Benjamim de Oliveira Filho, ao contrário, sustenta a tese
de que a correlação entre o direito objetivo e o direito subjetivo não deve ser
entendida no sentido de que a existência de verdadeiro direito subjetivo está
subordinada à exigência de concessão expressa na lei, ou à existência de lei
correspondente à faculdade, que poderá ser exercida. [88]
Voltemos, porém, aos dois aspectos do direito do ponto de
vista da teoria tradicional, até porque tradicionalmente a noção de direito
subjetivo tem sido contraposta à de direito objetivo, entendido como as normas
jurídicas que regem o comportamento humano, prescrevendo uma sanção no caso de
sua violação. [89] Aplica-se, neste caso, ao direito educacional: de
um lado, como direito objetivo, as normas jurídicas educacionais, ou seja, as
normas ou preceitos jurídicos cujo conteúdo regrado diz respeito ao fato
educacional; de outro lado, o direito subjetivo ou, como veremos no capítulo
IV, o direito subjetivo público à educação, como faculdade específica de exigir
prestação prometida pelo Estado. [90]
2. Conceituação de direito educacional
Uma questão que logo se apresenta é, sem dúvida, a escolha
da expressão "direito educacional". E, num segundo momento, a
definição ou conceito desse novo ramo da ciência jurídica. [91]
Aliás, todo conhecimento jurídico necessita do conceito de direito, embora,
como já vimos, não se tem conseguido um conceito único de direito e tampouco de
direito educacional, como veremos a seguir. [92]
A Enciclopédia Saraiva do Direito adotou no seu verbete
direito da educação a seguinte definição: "O Direito da Educação como ramo
da Ciência do Direito que estuda os princípios e as normas que envolvem a vida
dos indivíduos e dos grupos humanos nos aspectos formativos e
informativos." [93]
Da mesma forma, Maria Helena Diniz, em texto constante do
seu Dicionário jurídico, utiliza a expressão direito da educação. A
respeito, assim preleciona: "O Direito da Educação é o conjunto de normas
relativas à formação e à informação dos indivíduos, à política educacional, à
organização, à administração e ao currículo escolar e à didática." [94]
Renato Alberto Teodoro Di Dio, precursor do direito
educacional brasileiro, afirma que o mais apropriado seria a expressão
direito da educação, direito educacional ou direito educativo. Os puristas optariam
por direito educativo, uma vez que o adjetivo educacional soaria a galicismo.
De outro lado, no linguajar comum, educativo carrega a conotação de algo que
educa, ao passo que educacional seria o direito que trata da educação.
Consciente das possíveis objeções que, segundo ele, podem ser feitas ao termo,
usaremos a expressão direito educacional, à espera de que o uso e os
especialistas consagrem a melhor denominação. [95]
A opção pela expressão direito educacional,
prossegue o autor, não significa objeções à denominação direito da educação,
mas justifica-se por ser termo de conotação mais jurídica, de maior abrangência
para alcançar o complexo de normas e princípios, bem como as relações
jurídico-educacionais. A propósito,
Trata-se, na verdade, do pioneiro na abordagem
sistematizada da relação entre educação e direito. Em 1970, no curso de
especialização
Como observa Edivaldo Machado Boaventura, a definição de
direito educacional, com o propósito de pensar juridicamente à educação,
também, privilegia o processo ensino-apredizagem como núcleo, central gerador,
das relações jus-educacionais. Dessa maneira, o processo ensino-aprendizagem
está para o direito educacional como a relação de emprego caracteriza o direito
do trabalho. [98] Além disso, o que pode e deve ser dito é que o
direito à educação encontra-se devidamente protegido pelos poderes públicos,
assegurando ao aluno a tutela jurídica, bem assim ao professor e ao servidor.
[99]
Nesta mesma linha de raciocínio, mas referindo-se à
necessidade da ciência do direito educacional interceder para a superação da
fase legislativa educacional, ressalta o referido autor:
"O Direito Educacional, como disciplina nova que
é, não pode ser visto é estudado tão somente dentro dos limites da legislação.
Muito ao contrário, deve ser tratado à luz das diretrizes que lastreiam a
educação e os princípios que informam todo o ordenamento jurídico. Tanto no
caso das relações de trabalho como nos relacionamentos da educação, legislação
seria apenas um corpo sem alma, continua Sussekind, uma coleção de leis
esparsas e não um sistema jurídico dotado de unidade doutrinária e precisos
objetivos, o que contraria uma inquestionável realidade." [100]
Ele destaca, ainda, que José Augusto Peres empreende um
diversificado esforço de conceituação do direito educacional como norma,
conjunto de leis, ramo da ciência jurídica, para, no final dessa cadeia de
conceitos, colocar o seguinte:
"Na realidade, o que pode e deve ser ressaltado,
ao se falar introdutoriamente do Direito Educacional, é que o mesmo é um ramo
especial do Direito; compreende um já alentado conjunto de normas de diferentes
hierarquias; diz respeito, bem proximamente, ao Estado, ao educador e ao
educando; lida com o fato educacional e com os demais fatos a ele relacionados;
rege as atividades no campo do ensino e/ou aprendizagem de particulares e no
poder público, de pessoas físicas e jurídicas, de entidades públicas e
privadas." [101]
O direito educacional, para Álvaro Melo Filho, pode ser
entendido como:
"Um conjunto de técnicas, regras e instrumentos
jurídicos sistematizados que objetivam disciplinar o comportamento humano
relacionado à educação. Impondo-se como matéria curricular e como disciplina
autônoma, o direito educacional distinguir-se-á inteiramente de outras
disciplinas jurídicas, pois envolverá o estudo e o ensino de relações e
doutrinas com as quais nunca se havia preocupado o direito tradicional em
qualquer dos seus ramos." [102]
Para o renomado professor, se é verdade que há,
inegavelmente, uma legislação educacional no interior do ordenamento jurídico
brasileiro, também é irrecusável que tal legislação possui uma parte dispersa,
sem estrutura orgânica. E esse direito educacional funciona exatamente como um
núcleo aglutinador de normas às vezes extraídas de diferentes códigos, leis e
ramos do direito, mas compondo uma certa unidade de regulamentação. [103]
Ele sustenta a tese, ainda no plano teórico, que ao invés de questionar-se
sobre as "autonomias" legislativa e cientifica do direito
educacional, deve-se registrar que, pela simples razão de não poder existir uma
norma jurídica independente da totalidade do sistema jurídico, a autonomia de
qualquer ramo do direito é sempre e unicamente didática. [104] A
propósito, este é também o pensamento de Miguel Reale, que, em relação às
diversas disciplinas jurídicas, diz ser necessário estudá-las no seu conjunto
unitário, pois nenhuma delas têm sentido isoladamente, independentemente das
demais. As disciplinas jurídicas representam e refletem um fenômeno jurídico
unitário que precisa ser examinado. [105]
Aurélio Wander Bastos, em sua obra recente O ensino
jurídico no Brasil, apresenta tanto o conceito de direito educacional como
seu alcance:
"Os estudos jurídicos sobre legislação do ensino e
suas práticas administrativas, assim como sobre a hermenêutica de seus
propósitos, classificam-se no vasto âmbito do Direito Educacional, uma das mais
significativas áreas do conhecimento jurídico moderno. O Direito Educacional
estuda as origens e os fundamentos sociais e políticos dos currículos,
programas e métodos de ensino e avaliação." [106]
Pelas posições referentes ao conceito de direito educacional
segundo Edivaldo Boaventura, pode-se concluir que o direito à educação está
inserido no conjunto de normas, princípios e doutrinas que disciplinam o
comportamento das partes presentes no processo ensino-aprendizagem, composto de
alunos, professores, servidores, escolas, famílias e poderes públicos, que
constitui o centro de interesse maior para o direito. Cabe ao Estado
principalmente a proteção desse relacionamento. [107]
Em seu mais recente trabalho Direito educacional e
educação no século XXI, Elias de Oliveira Motta, na tentativa de esboçar o
seu conceito, segue os ensinamentos de Miguel Reale. Trata-se, neste caso, da
teoria tridimensional do direito:
"Uma análise em profundidade dos diversos sentidos
da palavra Direito veio demonstrar que eles correspondem a três aspectos
básicos, discerníveis em todo e qualquer momento da vida jurídica: um aspecto
normativo (o Direito como ordenamento e sua respectiva ciência); um aspecto
fático (o Direito como fato, ou em sua efetividade social e histórica) e um
aspecto axiológico (o Direito como valor de justiça)." [108]
Desta concepção de direito, nas palavras de Elias de
Oliveira Motta, podemos abstrair três formas de enfocar o conceito de direito
educacional:
1. conjunto de normas reguladoras dos relacionamentos
entre as partes envolvidas no processo ensino-aprendizagem;
3. ramo da ciência jurídica especializado na área
educacional.
Não pretendemos traçar barreiras, mas abrir portas para
que os pensadores das áreas jurídicas educacional e administrativa, com a
postura de criatividade que deve ser característica de todo bom profissional,
aperfeiçoem nossas conclusões e enunciados, [109] pois, "no
campo das ciências sociais, não podemos alimentar ilusões no sentido de
extremado rigor terminológico, mas nem por isso nos faltam estruturas
conceituais ajustáveis à complexa e matizada conduta humana". [110]
Nesse sentido, Maria Helena Diniz leciona que o
jusfilósofo, o sociólogo e o jurista devem estudar o direito na totalidade de
seus elementos constitutivos, visto ser logicamente inadmissível qualquer
pesquisa sobre o direito que não implique a consideração concomitante desses
três fatores. Todavia, é preciso esclarecer que cada qual cuidará mais deste do
que daquele elemento da experiência jurídica, mas sempre determinando o
significado de seu objeto de indagação em função dos outros dois. [111]
Entendemos, também, que há dificuldades de conceituação do
direito educacional, porque isto depende de um esforço comum dos estudiosos ou
especialistas da área do direito e da educação. Aliás, o direito educacional
tem uma característica híbrida pelo fato de existirem diferentes acepções de
direito e de educação. Entretanto, o nosso propósito de contribuição para a
sistematização do direito educacional não se esgota nesta relação conceitual
entre direito e educação. Pretendemos, do mesmo modo, apresentar a estrutura
clássica das fontes do direito, para utilizá-las no direito educacional.
CAPÍTULO III
FONTES DE DIREITO E DO
DIREITO EDUCACIONAL
Sumário: 1. Considerações iniciais; 2. Fontes
formais do direito; 2.1. Lei; 2.2. Costumes;2.3. Jurisprudência; 2.4. Doutrina;
3. Princípios do direito.
Pretende-se neste capítulo delimitar o quadro científico
do direito educacional, tendo como base as variáveis de fonte do direito e de
princípios do direito. A propósito, como leciona Tércio Sampaio de Ferraz
Junior, "a teoria das fontes do direito pode ser considerada a base de
todos os estudos jurídicos" [112] (grifos nossos). Contudo,
o nosso objetivo neste capítulo não se esgota nas variáveis das fontes
tradicionais do direito (leis, costumes, jurisprudência e doutrina). Pelo
contrário, ao contextualizarmos e exemplificarmos a discussão sobre os
princípios do direito, vamos adotar a tendência atual de considerar os
princípios como normas jurídicas. Aqui, em relação ao direito educacional, os
princípios da educação e do ensino, como veremos, assumiram funções normativas
e específicas com o advento da Constituição de 1988 e da nova Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional.
1. Considerações iniciais
A expressão fonte deriva de uma metáfora, designando-se
por fonte do direito a origem, a proveniência, a nascente de que promana. Fonte
de um rio, de um veio d´água, fonte da norma jurídica. Todavia, a expressão
fonte aplicada ao direito e à regra jurídica não significa apenas nascedouro,
procedência, ou órgão que emana. Indica, igualmente, as formas de que se
recobre o preceito, porque o preceito assume diferentes aspectos exteriores,
revestindo-se de roupagens diversas, que variam segundo sua natureza e segundo
a própria fonte, isto é, segundo sua proveniência, derivando de tal ou qual
órgão. Esse é o entendimento do professor Benjamim de Oliveira Filho.
[113]
Fonte do direito, de um lado, seria a origem primária do
direito, confundindo-se com o problema da gênese do direito e dos elementos que
emergem da própria realidade social e dos valores que inspiram o ordenamento
jurídico. [114] De outro lado, fonte, do direito são as
manifestações, os modos, as várias maneiras pelas quais se declara, ou se
manifesta a regra jurídica e essas próprias formas estão intimamente ligadas
aos órgãos de expressão do direito. Este é o conceito de fontes formais.
[115] Nesta acepção, enquadra-se, de certa forma, a fonte formal da
teoria tradicional, que é a idônea para produzir norma jurídica, ou seja, a que
é constituída pelos elementos que, na ordenação jurídica, servem de fundamento
para dizer qual é o direito vigente. [116] A propósito, uma norma de
conduta só se eleva à categoria do jurídico, considerando o direito como
direito positivo, quando pode se prevalecer de determinada origem, de que
provém, identificando-se com uma das fontes autorizadas do direito e revestindo
determinada forma específica, pela qual se manifesta ou se exprime a regra
jurídica. [117]
Cuidaremos das fontes formais do direito que, segundo a
clássica concepção, são a lei, o costume, a jurisprudência e a doutrina. No que
diz respeito ao direito educacional o objetivo é tornar este novo ramo do
direito mais vinculado à ciência e à dogmática jurídica, embora reconhecendo
que ele possui suas próprias fontes.
2. Fontes formais do direito
2.1. Lei
No caso brasileiro, a principal fonte do direito é a lei.
A palavra lei pode significar tanto a norma geral emanada do Poder Legislativo,
como qualquer norma de direito escrito, desde a Constituição até um decreto
regulamentar ou mesmo decreto individualizado. [118] A forma escrita
é a manifestação mais característica da lei.
Além disso, a lei é obra do legislador, que, nos Estados
modernos, é geralmente uma ou mais assembléias deliberativas de caráter
democrático, porque decorrentes de eleição popular. Outros sistemas, que
ignoram o processo liberal da separação dos poderes, tiveram como legislador ou
poder legislativo a mesma figura do detentor do poder executivo ou uma elite
aristocrática. Há, ainda, a possibilidade historicamente concreta da
deliberação legislativa direta ou exercida diretamente pelo povo nos sistemas
de democracia direta, tais como as cidades gregas ou a Roma republicana. Uma
fórmula intermediária entre a democracia direta antiga e a moderna democracia
representativa, segundo A. L. Machado Neto, são as formas de controle direto da
atividade legislativa utilizadas em algumas democracias representativas, tais
como o mandato imperativo, o referendum, a iniciativa popular e o
recall. [119]
Já Benjamim de Oliveira sustenta que o império avassalador
da lei aconselharia e justificaria o ius scriptum, o direito legislado.
São as condições naturais ou artificiais da vida moderna que vão tornando
indispensável a aplicação desses meios, e o próprio abuso deles, como
conseqüência da centralização sempre crescente. [120]
Miguel Reale, reconhecendo os freqüentes equívocos que
rondam a palavra "lei", sustenta que, nos domínios do direito, se
emprega o termo lei quando o que se quer significar é uma regra ou um conjunto
ordenado de regras. Porém, para que se possa empregar com rigor o termo lei,
não basta que haja norma ou um sistema de normas escritas, pois escritas são
também as normas dos regulamentos, decretos, resoluções, portarias, avisos etc.
A lei, no sentido técnico desta palavra, só existe quando a norma escrita é
constituída de direito ou, esclarecendo melhor, quando ela introduz algo de
novo com caráter obrigatório no sistema jurídico em vigor, disciplinando
comportamentos individuais ou atividades públicas. Nesse quadro, somente a lei,
em seu sentido próprio, é capaz de inovar no direito já existente, isto é, de
conferir, de maneira originária, pelo simples fato de sua publicação e
vigência, direitos e deveres a que todos devemos respeito. [121]
Entretanto, nesse contexto e em relação às fontes do direito educacional,
Edivaldo Boaventura argumenta o seguinte:
"Para um país, como o Brasil, perfilado na
tradição romanística, a legislação é a fonte principal do direito. Interessa o
conceito de legislação como conjunto das leis que regulam particularmente uma
certa matéria, para Caldas Aulete, que fornece como exemplos legislação militar
e legislação escolar, legislação educacional ou legislação de ensino. É a
legislação, portanto, uma das expressões mais fortes e mais importantes do
direito. Em educação, a legislação apresenta-se dispersa e distribuída pelas
esferas: União, Estados, Distrito Federal e Município." [122]
Na mesma direção da legislação inserida no contexto
jurídico-pedagógico, Lourival Vilanova afirma:
"A legislação sobre matéria educacional
dispersa-se em vários planos do ordenamento: está em nível constitucional, em
nível de lei ordinária (e atos normativos à lei equiparados), em decretos e
regulamentos; inclusive, atualmente, em outros níveis normativos, cujas fontes
são órgãos não propriamente legislativos (órgãos consultivos com funções também
normativas) e órgãos estritamente jurisdicionais." [123]
Igualmente, o professor Álvaro de Melo Filho assim se
expressa:
"Nesse momento, a atividade educacional, dentre
outras, passou a chamar a atenção dos juristas e a despertar no legislador um
interesse para disciplinar com normas jurídicas as várias e numerosas
manifestações e relações decorrentes da educação. Convém aduzir que, nesse
tocante, a legislação sobre matéria educacional espraia-se e dispersa-se em
vários planos do ordenamento jurídico. Assim é que existem normas educacionais
em nível constitucional, em nível de lei ordinária, em decretos e regulamentos
e até em outros níveis através de órgãos normativos e jurisdicionais."
[124]
A legislação em sentido amplo, na síntese de Tércio
Sampaio Ferraz Júnior, "é o modo de formação de normas jurídicas por meio
de atos competentes". A expressão abrange desde a Constituição e as leis
complementares até as leis ordinárias, conforme as categorias de processo
legislativo estabelecidas pela própria Lei Maior. Este autor detalha a fonte
legislativa em Constituição, leis decretos, regulamentos, portarias e fontes
legais, esquema que se ajusta perfeitamente ao ordenamento jurídico
educacional, dada a importância e volume das normas legais, principalmente de
decretos, portarias, resoluções, deliberações e pareceres normativos.
[125] A fonte primeira e fundamental do direito educacional brasileiro
está na Constituição Federal. [126]
A atual Constituição, em vigor
desde 1988, insere no Título VIII, da Ordem Social, o Capítulo III, intitulado
Da Educação, da Cultura e do Desporto, com uma soma de dez artigos dedicados à
educação (arts.
Além disso, vale lembrar que,
dentre as muitas leis que fluem da Constituição em direção ao ordenamento
jurídico-educacional, sobressaem as Leis de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB). Neste caso, como legislação ordinária e segunda fonte principal
do direito educacional brasileiro, esta legislação estrutura a administração,
declara princípios e procedimentos, como também regulamenta o currículo, o ano
escolar, os conteúdos programáticos e a duração dos cursos. [129]
No sentido amplo, como advoga
Edivaldo Boaventura, o direito educacional inclui várias outras legislações
educacionais: decretos, portarias, regimento escolar – inclui, além disso, e
embora se situem no âmbito do direito internacional, os tratados e convenções
internacionais, como as recomendações da UNESCO e do BIE (Bureau Internacional
de Educação). [130]
Merece destaque o decreto, que
é ato administrativo da competência exclusiva do chefe do Executivo federal,
estadual ou municipal, destinado a prover uma situação geral ou individual. A
propósito, há decretos que são regulamentos de leis. [131] A
portaria, pela sua freqüência na administração educacional – enfatiza Edivaldo
Boaventura –, enseja uma referência especial. [132] Hely Lopes
Meirelles concebe portarias como "atos administrativos internos, pelos
quais os chefes de órgãos, repartições ou serviços expedem determinações gerais
ou especiais e designam servidores para unções e cargos secundários".
