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A estrutura legal do Sistema Único de Saúde: breve escorço
sobre o Direito Constitucional Sanitário
Sandro Alex de Souza Simões
RESUMO
O artigo procura traçar um panorama sobre a dimensão do
Direito Sanitário brasileiro a partir de um relato de sua evolução legislativa
infraconstitucional até o tratamento dado pela atual Constituição, sobremaneira
no âmbito federativo.
ABSTRACT
The article makes an approuch on Brazil’s health Law since an historical
point of view over this specific legislation until the present Constitution
which gives a federalist treatment in this subject.
Conceito e evolução do sistema através
das Normas Operacionais Básicas
O Sistema Único de Saúde – SUS é um modelo de ação
social integrada e descentralizada de matiz constitucional como visto
anteriormente. O seu perfil, como sejam os seus princípios e seus objetivos, é
traçado pela Lei Fundamental no art. 194 na ampla compreensão que dá ao direito
de seguridade social no título da Ordem Social. Seu conceito é obtido na
legislação ordinária como sendo "o conjunto de ações e serviços de saúde,
prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais,
da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder
Público" (Lei 8.080/90, art. 4o ).
No plano infraconstitucional o legislador não se
esquivou da tradição de compor a normatização do SUS através de uma lei
orgânica que, como tal, pretende sistematizar de maneira lógica e funcional os
desideratos do direito à saúde enquanto política pública em uma ordem
institucional complexa, tal como o federalismo brasileiro.
É precisamente esse, a partir de uma perspectiva
político-constitucional, o mais delicado desafio da legislação básica de
direito sanitário no país: organizar e equilibrar coerentemente a exigência da
realização do mandamento constitucional da saúde enquanto direito fundamental,
e assim sendo amplo e indefectível, com o modelo tripartite de federalismo
acolhido pela Constituição de 1988 em um ambiente claramente assimétrico,
assinalado por desigualdades inter e intra-estaduais.
A Lei 8.080, de 19.09.1990 irá constituir a chamada Lei
Orgânica da Saúde e buscará atacar o problema do equilíbrio federativo nos
pontos mais estrangulados pela anterior prática de excessivo centralismo, cujo
modelo paroxístico foi o INAMPS, em dois pontos: o financiamento e a gestão, de
que trataremos melhor mais adiante.
A Lei 8.080/90 foi alvo de uma série de vetos que
provocaram a necessidade de formulação de um novo diploma para a regulação do
controle do sistema por parte da sociedade civil, como previa a Constituição de
1988 (art.194, parágrafo único, VII), com o que surge a Lei 8.142, de
28.12.1990.
A atividade normativa mais intensa, entretanto, revela
uma característica idiossincrática do direito sanitário, que é o ser de
natureza eminentemente regulatória, exercendo seu alcance por meio de uma
significativa atividade legiferante do Executivo, destacadamente as portarias
chamadas de Normas Operacionais Básicas (NOB) e, atualmente, Normas
Operacionais de Assistência à Saúde (NOAS).
Esse aspecto próprio do direito sanitário é apontado
pelo Professor BARROS TOJAL (1994:22) que afirma com acerto:
"A partir do momento em que se consolida o modelo
do Estado Social, e a sua evidência resta absolutamente clara entre nós,
especialmente à luz das considerações a propósito da ordem econômica da
Constituição de 1988, o direito assume o papel de fator implementador das
transformações sociais, veiculando inclusive prestações públicas. Por
conseqüência, opera-se uma rematerialização da racionalidade legal".
Esse aspecto é bastante sensível no direito sanitário
em função da dinâmica do seu objeto, bem como de seus particularismos, o que o
torna especialmente avesso aos moldes de normatização estatutária do direito
clássico, aos princípios de segurança jurídica e separação de poderes
analisados sob uma ótica estreita, ponto de vista, ademais, em geral
inconveniente para o cientista social.
