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A importância dos meios de comunicação para o Judiciário

 

 

Gerson de Oliveira Costa Filho*

 

 

A polêmica sobre a exigência do diploma de jornalista para o respectivo registro profissional é inequívoco sinal da importância dessa discussão, suscitada por uma decisão judicial, em ação civil pública proposta pelo Ministério Público, que entendeu não ser necessário o requisito do diploma, cuja exigência passou a existir a partir de norma brotada nos primeiros anos da Ditadura que dominou o País na segunda metade do século passado.

A decisão judicial foi objeto de recurso e o caso há de ser resolvido em instância superior. Enquanto isso, outra decisão judicial exigiu, de um cidadão em particular, a apresentação do diploma para o registro profissional de jornalista. Também dessa decisão coube recurso.

Enquanto não houver uma decisão conclusiva da última instância ou uma nova norma definindo a situação, outras decisões poderão sair, contra ou a favor da exigência do diploma. Daí porque a importância da discussão, com equilíbrio, profundidade e isenção de ânimo, sem agressões, quer contra os magistrados que eventualmente entendem não ser exigível o diploma, quer contra os cidadãos que exerceram seu legítimo direito de requerer o registro com base no ordenamento jurídico vigente, sob pena de revelar o despreparo daqueles que querem defender o diploma mas, em vez de demonstrarem a necessidade dessa exigência, dão provas de que o curso não os está preparando adequadamente para conviver com as regras democráticas que implicam no respeito ao ordenamento jurídico, que inclui a própria alteração das regras desse ordenamento, mas cuja segurança é essencial para a saúde do Estado democrático de Direito.

Permito-me, assim, fazer algumas considerações sobre o tema, que tem uma relação de relevada importância com o Poder Judiciário.

A Segunda Guerra Mundial foi um dos mais produtivos laboratórios da História da Humanidade e, nela, os meios de comunicação sofreram consideráveis avanços, como resultado das pesquisas e experiências para desenvolver ao máximo as formas de comunicação entre comandantes e comandados, aliados, entre si, e, inclusive, para disseminar a desinformação nas hostes adversas. Depois, a Guerra Fria contribuiu para incrementar esses avanços e a Tecnologia desenvolvida na área da comunicação dotou os veículos de comunicação de massa de recursos inimagináveis, tornando tal comunicação instantânea, contornando o tempo e o espaço.

Tal tecnologia deu poderes mais amplos e maior capacidade de repercussão a seus efeitos, exigindo uma melhor qualificação técnica dos profissionais da área da comunicação, como, aliás, se deu com outras profissões.

Na advocacia, até o Governo do Presidente José Sarney, a Ordem dos Advogados do Brasil podia admitir provisionados, ou seja, cidadãos que, sem o Curso de Direito ou de Ciências Jurídicas, podiam habilitar-se ao exercício da advocacia, como previa a própria Lei nº 4215/1963.

Na Engenharia, os mestres de obra dispensavam a presença dos engenheiros. As parteiras dispensavam os médicos. E assim se deu em outras profissões, até que a evolução da Ciência e seus resultados na Tecnologia foram exigindo profissionais cada vez mais habilitados, qualificados para responder aos avanços científicos e tecnológicos. E não poderia ser diferente com o jornalismo e demais atividades próprias dos veículos de comunicação social.

O mais importante, porém, em tudo isso, é que, a par desse requisito de qualificação – e nele embutido – seja a ética alçada ao patamar em que deveria estar, para que os profissionais, de todas as áreas, façam de seu mister um instrumento de desenvolvimento social e não um recurso pessoal para satisfazer interesses alheios ao bem comum.

Por tudo isso, sem entrar no mérito das decisões judiciais já proferidas sobre o caso, entendo que o diploma de jornalista deve ser exigido para o exercício da profissão, em decorrência natural de toda essa evolução da sociedade. E para isso só há dois caminhos: a decisão judicial já provocada, mas sem data para ser terminativa, e a sanção de nova norma reguladora, com a criação do Conselho da categoria.

As deficiências apresentadas por profissionais mal habilitados repercutem negativamente no seio da sociedade, exatamente pela extensão e importância dos resultados da atividade jornalística.

Com o dever de informar e formar a opinião pública, o profissional da mídia deve conhecer o mínimo suficiente do tema sobre o qual aborda, a fim de que sua atuação seja um acréscimo e não um retrocesso na dinâmica do amadurecimento político da sociedade.

Para tanto, o jornalista há que conhecer as regras do futebol para cobrir o assunto. Da mesma forma deve ser com relação às ocorrências policiais. É, portanto, imperioso que o jornalista que trata da matéria jurídica conheça o assunto, ou, no mínimo, a terminologia adequada, para que preste a informação corretamente, assim contribuindo para melhor formação e avaliação da sociedade. Sem isso, além de desinformar, deforma os conceitos, dificulta a avaliação da sociedade e contribui para pôr em risco a própria democracia, na medida em que submete as instituições e funções públicas a julgamentos equivocados.

Tradicionalmente fechado, o Poder Judiciário sempre esteve distante do conhecimento popular, inclusive pela postura de reserva que os magistrados sempre se impuseram, ao contrário do que hoje suas instituições defendem, conscientes de que o Poder Judiciário é um instrumento a serviço da comunidade. O que não deveria torná-lo, porém, um alvo para a sanha dos desinformados que, desconhecendo os limites dos magistrados, acusam-nos, não raras vezes, injustamente, de mazelas para as quais em nada contribuíram.

Então, a mesma mídia que, por profissionais despreparados, confunde as instituições com as condutas impróprias de alguns de seus membros, é o único veículo eficaz para levar ao conhecimento da comunidade qual o papel, a importância e os limites das instituições e, dentre elas, do Poder Judiciário.

Para isso, é importante, também, que as decisões judiciais sejam abordadas em todas as nuanças necessárias para o entendimento dos leigos, a fim de que os magistrados não sejam julgados por decisões tomadas de acordo com suas convicções e dentro do ordenamento jurídico.

Os interesses pessoais e as paixões não podem ser parâmetros estimuladores para o jornalista que pretende informar com ética.

E o Poder Judiciário, que, desde o final do último milênio, tem procurado mostrar-se para a sociedade, depende da responsabilidade e da ética dos profissionais desse extraordinário instrumento que é o conjunto dos meios de comunicação social.

Que dessa discussão sobre a exigência do diploma emirja também a discussão sobre a importância do compromisso ético de tão importante profissão.

 

*Desembargador Federal do Trabalho do TRT-16ª Região

 

 

Disponível em: http://www.canaljustica.jor.br/artigo20_gerson.htm. Acesso em: 10.maio.2005.