[133] Como ato administrativo ordinário, disciplina o funcionamento da
administração e a conduta funcional de seus agentes. O secretário estadual de
Educação, por exemplo, freqüentemente movimenta pessoal docente e
administrativo por meio de portarias. [134]
Na enumeração das categorias da
legislação como fonte do direito educacional, o regimento escolar também merece
especial destaque. No setor educacional, cada escola ou grupo de
estabelecimentos deve possuir o seu regimento. Tradicionalmente, o regimento é
definido como a "lei da casa": o regimento é a lei escolar, é um ato
administrativo normativo que regula a atividade interna da instituição
educacional. [135]
Seguindo a sistemática de
apresentação das fontes de direito, há os tratados e as convenções
internacionais. Os tratados são celebrados entre nações, e as convenções, no
âmbito dos organismos internacionais. No particular da internacionalização
do direito à educação, sobressai a Declaração Universal dos Direitos do
Homem, assinada em Paris, em 10 de dezembro de 1948, que, numa resolução
importante e histórica da 3ª sessão ordinária da Assembléia Geral das Nações
Unidas, inclui no seu texto a universalização desse direito:
"Artigo XXVI
1. Todo homem tem direito à
instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e
fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução
técnico-profissional será acessível a todos, bem como a educação superior, esta
baseada no mérito.
3. Os pais têm prioridade de
direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus
filhos." [136]
Nesse sentido, é oportuno
destacar algumas recentes recomendações da comissão internacional sobre
educação para o século XXI, contidas no relatório para a UNESCO:
"… As sociedades, as
relações entre os indivíduos, entre estes últimos e as instituições, entre
diversos grupos e entre nações tornam-se cada vez mais complexas. Um nível
inicial de educação cada vez mais elevado e uma educação constantemente
renovada e completada no decorrer da vida passaram a constituir necessidade
absoluta para todos os seres humanos, a fim de que eles possam levar os
inúmeros novos desafios e evitar cair numa situação sem identidade e objetivos
claros." [137]
"A educação básica é um
problema que se põe, naturalmente, a todos os países, até mesmo às nações
industrializadas. Logo a partir desta fase da educação, os conteúdos devem
desenvolver o gosto por aprender, a sede e a alegria de conhecer e, portanto, o
desejo e as possibilidades de ter acesso, mais tarde, à educação ao longo de
toda a vida." [138]
"A educação pode ser um
fator de coesão, se procurar ter em conta a diversidade dos indivíduos e dos
grupos humanos, evitando tornar-se um fator de exclusão social. O respeito pela
diversidade e pela especificidade dos indivíduos constitui, de fato, um
princípio fundamental, que deve levar à proscrição de qualquer forma de ensino
escolarizado. Os sistemas educacionais formais são, muitas vezes, acusados, e
com razão, de limitar a realização pessoal, impondo a todas as crianças o mesmo
modelo cultural e intelectual, sem ter em conta a diversidade dos talentos
individuais." [139]
Para Bronislaw Geremek, o
século XX termina com uma evidência um tanto amarga: as esperanças surgidas em
1990 foram vãs, e o notável progresso tecnológico e científico que assinalou
este século não trouxe mais equilíbrio entre o homem e a natureza, nem mais
harmonia entre os homens. Ao alvorecer de um novo século, é preciso definir os
desafios e tensões atuais, a fim de propor uma orientação para a educação e
estratégias educativas. É nesta perspectiva que a coesão social aparece como
uma das finalidades da educação. [140] Bronislaw ainda acrescenta:
"Se a educação tem um
papel determinante na luta contra a exclusão dos que, por razões
sócio-econômicas ou culturais, se encontram marginalizados nas sociedades
contemporâneas, parece ter um papel ainda maior na inserção das minorias na
sociedade. As normas jurídicas relativas ao estudo das minorias já
existem e aguardam aplicação, mas o problema é mais de psicologia social do que
legal. Para alterar as atitudes coletivas em relação à autoridade, devia haver
um esforço educativo conjunto do Estado e da sociedade civil, dos meios de
comunicação social e das comunidades religiosas, da família e das associações,
mas também – e antes de tudo – das escolas." [141]
Por fim, segundo o membro da
comissão internacional sobre educação para o século XXI, o ensino ao longo de
toda a vida opõe-se, naturalmente, à mais dolorosa das exclusões – a exclusão
devido à ignorância. As mudanças operadas a nível das tecnologias da informação
e da comunicação – a que também se dá o nome de revolução informática –
agravam, ainda mais, o perigo e atribuem ao ensino um papel crucial na
perspectiva do século XXI. [142]
Outra fonte peculiar ao direito
educacional, nas palavras de Edivaldo Boaventura, são os atos emanados do poder
normativo dos Conselhos de Educação, que assumem a forma de resoluções,
deliberações e pareceres normativos. [143] Para Hely Lopes
Meirelles, as resoluções são atos administrativos normativos expedidos pelas
altas autoridades do Executivo – mas não pelo chefe do Executivo, que só deve
expedir decretos –, ou pelos presidentes de tribunais, órgãos legislativos e
colegiados administrativos, para disciplinar matéria de sua competência
específica. Prossegue, ainda, Hely Lopes Meirelles:
"As resoluções,
normativas ou individuais, são sempre atos inferiores ao regulamento e ao
regimento, não podendo inová-los ou contrariá-los, mas unicamente completá-los
e explicá-los. Seus efeitos podem ser internos ou externos, conforme o campo de
atuação da norma ou os destinatários da providência concreta." [144]
As resoluções dos conselhos,
como leciona Edivaldo Boaventura, têm largo emprego no direito educacional.
[145] Da mesma forma, as deliberações também são "atos
administrativos normativos ou decisórios emanados de órgãos colegiados".
Neste caso, as decisões dos conselhos, como fonte do direito educacional, tomam
forma de deliberação, ou seja, as decisões revestem-se da forma de resolução,
ou de parecer normativo, quando o ato é originário de câmara ou comissão dos
Conselhos de Educação. [146]
O parecer normativo,
diferentemente do mero parecer técnico administrativo, "ao ser aprovado
pela autoridade competente, é convertido em norma de procedimento interno,
tornando-se impositivo e vinculante para todos os órgãos hierarquizados à
autoridade que o aprovou". Esta é a conceituação de Hely Lopes Meirelles.
[147]
Em suma, dentro da categoria
legislação educacional como fonte do direito educacional, temos que considerar
a Constituição; as Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional; decretos,
regulamentos, regimentos e portarias; tratados e convenções internacionais;
resoluções e pareceres normativos dos conselhos de educação; e regimentos
escolares. Acrescente-se, ainda, a existência de um anteprojeto de Consolidação
da Legislação Educacional brasileira em complementação à Lei n° 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, visando sistematizar formalmente as leis existentes sobre
matéria educacional no país. O projeto não incorpora a LDB, mas identifica os
dispositivos considerados repetitivos, conflitantes, inconstitucionais ou
ininteligíveis, tudo voltado para o enxugamento legislativo com racional
diminuição de artigos de leis. [148] Além disso, a Câmara dos
Deputados já aprovou o Projeto de Lei nº 4.173, que define o Plano Nacional
de Educação, constituindo uma lei complementar à LDB.
2.2. Costumes
Podemos definir os costumes
como sendo normas de conduta observadas pelo povo em caráter reiterado e
uniforme, em razão da consciência jurídica de sua necessidade. [149]
O costume é a grande fonte
primitiva do direito, a mais espontânea, em certo sentido, e também a mais
natural, ou normal. Aliás, leciona Benjamim de Oliveira que, sem negar a
precedência histórica do costume, poder-se-á dizer que costume e lei são formas
fundamentais do direito, e, por conseqüência, suas fontes primárias. [150]
Da mesma forma, Caio Mário da Silva Pereira nos ensina que os costumes são a
forma primeira de elaboração da norma jurídica: quando um grupo social adota
uma prática reiterada de agir, sua repetição constante a transforma em regra de
comportamento, que o tempo consolida em princípio de direito. [151]
Contudo, é oportuno destacar
duas situações de ordem prática epistemológica no que diz respeito aos costumes
como fonte do direito. Em primeiro lugar, como já observamos, há dois tipos de
ordenamento jurídico: o da tradição romanística (Civil Law) e o da
tradição anglo-americana (Common Law). Aquele caracteriza-se pelo fato
de considerar a lei como única expressão autêntica da nação e da vontade geral.
Este último, prioriza a tradição, os usos e costumes como fonte do direito.
Observando esses pressupostos, adverte Miguel Reale:
"Termos, pois, dois
grandes sistemas de Direito no mundo ocidental, correspondentes a duas
experiências culturais distintas, resultantes de múltiplos fatores, sobretudo
de ordem histórica. O confronto entre um e outro sistema tem sido extremamente
fecundo, inclusive por demonstrar que, nessa matéria, o que prevalece para
explicar o primado desta ou daquela fonte de direito não são razões abstratas
de ordem lógica, mas apenas motivos de natureza social e histórica." [152]
Há também uma força maior de
direito costumeiro em certos ramos ou para a solução de determinados problemas,
como é o caso do direito comercial e do direito internacional, enquanto em
outros ramos do direito, como o direito civil e o direito penal, por exemplo, o
papel do costume é relativamente limitado. Nesse sentido, John Gilissen, em sua
obra Introdução histórica do direito, leciona:
"as codificações da época
revolucionária e napoleônica derrogaram os costumes antes observados nesta
matéria, à excepção de algumas questões não resolvidas pelos novos códigos ou
pelas leis posteriores; como as disposições legislativas são precisas e
numerosas nestas Matérias e como, sobretudo em direito penal, só o legislador
pode erigir um facto em infracção (nullum crimen sine lege), não há a
possibilidade de surgirem muitos costumes novos." [153]
Já Miguel Reale, partindo da
distinção entre direito público e direito privado, sustenta o seguinte:
"podemos dizer que no
Direito Público os costumes desempenham papel mais relevante. Em algumas
nações, o Direito Público é, todo ele, no que tem de essencial de natureza
consuetudinária. A Inglaterra, por exemplo, formou as bases do seu regime
parlamentar tão-somente à luz de um comportamento político que foi se
consolidando através do tempo e se transformando em uma consciência social
muito viva, com maior capacidade de atuação do que as leis propriamente ditas
(…) No Direito Administrativo anglo-americano também as regras costumeiras têm
importância fundamental." [154]
Os Estados Unidos da América
coincidem com a Inglaterra [155] apenas no tocante ao direito
privado, pois no plano do direito constitucional nos oferecem o mais notável
exemplo de Constituição rígida, só suscetível de emendas através de múltiplas
exigências e cautelas que envolvem todo o sistema federativo.
Como adverte Miguel Reale, as
referências jurídicas inglesa e norte-americana bastam para demonstrar que, em
matéria de fontes, não podem prevalecer esquemas abstratos ou puramente
lógicos. Não se pode falar em primado da lei ou do costume, a não ser em função
de distintos ciclos históricos, havendo variações notáveis dentro de um mesmo
país, com relação a esta ou aquela outra parte do direito. [156]
Acrescente-se, que o contraste
ou confronto entre as duas tradições, Civil Law e Common Law,
embora em alguns casos propiciando pontos de encontro, não é apenas um problema
de ordem jurídica, muito pelo contrário. Segundo Edivaldo Boaventura,
diferenciação bem mais profunda emana dos fundamentos filosóficos e da
metodologia. O modo de pensar indutivo-empírico informa o sistema Common Law,
da mesma maneira que o dedutivo-teórico estrutura racionalmente o sistema Civil
Law. Neste caso, ambas as maneiras de pensar adotadas pelos diferentes
grupos sociais refletem-se na educação dos profissionais. A propósito, Edivaldo
Boaventura prescreve o seguinte:
"Os formados pelas
Faculdades de Direito norte-americanas tendem a pensar segundo o modo
empírico-indutivo, contrastando com aqueles que se diplomam nas faculdades de
Direito da Alemanha, da França e mesmo do Brasil, que seguem o
raciocínio predominantemente dedutivo. As conseqüências para a formação são bem
diferentes. Nos países da lei-código, o Direito é exposto geralmente em
aulas-conferências." [157]
Nesse contexto, pode-se
compreender a relevância dos costumes como fonte do direito educacional, no
ramo do direito público. De certo modo, os costumes preenchem as possíveis
omissões, lacunas ou ausência de legislação educacional, até porque trata-se de
um ramo novo do direito ou da ciência jurídica. Além disso, há legislações
esparsas, às vezes conflitantes e repetitivas, na área educacional que
justificam a importância do costume como fonte do direito educacional.
No direito educacional, adverte
Edivaldo Boaventura, estão presente vários costumes, por exemplo, o pedido de
revisão de prova e de exame pelo próprio aluno; os conteúdos mínimos para o
ensino fundamental; os indicadores para currículo. [158] É oportuno
enfatizar que alguns desses costumes já foram incorporados na Constituição de
1988 e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394, de 26 de
dezembro de 1996).
Vê-se, então, que o costume e a
lei são formas de expressão do direito educacional. A lei seria a forma
fundamental e o costume uma das formas complementares, que se costuma
acrescentar à jurisprudência, à doutrina e aos princípios gerais do direito.
2.3. Jurisprudência
Seguindo a sistemática de
apresentação das fontes de direito, temos o termo jurisprudência com,
pelo menos, dois sentidos fundamentais. Num deles, ela é sinônimo de ciência do
direito ou de dogmática jurídica. Num segundo e mais freqüente sentido, a
palavra jurisprudência refere-se à reiterada repetição de uma dada
solução judicial de casos análogos. [159] É obvio, como leciona
Machado Neto, que apenas nesse último sentido pode-se entender a jurisprudência
como fonte do direito. [160]
Dentre as fontes do direito, a
jurisprudência tem muito de semelhante ao costume – alguns autores chegam a
identificá-la como costume jurisprudencial. [161] Todavia, há
características de um e de outra que bem podem distinguir costume e
jurisprudência. Os pontos cruciais desta distinção, conforme os ensinamentos do
jurista já mencionado, são os seguintes:
a) O costume é obra de todos os
membros da coletividade, enquanto a jurisprudência o é de um setor definido da
comunidade – os juízes e tribunais;
b) o costume nasce
espontaneamente no exercício de direitos e deveres, ao passo que a
jurisprudência ocorre apenas como conseqüência dos casos em conflito;
c) o costume é espontâneo, como
vimos acima, enquanto a jurisprudência é reflexiva, por nascer do pensamento e,
pois, da reflexão sistemática dos julgadores, ou seja, especialistas;
d) finalmente, o núcleo de
identidade se acha, no costume, apenas dado no conjunto das condutas
concordantes, apenas vivido, pois; ao contrário, na jurisprudência ele se acha
também pensado, refletido. [162]
A inclusão da jurisprudência
como uma verdadeira espécie de costume deve-se à escola histórica do direito,
cujas expressões máximas são Savigny e seu discípulo Puchta. No campo do
direito científico, o realçamento da importância do costume como forma de
expressão do direito positivo deve-se, também, a esses cientistas do direito.
Expressão do direito positivo porque os especialistas, jurisconsultos,
integradores, por assim dizer, de uma elite de conhecedores dos problemas jurídicos,
ao emitirem suas opiniões, como que representam a consciência popular, em meio
à qual se formou a sua mentalidade jurídica. [163] Na obra clássica A
vida do direito e a inutilidade das leis, Jean Cruet destacou o valor da
jurisprudência:
"A jurisprudência
evolui contra a lei, porém, com a finalidade de aprimorá-la, porque todo o
corpo de direito, por si mesmo, tende a não evoluir, mas a consolidar-se. (…) É
preciso, então, que a jurisprudência, tendo evoluído contra a lei, continue a
evoluir contra si mesma. (…) A jurisprudência assegura o progresso do direito
fora da lei ou contra ela, daí devemos procurar os meios de transformar o
direito fora da jurisprudência e contra ela. E pois que não é o direito que faz
viver a sociedade, é preciso que a sociedade faça viver o seu direito,
quebrando ou alargando a carapaça legal ou jurisprudencial que lhe comprime o
livre vôo. Muita anarquia é a desordem, mas um pouco de anarquia é o
progresso." [164]
Contudo, a história da evolução
da jurisprudência no decurso dos últimos cento e cinqüenta anos não foi ainda
suficiente descrita. Podemos verificar que os tribunais se mostram ora
demasiadamente tímidos e conservadores ora muito ousados, como afirma John
Gilissen, em sua obra Introdução histórica do direito. [165] Ademais,
como já vimos, os sistemas de direito da família romano-germânica são sistemas
fechados, enquanto a Common Law é um sistema aberto, onde novas regras
são continuamente reveladas. [166] No caso brasileiro, que adotou
sistema romano-germânico (Civil Law), a jurisprudência tem um sentido
específico. Não se trata de proferir normas gerais e obrigatórias, mas
significa a maneira uniforme e constante pela qual juízes e tribunais,
especialmente os tribunais, interpretam e aplicam o direito. [167]
No ordenamento jurídico nacional se percebe a crescente importância dos
tribunais e dos órgãos administrativos superiores no desenvolvimento da vida
jurídica.
Para Miguel Reale, já se pode
considerar superada a dúvida sobre se a jurisprudência é ou não "fonte de
direito", desde que se passou a uma compreensão mais ampla e abrangente de
"ordenamento jurídico". Este, na realidade, não se reduz mais a um
puro sistema de normas legais, completado, no máximo, por um corpo de normas
costumeiras, reservando-se à jurisprudência e à doutrina uma função acessória.
[168]
Dentro as fontes do direito, a
jurisprudência tem papel marcante, eis que representa a imagem viva da
interpretação dos frios textos da lei. Conceitualmente, jurisprudência é um
conjunto de solução dadas pelos tribunais superiores à questão de direito;
interpretação reiterada que os tribunais dão às leis, nos casos concretos
submetidos ao seu julgamento. [169] Por sua vez, Edivaldo
Boaventura, explica que, além da legislação, a jurisprudência é um outro modo
de criação de normas. Como é notório, a atividade dos juízes e tribunais na
aplicação do direito positivo, quando repetida no mesmo sentido, forma
jurisprudência, que é, assim, a repetição uniforme que os tribunais dão à lei,
nos casos concretos submetidos ao seu julgamento. [170]
O direito educacional no Brasil
tem na jurisprudência uma das suas principais fontes, uma vez que os conflitos
jus-pedagógicos vêm marcando as relações entre governos, alunos e
estabelecimentos de ensino. [171] No entanto, quando da aplicação do
direito no campo da educação, surge a primeira indagação, que consiste em saber
como aplicar o direito educacional para melhor conhecer-se o entendimento dos
tribunais e da jurisprudência, e desta extrair maior aproximação com a ciência
do direito e com a realidade no campo jurídico-educacional.
As fontes jurisprudenciais do
direito educacional estão presentes nas decisões dos tribunais, ou seja, na
esfera jurídica com os acórdãos e as súmulas, também chamadas de enunciados.
Igualmente, nas decisões dos colegiados (Conselhos de Educação), no campo
administrativo com os pareceres das entidades educacionais que têm força de
jurisprudência (jurisprudência administrativa). A propósito, segundo João
Roberto Moreira Alves, o Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação iniciou
um trabalho de Súmulas da Jurisprudência predominante no antigo Conselho
Federal de Educação. [172] Salientando a importância da
jurisprudência para o direito educacional, o presidente do Instituto de
Pesquisas Avançadas em Educação explica o seguinte:
"Nas decisões, sejam de
cunho administrativo, sejam de cunho judiciário, o Direito Educacional está
sempre presente. Assim demonstra a importância da jurisprudências
administrativas (Conselhos de Educação) e judiciária (Poder Judiciário), pois
nos possibilita analisar por outro ângulo, o do julgador, o entendimento de
algumas questões controvertidas e a possibilidade de um favorável deslinde ao
caso estudado." [173]
Quanto à jurisprudência
administrativa, podemos destacar dois aspectos fundamentais. Em primeiro lugar,
os conselhos de educação como fonte do direito educacional. Em segundo lugar, a
atuação dos colegiados superiores das universidades, das procuradorias e
consultorias jurídicas do Ministério da Educação, das Secretarias de Educação e
organismos outros que prestam serviço jurídicos às instituições oficiais de
ensino. Estas entidades, conhecedoras dos problemas nas relações entre Estado,
alunos e estabelecimentos de ensino, elucidam as práticas e os costumes no
campo da educação. [174]
Já a jurisprudência dos
tribunais, no que concerne à matéria educacional, tem colaborado para
estabelecer contornos e precisões, fornecendo mais segurança e definição às
situações educacionais. [175] Em nosso país, segundo a professora
Salete Maria Maccalóz, alcançaremos, com almejada eficiência, os ideais de
celeridade e presteza da Justiça se nossa jurisprudência voltar-se, com mais
extensão e profundidade, para os princípios gerais do direito, que dão muito
maior e melhor flexibilidade aos enunciados de interpretação da lei. [176]
Para o educador e consultor
jurídico na área educacional, Elias de Oliveira Motta:
"Nos últimos anos,
tem-se formado extensa jurisprudência de Direito Educacional nas várias
instâncias do Poder Judiciário, inclusive no Supremo Tribunal Federal, onde
existem vários acórdãos, especialmente sobre as Medidas Provisórias editadas
pelo Poder Executivo Federal nos últimos três anos, que foram alvo de diversas
Ações Diretas de Inconstitucionalidade (impetradas principalmente pela COFENEN
e por partidos políticos). Dispunham essas Medidas Provisórias sobre
mensalidades escolares, inadimplência de aluno e pais de aluno, punições
pedagógicas e administrativas, Conselho Nacional de Educação, avaliação das
instituições de ensino superior, eleição de reitores das universidades
públicas, etc." [177]
Enfim, a jurisprudência se
constitui em fonte importante para o direito educacional. Ela se tem mostrado
indispensável, especialmente sua ação, que é poderosa para o progresso da
ciência do direito educacional e da sociedade. Além disso, os conflitos entre
Estado, alunos e instituições de ensino estão exigindo a participação efetiva
do Poder Judiciário. [178]
2.4. Doutrina
Nessa linha das fontes do
direito, temos a doutrina. Neste caso, surge a indagação, questão bastante
controvertida, se a doutrina constitui ou não uma fonte jurídica, [179]
muito embora, o fato de ser ou não ser fonte do direito não retira da doutrina
a sua importância como fonte inspiradora para o juiz na aplicação da lei, como
do próprio legislador na elaboração das normas.