No direito sanitário a tendência comumente apontada
pelos publicistas desde LOEWENSTEIN, consoante noticia Clèmerson Clève
(1993:49) quanto ao robustecimento do Poder Executivo em face da nova e volátil
dinâmica da sociedade pós-moderna e pós-industrial, é destacada. O Estado passa
a assumir a função de suprir demandas que antes eram resolvidas no espaço
individual ou familiar. A saúde é um exemplo mais do que claro do argumento,
pois se doenças menos ofensivas ainda se prestam aos preparos medicamentosos
caseiros, as epidemias e a saúde preventiva apresentam espectro meta-individual
e meta-familiar.
Dessa maneira é que em 08.01.1991 a Secretaria Nacional
de Assistência à Saúde do Ministério da Saúde reúne as Portarias de 15 a 20 na
forma da NOB 01/91 e a Resolução 258, do Instituto Nacional de Assistência Médica
e Previdência Social - INAMPS, norma administrativa editada com vistas a
regulamentar e dar cumprimento à disciplina constitucional e legal sobre a ação
sanitária do Estado na forma do Sistema Único de Saúde.
Essa importante norma administrativa será a primeira de
uma série de NOBs que traçarão o desenvolvimento e a implementação do ideal de
proteção integrada à saúde no Brasil. A NOB 01/91 destaca-se pela criação do
SISTEMA DE INFORMAÇÃO HOSPITALAR (SIH/SUS) e do SISTEMA DE INFORMAÇÃO AMBULATORIAL
(SAI/SUS) que serão os mecanismos, doravante, de organização e
operacionalização dos pagamentos dos serviços hospitalares e ambulatoriais.
A NOB 01/91 irá adotar alterar o critério para
distribuição das AIH (autorizações de internamento hospitalar) e UCA (Unidade
de Cobertura Ambulatorial), que antes era baseado na relação direta entre os
serviços prestados pelos Estados e Municípios. O critério da produtividade, por
assim dizer, é comutado pelo parâmetro de atendimento de 10% da população-ano.
Dessa forma, a Portaria 19, de 08.01.91, que integra a NOB 01/91 definiu para o
Estado do Pará, ilustrativamente, 35.945 AIH-ano por um critério populacional e
não mais de volume de internações feitas anteriormente.
É de se observar que com a NOB 01/91 é clara a intenção
de estruturar o serviço de saúde pública em outras bases e voltados a outros
objetivos, desta vez profundamente influenciados pela política sanitária
sugerida pela Constituição Federal, qual seja a da gestão descentralizada da
saúde. Em insistindo na continuidade do critério produção-pagamento a relação
entre a União e Estados e Municípios seria sempre a de prestadores de serviço
de saúde, o que nitidamente é a intenção da Constituição de 1988, nem a da Lei
8.080/90, a qual se preocupa expressamente ao estabelecer as diretrizes do SUS
em acentuar a capacidade de gestão* em cada esfera federativa, senão vejamos:
"Art. 7º. As ações e serviços públicos de saúde e
os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de
Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art.
198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:
...
IX - descentralização político-administrativa, com
direção única em cada esfera de governo:
a) ênfase na descentralização dos serviços para os
municípios;
b) regionalização e hierarquização da rede de serviços
de saúde;
X - integração em nível executivo das ações de saúde,
meio ambiente e saneamento básico;
XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos,
materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
na prestação de serviços de assistência à saúde da população;
XII - capacidade de resolução dos serviços em todos os
níveis de assistência; e
XIII - organização dos serviços públicos de modo a
evitar duplicidade de meios para fins idênticos" (Grifos nossos).
A evolução do aparato regulatório do SUS vai apresentar
uma linha extremamente coerente no sentido de realizar o preceito da gestão
descentralizada. A Resolução 258, de 07.01.91 que irá compor o texto da NOB
01/91, entretanto, não escapou às críticas pela marca centralista que ainda
sugeria ao colocar o INAMPS como controlador do SUS. De fato, a posição do
INAMPS no processo é ambígua porque por um lado representa uma estrutura
centralizada, nacional, diretamente ligada ao Governo Federal e que nas
reformulações pelas quais passa a Seguridade Social na década de 1990 perde
completamente o significado, mais precisamente após a extinção do SINPAS e a
criação do INSS. Com a Lei 8.080/90, art. 39, §5º todo patrimônio imobiliário
do INAMPS passa a ser transferido para os órgãos que integram o SUS. Ademais a
Constituição Federal atribui a competência para ação sanitária (art.198) ao
SUS, perdendo o sentido a presença extemporânea do INAMPS na dita Resolução.
Nesse diploma administrativo é reconhecida a necessidade da descentralização
pelo que cabe ao INAMPS, quanto à supervisão das atividades de saúde
"conceder um crédito de confiança aos Estados e Municípios, sem prejuízo
do acompanhamento a ser exercido pelos mecanismos de controle e avaliação que
estavam sendo desenvolvidos". Além do que a transferência dos recursos do
INAMPS para as unidades federativas dar-se-ia mediante celebração de convênios.
Sobre isso observa com acidez SANTOS citado por MONTEIRO DE ANDRADE (2001:37):
"O Sistema Único de Saúde de repente passou a ser
controlado pelo INAMPS, que num ‘crédito de confiança’, resolveu delegar
competências ‘suas’(?) aos Estados e Municípios, o que é um absurdo
jurídico!...Não podemos esquecer que o INAMPS não pode mais ser tido como o organismo
nacional de assistência médica. Deve ser definido (pois ele não foi
extinto)...É de se mencionar, também, que não há mais como alocar recursos para
serviços de assistência à saúde no orçamento do INAMPS, uma vez que não lhe
cabe mais prestar serviços (...)A União, os Estados, O Distrito Federal e os
Municípios têm a sua competência determinada pela Constituição da República.
Portanto, estão em pé de igualdade entre si, porque nenhuma destas esferas
recebe sua competência da outra, mas da Constituição. Conseqüência disso: a) a
descentralização estabelecida pela Constituição da República é essencialmente
política, ou político-administrativa; b) sendo política, deve-se concretizar
sem nenhum entrave, requisito ou pressuposto administrativo; c) o convênio é
instrumento de descentralização administrativa; d) logo, a efetivação da
descentralização política não pode depender de convênio, que é instrumento
administrativo de atuação; e) não se opera a descentralização por convênio, uma
vez que a descentralização é política nascida da Constituição da República; f)
a Lei Orgânica da Saúde é o instrumento nacional garantidor da unicidade
conceitual e operativa do sistema".
Dessa maneira cabe relativizar a presença dos Convênios
como instrumentos componentes da estrutura legal do SUS durante a vigência da
NOB 01/91. Hodiernamente, como veremos adiante os convênios são formulados para
o financiamento de projetos e programas específicos na área de saúde.como os de
qualidade do sangue, para garantia de qualidade e auto-suficiência de sangue,
componentes e derivados sanguíneos com a implantação de unidades de hematologia
e hemoterapia, o programa de saúde mental para atenção extra-hospitalar ao
portador de transtorno mental, programa de valorização do idoso, mantidos pelo
Ministério da Saúde e outros às expensas da Fundação Nacional de Saúde –
FUNASA, como os sistemas de abastecimento de água, serviços de drenagem para o
controle da malária, unidades de zoonoses e fatores biológicos de risco etc.
Sucedeu a NOB 01/91 a NOB 01/92 e NOB 01/93. Quanto à
primeira cabe destacar que ela avançou na seara do financiamento ao alocar os
recursos do INAMPS para o Fundo Nacional de Saúde, superando assim a crítica de
centralismo e a aura de inconstitucionalidade do controle estabelecido pela
Norma Operacional anterior, tal como exposto acima. A NOB 01/92 acena com um
mecanismo bastante peculiar de incentivo e estímulo à descentralização que são
os FEM e FEGE (Fator de Estímulo à Municipalização e fator de Estímulo à Gestão
Estadual, respectivamente), bem como o Pró-Saúde o qual buscava a realização da
gestão de referência regionalizada referida na LOS, art. 7o, IX, "b".
Tal Norma, contudo, não conseguiu tornar efetivas tais previsões, mas ampliou o
número de municípios credenciados para gestão municipalizada da saúde para
1.074, mais que o triplo do obtido em 1991 (321).