Muitos autores há que excluem a
doutrina como fonte do direito, alegando que, por maior que seja a dignidade de
um mestre e por mais alto que seja o prestígio intelectual de um jurisconsulto,
os seus ensinamentos jamais terão força bastante para revelar a norma jurídica
positiva que deva ser cumprida pelos juízes ou pelas partes. [180]
Historicamente, no entanto, tempo houve em que a doutrina teve mais força do
que hoje. Isso se deu quando numerosos imperadores romanos atribuíram força de
lei aos pareceres doutrinários ou às obras teóricas e didáticas dos grandes
jurisconsultos romanos da época, ou quando legislações medievais e modernas
admitiram expressamente como fontes subsidiárias a obra de algum famoso
glosador medieval, tal como ocorreu em relação a Bátolo e Acúrsio nas
Ordenações Afonsinas. [181] Para Benjamim de Oliveira, a doutrina
não é mais, nem pode ser fonte formal do direito. Não tem, manifestamente, essa
qualidade. [182] Miguel Reale, da mesma forma, não reconhece
doutrina como fonte do direito. Porém, em análise última acrescenta:
"A doutrina não é fonte
do Direito, mas nem por isso deixa de ser uma das molas propulsoras, e a mais
racional das forças diretoras, do ordenamento jurídico." [183]
Caio Mário da Silva, numa linha
de exposição dogmática, adverte e afirma:
"Com a codificação do
direito, a sistematização dos preceitos reduziu a importância da obra
doutrinária. Mas nem por isso a doutrina deixa constituir fator relevante como fonte
indireta. Expõe os princípios gerais de direito, debate as idéias e revive
as discussões de temas que alargam o conteúdo das regras jurídicas. São os
escritores que ventilam com o poder de sua inteligência os textos e os arestos,
formulando e desenvolvendo conceitos que realizam a evolução do direito." [184]
Outros, como A. L. Machado
Neto, sustentam, ao contrário, que a doutrina tem o caráter de fonte do
direito. Por doutrina, como fonte jurídica, entende-se a obra científica dos
jurisprudentes ou juristas, comentando a legislação, os costumes ou a
jurisprudência, procurando realizar a necessária coerência dos sistemas
jurídico e construir os institutos à base das disposições normativas vigentes.
[185] Além disso, enquanto o costume vem perdendo o terreno, dado o
incremento da atividade legislativa, a doutrina vem ganhando terreno, seja ela
a sentinela avançada da evolução jurídica dos povos, seja através de
construções teóricas que vão penetrando gradativamente no direito legislado,
seja através do reconhecimento das fontes materiais como os usos sociais
emergentes, atribuindo-lhes a necessária força de convicção para que possam ser
invocados pelos julgadores. [186] Vale consignar os argumentos deste
sociólogo do direito:
"Já se tentou negar o
caráter de fonte à doutrina, sob a alegação de que ela não ajunta nenhum
sentido jurídico ao que já se encontra nas demais fontes – lei, costume e
jurisprudência – Tal argumentação não procede, contudo, já que mesmo a doutrina
inteiramente secundum legem cumpre tarefas fundamentais de caráter
científico, prático
Crítico para a vida do
direito nos povos mais evoluídos." [187]
Como tarefa científica,
prossegue Machado Neto, a doutrina realiza a sistematização lógica do
ordenamento jurídico. No plano prático ou técnico-jurídico, a doutrina
contribui para facilitar a tarefa de aplicação do direito. Extraordinariamente
significativa é a contribuição crítica que a doutrina proporciona à reforma do
direito e das instituições jurídicas que a prática social vai inapelavelmente
superando. Neste último ponto, o caso da teoria da imprevisão e da teoria do
abuso de direito, construções doutrinárias que tanto contribuíram como
mecanismos ou anteparos elásticos colocados entre a inflexibilidade do direito
individualista e a crescente coletivização da vida numa sociedade de massas, o
que por si só bastaria para confirmar a doutrina como fonte do direito.
[188]
A doutrina jurídica, como
vimos, é constituída de manifestações dos jurisconsultos, dos tratadistas, dos
escritores jurídicos, cientistas sociais
"A ciência não é
considerada como algo pronto, acabado ou definitivo. Ela é entendida como uma
busca constante de explicações e soluções, de revisão e reavaliação de seus
resultados e tem a consciência clara de sua falibilidade e de seus limites. Por
ser algo dinâmico, a ciência busca renovar-se e reavaliar-se continuamente. A
ciência é um processo de construção." [192]
É deveras sintomático, nas
palavras de Miguel Reale, que o conceito de dogmática jurídica tenha se
convertido num dos mais problemáticos e polêmicos da epistemologia jurídica contemporânea,
mas tais contrastes – a começar pela conveniência ou não de manter-se ainda
aquela tradicional denominação – traduzem apenas a crise por que passa a
ciência do direito quando à elaboração das estruturas normativas que devem
corresponder à sociedade contemporânea e ao Estado de justiça social [193]
– muito embora considere o direito uma ciência dogmática, não por se basear em
verdades indiscutíveis, mas sim porque a doutrina jurídica se desenvolve a
partir das normas vigentes, isto é, do direito positivo: etimologicamente
"dogma" significa aquilo que é posto ou estabelecido por quem tenha
autoridade para fazê-lo. [194] Mas afinal, há confronto entre a
dogmática jurídica e a ciência do direito?
Para Tércio Sampaio Ferraz
Junior, o agrupamento de doutrinas em corpos mais ou menos homogêneos é que
transforma, por fim, a ciência do direito em dogmática jurídica, [195]
enquanto Miguel Reale sustenta que a dogmática jurídica deve ser compreendida
como o momento culminante da ciência do direito na plenitude de sua existência,
como horizonte de sua objetividade, e o horizonte não se põe jamais como limite
definitivo, mas é linha móvel a projetar-se sempre à frente do observador em
marcha. [196]
Para nós, no entanto, parece
mais condizente e lógico, conforme a definição de dogmática jurídica,
[197] admiti-la como parte da ciência jurídica. Aliás, como leciona
Silvio de Macedo, a doutrina e a dogmática jurídicas não possuem a mesma pureza
metodológica que a ciência jurídica, tampouco a amplitude da filosofia do
direito. [198] Mais ainda, não possuem as mesmas características do
conhecimento científico, que busca renovar-se e reavaliar-se continuamente. Na
acepção de Tércio Sampaio Ferraz Júnior, a ciência jurídica diferencia-se de
outras formas de abordagem do fenômeno jurídico, porque o cientista do direito
se sente vinculado, na colocação dos problemas, a uma proposta de solução
possível e viável. A ciência jurídica, segundo ele, coloca problemas ou
questões para ensinar. [199] Desse modo, a ciência jurídica abrange
a doutrina jurídica e a dogmática jurídica, haja vista que estas são partes
daquela. Por outro lado, a doutrina jurídica, como fonte jurídica, realiza a
construção teórica e a sistematização de ordenamento jurídico, contribuindo
efetivamente para ciência do direito.
No caso do direito educacional,
por se tratar de um ramo novo do direito com carência de pesquisas, a doutrina,
como fonte jurídica, é fundamental para a construção da teoria e a
sistematização do ordenamento jurídico educacional. Trata-se, aqui, da
possibilidade efetiva de reunir doutrinas, em corpos mais ou menos homogêneos,
no contexto da ciência do direito educacional.
A doutrina, como salientou
Machado Neto, é tarefa do jurista enquanto cientista da ciência jurídica, ou
seja, é obra do jurista como cientista da ciência do direito, a fim de realizar
a sistematização do ordenamento jurídico, facilitando, assim, a aplicação do
direito e sua reforma, bem como a reforma das instituições. [200] Já
Maria Helena Diniz, na recente obra Compêndio de introdução à ciência do
direito, explica o seguinte: "A doutrina é formada pela atividade dos
juristas, ou seja, pelos ensinamentos dos professores, pelos pareceres dos
jurisconsultos, pelas opiniões dos tratadistas." [201]
Parece-nos, também, que não restam dúvidas de que a doutrina exige um
conhecimento técnico e científico e está vinculada à atividade
científico-jurídica. São pertinentes, também, as observações do jurista Pontes
de Miranda:
"Há grande vantagem em
se estudar, tratar e expor o direito, aprofundando-se-lhe os princípios:
primeiro, porque é assim que tem progredido a ciência, e só assim se pode ficar
em dia com ela; segundo, evita-se que se tenham os problemas jurídicos como
assuntos sobre os quais, sem preparação, todo mundo possa discorrer. O que a
experiência tem mostrado é que o povo de cada país desaprova qualquer
exposição, ou discussão jurídica, de que não lhe seja dado ver elementos para a
sua convicção. E o povo contém juristas, gente que lê ciência." [202]
Contudo, em se tratando das
fontes doutrinárias do direito educacional existe diversidade maior de fontes,
a começar pelos próprios conceitos de educação e de direito educacional. Há
peculiaridades nas diversas publicações dos Conselhos, do Congresso Nacional,
seja por meio da Revista de Informação Legislativa, seja pelos seus
anais, que guardam extraordinárias contribuições para a doutrina básica do
direito educacional produzidas pelos senhores parlamentares, por meio de
pronunciamentos, projetos de lei, pareceres, votos, emendas, audiências
públicas etc. [203]
Quando aos pronunciamentos de
parlamentares, vamos destacar os escritos de Rui Barbosa sobre educação, em
dois pareceres, produzidos no limitado prazo que mediou de
O professor Lourenço Filho, o
maior estudioso desses pareceres, afirma que Rui Barbosa foi sem dúvida, no
Brasil, o primeiro a tratar da pedagogia como problema integral da cultura,
isto é, problema filosófico, social, político e técnico, a um só tempo.
[204] Os pareceres, como já foi dito, foram dois: um sobre a Reforma do
Ensino Primário, e outro, sobre a Reforma do Ensino Secundário e Superior (v.
edição comemorativa do 1º Centenário dos Pareceres apresentados na Câmara do
Império em 1882, publicada pela Fundação Casa de Rui Barbosa). Na análise a que
procedemos sobre o texto dos dois pareceres, os assuntos foram desenvolvidos
como verbetes das melhores enciclopédias pedagógicas. Nesses pareceres, em
resumo, encontramos o seguinte:
"Uma conceituação da
educação; os seus princípios normativos, ou filosofia pedagógica; as bases
científicas da ação educativa, com indicações precisas sobre a biologia e a
psicologia da criança; toda a técnica da educação pré-primária e primária e
indicação substanciosa da técnica dos estudos secundários e superiores; notas e
exemplos, segundo os mais adiantados modelos da época (os quase testes de
Martins) sobre a verificação do rendimento do ensino; os tipos fundamentais de
ensino comum e de ensino especial, primário, secundário, profissional,
superior; o estudo do pessoal docente, quanto à formação, carreira, condições
de recrutamento e de aperfeiçoamento; os grandes problemas da organização
escolar, do efetivo das classes, dos horários; os princípios gerais de
didática, o material, os processos de ensino, a conceituação rigorosa do
método; normas relativas às construções escolares, situação, arquitetura,
higiene da visão; o mobiliário escolar; a educação física; a educação
sanitária; a metodologia dos jardins de infância, que Ruy prefere chamar de
"jardins de criança" a questão dos programas de ensino; da
co-educação econômica; da educação artística…" [205]
Rui Barbosa, na condição de
jurista sentiu a necessidade de colaborar na área educacional e contribuir para
maior aproximação entre a educação e o direito. Para nós, trata-se de
efetiva contribuição para doutrina do direito educacional. É certo a nosso ver,
por outro lado, que, embora Rui Barbosa invocasse exemplos norte-americanos e
europeus para justificar o ensino livre e as escolas gratuitas, jamais
mencionou, do ponto de vista da doutrina, que nos Estados Unidos da América, na
época da guerra civil americana, com a abolição da escravatura, o presidente
Lincoln organizou um departamento dos libertos, criando escolas, distribuindo
terras e incentivando o alistamento eleitoral. E sua maior realização foi no
campo da educação. [206] No caso brasileiro, ao contrário, ao invés
de leis, projetos, programas na área da educação – como observamos nos
comentários da maioria dos autores – houve um descaso e desinteresse do poder
público no que diz respeito à educação, sobretudo em relação ao ensino popular.
Para a ciência do direito há uma
certa vinculação entre doutrina e pesquisa científica. A doutrina é o
conhecimento teórico ou científico e, como fonte jurídica, tem os Conselhos
como fontes do direito educacional. O atual Conselho Nacional de Educação e seu
antecessor, o Conselho Federal de Educação, e os Conselhos Estaduais de
Educação têm legislado abundantemente acerca da educação nas áreas sob suas
respectivas jurisdições. Esses órgãos públicos, pelas suas funções normativas,
interpretativas e até judiciais, têm produzido magníficos pareceres e julgamentos.
[207] Toda essa matéria constitui fonte doutrinária do direito
educacional e sua pesquisa é facilitada pelas diversas publicações dos
Conselhos, como esclarece o professor e consultor jurídico Elias de Oliveira
Motta. [208]
A doutrina do direito
educacional, ao longo do tempo, vem acumulando através dos Conselhos importante
acervo de decisões, que se incorporou, dada a natureza do direito positivo
brasileiro, às próprias fontes do direito educacional. Orienta ela o
funcionamento do sistema de ensino e fundamenta decisões tomadas quer na
instância administrativa, quer até mesmo na judiciária. Neste caso, um novo
Direito Educacional deverá afluir uma inumerável soma de decisões e julgados,
que darão à doutrina posição de relevo no desenvolvimento e na consolidação
desse novo ramo da ciência jurídica entre nós. [209]
Outra contribuição para o
aprofundamento da doutrina do direito educacional tem sido os seminários e
congressos de direito educacional. Trata-se, no caso, da reunião de especialistas
no assunto, em conjunto com os profissionais da área jurídica, da área
administrativa, de especialista na área de educação, universitários e áreas
afins, que incentivam a formação de especialistas, de pesquisadores e efetiva
autonomia do direito educacional, como disciplina e novo ramo do direito, e
sobretudo fortalece a luta pelo direito à educação no Brasil.
Na tese de livre-docência, com
o título Contribuição à sistematização do direito educacional, Renato
Alberto Teodoro Di Dio faz o seguinte comentário:
"Foi com agradável
surpresa que, em 1977, tivemos notícia de um seminário de Direito Educacional,
realizado sob os auspícios da Universidade Estadual de Campinas. Não terá sido
a semente de nossas idéias – que, de resto, ficaram guardadas nas cinqüenta e
oito páginas de nosso ensaio acadêmico – mas o pólen carregado pelos ventos da
atmosfera educacional que começa a provocar a fecundação prenunciada. É verdade
que, no Brasil, mais do que lá fora, os ventos da inovação lembram antes
calmaria do que tormenta. Mormente nesse setor que potência o tradicionalismo
de duas forças predominantes conservadoras: o direito e a educação." [210]
Na apresentação dos respectivos
Anais desse 1º Seminário de Direito Educacional no Brasil, realizado em
Campinas de
"Este 1º Seminário de
Direito Educacional constitui um marco significativo na evolução do pensamento
educacional brasileiro, porque, pretendendo iniciar a sistematização
técnico-científica do Direito Educacional, atingirá, em médio prazo, o objetivo
de isolar e valorizar, distintamente, o fato educacional, exigindo-lhe
tratamento adequado pela ação dos órgãos do governo (Executivo, Legislativo e
Judiciário)."
E continuou: "As
conclusões aprovadas na última sessão indicam a consistência da preocupação
comum a juristas, educadores, sociólogos e autoridades de ensino,
principalmente, no sentido da importância de emergente ramo do direito."
[211]
Nesse sentido, são oportunas as
palavras do professor Elias de Oliveira Motta, quando afirma não haver mais
sentido ensinar-se para alunos dos cursos de Direito ou de Educação e, muito
menos, para os alunos de pós-graduação das respectivas áreas, apenas Legislação
de Ensino, quando existe todo um corpo doutrinário de princípios no Direito
Educacional. Manter, pois, nos currículos desse cursos apenas a disciplina
Legislação do Ensino será uma demonstração de desatualização que poderá
redundar tanto em deficiência dos cursos, quanto em prejuízo para a formação
dos futuros profissionais. [212]
A doutrina como fonte jurídica
proporciona ao ordenamento jurídico brasileiro e ao direito educacional uma
significativa contribuição crítica, através do jurista e filósofo Pontes de
Miranda, um dos primeiros a definir à educação como direito subjetivo público.
A propósito, em 1933, na sua obra Direito à educação, afirma o seguinte:
"Há direitos declarados
só verbalmente e de difícil reconhecimento, é o direito subjetivo à educação.
Infelizmente o Estado moderno e Constitucional deixou sem sanção certos
direitos declarados." [213]
Pontes de Miranda, segundo o
professor Paulo Nathanael Pereira de Souza, ao escrever seus comentários à
Constituição de 1934, ao mesmo tempo em que reconhece o amplo tratamento dado à
matéria educacional, critica o fato de não haverem os constituintes inserido
na Carta os meios de forçar o poder público a cumprir os compromissos assumidos
com a obrigatoriedade universal e gratuita do ensino primário. Faltou o que
o eminente jurista chamou de direito público subjetivo. Ou, para usar suas
palavras: "Ao lado do direito à educação deve estar a obrigação de
educar." [214]
Houve uma longa discussão da
doutrina brasileira sobre direito à educação e direito público subjetivo à
educação, como vamos verificar no capítulo IV do presente trabalho. [215]
Para Edivaldo Boaventura, as
doutrinas educacionais, especialmente os resultados das pesquisas em psicologia
e em sociologia, muito enriquecem a educação. A investigação científica reforça
a doutrina pela construção do conhecimento. [216] Todavia, não há
grande acervo doutrinário na área do direito educacional, até porque as
pesquisas ainda são reduzidas. Um dos importantes colaboradores para a
construção teórica do direito educacional em nosso país é Renato Alberto
Teodoro Di Dio, já mencionado no presente trabalho.
Elias de Oliveira Motta, no
mais recente trabalho sobre direito educacional, para comprovar a existência do
direito educacional, sustenta a necessidade de identificamos suas doutrinas
homogêneas e peculiares. [217] Filiamo-nos, em tese, a esse
critério, mas identificando inicialmente alguns doutrinadores com obras ou
artigos específicos sobre direito educacional. Vamos apresentar, então, outros
doutrinadores, que já se manifestaram sobre educação e direito em seus livros e
artigos.
Em primeiro lugar, a educação
como direito é um assunto pouco explorado entre nós, embora com a contribuição
de importantes estudiosos, educadores e juristas: o jurista e educador Edivaldo
Boaventura, o laureado Renato Alberto Teodoro Di Dio, o conceituado Elias de
Oliveira Motta, os não menos conceituados Aurélio Wander Bastos, Álvaro Melo
Filho, Lourival Vilanova, Ester de Figueiredo Ferraz, Pedro Sacho Silva, Paulo
Nathanael Souza, Alberto Venâncio Filho, Oldega Vieira, João Roberto Moreira
Alves, Newton Lins Buarque Sucupira, Maurício Antônio Ribeiro Lopes.