A NOB 01/93, criada pela Portaria 545, de 20 de maio de
1993, é sob muitos aspectos divisora de águas no plano do desenvolvimento da
política sanitária brasileira desde a CF/88. Primordialmente por ter sido
concebida em um amplo debate nascido na IX Conferência Nacional de Saúde, em
Brasília, de 9 a 14 de agosto de 1992. Nesse momento, as avaliações dos
gestores e secretários de saúde, assim como técnicos dos Estados e Municípios
já permitia antever, diante da mudança de administração no Ministério da Saúde,
a verticalização do processo de municipalização. Em 24 de maio de 1993 é
publicado o documento A ousadia de cumprir e fazer cumprir a Lei, uma exposição
de motivos que compõe a NOB 01/93, a qual nos referiremos com mais acuro
adiante. Importa notar agora que a NOB 01/93 perfilou situações transacionais
para o processo de municipalização plena da gestão, estabelecendo três
situações distintas: a transacional incipiente, parcial e semiplena. A NOB
01/93 também acentuou a importância da implantação de uma política de formação
de recursos humanos na área de saúde, o efetivo funcionamento dos Conselhos de
Saúde e Conferência de Saúde criados pela Lei 8.142/90, e a implantação das
Comissões Intergestores tripartite (federal) e bipartite (estadual) e, last but
not least, o aporte de recursos para o Fundo Nacional de Saúde pelas três
esferas de governo. Cabe observar que a NOB 01/93 resulta de um processo de
convicção de que os objetivos já desenhados pelos Constituição, Lei 8.080/90 e
8.142/90 estavam corretos e provocariam as mudanças desejadas para uma situação
ideal de "política sanitária cidadã" para o Brasil. Mister recordar, contudo,
que apenas em novembro de 1994 com o decreto 1.232, de 30 de agosto daquele ano
foi regulamentada e viabilizada operacionalmente a transferência automática e
direta de recursos para os municípios em gestão semiplena.
Por maior que tenha sido o avanço técnico proposto pela
NOB 01/93, noticia MONTEIRO DE ANDRADE (2001:58):
"Pode-se constatar que, dos 4.976 municípios
brasileiros, apenas 3.127 (62.84%) estavam enquadrados em algum tipo de gestão.
Ressalte-se que, destes, 2.367 (47,56%) achavam-se em gestão incipiente, 616
(12,38%) na parcial e somente 144 (2,89%) em gestão semiplena. Isto demonstra
que, mesmo com a NOB 01/93, a grande maioria dos municípios brasileiros, 97,7%,
encontravam-se na condição de prestadores de serviço de saúde.
"Outras limitações que podem ser percebidas na NOB
01/93 seriam a ausência de definições acerca da vigilância sanitária,
epidemiológica e de endemias como também quanto ao estímulo para inversão do modelo
de atenção".
A NOB 01/96 editada pela Portaria MS 2.203, publicada
no DOU a 6 de novembro de 1996 por sua vez amplia em consonância com a LOS a
atuação da política de saúde em três áreas, quais sejam a assistência, as
intervenções ambientais e as políticas externas ao setor saúde, in verbis:
"A atenção à saúde, que encerra todo o conjunto de
ações levadas a efeito pelo SUS, em todos os níveis de governo, para o
atendimento das demandas pessoais e das exigências ambientais, compreende três
grandes campos, a saber:
a)o da
assistência, em que as atividades são dirigidas às pessoas, individual ou
coletivamente, e que é prestada no âmbito ambulatorial e hospitalar, bem como
em outros espaços, especialmente no domiciliar;
b)o das intervenções ambientais, no seu sentido mais
amplo, incluindo as relações e as condições sanitárias nos ambientes de vida e
de trabalho, o controle de vetores e hospedeiros e a operação de sistemas de
saneamento ambiental (mediante o pacto de interesses, as normalizações, as
fiscalizações e outros); e
c)o das políticas externas ao setor saúde, que
interferem nos determinantes sociais do processo saúde-doença das
coletividades, de que são partes importantes questões relativas às políticas
macroeconômicas, ao emprego, à habitação, à educação, ao lazer e à
disponibilidade e qualidade dos alimentos."