Em segundo lugar, a doutrina a
respeito do direito à educação é muito mais ampla, pois abrange comentários de
doutrinadores de diferentes áreas de conhecimento, mas que já se manifestaram
sobre educação e o direito em seus livros e artigos, bem como nas revistas
especializadas: Rui Barbosa, Pontes de Miranda, John Dewey, Anísio Teixeira,
Hermes Lima, Lourenço Filho, Santiago Dantas, Hely Lopes Meirelles, José Carlos
Libâneo, Demerval Saviani, Arnaldo Niskie, Lauro de Oliveira Lima, Luiz Antônio
Cunha, Paulo Freire, Vicente de Paula Barreto, José Ribas Vieira, Nilda Teves
Ferreira, Ivo José Both, João Gualberto C. Menezes, Pedro Demo, entre outros.
Todos eles estão efetivamente
contribuindo para a doutrina do direito educacional. Cabe, no entanto, aos
juristas-educadores ou aos educadores-juristas construírem um corpo doutrinário
homogêneo de conceitos, institutos jurídicos próprios e princípios, como
efetiva contribuição à sistematização e autonomia do direito educacional.
3. Princípios do direito
Embora quase toda doutrina
afirme que os princípios gerais do direito não constituem fonte do direito,
vale lembrar que toda ciência tem princípios. [218] Ademais, toda
disciplina jurídica autônoma corresponde a um conjunto sistematizado de
princípios e normas. Neste caso, o direito educacional, como ramo da ciência
jurídica, também tem os seus princípios, tanto que, como se verá a seguir, as
legislações, quer sejam constitucionais ou infraconstitucionais, mencionam os
princípios. [219] Contudo, antes de examinarmos os princípios
propriamente ditos do direito educacional, cabe dar uma breve noção sobre as
acepções do termo princípio.
A teoria tradicional do direito
consagra os princípios gerais do direito na condição de forma complementar do
direito normativo. A esse propósito, a nossa Lei de Introdução ao Código Civil
é categórica ao estabelecer que "quando a lei for omissa, o juiz decidirá
o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de
direito" (art. 4º). Do mesmo modo, o art. 126 do Código de processo Civil
adotou o mesmo teor normativo. [220]
Entretanto, Paulino Jacques
observa que alguns autores confundem os princípios gerais do direito com os
princípios gerais de alguns ramos do direito (do constitucional, penal, civil,
trabalhista etc.). [221] Para a doutrina tradicional, os princípios
gerais do direito diferem das normas jurídicas em geral por não disporem de uma
estrutura com hipótese de fato, impondo-se por sua própria importância, sem
referência a pressupostos concretos de aplicação. [222] Aqui,
verifica-se que a teoria da metodologia jurídica tradicional distingue norma
jurídica dos princípios. Parece-nos, como afirma a doutrina moderna, que saber
distinguir normas, regras e princípios é tarefa particularmente complexa –
aliás, nas palavras de Celso Ribeiro Bastos, embora muito aceita a distinção
entre norma e princípios, ela nem sempre é fácil de ser firmada. [223]
Porém, é no direito constitucional que a teoria dos princípios gerais do
direito ganhou prestígio e estabeleceu aprofundadas reflexões. A respeito, José
Joaquim Gomes Canotilho assim leciona:
"De um lado, um modelo
ou sistema constituído exclusivamente de regras conduzir-nos-ia a um sistema
jurídico de limitada racionalidade prática (…), conseguir-se-ia um sistema de
segurança, mas não haveria qualquer espaço livre para a complementação e o
desenvolvimento de um sistema como o constitucional, que é necessariamente um
sistema aberto. De outro lado, o modelo ou sistema baseado exclusivamente em
princípios levar-nos-ia a conseqüências também inaceitáveis. A indeterminação,
a inexistência de regras precisas, a coexistência de princípios conflitantes só
poderiam conduzir a um sistema falho de segurança jurídica…" [224]
Para Luiz Roberto Barroso, já
se encontra superada a distinção que outrora se fazia entre norma e princípio.
A dogmática moderna avaliza o entendimento de que as normas jurídicas em geral
e as normas constitucionais em particular podem ser enquadradas em duas
categorias diversas: as normas-princípio e as normas-disposição.
As normas-disposição, também referidas como regras, têm eficácia restrita às
situações específicas às quais se dirigem. Já as normas-princípio, ou
simplesmente princípios, têm, normalmente, maior teor de abstração e uma
finalidade mais destacada dentro do sistema. [225] Violar um
princípio, afirma Celso Antônio Bandeira de Mello, é muito mais grave do que
transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um
específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comando. É a mais
grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do
princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema,
subversão de seus valores fundamentais. [226]
Atualmente, segundo Ruy Samuel
Espíndola, entende-se que os princípios estão inclusos tanto no conceito de
lei, quanto no de princípios gerais do direito. Essa tendência, que tem sido
chamada de pós-positivista, entende os princípios como normas jurídicas
vinculantes, dotados de efetiva juridicidade, como quaisquer outros preceitos
encontráveis na ordem jurídica. Consideram as normas de direito como gênero, do
qual os princípios e as normas são espécies jurídicas. [227]
Da mesma forma, essa nova
tendência introduziu-se no direito educacional, com o advento da Constituição
de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Nesse sentido, os
princípios assumiram funções normativas específicas, reforçando-se os
princípios doutrinários da ciência jurídica da educação. [228] A
educação, direito de todos, é dever do Estado e da família preceitua o art. 205
da Constituição Federal. Porém, para a concretização das finalidades expostas
nesse dispositivo constitucional, o ensino deve obedecer aos princípios do
art. 206 do texto constitucional, os quais devem constituir a base de
qualquer planejamento que se faça na área de educação. [229]
Os constituintes de 1988 não
estabeleceram precisão terminológica no emprego das expressões educação
e ensino. [230] Mas conseguiram sintetizar os princípios
básicos da educação em sete itens. Segundo o art. 206 da Constituição Federal,
"o ensino será
ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições
para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender,
ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de idéias e
de concepções pedagógicas e coexistência de instituições públicas e privadas de
ensino;
IV - gratuidade do ensino
público em estabelecimentos oficiais;
V - valorização dos
profissionais do ensino, garantidos, na forma da lei, planos de carreira para o
magistério público, com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente
por concurso público de provas e títulos;
VI - gestão democrática do
ensino público, na forma da lei;
VII - garantia de padrão de
qualidade."
Ao comentar os princípios
básicos do ensino, José Afonso da Silva observa com muita propriedade que:
"A consecução prática
dos objetivos da educação consoante o art. 205 – pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho – só se realizará num sistema educacional democrático, em que a
organização da educação forma; concretize o direito ao ensino, informado por
princípios com eles coerentes, que, realmente, foram acolhidos pela
Constituição no art. 206." [231]
Depois da Constituição Federal,
a maior lei infraconstitucional da educação é a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação nacional, que trata da chamada "educação escolar". Essa lei
ordinária adota também princípios basilares da educação. O art. 2º, que coloca
a educação como um dever do Estado e da família, é uma repetição do mandamento
constitucional expresso no art. 205, com a exclusão da expressão "direito
de todos, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade". No
mencionado art. 2º há o seguinte acréscimo: "inspirada nos princípios da
liberdade e nos ideais de solidariedade humana", acréscimo que se
harmoniza com os princípios fundamentais da Constituição Federal. Também o art.
3º é, praticamente, cópia do art. 206 da Constituição de 1988, mas com alguns
acréscimos, inclusive novos incisos. O inciso IV inclui como princípio básico
do ensino a ser ministrado em nossas escolas "respeito à liberdade e
apreço à tolerância". O inciso X adicionou o princípio da
"valorização da experiência extra-escolar". E o último inciso do art.
3º, de número XI, estabeleceu como princípio a "vinculação entre a
educação escolar, o trabalho e as práticas sociais". [232]
Parece-nos, no entanto, que não
podemos analisar os artigos 205 e 206 da Constituição Federal, em especial os
princípios do direito educacional, sem harmonizá-los com os princípios
fundamentais da República Federativa do Brasil, até porque atualmente os
juristas reconhecem a Constituição como um sistema de princípios e de normas
constitucionais. Todavia, pelas limitações do presente trabalho, não cabe
discutir a fundo as bases e as relações de todos os princípios fundamentais do
direito constitucional e do direito educacional, mas é certo que algo deve ser
dito a esse respeito, daí elegermos os princípios da liberdade e da igualdade,
por se tratarem de aspirações humanas que servem de pilares do Estado
democrático de direito na Constituição Federal. Para o jurista Paulo Benavides:
"Foi Montesquieu sábio
ao dizer que ‘a liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permitem’.
Com estas palavras, ele vinculou indissociavelmente a liberdade ao Direito. De
tal sorte que, onde não houver o primado da ordem jurídica, não haverá
liberdade. (…) Completou Rousseau muito bem o conceito de liberdade de
Montesquieu mediante a concepção da lei como produto da ‘vontade geral’."
Prossegue o renomado jurista:
"A liberdade, graças
àqueles dois gigantes do pensamento político moderno, nos libertou da legislação
do absolutismo. Pôs abaixo o monstruosos edifício das soberanias do direito
divino. Acabou com os privilégios civis e políticos, que oprimiam o povo e a
sociedade…" [233]
A liberdade tem um caráter histórico, porque depende do
poder do homem sobre a natureza, sobre a sociedade e sobre si mesmo em cada
época. [234] A história mostra que o liberalismo ocidental,
conduzido e vivido pela burguesia, colocou como valor básico da existência
humana a liberdade. Realmente a história mostra que o conteúdo da liberdade se
amplia com a evolução da humanidade. Fortalece-se, entende-se, à medida que a
atividade humana de alarga. Liberdade é conquista constante. [235]
Cabe considerar, segundo Maurício Antônio Ribeiro Lopes, a
liberdade matriz, a liberdade base, que é a liberdade de ação em geral, a
liberdade geral de atuar, que decorre do art. 5º da Constituição, o qual
dispõe: "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude da lei". É um modo diferente de expressar do de Montesquieu.
Para este, a liberdade consistiria na direito de fazer tudo o que as leis
permitissem. O texto constitucional atual, ao contrário, prevê a liberdade de
fazer, a liberdade de atuar ou a liberdade de agir como princípio. Vale dizer,
o princípio é o de que todos têm a liberdade de fazer e de não fazer o que bem
entenderem, salvo quando a lei determine o contrário. [236]
No direito educacional, o princípio da liberdade aparece
mais fortemente expresso diante de outros corolários, como "o princípio da
liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o
saber" (art. 206, inc. II da Constituição Federal), igualmente expresso no
inc. II do art. 3º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Nesse artigo,
estão compreendidas duas dimensões do conhecer: a dimensão subjetiva e a
dimensão objetiva. Na primeira, dá-se a relação dos sujeitos do conhecimento,
envolvendo a liberdade de transmitir o conhecimento – que cabe ao professor – e
o direito de receber o conhecimento ou de buscá-lo – que cabe a alunos e
pesquisadores. Na segunda, encontra-se a liberdade de o professor escolher o
objeto relativo do ensino a transmitir. Dizemos objeto relativo porque sua
liberdade aqui fica condicionada aos currículos escolares e aso programas
oficiais de ensino (art. 209). [237] Vale lembrar que não é óbice
para o professor ministrar o seu curso ou disciplina com a liberdade de
crítica, de conteúdo e metodologia que lhe pareçam mais corretos. A propósito,
consoante o magister do precursor do direito educacional brasileiro, Renato
Alberto Teodoro Di Dio:
"A liberdade de ensino, entendida como a liberdade
intelectual de pessoas que participam do processo educativo, é hoje reconhecida
como um dos princípios fundamentais da educação de uma sociedade. Esse
princípio é proclamado não só por seu valor intrínseco, uma vez que constitui
um dos anseios básicos do homem, como também porque propicia o desenvolvimento
do espírito crítico, o progresso do conhecimento e a melhoria da convivência
social." [238]
Já o princípio da igualdade ou da isonomia, embora não
merecendo tantos discursos como a liberdade, [239] é um dos pilares
do Estado democrático de direito. Para o professor Sergio Abreu o debate acerca
do princípio da igualdade está envolvido numa complexidade jurídico-filosófica
de tal ordem que não pode ser reduzido aos cânones do direito positivo.
[240]
A igualdade adotada pela Revolução Francesa – com a
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789 – era a igualdade de
tratamento e se manifestava pela abolição de privilégios de toda espécie, daí o
princípio, geralmente admitido desde então, nas democracias liberais, da
igualdade de todos perante a lei. A luta pela igualdade era uma luta pela
abolição dos privilégios do clero e da nobreza, tanto em relação ao acesso às
funções públicas, como em relação aos impostos. No século XIX, a igualdade dos
direitos era garantida aos proprietários. O direito de propriedade era
considerado um direito natural, prolongamento da liberdade individual e
fundamento da ordem social.
As Constituições brasileiras só têm reconhecido a
igualdade no seu sentido formal jurídico: igualdade perante a lei. A
Constituição de 1988 abre o capítulo dos direitos individuais com o princípio
de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (art.
5º, caput). [241] O princípio da igualdade ou da isonomia
está firmado na Constituição Federal, no preâmbulo, no art. 3º (que trata dos
objetos fundamentais da República), no art. 5º, caput e em seu inc. I,
dentre outros dispositivos constitucionais gerais. No entanto, hoje, segundo
Chaim Perelman, considerado um dos maiores filósofos do direito deste século:
"A idéia que se impõe cada vez mais é a de
diminuir as desigualdades entre os membros de uma mesma sociedade ou entre
povos e Estados cujo desenvolvimento é desigual, concedendo compensação aos que
estão em estado de inferioridade. Nos Estados Unidos, a propósito, quando se
tratou da admissão às universidades, em vez de designar os melhores candidatos,
o que teria eliminado quase todos os estudantes negros, decidiu-se
conceder-lhes uma certa cota, para permitir escolher certo número de estudantes
negros, mesmo que se devesse, agindo assim, eliminar estudantes de raça branca
mais merecedores do que os que haviam sido admitidos." [242]
O princípio da igualdade no direito educacional está
expresso como "igualdade de condições para o acesso e a permanência na
escola" (art. 206, inc. I da Constituição Federal; art. 3º, inc. I da
Lei de Diretrizes de Bases da Educação; e art. 53, inc. I do Estatuto da
Criança e do Adolescente). Trata-se do princípio de isonomia da educação, de
cunho material, posto que, sendo o ensino direito público subjetivo – nos
termos do § 1º e § 2º do art. 208; do art. 5º da Lei de Diretrizes e Bases; e
do art. 53, § 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90) –,
tanto acesso quanto permanência devem ser materialmente garantidos, sendo, via
de conseqüência, ambos exigíveis do poder público, importando a conseqüente
responsabilidade da autoridade omitente. [243]
Entretanto, do ponto de vista da igualdade formal da
educação, a concretização da educação como "direito de todos e dever do
Estado e da família" depende da efetiva aplicação do princípio da
igualdade da educação (art. 205 e art. 206, inc. I, da Constituição Federal).
Neste caso, há real impossibilidade de considerar os alunos em igualdade de
condições, sem levar em conta as diferenças socioeconômicas de suas famílias.
No caso em tela, também são oportunos os comentários de
Renato Teodoro Di Dio, quando afirma que muito resta por fazer: "eliminar
as disparidades entre escolas rurais e escolas urbanas, entre escolas de
clientela pobre e de clientela rica; criar escolas especiais para excepcionais e
para superdotados". [244]
Para nós, como já comentamos, não há capítulos da
Constituição autônomos e que tampouco podemos analisar os princípios do ensino
(art. 206 e incisos) sem harmonizá-los com os princípios básicos do Estado
democrático de direito (arts. 1º e 3º da Constituição Federal). [245]
A igualdade de condições de acesso à educação e permanência na escola
depende de um governo comprometido com os fundamentos e os objetivos
fundamentais constitucionais, chamados princípios fundamentais da República Federativa
do Brasil, bem como de ação ou política afirmativa.
Por fim, as normas-princípio do direito educacional
ganharam corpo com o advento da Constituição Federal de 1988 e com a nova Lei
de Diretrizes e Bases da Educação, que reconhecem o direito público subjetivo à
educação. E, no caso de não-oferecimento ou de oferta irregular do ensino
obrigatório, como veremos no próximo capítulo, a Constituição e algumas
legislações infraconstitucionais indicam expressamente os instrumentos
jurídicos colocados à disposição do cidadão para exigir do poder público o
cumprimento da prestação educacional. Trata-se, na realidade, de princípio de
ordem pública, porque diz respeito à cidadania, ao interesse público e à
educação como direito fundamental.
CAPÍTULO IV
DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO À
EDUCAÇÃO
Sumário: 1. Breves considerações; 2. Direito
público subjetivo;3. Direito à educação; 4. Instrumentos de tutela à educação.
Mostraremos neste capítulo que tanto a doutrina, como a
legislação e a jurisprudência reconhecem a educação, hoje, como direito público
subjetivo de caráter cogente e coercitivo, com instrumentos de tutela para
acesso à justiça. Nessa linha de raciocínio, no primeiro momento,
apresentaremos noções de direito subjetivo e de direito público subjetivo. Num
segundo momento, discorreremos sobre o cerne do direito educacional,
analisando, por um lado, a discussão doutrinário e a consolidação, em nível
constitucional e infraconstitucional, do direito público subjetivo à educação,
e, por outro, tratando dos instrumentos de tutela à educação, ressaltando a
importância do Ministério Público, da ação civil pública e dos juizados
especiais cíveis no acesso à justiça em matéria educacional.
1. Breves considerações
A primeira questão que se pode colocar é a seguinte: o
direito subjetivo é algo dado ou é construído pelo direito objetivo? Do ponto
de vista histórico, os direitos subjetivos são produto de um movimento
ideológico democrático e liberal, destinado a proteger o indivíduo dos excessos
do absolutismo estatal. Na sua origem, estão os movimentos políticos do
liberalismo e do capitalismo, de que são também manifestações jurídicas as
declarações políticas dos direitos do homem e do cidadão. [246] Por
outro lado, os direitos subjetivos são permissões dadas por meio de normas
jurídicas (direito objetivo). Tais permissões, por serem dadas através de
normas jurídicas, chamam-se permissões jurídicas. O direito subjetivo não se
acha fora das pessoas que o detêm; não se coloca diante delas. Pelo contrário,
as permissões constitutivas de tal direito, após serem concedidas e assumidas,
se incorporam a seus titulares, como qualidades próprias deles. [247]
É subjetivo, segundo Goffredo Telles Jr., porque as permissões que o constituem
são próprias das pessoas que as possuem. São permissões que lhes pertencem,
podendo ser usadas ou não por elas. Portanto, são permissões que a elas se
sujeitam e que, de certa maneira, estão dentro delas. [248]
Há teorias que negam a existência do direito subjetivo,
[249] no entanto três teorias da doutrina tradicional consagram e
reconhecem a existência do direito subjetivo: teoria da vontade, teoria do
interesse e teoria mista ou eclética. Inicialmente, dois grandes juristas
discutiram o tema, situando-se em posições antagônicas: Windscheid e Ihering.
Para o primeiro, o direito subjetivo é sempre uma expressão da vontade –
entendido esse termo como poder de vontade conferido pela ordem jurídica –,
enquanto para Ihering, "o direito subjetivo é o interesse juridicamente
protegido". Segundo Miguel Reale, esse grande jurisconsulto sustentava que
a essência do direito subjetivo não é a vontade, mas sim o interesse. Tomava
ele a palavra interesse no sentido mais lato possível, indicando tanto o
interesse para as causas concretas e materiais, como para as de natureza ideal
ou intelectual, como seria, por exemplo, o interesse por uma obra de arte.
[250]
Como se vê, a teoria de Ihering, como teoria objetiva,
contrapõe-se à de Windscheid, na condição de teoria subjetiva. Enquanto para
este pandectista o direito subjetivo é um fenômeno da vontade, para Ihering é
algo de objetivo, pois é o interesse que, por seu caráter social, o direito
protege. [251]
As teorias mistas procuram conciliar o direito subjetivo
com o direito objetivo, Coube, neste caso, a Georg Jellinek, elaborar a teoria
eclética, que combina e funde as anteriores, chegando à seguinte definição:
"Direito subjetivo é o poder da vontade humana que, protegido e
reconhecido pela ordem jurídica, tem por objeto um bem ou interesse."
[252]
2. Direito público subjetivo
A teoria dos direitos públicos subjetivos nasce na França,
com o triunfo do liberalismo em seguida à Revolução Francesa. Os
jusnaturalistas, sobretudo no século XVIII, sustentavam que os indivíduos
possuem direitos naturais públicos subjetivos em virtude do contrato social
por eles contraído para sua própria garantia. [253]
Para Miguel Reale, o problema dos direitos públicos
subjetivos é histórico-cultural, porquanto representa um momento de ordenação
jurídica, atendendo a uma exigência social que se processa, independentemente
do arbítrio e da vontade daqueles que, transitoriamente, enfeixam em suas mãos
o poder político. [254] O reconhecimento das liberdades individuais,
contrapostas ao absolutismo estatal, exigia do direito estruturas jurídicas
capazes de garantir a eficácia de tais liberdades, identificando os poderes e
deveres existentes nas relações jurídicas entre o indivíduo e o Estado e
tornando-os objetivo de tutela jurisdicional específica. Tais estruturas se
consubstanciaram no direito subjetivo público. [255]
Esta teoria representa uma conquista da época moderna, que
atinge a sua força teórica e doutrinária tão-somente na segunda metade do
século XIX. A propósito, até época bem recente, nem sequer passava pela cabeça
dos tratadistas a idéia, hoje fundamental, da existência de direitos públicos
subjetivos. [256] Para uns, o direito público subjetivo deriva do
Estado e só é admissível nos limites que ele estabelece, enquanto para outros o
direito público subjetivo está contido nas relações que o "Estado",
por ser titular de direitos perante os cidadãos, com eles mantém, resultando
dessas relações, conseqüentemente, direitos dos cidadãos perante o
Estado.
Do ponto de vista jurídico, o direito subjetivo público é
uma facultas agendi pública, que tanto pode ter como titular o Estado
quanto o particular. De um lado, o estado tem a faculdade de exigir do
administrado o cumprimento de prestações; de outro lado, o particular tem a
faculdade de exigir do Estado o cumprimento de diversas prestações. Há,
portanto, direito público subjetivo "do administrado" e direito
público subjetivo "da administração", que recebem proteção
jurisdicional, mediante o emprego de vários instrumentos ou garantias
jurídicas. [257]
Atualmente, segundo Francisco Amaral, quando o social
predomina sobre o particular, não mais se justifica a distinção jurídica entre
o direito subjetivo público e o direito subjetivo privado. Trata-se de
considerar o direito subjetivo como prerrogativa individual contida nas
relações jurídicas dos particulares entre si ou com o Estado, ambos
subordinados à ordem jurídica, sob o império da constitucionalidade e da
legalidade. [258] Aqui no Brasil, como ocorre com a quase totalidade
das Constituições contemporâneas, o direito público subjetivo, devido à
relevância da matéria, encontra-se no texto constitucional.
Para conhecer e saber quais os direitos públicos
subjetivos fundamentais, basta examinar os títulos I e II da Constituição
Federal, sobretudo os capítulos I (Dos direitos e deveres individuais e
coletivos), II, III, IV. Na lição de Miguel Reale:
"Tais declarações de Direito durante muito tempo
tiveram apenas um sentido jurídico-político, limitando-se a estabelecer
garantias de ação aos indivíduos contra o Estado ou no Estado. No decorrer do
século XX, porém, em continuação a um processo histórico iniciado em épocas
anteriores, as Declarações de Direito passaram a ter um caráter mais social e
econômico." [259]
Acrescente-se que os direitos públicos subjetivos
fundamentais recebem proteção jurisdicional, mediante remédios constitucionais.
[260] Nesse passo, segundo Manoel Gonçalves Ferreira Filho, os
ensinamentos de Alfredo Buzaid são precisos quando afirma:
"O remédio constitucional é uma espécie de ação
judiciária que visa a proteger categoria especial de direitos públicos
subjetivos." [261]
A educação, como direito social fundamental (art. 6º da
Constituição Federal), é protegida por uma série de garantias que procuram
efetivar a prestação educacional pelo Estado (art. 208 da Constituição Federal).
A educação é um direito fundamental do homem, na condição de direito público
subjetivo à educação, mas, sobretudo, como algo inerente à própria existência
humana, que o Estado deve respeitar, proporcionando educação para todos.
3. Direito à educação
É provável, como já vimos, que Pontes de Miranda tenha
sido o primeiro jurista a discutir, a defender e a definir o direito à educação
como um direito público subjetivo. Cabe assinalar, também, que o direito à
educação serve para ilustrar os tema dos direitos subjetivos públicos, no
entanto, não podemos confundir o direito à educação com o direito subjetivo
público à educação. Aliás, como afirma o constitucionalista Maurício Antônio
Ribeiro Lopes:
"O direito que todos têm ou teriam à educação,
direito declarado, não é a solução melhor, mais perfeita, mais humana. Cumpre
elevar, mediante pretensão, ação e remédio processual adequado, o direito à
educação à categoria de realidade exigível, pela aplicação de sanções a quem
não o cumpre." [262]
Para Edivaldo Boaventura, Pontes de Miranda, com sua
larga e profunda cultura filosófica e jurídica, avançou tanto ou mais do que os
educadores na defesa dos direitos educacionais de natureza constitucional.
[263] Nos comentários à Constituição de 1967, textualmente assim se
expressou Pontes de Miranda:
"A ingenuidade ou a indiferença ao conteúdo dos
enunciados com que os legisladores constituintes lançam a regra ‘A educação é
direito de todos’ lembra-nos aquela Constituição espanhola em que se decretava
que todos os espanhóis seriam, desde aquele momento, ‘buenos’. A educação
somente pode ser direito de todos se há escolas em número suficiente e se
ninguém é excluído delas; portanto, se há direito público subjetivo à educação
e o Estado pode e tem de entregar a prestação educacional. fora daí, é iludir o
povo com artigos de Constituição ou de leis. Resolver o problema da educação
não é fazer leis, ainda que excelentes: é abrir escolas, tendo professores e
admitindo alunos." [264]
Na mesma direção, Esther de Figueiredo Ferraz afirma:
"É que não existe um direito público subjetivo à
educação, isto é, um direito cuja prestação pudesse ser exigida do poder
público através de ação intentada contra a União, o Estado e o Município."
[265]
Contudo, não podemos deixar de assinalar a importante
contribuição da Constituição de 1934, pois foi a primeira que tratou a educação
como direito de todos e a mais rica no que diz respeito à educação, embora não
tenha recepcionado norma sancionadora ao Estado por falta de prestação
educacional. É oportuno transcrever seu art. 149:
"A educação é direito de todos e deve ser
ministrada pela família e pelos poderes públicos, cumprindo a estes
proporcioná-la a brasileiros e a estrangeiros domiciliados no país, de modo que
possibilite eficientes fatores da vida moral e econômica da Nação e desenvolva
no espírito brasileiro a consciência da solidariedade humana."
A Carta Constitucional de 1934 além disso foi a primeira
que falou em educação popular e determinou que o poder público, em especial a
União e os municípios, aplicassem nunca menos de 20% da renda resultante dos
impostos na manutenção e no desenvolvimento dos sistemas educacionais (art.
156). Não temos dúvida de que ela representou um passo adiante no processo de
modernização da educação, incluindo um título para a família, a educação e a
cultura (Título V). A educação veio a receber maior atenção dos constituintes
de 1934 – com todo um capítulo a ela destinado –, partindo de bases renovadores
e descentralizadoras, por influência dos pioneiros da Escola Nova, com Fernando
de Azevedo e Anísio Teixeira à frente. [266]
Nesse contexto, no que tange o disposto no art. 149 do
texto constitucional, trata-se de norma constitucional inócua, meramente
programática, pela ausência do caráter cogente e coercitivo da matéria
educacional. As Constituições que se seguiram (1937, 1946, 1967, 1969) foram
omissas quanto à necessidade de sanções a quem não cumpre a prestação
educacional. É inegável, no entanto, que a doutrina brasileira recepcionou
longa discussão sobre a educação como direito público subjetivo, exigindo do
legislador incluir a obrigação de educar.
Pontes de Miranda, citado pela educadora e jurista Esther
de Figueiredo Ferraz, sustentou na conferência da Ordem dos Advogados em 1965 –
tese nº XV, sob o título "O acesso à cultura como direito de todos" –
que fosse criado para todos o direito subjetivo à educação, no sentido de que o
cidadão pudesse estar armado de uma ação capaz de exigir do Estado a prestação
educacional. E acrescenta que a melhor solução é dar-se legítima ação ativa aos
pais para exercerem, em nome dos filhos, a pretensão e a ação. Qualquer cidadão
deve ter o direito de ingressar em juízo com ação popular, para exigir do
Estado que lhe dê educação ou a outrem, que não tenha capacidade de ingressar
em juízo por ser menor. [267]
Além de Pontes de Miranda, assumiram a frente da luta
pelos direitos educacionais: San Tiago Dantas (1955), Esther de Figueiredo
Ferraz (1969), Renato Alberto Theodoro Di Dio (1970-1981), Lourival Vilanova
(1982-1983). Eles lutaram, como esclarece Edivaldo Boaventura, para efetivação
não somente do direito à educação, como também do direito educacional.
[268] A nosso ver, o direito à educação é faculdade concedida ao indivíduo,
ao passo que o direito educacional diz respeito à norma, à lei
reguladora das relações jurídico-educacionais entre o Estado, a instituição de
ensino, o aluno e o professor, que inclui o direito público subjetivo à
educação. Nesse sentido, Esther de Figueiredo Ferraz relaciona a educação com o
direito, insistindo em que se considere a educação como um direito público
subjetivo, mas lembrando a necessidade de uma ação correspondente, que possa
ser requerida pelo Estado. Conclui, então, pela existência do direito
educacional:
"De maneira que existe o Direito Educacional no
sentido objetivo, ou seja, no sentido de um conjunto, de um riquíssimo conjunto
de normas e princípios jurídicos regulamentadores da atividade educacional,
desenvolvida pelo Estado e pelas pessoas e entidades particulares, por ele
autorizadas e fiscalizadas." [269]
É histórico no Brasil que o poder público não cumpra de
maneira satisfatória a prestação educacional, apesar do texto constitucional
declarar que a educação é direito de todos. Acrescente-se que o não
oferecimento ou o oferecimento irregular da prestação educacional é uma dívida
histórico do poder público, que importa responsabilidade do Estado. Daí, como
sustentam os renomados juristas já mencionados, é necessário o reconhecimento
no texto constitucional do direito público subjetivo à educação e a existência
de garantias, de sanções, de remédios judiciais adequados e eficazes.
[270]
Todas essas questões no processo educacional brasileiro, e
as longas discussões que engendraram, finalmente foram consolidadas na
Constituição de 1988. Tanto na doutrina, quanto na legislação, especialmente na
atual Constituição, a educação finalmente é direito público subjetivo, e a
negligência por parte do poder público na prestação do serviço importa crime de
responsabilidade. Certo estava Pontes de Miranda.
Eis portanto o cerne do direito educacional: de um lado
temos o dever do Estado com a educação (art. 208 da Constituição Federal); de
outro, o art. 5º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que, além de repetir
que o acesso ao ensino fundamental é direito público subjetivo, acrescentou que
qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização
sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída e o Ministério Público
podem acionar o poder público para exigi-lo. Assim como disposição contida no
Estatuto da Criança e do Adolescente, no art. 54, § 1º: "O acesso ao
ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo." [271]
Para o educador e jurista Edivaldo Boaventura:
" ‘A educação é direito de todos, dever do Estado
e da família.’ De um lado, temos a pessoa humana portadora do direito à
educação e, do outro, a obrigação estatal de prestá-la. Em favor do indivíduo
há um direito subjetivo; em relação ao Estado um dever a cumprir. Se há um
direito público subjetivo à educação (vide § 1º, do art. 208), isso quer dizer
que o particular tem a faculdade de exigir do Estado o cumprimento da prestação
educacional pelos poderes públicos (vide § 2º, do art. 208). O seu não
oferecimento importa na responsabilidade da autoridade competente. A
Constituição poderá fazer muito pela Educação no sentido de sua promoção,
colocando em prática os meios jurídicos para efetivá-la como um direito público
subjetivo. Finalmente o legislador atendeu aos reclamos da doutrina."
[272]
Na mesma direção, o constitucionalista Maurício Antônio
Ribeiro Lopes é bastante enfático:
"O art. 208, § 1º da Constituição vigente não
deixa a menor dúvida a respeito do acesso ao ensino obrigatório e gratuito que
o educando, em qualquer grau, cumprindo os requisitos legais, tem o direito
público subjetivo, oponível ao Estado, não tendo este nenhuma possibilidade de
negar a solicitação, protegida por expressa norma jurídica constitucional
cogente." [273]
Nas palavras de Elias Oliveira da Motta, tanto o art. 208,
§ 1º e 2º da Constituição de 1988, quanto o seu correspondente em nível
infraconstitucional, no caput do art. 5º e parágrafos 3º e 4º da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação são instrumentos educativos e coercitivos
eficientes no combate à indiferença das autoridades, principalmente as
municipais, em relação à democratização da educação. [274] Trata-se
de direito público subjetivo fundamental, até porque o §4 do art. 5º da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação dispõe o seguinte:
"Comprovada a negligência da autoridade competente
para garantir o oferecimento do ensino obrigatório, poderá ela ser imputada por
crime de responsabilidade."
Prossegue Elias de Oliveira Motta, na obra Direito
educacional e educação no século XXI: em primeiro lugar, a previsão de
punibilidade para os negligenciadores, por si só, já é um grande avanço e
demonstra a preocupação de nossos legisladores em tornar efetivo o direito à
educação; em segundo lugar, essa possibilidade de imputação por crime de
responsabilidade é um instrumento nas mãos da sociedade para que qualquer
pessoa que se sinta lesada pela omissão de alguns dos poderes públicos possa
exigir o respeito à educação e, ao mesmo tempo, contribuir para a redução do
número de crianças fora das escolas. [275]
No entanto, para que se consiga a efetivação da educação
como direito público subjetivo nas relações juspedagógicas que envolvem as
instituições de ensino, o Estado (em seus três níveis: União, estados ou
distrito federal e municípios) e os alunos, é necessária, além disso, uma ordem
constitucional de remédios, ações, garantias fundamentais e entidades ou órgãos
governamentais e não-governamentais, aqui, como instrumentos de tutela à
educação para facilitar o acesso à justiça em matéria educacional.
4. Instrumentos de tutela à educação
Diversos são os instrumentos ou medidas judiciais à
disposição dos alunos ou responsáveis pelos alunos, instituição de ensino,
professores, funcionários administrativos e governo na área do direito
educacional. Porém, antes de identificarmos os instrumentos e garantias
constitucionais utilizados nas relações jurídicas e conflitos educacionais
vamos, em primeiro lugar, apresentar um breve comentário sobre o acesso à
justiça e ações constitucionais.
O advento do direito constitucional de ação é uma
conquista da evolução da ciência jurídica que teve, num primeiro momento, o
reconhecimento do direito de ação como direito de acesso à justiça. Todo
cidadão tem o direito de pedir ao judiciário que obrigue o autor da lesão a
reparar o ato danoso que praticou. E nisto, justamente, consiste o direito de
ação. [276] Trata-se, neste caso, de efetiva contribuição dos
estudiosos filiados à doutrina da ação como direito autônomo e abstrato, que
concebe a ação como direito subjetivo público à composição do litígio pelo
Estado.
A acepção tradicional do termo direito de ação não
permitia reconhecê-la como direito de acesso à justiça. A partir do momento em
que as ações e os relacionamentos assumiram um caráter cada vez mais coletivo e
complexo do que individual, o "acesso à justiça" passou a ser básico
e fundamental como garantia do exercício da cidadania. O conceito de acesso à
justiça tem sofrido transformações importantes. [277]
Acesso à justiça, entretanto, não significa apenas
possibilidade de ingresso em juízo, nem tampouco a mera admissão ao processo
judicial, significa, também, "acesso à ordem jurídica justa". Para
que exista efetivo acesso à justiça, é indispensável, ainda, que o maior número
possível de pessoas seja admitido a demandar e a defender-se adequadamente. No
caso brasileiro, para que o acesso à justiça seja efetivo, é necessário que o
poder público resgate os direitos civis do cidadão brasileiro, os quais, até
hoje, continuam muitos deles inacessíveis à maioria da população.
Mauro Cappelleti afirma que há barreiras ao acesso à
justiça. Uma barreira fundamental é a do acesso dos despossuídos à justiça,
porém essas barreiras não afetam apenas os pobres. [278] Para nós, o
acesso à justiça depende do acesso à educação, haja vista que, sem
conhecimentos jurídicos básicos, em razão do baixo nível de educação, o cidadão
não terá condições de utilizar os instrumentos de tutela constitucional e,
tampouco, as medidas judiciais. Segundo Boaventura de Souza Santos, estudos
revelaram que:
"a discriminação social no acesso à justiça é um
fenômeno muito mais complexo do que à primeira vista pode parecer, já que, para
além das condicionantes econômicas, sempre mais óbvias, envolve condicionantes
sociais e culturais resultantes do processo de socialização e da interiorização
de valores dominantes muito difíceis de transformar. (…) Estudos, também,
revelaram que a distância dos cidadãos em relação à administração da justiça é
tanto maior quanto mais baixo é o estrato social a que pertencem, e que essa
distância tem como causas próximas não apenas fatores econômicos, mas também
sociais e culturais…" [279]
No mesmo sentido, mas em relação aos princípios que
informam o acesso à justiça, o professor Paulo Cezar Pinheiro Carneiro afirma o
seguinte:
"O conhecimento dos direitos que temos e como
utilizá-los é o ponto de partida e, ao mesmo tempo, de chegada para que o
acesso à justiça seja real e alcance a todos."
Prosseguindo, observa ainda o autor:
"O direito à informação, como elemento essencial
para garantir o acesso à justiça em países em desenvolvimento como o nosso é
tão importante como o de ter um advogado, um defensor, que estejam à disposição
daqueles necessitados que, conhecedores dos seus direitos, querem exercê-los.
Trata-se de pessoas que não têm condições sequer de serem partes – os
"não-partes" são pessoas absolutamente marginalizadas da sociedade,
porque não sabem nem mesmo os direitos de que dispõem ou como exercê-los;
constituem o grande contingente de nosso país." [280]
Os remédios constitucionais, como o mandado de segurança
(art. 5º, LXIX e LXX, b, da Constituição Federal) e outras garantias
constitucionais, como veremos a seguir, são postos à disposição dos cidadãos
para que estes provoquem a intervenção do Poder Judiciário (art. 5º, inc. XXXV
da Constituição Federal). Alguns deles têm a natureza de ações e garantias
constitucionais. Eles são instrumentos destinados a assegurar o gozo de
direitos violados ou em vias de serem violados ou simplesmente não atendidos.
[281]
Em nível infraconstitucional, presente nas relações
jurídicas educacionais, temos o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº
8.078/90, arts. 81, 82, 83, 84, 87 e 91), que introduziu pela primeira vez na
legislação brasileira o conceito legal de interesses ou direitos coletivos;
interesses ou direitos difusos; e interesses ou direitos homogêneos. [282]
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90) destina o capítulo IV
ao direito à educação (arts.
No mesmo sentido, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
(Lei nº 9.394, de 26.12.1996), no caput do art. 5º, estabelece que o
acesso ao ensino fundamental corresponde a direito público. E menciona, também,
quem está legitimado para acionar o Poder Público no caso de não oferecimento
ou mesmo de oferta irregular do ensino público (art. 208, § 2º, da Constituição
Federal), a fim de garantir o acesso ao ensino obrigatório. Neste caso,
qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização
sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída e ainda o
Ministério Público (caput do art. 5º) têm legitimidade para proporem
ações judiciais contra o Poder Público, com direito à gratuidade e rito
sumário, como garantia à educação (art. 5º, § 3º, Lei nº 9.394/96). [284]
Já em nível constitucional, por força do disposto no art.
129, III, ampliou-se a legitimidade do Ministério Público. Hoje, mais do que
nunca, o ordenamento jurídico brasileiro elevou a ação civil pública, com
ampliação de seu objeto, à categoria de ação constitucional. Reservou,
igualmente, um importante papel ao Ministério Público, como guardião da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis. Trata-se, neste caso, de abertura da legitimidade para agir,
mediante legitimação do Ministério Público e de corpos intermediários, como associações,
entidades sindicais, partidos políticos e outras entidades organizadas para a
defesa de interesses difusos e coletivos. O constitucionalista Maurício Antônio
Ribeiro Lopes, a propósito, leciona:
"O Ministério Público poderá demandar contra o
poder público para exigir o acesso à educação pelos meios já expostos, com
exceção do mandado de segurança coletivo, por lhe faltar legitimidade
processual."
Prossegue ainda o autor, com muita propriedade:
"O Ministério poderá, principalmente, por força no
disposto no art. 129, III, da Constituição Federal, art. 25, inc. IV, a, da Lei
nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), no art. 5º da Lei nº
7.347/85, propor ação civil pública e nos arts. 201, inc. V, e 210, inc. I, do
Estatuto da Criança e do Adolescente." [285]
Uma pesquisa de campo realizada no Rio de Janeiro, nos
últimos quatro anos, sobre os Juizados Especiais Cíveis e ação civil pública,
revelou que os órgãos públicos em geral (Ministério Público, Defensoria Pública
e municípios) respondem por 87% das ações civis públicas propostas, cabendo às
associações a parcela de 10,34%, sendo 44% na defesa aos direitos relativos ao
meio ambiente. [286] Vê-se, então, que o acesso à Justiça,
principalmente em defesa de interesses individuais homogêneos, em matéria
educacional, fica dependente da iniciativa do Ministério Público. Para nós, a
proteção dos direitos ou interesse homogêneos nas relações
jurídico-educacionais, através da ação civil pública, é uma importante
contribuição para a área do direito educacional.
Entendemos, por iguais razões, que o Ministério Público
e a ação civil pública são instrumentos eficazes de tutela à educação nos
conflitos específicos entre os atores que fazem parte desse cenário:
instituições de ensino, governo, alunos ou responsáveis pelos alunos,
funcionários administrativos e professores. Aqui o Poder Judiciário ganha
maior destaque e utilidade quando tutela interesses transindividuais na área
educacional. aliás, já comentamos que a jurisprudência dos tribunais, no que
concerne à matéria educacional, tem colaborado efetivamente para a
sistematização e a autonomia do direito educacional. A adequação da doutrina
com a jurisprudência em torno do direito público subjetivo à educação, do
Ministério Público e da ação civil pública contribui efetivamente para um
tratamento sistemático sobre o assunto. É inegável, a nosso ver, que a
iniciativa do Ministério Público sobre questões de direito educacional tem
aumentado:
"Não é ilegal a exigência de contrato de prestação
de serviços educacionais como condição de matrícula em colégio particular. Na
verdade, a lei não define o chamado direito difuso, embora dele outra ilação
não se possa tirar senão a de que só restará caracterizado quando não se
consiga precisar a quem pertence tal interesse. Os exemplos mais freqüentes são
o meio ambiente e o ar que todos respiram. Assim, na relação contratual
aluno—escola particular não há interesse coletivo na sua universalidade, ou
difuso, mas partes certas, determinadas e conhecidas. Contudo, esta Corte vem
admitindo, reiteradamente, ação do Ministério Público em ações idênticas,
razão pela qual se afasta a ilegitimidade proclamada." (TJ - SC - Ac.
Unân. da 2ª Câm. Civ., publicada em 21.05.93. AI 7.171 - Rel. Des. Xavier
Vieira - Colégio São José x Ministério Público.)
"As ações de responsabilidade por ofensa aos
direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento
ou oferta irregular do ensino obrigatório regem-se pelas disposições do ECA
(art. 208, I), ostentando o Ministério Público legitimidade para promovê-las
(EC, art. 201, incs. V e IX)." (TJSP, agr. 39.392.0/8, Rel. Des. Luís
de Macedo, 30.07.98.)
"O mandamus que visa assegurar a criança
com sete anos incompletos matrícula no ensino fundamental obrigatório e gratuito
qualifica-se como ação civil mandamental, fundada no direito individual das
crianças a tal ensino, competindo à Justiça da Infância e da Juventude conhecer
e julgá-las nos termos do art. 148, inc. IV, e 209 do ECA." (TJSP,
apel. 42.840-0/0, Rel. Des. Djalma Lofrano, 04.06.98.)
Dentro da ordem de garantias das partes no processo
educacional, o mandado de segurança é um remédio jurídico de largo emprego na
área escolar, educativa e acadêmica, protegendo o estudante, o professor, o
servidor, a escola e a universidade. Este procedimento já tem emprego
tradicional na educação.
"Compete à Justiça Federal processar e julgar
mandado de segurança contra ato praticado por dirigente de estabelecimento
particular de ensino superior." (STJ - Ac. unân. da 1ª Seç. Públ., em
16.08.93 - Confl. Comp. 4.923-3 DF. Rel. Min. Hélio Mosimann - Diretório
Central dos Estudantes do Centro de Ensino Unificado de Brasília (DCE-CEUB) x
Presidente do Centro de Ensino Unificado de Brasília - Advª Theresinha Moura.)
"Cuidando-se de litígio entre estudante e
estabelecimento de ensino particular, em torno da validade da matrícula obtida
por força de liminar ante sua aprovação em exame vestibular, a competência é da
Justiça estadual." (TJ/RJ - Ac. unân. da 2ª Câm. Civ., em 13.04.93.
Relª Desª Maria Stella – Sociedade Brasileira de Instrução x Marcela Rodrigues
Machado.)
Parece-nos, porém, que apenas com a existência dos
instrumentos de tutela à educação, sem o desenvolvimento de políticas públicas
na área da educação, não teremos uma real garantia de direito à educação. Neste
caso, vale lembrar os ensinamentos do renomado jurista Pontes de Miranda:
"resolver o problema da educação não é fazer leis, ainda que
excelentes: é abrir escolas, tendo professores e admitindo alunos"
[grifos nossos]. [287] O magistrado Urbano Ruiz, por sua vez,
comentou, no jornal Folha de São Paulo:
"O que fazer se a Constituição Federal (art. 205)
declara: educação é direito de todos e dever do Estado e da família, tanto que
o ensino fundamental é obrigatório e gratuito (ECA, art. 54, inc. I).
Entretanto, num caso concreto, faltam vagas na rede de ensino público. Segundo
ele, problema dessa ordem foi eficientemente resolvido, recentemente, na cidade
de Rio Claro (SP), onde o promotor de Justiça, dando-se conta dessa tragédia,
resolveu apurar junto à Delegacia de Ensino quantas vagas faltavam no ensino
fundamental, de responsabilidade do município, e promoveu ação civil pública
(ECA, art. 211, § 2º), além de responsabilizar penalmente o prefeito, se
comprovada a sua negligência (art. 5º caput e parágrafos 3º e 4 º da
LDB). O juiz, logo após a audiência prévia dos interessados, determinou,
liminarmente, a criação das vagas faltantes, de maneira que, a todas as
crianças em idade escolar, fosse garantido o direito à educação." [288]
Este é um exemplo real da eficácia do direito público
subjetivo à educação. Os remédios ou garantias constitucionais colocados à
disposição do cidadão comum e dos operadores do direito (advogados, promotores
públicos, juízes, defensores públicos, procuradores) já são conhecidos, até
porque são utilizados na composição dos conflitos educacionais: ação civil
pública, mandado de segurança, mandado de injunção, habeas data –
citamos alguns deles que têm emprego tradicional na educação. É certo que, além
dos instrumentos de tutela à educação já mencionados, existem outros direitos e
garantias constitucionais que não se referem expressamente à educação nem ao
ensino. Assim, há outros instrumentos ou mecanismos postos à disposição de
alunos, instituições de ensino e governo que integram a relação jurídica
educacional.
Há institutos e normas jurídicas do direito civil, do
direito do consumidor e do processo civil aplicadas nas relações jurídicas
educacionais. O contrato escolar, por exemplo, faz parte das relações
juspedagógicas, visto que um estabelecimento de ensino, seja particular ou
público, celebra contrato de adesão escrito ou tácito com os alunos. É
possível, então, que ocorram casos de não cumprimento das cláusulas contratuais
ou da prestação de serviços educacionais e, por isso, surjam os pedidos de
tutela jurisdicional. Nas causas educacionais ocorrem, também, pedidos
específicos de indenização por danos morais, obrigação de fazer, obrigação de
não fazer, com tutela antecipada, que exigem respostas do Poder Judiciário
(arts.
Na investigação das relações entre educação e direito é
preciso pesquisar mais a fundo a competência dos Juizados Especiais Cíveis. É
inegável, no entanto, a importância do Juizado Especial Civil instituído pela
Lei nº 9.099/95, nas causas de menor complexidade ou de reduzido valor
econômico (art. 3º). Neste caso, podemos incluir os conflitos jurídicos
específicos entre as instituições de ensino e os alunos, diretamente ou por
meio de suas famílias. [289] Aqui, com a opção pelo procedimento do
Juizado, onde prevalece a técnica de composição dos conflitos através da
conciliação, evitam-se seqüelas entre alunos ou pais de alunos, instituição de
ensino e a sociedade em geral.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No início desta dissertação destacamos a seguinte
indagação: como o direito tem visto e contribuído para a educação
brasileira? De certo modo, ao longo da investigação, conseguimos demonstrar
as relações existentes entre educação e direito. Tentou-se, da mesma forma,
mostrar as contribuições do direito para a superação da fase legislativa da
educação e, por conseguinte, para a sistematização do direito educacional.
Chegamos agora à etapa final da dissertação, mas sem pretensões de concluí-lo
de forma definitiva, visto que a ciência é um processo de construção.
Justifica-se por isso, também, não apresentarmos uma análise conclusiva, em
virtude da característica incipiente e inovadora do direito educacional.
Contudo, não nos furtaremos a apresentar um esboço modesto
das principais idéias contidas na dissertação e de expor nossa posição no que
diz respeito à sistematização e à possível autonomia do direito educacional.
Parece-nos que a educação e o direito não expressam apenas o que existe, mas
sobretudo o que se deseja e aquilo por que se luta. Decorre daí o fato de
termos utilizado um enfoque interdisciplinar e crítico, embora preservando o
núcleo de idéias vinculadas à educação e ao direito.
Devido a abrangência do tema e seu estudo recente, no
capítulo I procurou-se delimitar a análise histórico-conceitual acerca das
diferentes concepções de educação para facilitar a compreensão das relações
entre educação e direito. Com isto, percebeu-se o aspecto positivo das
contribuições da filosofia, teologia, sociologia e pedagogia para o nosso tema.
Aliás, nesse capítulo, observamos que, ao contrário do direito contribuir para
a educação, as diferentes concepções da educação contribuíram para a construção
do conceito jurídico de direito à educação.
Da mesma forma, discutiu-se a idéia da educação como dever
do Estado e direito social do cidadão como contribuições efetivas na defesa do
direito público subjetivo à educação. Ademais, o enfoque interdisciplinar
adotado ao longo do primeiro capítulo permitiu o levantamento bibliográfico de
vários autores clássicos que expressaram suas concepções sobre a educação.
Destacamos, aqui, o filósofo e educador americano John Dewey como paradigma
para resumirmos a concepção democrática de educação em três épocas diferentes.
As idéias desse autor, como vimos, tiveram grande peso no
movimento escola nova no Brasil e, por conseqüência, exerceram influência na
formação de Anísio Teixeira, educador brasileiro que seguiu a perspectiva do
pragmatismo filosófico e educacional de Dewey. Para Anísio Teixeira, uma
efetiva renovação educacional somente é possível se fundamentada em rigorosas
bases científicas.
Constatamos, também, a importante contribuição do jurista
e filósofo do direito Pontes de Miranda, com sua obra inédita na área de
sociologia jurídica publicada em 1933, intitulada Direito à educação.
Iniciava-se, então, uma longa luta pelos direitos à educação e pelos direitos
subjetivos públicos à educação no Brasil.
No segundo capítulo, iniciamos a investigação da relação
entre o direito e o direito educacional. Para isto, adotamos a concepção do
direito como ciência jurídica para depois introduzir o estudo do direito
educacional. Trata-se de um aspecto positivo da análise, como contribuição para
a superação da fase legislativa da educação e aplicação da teoria tradicional
do direito ao direito educacional, novo ramo da ciência jurídica. São evidentes
as dificuldades de conceituação do direito, quer seja como ciência jurídica ou
doutrina jurídica, quer seja na condição de teoria da norma. Igualmente observamos
que há dificuldades na conceituação do direito educacional, até porque trata-se
de um novo ramo do saber jurídico, que depende reciprocamente dos estudiosos e
especialistas das áreas de educação e do direito.
Todavia, de certo modo conseguimos apresentar alguns
conceitos do direito educacional que contribuem para a construção da doutrina
ou da ciência jurídica educacional. Nesse sentido, parece válido destacar o
conceito do educador e jurista Edivaldo Boaventura, que concebe o direito
educacional como "um conjunto de normas, princípios e doutrinas que
disciplinam a proteção das relações entre alunos, professores, escolas, família
e poderes públicos, numa situação formal de aprendizagem".
No capítulo terceiro fizemos um esforço epistemológico
para introduzir as tradicionais fontes do direito e de princípios do direito na
investigação e sistematização do direito educacional. Optamos, portanto, pelas
fontes formais da teoria tradicional (lei, costumes, jurisprudência e
doutrina), para, em seguida, analisar os princípios do direito e do direito
educacional.
Nesse contexto, por termos adotado no Brasil o sistema
jurídico da tradição romanista (Civil Law) – ao contrário dos Estados
Unidos da América e da Inglaterra, que adotaram o da tradição anglo-americana (Commom
Law) –, a legislação é a principal fonte do direito e, por conseguinte, uma
das expressões mais importantes do direito educacional.
A fonte primeira do direito educacional no Brasil, como
vimos, está na Constituição Federal, desde a Constituição do Império
(Constituição de 1824), até o nosso recente texto constitucional de
No que concerne aos costumes como fonte do direito,
procuramos explicar que há uma força maior do direito costumeiro em certos
sistemas de direito (como na tradição anglo-americana da Commom Law) e
em alguns ramos do direito (direito comercial, ramos do direito público e
misto). Adotamos no Brasil o sistema da Civil Law, com o direito à
educação legislado e seguindo o método dedutivo-teórico no contexto
educacional.
Contudo, no caso do direito educacional, pela própria
natureza social e fundamental do direito à educação, observamos a predominância
de normas do direito público. Acrescente-se que alguns usos e costumes
utilizados no âmbito da educação já estão incorporados nas legislações
educacionais em nível constitucional e infraconstitucional. Neste caso, por se
tratar de ramo novo do direito, temos nos costumes uma fonte importante para o
direito educacional.
Dentre as fontes do direito, observamos que a
jurisprudência tem muito de semelhante ao costume, mas destacando-se por
concentrar nos Tribunais Superiores as soluções dos casos concretos submetidos
ao seu julgamento. Procuramos demonstrar a importância da jurisprudência como
fonte do direito educacional, inclusive mencionamos a jurisprudência
administrativa nas decisões dos colegiados (Conselhos de Educação).
Salientamos, no entanto, que a jurisprudência em matéria educacional, embora
incipiente na esfera jurídica, vem marcando as relações juspedagógicas entre
poder público, alunos e estabelecimentos de ensino. A nosso ver, é o momento de
os estudiosos do direito procurarem conhecer o entendimento da jurisprudência,
e de os operadores do direito conhecerem e aplicarem a legislação educacional,
como forma de provocar a manifestação do Poder Judiciário, contribuindo, assim,
para o progresso da ciência jurídica e a consolidação do direito educacional
como novo ramo do direito.
Por último, nessa linha das fontes do direito,
apresentamos uma questão controvertida, a de se a doutrina constitui ou não uma
fonte jurídica. De certo modo, o fato de ser ou não ser fonte do direito não
retira, como vimos, a importância da doutrina como contribuição efetiva para a
construção de uma doutrina homogênea e sistematizada do direito educacional.
Contudo, pode-se observar, não obstante a existência de contribuições efetivas
de alguns educadores e juristas, que o direito educacional carece de um acervo
doutrinário. Para tanto, faz-se necessária uma permanente investigação das
relações entre educação e direito, e, de modo geral, neste trabalho avançamos
nessa investigação, ao realizarmos o levantamento bibliográfico na área de
direito educacional. Certamente outras contribuições surgirão para o
aprofundamento da doutrina do direito educacional, como é o caso da tese de
livre-docência Contribuição à sistematização do direito educacional, de
1981, do educador e jurista Renato Alberto Teodoro Di Dio.
Ao examinarmos os princípios do direito em matéria
educacional, observamos que a concepção moderna, que entende os princípios
enquanto norma jurídica, introduziu-se no direito educacional a partir da
Constituição de 1988, da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação e do
Estatuto da Criança e do Adolescente. De certo modo, surgiram princípios e
institutos jurídicos próprios do direito educacional. Pode-se observar, também,
que o capítulo III, seção I, destinado à educação (arts.
Finalmente, a questão básica do capítulo IV consistiu na
longa discussão da doutrina sobre direito público subjetivo à educação. Pontes
de Miranda, como vimos, foi o primeiro jurista brasileiro a discutir, definir e
defender o direito à educação como direito público subjetivo. Ele avançou tanto
ou mais do que os próprios educadores nessa matéria educacional. Destacamos,
ainda, a importante e marcante contribuição da Constituição de 1934, pois foi a
primeira vez em que um texto constitucional brasileiro tratou a educação como
direito de todos, embora não tenha recepcionado norma sancionadora ao Estado
por falta de prestação educacional. Chegou, afinal, com a promulgação da
Constituição de 1988 e o seu correspondente em nível infraconstitucional, a Lei
de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394/96), o momento de atender aos
antigos reclamos da doutrina de um direito à educação cuja prestação pudesse
ser exigida do poder público através de ação contra a União, o estado e o
município.
Outro aspecto positivo foi o levantamento, apesar de
incipiente, dos mecanismos ou instrumentos de tutela à educação destinados a
facilitar e garantir o acesso à justiça em matéria educacional. Entretanto,
concluímos que o acesso à justiça depende primeiro do acesso à educação, pois,
sem conhecimentos jurídicos básicos, em razão do baixo nível educacional, o
cidadão não terá condições de conhecer e utilizar os mecanismos processuais
destinados a garantir os seus direitos nas causas educacionais.
Aqui vale lembrar que não tratamos o direito como ciência
jurídica, tampouco como teoria, mas sobretudo como utilidade e praticidade, ou
seja, houve um esforço para demonstrar como se aplica e se realiza o direito
educacional. Para tanto, utilizamos como paradigma uma pesquisa de campo
realizada no Rio de Janeiro nos últimos quatro anos, que tratou dos Juizados
Especiais Cíveis e da ação civil pública, bem como da aplicação e prática de
tais leis. Pôde-se observar, ainda, que o Ministério Público e a ação civil
pública são instrumentos eficazes de tutela à educação nos conflitos
específicos entre instituições de ensino, governo, alunos ou responsáveis pelos
alunos. Identificamos, também, outros mecanismos de acesso à justiça colocados
à disposição do cidadão comum e dos operadores do direito (advogados,
promotores públicos, defensores públicos e juízes de direito) em matéria
educacional. Ressaltamos, por fim, a importância dos Juizados Especiais nas causas
educacionais de menor complexidade ou de reduzido valor econômico.
Neste contexto de argumentação, não é impróprio falar-se
da existência de um direito educacional, embora de formulação recente, como
novo ramo da ciência jurídica. Atendendo o nosso propósito inicial, conseguimos
realizar uma investigação sobre as relações entre a educação e o direito. Além
disso, ao longo da pesquisa tratamos o direito como ciência e procuramos
sistematizar o conhecimento do direito educacional, mantendo as contribuições
recíprocas de educadores e juristas. Nesse sentido, houve um esforço
epistemológico em apresentar conceituações coerentes; em fazer um estudo amplo,
articulado e adequado à disciplina; em adotar uma metodologia de caráter
interdisciplinar, dada a própria natureza do campo investigado; em contribuir
para a construção de doutrinas homogêneas; em apresentar os novos institutos e
princípios próprios do direito educacional.
Por tudo isso, embora a investigação deva ser aprofundada
nas interfaces do direito educacional com outros ramos do saber jurídico e do
conhecimento. Podemos considerar o direito educacional como um conjunto de
regras, procedimentos, normas e princípios jurídicos, que disciplinam as
relações juspedagógicas entre alunos, professores, estabelecimento de ensino,
poder público e investiga as interfaces com outros ramos do direito, no âmbito
do processo ensino-aprendizagem.
Portanto, o direito educacional tem todas as condições de
reconhecimento de sua autonomia e da especialização, como novo ramo do direito.
290. Além disso, a relação entre educação e o direito pode ser aprofundada
pelos educadores e juristas, tendo como aliado o direito educacional para
cultivar e proteger a educação no terceiro milênio.
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NOTAS
01 Para a doutora pela Sorbone (Paris),
professora Elvira de Souza Lima, pela Hofstra University (N. York): "Mesmo
países ricos, como os Estados Unidos, enfrentam problemas sérios de
aprendizagem. Trabalhando nos Estados Unidos, França e Brasil, fui percebendo
que não podia me restringir ao conhecimento de minha área de formação, a Psicologia,
já que Sociologia da Educação, História, Antropologia, Filosofia da Educação
são áreas igualmente importantes para entendermos a dinâmica da produção do
sucesso e do fracasso escolar…" (Jornal do Brasil, 30 de abril de
2000. Entrevista publicada no caderno Educação e Trabalho, p. 1-2.
02 DEWEY, John. Democracia e educação.
3. ed. Trad. Godofredo Rangel & Anísio Teixeira. São Paulo : Companhia
Editora Nacional, 1959. p. 99.
03 Apud PILETTI, Claudino & PILETTI,
Nelson. Filosofia e história da educação, p. 637.
04 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 2. ed.
Brasília : Editora UNB, 1992. V 1130b, p. 95.
05 As principais idéias educacionais de
Comenius estão contidas nessa obra clássica, completada em 1632 em língua
checa, que foi traduzida para o latim e publicada em 1657. Comenius desenvolveu
idéias avançadas para a prática educativa nas escolas, numa época em que
surgiam novidades no campo da filosofia e das ciências. Ele foi o primeiro
educador a formular a idéia da difusão dos conhecimentos para todos e a criar
princípios e regras do ensino (Cf. LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São
Paulo : Cortez, 1994. p. 58).
06 COMENIUS, João Amós. Didática magna.
Rio de Janeiro : Editora Rio, 1978. p. 15.
07 Os pensamentos de Locke sobre a educação têm
como objetivo declarado o delinear o projeto da educação de um jovem
pertencente à aristocracia inglesa.
08 Cf. ABBAGNANO, Nicola. História da
filosofia. Lisboa : Presença, 1994. V. 6, p. 90.
09 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Emílio ou da
educação. São Paulo : Difusão Européia do Livro, 1968. p. 10.
10 Cf. BARROS, Roque Spencer Maciel de. Ensaios
sobre educação. São Paulo : EdUSP, 1971. p. 72.
11 HEGEL, George Wilhelm Friedrich. Princípios
de filosofia do direito. 4. ed. Lisboa : Guimarães Editores, 1990. p. 170.
12 É oportuno citar, em defesa desta tese, as
palavras de Jean Piaget sobre o significado do direito à educação: se a própria
lógica se constrói, ao invés de ser inata, chega-se à conclusão de que a
primeira tarefa da educação consiste em formar o raciocínio (PIAGET, J., op.
cit., p. 38).
13 PIAGET, Jean. Para onde vai a educação?
2. ed. Rio de Janeiro : José Olympio, 1974. p. 39.
14 MARSHALL, T. H. Cidadania, classe social
e status. Rio de Janeiro : Zahar Editores, 1967.
15 Idem, p. 73.
17 LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São
Paulo : Cortez, 1994. p. 16.
18 Ibid., p. 91.
19 NERICI, Imideo Giuseppe. Introdução à
didática geral. 13. ed. Rio de Janeiro : Editora Científica, 1998. p. 9.
20 Apud MENDONÇA, Ana Waleska &
BRANDÃO, Zaia (orgs.). Por que não lemos Anísio Teixeira? Uma tradição
esquecida. Rio de Janeiro : Ravil, 1997. p. 148.
21 DEWEY, John. Democracia e educação, op.
cit., p. 94.
22 Idem, p. 96.
23 Idem, p. 97.
24 Ibid.
25 Apud BARROS, Roque Spencer Maciel de.
Ensaios sobre educação. São Paulo : EdUSP, 1971. p. 88.
26 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a
origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. São Paulo :
Martins Fontes, 1993. p. 143.
27 DEWEY, John. Democracia e educação, op.
cit., p. 99.
28 Idem, p. 100.
29 LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São
Paulo : Cortez, 1994. (Série formação do professor). p. 60.
30 Cf. idem, p. 60.
31 Pestalozzi voltou-se para o ensino
elementar, por considerá-lo fundamental para crianças desamparadas da aldeia de
Neuhof, onde pôde aplicar, com sucesso, suas idéias (Cf. Pestalozzi. In:
ENCYCLOPÆDIA BRITANNICA do Brasil. São Paulo/Rio de Janeiro : Enciclopædia
Britannica do Brasil Publicações, 1982. V. 16).
32 DEWEY, John. Democracia e educação, op.
cit., p. 100.
33 Idem, p. 107.
34 Idem, p. 100.
35 Apud MOCHCOVITCH, Luna Galano. Educação,
Estado e cidadania: uma reflexão sobre a realidade atual do sistema
educacional brasileiro. Rio de Janeiro, 1985. Dissertação (Mestrado em
Filosofia da Educação) – Departamento de Filosofia da Educação, IESAE, FGV. p.
88.
36 TEIXEIRA, Anísio. Educação é um direito.
2. ed. Rio de Janeiro : Editora UFRJ, 1996. p. 56.
37 DEWEY, John. Democracia e educação, op.
cit., p. 101.
38 Idem, p. 106.
39 Pragmatismo significa que o homem não é
essencialmente um ser teórico ou pensante, mas sim um ser prático, um ser de
vontade e de ação. Considera-se o filósofo americano William James (1910) como
o verdadeiro fundador do pragmatismo; a ele se deve também a criação do termo
"pragmatismo" (cf. HESSEN, Johannes. Teoria do conhecimento.
5. ed. Coimbra : Arménio Amado Editor, 1970. p. 51).
40 Criou o Instituto Nacional de Estudos
Pedagógicos (INEP), em 1937, visando a realização de pesquisas que subsidiassem
a orientação de políticas públicas e de educação no país. Para o grande jurista
Hermes Lima, falar de educação com Anísio Teixeira não se restringe a falar da
rotina do ensino, mas da própria sociedade. Seu pensamento educacional
descerrava não somente a imagem de uma educação diferente, porém, igualmente,
de um país diferente. Educação era também construir a nação (cf. LIMA, Hermes. Anísio
Teixeira, estadista da educação. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira,
1978. p. 43).
41 Apud MENDONÇA,
Ana Waleska & BRANDÃO, Zaia (orgs.). Por que não lemos Anísio Teixeira?
Uma tradição esquecida, op. cit., p. 149.
42 TEIXEIRA, Anísio.
Educação é um direito, op. cit., p. 60-61.
43 Idem, p.
103.
44 MIRANDA,
Francisco Cavalcanti Pontes de. Direito à educação. Rio de Janeiro :
Alba, 1933. p. 6-7.
45 Idem, p.
23.
46 1º SEMINÁRIO DE
DIREITO EDUCACIONAL (1977, Campinas). Anais. Campinas : UNICAMP/ CENTAU,
1977. p. 27.
47 DANTAS, San
Tiago. Palavras de um professor. São Paulo : Forense, 1975. p. 79.
48 IHERING, Rudolf
Von. A luta pelo direito. Rio de Janeiro : Editora Rio, 1978. p. 1.
49 OLIVEIRA FILHO,
Benjamim de. Introdução à ciência do direito. 4. ed. Rio de Janeiro :
José Konfino Editor, 1967. p. 73.
50 REALE, Miguel. Lições
preliminares do direito. 3. ed. São Paulo : Saraiva, 1976. p. 73.
51 OLIVEIRA FILHO,
Benjamim de. Introdução à ciência do direito, op. cit., p. 73.
52 HEGEL, George
Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito. 4. ed. Lisboa :
Guimarães, 1990. p. 195.
53 FERRAZ JUNIOR,
Tércio Sampaio. A ciência do direito. São Paulo : EDUSP, 1977. (Coleção
Universitária de Ciências Humanas, 4). Segundo ele: "O termo ciência não é
unívoco; se é verdade que com ele designamos um tipo específico de
conhecimento, não há, entretanto, um critério único que determine a extensão, a
natureza e os caracteres deste conhecimento; os diferentes critérios têm
fundamentos filosóficos que ultrapassam a prática científica, mesmo quando esta
prática pretende ser ela própria usada como critério. (…) Embora haja certo
acordo em classificar a Ciência do Direito entre as ciências humanas, surgem aí
debates entre as diversas epistemologias jurídicas sobre a existência ou não de
uma ciência exclusiva do Direito, havendo aqueles que preferem vê-la como uma
simples técnica ou arte, tomando a ciência propriamente dita do Direito como
uma parte da Sociologia, ou da Psicologia, ou da História, ou da Etnologia
etc., ou de todas elas no seu conjunto." (A ciência do direito, op.
cit., p. 9).
54 DINIZ, Maria
Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 11. ed. atual. São
Paulo : Saraiva, 1999. p. 27.
55 Para Kelsen no
uso corrente da linguagem é confundido o direito com a ciência jurídica. Ele
distingue direito e ciência do direito. Este tem por missão conhecer – de fora,
por assim dizer – o direito e descrevê-lo com base no seu conhecimento. Os
órgãos jurídicos têm – como autoridade jurídica –, antes de tudo, por missão
produzir o direito para que ele possa então ser conhecido e descrito pela
ciência jurídica (sobre a cientificidade do conhecimento jurídico, consulte a
obra Teoria pura do direito, p. 81-82).
56 DINIZ, Maria
Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 132.
57 Cf. idem,
p. 143.
58 REALE, Miguel. Lições
preliminares do direito. 3. ed. São Paulo : Saraiva, 1967. p. 16.
59 FERRAZ JUNIOR,
Tércio Sampaio. A ciência do direito, op. cit., p. 29.
60 MACHADO NETO,
Antônio Luiz. Compêndio de introdução à ciência do direito. 3. ed. São
Paulo : Saraiva, 1975. p. 16.
61 DINIZ, Maria
Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 27.
62 Apud MACHADO
NETO, Antônio Luiz. Compêndio de introdução à ciência do direito, op.
cit., p. 34.
63 Idem, p.
34.
64 REALE, Miguel. Lições
preliminares do direito, op. cit., p.61.
65 DINIZ, Maria
Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 217.
66 Loc. cit.,
p. 62.
67 VILANOVA,
Lourival. O direito educacional como possível ramo da ciência jurídica. Mensagem,
Revista do Conselho de Educação do Ceará, Fortaleza, 1982-83. p. 47.
68 Idem, p.
47.
69 AMARAL NETO,
Francisco dos Santos. Direito civil brasileiro: introdução. Rio de
Janeiro : Forense, 1991. p. 49. Esclarece o doutor em direito privado:
"Não se confundem as normas jurídicas com os dispositivos de lei que as
expressam. Esses dispositivos, ou proposições, são os sinais lingüísticos,
conjunto de palavras que as revelam. (…) As normas apresentam-se nos textos
legais sob a forma de artigos, subdivididos em itens e estes
70 FERRAZ JUNIOR,
Tércio Sampaio. A ciência do direito, op. cit., p. 50.
71 Ibid.
72 DINIZ, Maria
Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 329.
73 Idem, p.
57.
74 Parte da ciência
jurídica que expõe, critica e classifica os princípios que serviram de fonte ao
direito positivo de determinado país e a cada um de seus ramos. Conhecimento e
estudo analítico das normas legais, que são apreciadas como princípios aceitos
pacificamente, por conterem verdades certas e indiscutíveis (cf. NUNES, Pedro. Dicionário
de tecnologia jurídica. Rio de Janeiro : Freitas Bastos, 1976. p. 373).
75 DINIZ, Maria
Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 27.
76 VILANOVA,
Lourival. O direito educacional como possível ramo da ciência jurídica, op.
cit., p. 85.
77 Ibid.
78 CONSTITUIÇÃO
FEDERAL: arts. 205; 206, I-VII; 207 §§ 1º, 2º; 208, §§ 1º, 2º; 209, I-II; 227,
§§ 1º, 3º e 7º; e 242; LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO (Lei nº 9.394, de
26.12.1996): arts. 5º-7º; ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (Lei nº 8.069,
de 13 de julho de 1990): arts. 4º, "c"; 5º, 53, I-V, e parág. único;
54, I-IV e §§ 1º-3º; 56, I-III; 70, 71, 129, 136, 201, 208, 209, 212, 220-223;
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990): arts.
82-84.
79 Revista do
Direito Educacional, Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação, Rio de
Janeiro, n. 46, p. 40, set.-out. 1977.
80 VILANOVA,
Lourival. O direito educacional como possível ramo da ciência jurídica, op.
cit., p. 85.
81 OLIVEIRA FILHO,
Benjamim de. Introdução à ciência do direito, op. cit., p. 227.
82 FERRAZ JUNIOR,
Tércio Sampaio. Direito subjetivo – II. In: ENCICLOPÉDIA Saraiva do Direito, op.
cit., p. 330.
83 Loc. cit.,
p. 228.
84 OLIVEIRA FILHO,
Benjamim de. Introdução à ciência do direito, op. cit., p. 228.
85 Goffredo Telles
Jr., por exemplo, diz que "nenhuma faculdade humana é um direito. Nenhum
direito subjetivo é faculdade. O que ao direito incumbe é ordenar; é colocar,
numa ordem conveniente, o que é dado ao homem pela natureza. Mais
preciosamente, o que compete ao direito é exprimir mandamentos, permissões e
proibições, ou seja, manifestar os imperativos de uma comunidade relativamente
ao uso das faculdades que a natureza deu ao homem. Compete ao direito exprimir,
por meio de normas, a ordem a que se deve sujeitar o comportamento
humano." (TELLES JR., Goffredo. Direito subjetivo – I. In: ENCICLOPÉDIA
Saraiva do Direito, op. cit., p. 301-302.)
86 Idem, p.
299.
87 DINIZ, Maria
Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 245.
88 OLIVEIRA FILHO,
Benjamim de. Introdução à ciência do direito, op. cit., p. 229.
89 MACHADO NETO,
Antônio Luís. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 155.
90 LOPES, Maurício
Antônio Ribeiro. Comentários à Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 1999. p. 81.
91 Para o educador e
consultor jurídico na área educacional Elias de Oliveira Motta, "não há
como confundir Legislação do Ensino com Direito Educacional. Enquanto aquela se
limita ao estudo do conjunto de normas sobre educação, este tem um campo muito
mais abrangente e pode ser entendido como um conjunto de técnicas, regras e
instrumentos jurídicos sistematizados que objetivam disciplinar o comportamento
humano relacionado à educação", como conceituou Álvaro Melo Filho (cf.
MOTTA, Elias de Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI.
Brasília : UNESCO, 1997. p. 51).
92 Sobre o conceito
de direito, esclarece Maria Helena Diniz: "… não é da alçada do jurista
elaborar o conceito geral ou essencial do direito, porém, ante o princípio
metódico da divisão do trabalho, é imprescindível a decomposição analítica do
direito, que é objeto de várias ciências: sociologia jurídica, história do
direto, filosofia do direito etc. para delimitar o aspecto em que será
abordado. A escolha do prisma em que se vai conhecê-lo depende do sistema de
referência do jurista, pressupondo uma reflexão sobre os fins do ordenamento
jurídico." (Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 240.)
93 MENESES, João
Gualberto de Carvalho. Direito da Educação – I. In: ENCICLOPÉDIA Saraiva do
Direito, op. cit., p.10
94 DINIZ, Maria
Helena. Dicionário jurídico. São Paulo : Saraiva, 1998. (O verbete direito
da educação remete para direito educacional. Depreende-se, neste
caso, que não há objeção à utilização de uma ou outra expressão.)
95 DI DIO, Renato
Alberto Teodoro. Contribuição à sistematização do direito educacional.
São Paulo, 1981. Tese (Livre-docência) – Faculdade de Educação, Universidade de
São Paulo. p. 25.
96 Idem, p.
24.
97 Apud
MOTTA, Elias de Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI, op.
cit., p. 58.
98 BOAVENTURA, Edivaldo
Machado. A educação brasileira e o direito. Belo Horizonte : Nova
Alvorada, 1997. p. 30.
99 Ibid.
100 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. Um ensaio de sistematização do direito educacional. Revista
de Informação Legislativa, Senado Federal, Brasília, v. 33, n. 131,
jul.-set. p. 46.
101 Apud BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p. 30-31.
102 MELO FILHO,
Álvaro. Direito educacional: aspectos teóricos e práticos. Mensagem,
Revista do Conselho de Educação do Ceará, Fortaleza, n. 8 (nº especial sobre
direito educacional), 1982-1983. p. 54.
103 Idem, p.
53.
104 Idem, p.
54.
105 Cf. REALE,
Miguel. Lições preliminares do direito, op. cit., p. 6.
106 BASTOS, Aurélio
Wander. O ensino jurídico no Brasil. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 1998.
Introdução, p. xi.
107 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
31.
108 MOTTA, Elias de
Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI, op. cit.,
p. 51.
109 Ibid.
110 Cf. REALE,
Miguel. Lições preliminares do direito, op. cit., p. 64.
111 DINIZ, Maria
Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 143.
113 OLIVEIRA FILHO,
Benjamim de. Introdução à ciência do direito, op. cit., p. 258.
114 Trata-se das
fontes materiais ou reais do direito que condicionam o aparecimento de normas
jurídicas. Na realidade, são fatores sociais que abrangem fatores históricos,
religiosos, naturais (clima, solo, raça, natureza geográfica do território,
constituição anatômica e psicológica do homem), demográficos, higiênicos,
políticos, econômicos e morais (honestidade, decoro, decência, fidelidade,
respeito ao próximo), mas também os valores de cada época (ordem, segurança,
paz social, justiça). Cf. DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à
ciência do direito, op. cit., p. 281-282.
115 Op. cit.,
p. 259.
116 COELHO, Luiz
Fernando. Fonte formal. In: ENCICLOPÉDIA Saraiva do Direito, op. cit., v.
38, p. 40.
117 OLIVEIRA FILHO,
Benjamim de. Introdução à ciência do direito, op. cit., p. 259.
118 MACHADO NETO,
Antônio Luis. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p.199.
119 Idem, p.
199-200.
120 OLIVEIRA FILHO,
Benjamim de. Introdução à ciência do direito, op. cit., p. 259.
Justifica o renomado professor: "Numa sociedade, onde ninguém se ama, nem
se preza, nem se respeita, onde a anarquia se estabelece espontaneamente, pela
postergação de todos os valores que não representam a força, considerada em
qualquer de suas expressões materiais, o emprego da coerção organizada, própria
da lei jurídica, torna-se realmente inevitável. Só se acredita na força e, por
conseguinte, só se acredita na lei, porque a lei é forte. É o apelo às sanções
mais imediatas, com o fito de coibir os abusos." (idem, p. 260).
121 REALE, Miguel. Lições
preliminares do direito, op. cit., p. 162-163.
122 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
74-75.
123 O direito
educacional como possível ramo da ciência jurídica, op. cit., p.
81-82.
124 MELO FILHO,
Álvaro. Direito educacional: aspectos teóricos e práticos, op. cit.,
p. 53.
125 Apud BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
74.
126 Paulo Nathanael
Pereira de Souza, citado por ALVES, João Roberto Moreira. Jurisprudência
educacional, op. cit., p. 28.
127 Op. cit.,
p. 148.
128 Idem, p.
28.
129 Idem, p.
29.
130 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
77.
131 Idem, p.
78.
132 Ibid.
133 MEIRELLES, Hely
Lopes. Direito administrativo brasileiro. 14. ed. São Paulo : Revista
dos Tribunais, 1989. p. 160.
134 Idem, p.
78.
135 Idem, p.
80-81.
136 ALTAVILA, Jayme
de. Origem dos direitos dos povos. São Paulo : Melhoramentos, 1964. p.
224.
137 Educação: um
tesouro a descobrir. São Paulo : Cortez; Brasília : MEC/UNESCO, 1998. p.
11.
138 Idem, p.
22.
139 Idem, p.
54.
140 Idem, p.
228.
141 Idem, p.
234.
142 Idem, p.
232.
143 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
79.
144 MEIRELLES, Hely
Lopes. Direito administrativo brasileiro, op. cit., p. 158.
145 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
79.
146 MEIRELLES, Hely
Lopes. Direito administrativo brasileiro, op. cit., p. 80.
147 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
79.
148 Anteprojeto de
consolidação da legislação educacional. Consolida a legislação educacional
brasileira em complementação à Lei n° 9394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes
e bases da educação nacional e dá outras providências. Diário Oficial [da]
República Federativa do Brasil, Brasília, DF, n. 98, 26 maio 1998. Seção 1,
p. 84.
149 OLAVO, Acyr de
Lima. Costume. In: ENCICLOPÉDIA Saraiva de Direito, op. cit., p. 101.
150 OLIVEIRA FILHO,
Benjamim de. Introdução à ciência do direito, op. cit., p. 264.
151 PEREIRA, Caio
Mario da Silva. Instituição de direito civil. 5. ed. Rio de Janeiro :
Forense, 1976. p. 71.
152 REALE, Miguel. Lições
preliminares de direito, op. cit., p. 142.
153 GILISSEN, John. Introdução
histórica do direito. Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian, 1995. p. 486.
154 REALE, Miguel. Lições
preliminares de direito, op. cit., p. 160.
155 Harold J.
Berman, em sua obra Aspectos do direito americano (São Paulo : Forense,
1963. p. 12), afirma que o sistema jurídico mais próximo do direito americano é
o direito inglês, trazido pelos colonizadores ingleses para o Novo Mundo nos
séculos XVII e XVIII, tendo sido formalmente aceito, depois da revolução americana
pelos diversos estados da União, como fundamento de suas próprias leis. Através
da adoção do direito inglês, foi preservada a continuidade do direito americano
com a herança natural e legal que recebeu do Europa Ocidental.
156 Op. cit.,
p. 155.
157 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
91.
158 Ibid., p.
86.
159 Cf. OLIVEIRA
FILHO, Benjamim de. Introdução à ciência do direito, op. cit., p.
266: "Quanto à jurisprudência, o sentido é, aqui, específico. Não mais se
trata da ciência do direito, sentido que prevalece no teor da célebre definição
de Ulpiano, adotada por Justiniano, no Corpus Iuris. Jurisprudência,
particularmente, significa a maneira uniforme e constante pela qual juízes e
tribunais, especialmente os tribunais, interpretam e aplicam o direito."
160 MACHADO NETO,
Antônio Luis. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 212.
161 Ibid., p.
212.
162 Idem, p.
212.
163 FRANÇA, R.
Limongi. Jurisprudência. In: ENCICLOPÉDIA Saraiva do Direito, op. cit.,
p. 163.
164 CRUET, Jean. A
vida do direito e a inutilidade das leis. Lisboa : Ibero-Americana, 1939.
p. 62.
165 GILISSEN, John. Introdução
histórica do direito, op. cit., p. 508.
166 SOARES, Guido
Fernando Silva. Common Law: introdução ao direito dos EUA. São Paulo :
Revista dos Tribunais, 1999. p. 53.
167 OLIVEIRA FILHO,
Benjamim de. Introdução à ciência do direito, op. cit., p. 266.
168 REALE, Miguel.
Jurisprudência e doutrina. In: ENCICLOPÉDIA Saraiva do Direito, op. cit.,
p. 203.
169 ALVES, João
Roberto Moreira. Jurisprudência educacional, op. cit., p. 9.
170 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
82.
171 ALVES, João
Roberto Moreira. Jurisprudência educacional, op. cit., p. 13.
172 Idem, p.
9.
173 Idem, p.
62.
174 Idem, p.
25.
175 Idem, p.
13.
176 Cf. artigo da
magistrada e professora Salete Maria Maccalóz, publicado no Jornal do Brasil,
21 maio 2000. 1º Caderno, p. 11.
177 MOTTA, Elias de
Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI, op. cit.,
p. 67.
178 V. Instrumento
de Tutela à Educação, capítulo IV, item 4 desta dissertação.
179 O termo doutrina
advém do latim doctrina, do verbo doceo: ensinar, instruir (arte,
ciência, teoria, método). A doutrina é o resultado do pensamento sistematizado
sobre determinado problema, com o objetivo principal de ensinar, mas seu
conteúdo é vario: idéia, regras, prescrições adotadas (cf. MACEDO, Silvio de.
Doutrina. In: ENCICLOPÉDIA Saraiva do Direito, op. cit., p. 380).
180 REALE, Miguel. Lições
preliminares de direito, op. cit., p. 175.
181 MACHADO NETO,
Antônio Luis. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 215.
182 FILHO, Benjamim
de Oliveira de. Introdução à ciência do direito, op. cit., p.
269.
183 REALE, Miguel. Lições
preliminares de direito, op. cit., p. 176.
184 Idem, p.
178.
185 MACHADO NETO,
Antônio Luiz. Compêndio de introdução à história do direito, op. cit., p. 214.
186 Idem, p.
215.
187 Idem, p.
215.
188 Idem, p.
215.
189 MACEDO, Silvio
de. Doutrina. In: ENCICLOPÉDIA Saraiva do Direito, op. cit., p. 380.
190 Entendemos por
dogmatismo a posição epistemológica para a qual não existe ainda o problema do
conhecimento. O dogmatismo tem por supostas a possibilidade e a realidade do
contato entre o sujeito e o sujeito e o objeto. É para ele evidente que o
sujeito, a consciência cognoscente, apreenda o objeto. Tal posição assenta numa
confiança na razão humana, que ainda não está enfraquecida pela dúvida (cf. Teoria
do conhecimento. 5. ed. Coimbra : Arménio Amado Editor, 1970. p. 37.
191 Ibid., p.
381.
192 CERVO, Amado
Luiz. Metodologia científica. 3. ed. São Paulo : McGrawHill do Brasil,
1983. p. 9.
193 REALE, Miguel. O
direito como experiência. São Paulo : Saraiva, 1976.
194 Idem, p.
145.
195 FERRAZ JUNIOR,
Tércio Sampaio. A ciência do direito, op. cit., p. 108.
196 REALE, Miguel. O
direito como experiência, op. cit., p. 145.
197 Dogmática
jurídica é parte da ciência jurídica que expõe, critica e classifica os
princípios que serviram de fontes ao direito positivo de determinado país e
cada um de seus ramos; conhecimento e estudo analítico das normas legais, que
são apreciadas como princípios aceitos pacificamente, por conterem verdades
certas e indiscutíveis (cf. NUNES, Pedro dos Reis. Dicionário de tecnologia
jurídica. 9. ed. Rio de Janeiro : Freitas Bastos, 1976. V. 1, p. 373.
199 Idem, p.
108.
200 MACHADO NETO,
Antônio Luis. Compêndio de introdução à ciência do direito, op. cit.,
p. 214.
201 DINIZ, Maria
Helena. Comentários de introdução à ciência do direito. 11. ed. atual.
São Paulo : Saraiva, 1999. p. 309.
202 MIRANDA,
Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil.
Rio de Janeiro : Forense; 1973. Tomo 1, Prólogo, p. xvi.
203 MOTTA, Elias de
Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI, op. cit.,
p. 66.
204 LOURENÇO FILHO,
M. B. Pedagogia de Rui Barbosa. São Paulo : Melhoramentos, 1954. p. 14.
205 Apud SOUZA,
Paulo Nathanael Pereira de. Educação na Constituição e outros estudos.
São Paulo : Pioneira, 1986. p. 94-95.
206 MORSBACH, Mabel.
O negro na vida americana. Rio de Janeiro : Record, 1969. p. 118.
207 Sendo doutrina,
pleno conhecimento teórico ou científico, o parecer normativo é portanto,
essencialmente norma. O parecer normativo difere do mero parecer técnico
administrativo; o parecer normativo é, inegavelmente, uma fonte de direito
educacional brasileiro. A doutrina exposta nos pareceres normativos desfruta de
considerável influência e prestígio pela normatividade que encerra; o melhor exemplo
da força normativa do parecer é fornecido pelo Conselho Nacional de Educação.
São inúmeros os pareceres aprovados que têm efeito para os sistemas de educação
federal e estadual (v. ALVES, João Roberto Moreira. Jurisprudência
educacional. Rio de Janeiro : Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação,
1999. p. 83).
208 MOTTA, Elias de
Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI, op. cit.,
p. 66.
209 ALVES, João
Roberto Moreira. Jurisprudência educacional, op. cit., p. 30-33.
210 DI DIO, Renato
Alberto Teodoro. Contribuição à sistematização do direito educacional, op.
cit., p. 2.
211 Idem, p.
4.
212 MOTTA, Elias de
Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI, op. cit.,
p. 69.
213 MIRANDA,
Francisco Cavalcanti Pontes de. Direito à educação. Rio de Janeiro :
Alba, 1933. p. 8.
214 SOUZA, Paulo
Nathanael Pereira de. Educação na Consituição e outros estudos, op.
cit., p. 30.
215 "O direito
à educação serve para ilustrar o tema dos direitos subjetivos públicos, mas não
se confunda o direito à educação com o direito público subjetivo à
educação", como leciona o constitucionalista Maurício Antônio Ribeiro
Lopes (cf. Comentários à Lei de Diretrizes e Bases da Educação. São
Paulo : Revista dos tribunais, 1999. p. 84).
216 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
40.
217 MOTTA, Elias de
Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI, op. cit.,
p. 64.
218 "Toda
ciência possível tem um princípio que não pode ser demonstrado no interior
dela, mas tem de ser certo anteriormente a ela" (FICHTE, Johann Gottlieb. Escritos
filosóficos. São Paulo : Abril Cultural, 1973. (Os pensadores). p. 19.
219 Ver art. 206 da
Constituição Federal e art. 3º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
220 Sobre os princípios
gerais do direito, ver as anotações de DINIZ, Maria Helena. Compêndio de
introdução à ciência do direito. 11 ed. São Paulo : Saraiva, 1999. p.
456-463.
221 JACQUES,
Paulino. Curso de introdução à ciência do direito. Rio de Janeiro :
Forense, 1967. p. 133.
222 AMARAL NETO,
Francisco dos Santos. Direito civil brasileiro: introdução. Rio de
Janeiro : Forense, 1991. p. 79.
223 BASTOS, Celso
Ribeiro. Curso de direito constitucional. 19. ed. São Paulo : Saraiva,
1998. p. 53.
224 Sobre sistema de
princípios e sistema de regras, ver os comentários e propostas de CANOTILHO,
José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 6. ed. Coimbra : Almedina,
1993. p. 168-170.
225 BARROSO, Luiz
Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 2. ed. São Paulo :
Saraiva, 1998. p. 141.
226 MELLO, Celso
Antônio Bandeira de. Elementos do direito administrativo. São Paulo :
Revista dos Tribunais, 1991. p. 230.
227 ESPÍNDOLA, Ruy
Samuel. Conceito de princípios constitucionais. São Paulo : Revista dos
Tribunais, 1999. p. 28.
228 Os princípios do
direito educacional encontram-se no art. 206 da Constituição Federal e arts. 2º
e 3º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Aqui estão as bases jurídicas
para a educação.
229 MOTTA, Elias de
Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI. Brasília :
UNESCO, 1997. p. 171.
230 Ver, a esse
respeito, os comentários de Maurício Antônio Ribeiro Lopes (Comentários à
Lei de Diretrizes e Bases da Educação. São Paulo : Revista dos Tribunais,
1999. p. 42).
231 SILVA, José
Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo :
Malheiros, 1994. p. 712.
232 MOTTA, Elias de
Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI, op. cit.,
p. 217.
233 BENAVIDES,
Paulo. A Constituição aberta. 2. ed. São Paulo : Malheiros, 1996. p.
212.
234 LOPES, Maurício
Antônio Ribeiro. Comentários à Lei de Diretrizes e Bases da Educação, op.
cit., p. 46.
235 Ibid.
236 Idem, p.
49.
237 Idem, p.
51.
238 DI DIO, Renato
Alberto Teodoro. Contribuição à sistematização do direito educacional.
São Paulo, 1981. Tese (Livre-docência) – Faculdade de Direito – Universidade de
São Paulo.
239 Como destaca
José Afonso da Silva, "o direito de igualdade não tem merecido tantos
discursos como a liberdade. É que a igualdade constitui o signo fundamental da
democracia. (…) Por isso é que a burguesia, cônscia de seu privilégio de
classe, jamais postulou um regime de igualdade tanto quanto reivindicou o de
liberdade. (…) Nossas constituições, desde o Império, inscreveram o princípio
da igualdade perante a lei, enunciado que, na sua literalidade, se confunde com
a mera isonomia formal, no sentido de que a lei e sua aplicação trata a todos
igualmente, sem levar em conta as distinções de grupos." (cf. Curso de
direito constitucional positivo. São Paulo : Malheiros, 1994. p. 193-196).
240 ABREU, Sergio. Os
descaminhos da tolerância (o afro-brasileiro e o princípio da igualdade e da
isonomia no direito constitucional). Rio de Janeiro : Lumen Juris, 1999. p.
45.
241 SILVA, José
Afonso da. Curso de direito constitucional positivo, op. cit., p.
193.
242 PERELMAN, Chaim.
Ética e direito. São Paulo : Martins Fontes, 1997. p. 218.
243 LOPES, Maurício
Antônio Ribeiro. Comentários à Lei de Diretrizes e Bases da Educação, op.
cit., p. 44.
244 DI DIO, Renato
Alberto Teodoro. Contribuição à sistematização do direito educacional, op.
cit., p. 1.245.
245 SILVA, Pedro
Sancho da. Sistematização do direito educacional. Revista do Direito
Educacional, Rio de Janeiro, Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação,
n. 46, 1977. p. 34.
246 AMARAL NETO,
Francisco dos Santos. Direito civil brasileiro: introdução, op. cit.,
p. 193.
247 TELLES JR.,
Goffredo. Direito subjetivo I. ENCICLOPÉDIA Saraiva de Direito, op. cit.,
p. 299.
248 Idem, p.
299.
249 Principalmente
as teorias de Hans Kelsen e de Leon Duguit. A primeira é chamada de teoria da
norma pura, enquanto a segunda, teoria realista ou objetiva.
250 REALE, Miguel. Lições
preliminares do direito, op. cit., p. 251.
251 Idem, p.
252.
252 LOPES, Maurício
Antônio Ribeiro. Comentários à Lei de Diretrizes e Bases da Educação:
Lei 9.394, de 20.12.1996; jurisprudência sobre educação. São Paulo : Editora
Revista dos Tribunais, 1999. p. 80.
253 O primeiro autor
que tratou deste assunto, com grande profundidade, foi Rudolf Von Ihering, em
sua obra clássica O fim do direito. A teoria de Ihering foi
posteriormente desenvolvida por Georg Jellinek, nos seus dois grandes livros: Sistema
dos direitos públicos subjetivos e Doutrina geral do Estado.
Jellinek sustenta que os direitos públicos subjetivos existem na medida em que
o Estado não pode deixar de traçar limites a si próprio, enquanto Estado de
direito (cf. REALE, Miguel. Lições preliminares de direito, op. cit.,
p. 269).
254 REALE, Miguel. Lições
preliminares do direito, op. cit., p. 271.
255 AMARAL NETO,
Francisco dos Santos. Direito civil brasileiro, op. cit., p. 196.
256 Loc. cit.,
p. 263.
257 CRETELLA JR.,
José. Direito subjetivo público. In: ENCICLOPÉDIA Saraiva do Direito, op.
cit., p. 338.
258 AMARAL NETO,
Francisco dos Santos. Direito civil brasileiro, op. cit., p. 197.
259 REALE, Miguel. Lições
preliminares de direito, op. cit., p. 266.
261 Apud
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos humanos fundamentais. São
Paulo : Saraiva, 1996. p. 137.
262 LOPES, Maurício
Antônio Ribeiro. Comentários à Lei de Diretrizes e Bases da Educação, op.
cit., p. 84.
263 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
34.
264 MIRANDA, Francisco
Cavalcanti Pontes de. Comentários à Constituição de 1967; com a Emenda nº 1.
3. ed. Rio de Janeiro : Forense, 1987. p. 348.
265 FERRAZ, Esther
de Figueiredo. A importância do direito educacional. In: 1º SEMINÁRIO DE
DIREITO EDUCACIONAL (1977 : Campinas). Anais… Campinas : UNICAMP/CENTAU,
1977. p. 37.
266 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
129.
267 Apud DI
DIO, Renato Alberto Teodoro. Contribuição à sistematização do direito
educacional, op. cit., p. 99.
268 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. Direito educacional constitucional, op. cit.,
p. 22.
269 Apud BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. Direito educacional constitucional, op. cit.,
p. 33.
270 "A eficácia
é o fato de que a norma é efetivamente aplicada e seguida. (…) Dizer que uma
norma vale (é vigente) traduz algo diferentes do que quando se afirma que ela é
efetivamente aplicada e respeitada, se bem que entre vigência e eficácia possa
existir uma certa conexão." Em suma, para José Afonso da Silva: "Eficácia
é a capacidade de atingir os objetivos previamente fixados como metas.
Tratando-se de normas jurídicas, a eficácia consiste na capacidade de atingir
os objetivos nela traduzidos, que vêm a ser, em última análise, realizar os
ditames jurídicos objetivados pelo legislador." (cf. SILVA, José Afonso
da. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo : Malheiros,
1998. p. 66).
271 MOTTA, Elias de
Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI, op. cit.,
p. 227.
272 BOAVENTURA,
Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito, op. cit., p.
147 [grifo nosso].
273 LOPES, Maurício
Antônio Ribeiro. Comentários à Lei de Diretrizes e Bases da Educação, op.
cit., p. 85.
274 MOTTA, Elias de
Oliveira. Direito educacional e educação no século XXI, op. cit.,
p. 227.
275 Idem, p.
228.
276 MARQUES, José
Frederico. Manual de direito processual civil. São Paulo : Saraiva,
1974. p. 145.
278 Idem, p.
22.
279 SANTOS,
Boaventura Souza de. Pelas mãos de Alice. O social e o político na
pós-modernidade. São Paulo : Cortez, 1995. p. 167.
280 CARNEIRO, Paulo
Cezar Pinheiro. Acesso à justiça: juizados especiais cíveis e ação civil
pública – uma nova sistematização da teoria geral do processo, op. cit.,
p. 57-58.
281 Ibid.
282 Os direitos
individuais homogêneos são aqueles cujos titulares são perfeitamente individualizáveis,
detentores de direitos divisíveis. Nelson Nery Júnior observa que é difuso o
direito ou interesse que atinge número indeterminado de pessoas, ligadas por
relação meramente fatual, ao passo que seriam coletivos aqueles outros
interesses e direitos pertencentes a grupo ou categoria de pessoas
determináveis, ligadas por uma relação jurídica (cf. NERY JR., Nelson. Aspectos
do processo civil no Código de Defesa do Consumidor. Revista do Direito do
Consumidor, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, n. 1, p. 202).
283 CURY, Munir et
al. Estatuto da Criança e do Adolescente comentado. Comentários jurídicos e
sociais. São Paulo : Malheiros, 1996. p. 648.
284 LOPES, Maurício
Antônio Ribeiro. Comentário à Lei de Diretrizes e Bases da Educação, op.
cit., p. 87.
285 Ibid..
286 CARNEIRO, Paulo
Cezar Pinheiro. Acesso à justiça: juizados especiais cíveis e ação civil
pública – uma nova sistematização da teoria geral do processo. Rio de Janeiro :
Forense, 1999. p. 191.
287 MIRANDA,
Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentário à Constituição de 1946. 2.
ed. Rio de Janeiro : Borsoi, 1963. v. 4, p. 187.
288 Cf. artigo de
RUIZ, Urbano. Direito à educação. Folha de São Paulo, São Paulo, 20 jun.
1998. 3º Caderno, p. 2.
289 ALVES, João
Roberto Moreira. Jurisprudência educacional, op. cit., p. 57.
* Advogado, mestre em Direito
pela UGF, especialista
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8535>. Acesso em: 17 jun. 2006.