Lembra o já aludido MONTEIRO DE ANDRADE (2001:61) que
essa norma irá fazer expressamente a diferença entre a gerência e a gestão do
sistema de saúde. É a própria NOB que com perspicácia pontifica:
"Assim, nesta NOB gerência é conceituada como
sendo a administração de uma unidade ou órgão de saúde (ambulatório, hospital,
instituto, fundação etc.), que se caracteriza como prestador de serviços ao
Sistema. Por sua vez, gestão é a atividade e a responsabilidade de dirigir um
sistema de saúde (municipal, estadual ou nacional), mediante o exercício de
funções de coordenação, articulação, negociação, planejamento, acompanhamento,
controle, avaliação e auditoria. São, portanto, gestores do SUS os Secretários
Municipais e Estaduais de Saúde e o Ministro da Saúde, que representam,
respectivamente, os governos municipais, estaduais e federal.
A criação e o funcionamento desse sistema municipal
possibilitam uma grande responsabilização dos municípios, no que se refere à
saúde de todos os residentes em seu território. No entanto, possibilitam,
também, um elevado risco de atomização desordenada dessas partes do SUS,
permitindo que um sistema municipal se desenvolva em detrimento de outro,
ameaçando, até mesmo, a unicidade do SUS. Há que se integrar, harmonizar e
modernizar, com eqüidade, os sistemas municipais."
A NOB 01/96 vai definir com maior clareza o papel dos
gestores nas três esferas de governo, pela primeira vez quanto à União,
ademais. Demonstra, como visto acima, uma preocupação legítima com a
necessidade de integrar as ações de maneira a evitar o enfraquecimento global
do SUS na assimetria dos municípios brasileiros, com a manutenção do papel das
Comissões bipartite e tripartite e os Conselhos de Saúde como órgãos de
programação e pactuação entre os gestores.
Deve-se assinalar a criação da proposta do cartão sus
municipal que permitiria a identificação simultânea do cidadão com seu sistema
municipal de saúde e o sistema nacional e o incentivo ao modelo de agentes
comunitários de saúde no combate aos riscos epidemiológicos. A NOB 01/96 vai
instituir o Piso Assistencial Básico – PAB que garantirá o repasse automático
para ações básicas em saúde.
Serão definidos pela
NOB 01/96 os denominados tetos financeiros, quais sejam o teto financeiro
global (TFG), o teto financeiro da assistência (TFA), o teto financeiro global
do Estado (TFGE), o teto financeiro de vigilância sanitária (TFVS), o teto
financeiro de epidemiologia e controle de doenças (TFECD), o teto financeiro
global do município (TFGM), o teto financeiro da assistência ao município
(TFAM) e o teto financeiro de assistência ao Estado (TFAE), o que permitiu
maior transparência e controle gerencial das transferências e repasses
automáticos.
Para os municípios que adotem os programas de saúde da
família e agentes comunitários ficaram garantidos acréscimos percentuais ao
montante do PAB, o que revela a clara intenção do Ministério da Saúde em
minimizar os obstáculos ao estabelecimento do paradigma ético-participativo na
gestão sanitária em substituição ao modelo assistencial-curativo.
A NOB 01/96 propôs dois modelos de gestão aos quais
habilitaram-se 99% dos municípios brasileiros conforme notícia do Ministério da
Saúde. São eles a Gestão Plena da Atenção Básica e a Gestão Plena do Sistema
Municipal. Sendo norma atualmente em vigor permito-me transcrever sua
disciplina para cada modelo quanto às responsabilidades e prerrogativas em que
importa cada qual, e os critérios para habilitação:
A Gestão Plena da Atenção Básica:
"Responsabilidades
a)Elaboração de programação municipal dos serviços
básicos, inclusive domiciliares e comunitários, e da proposta de referência
ambulatorial especializada e hospitalar para seus munícipes, com incorporação
negociada à programação estadual.
b)Gerência de unidades ambulatoriais próprias.
c)Gerência de unidades ambulatoriais do estado ou da
União, salvo se a CIB ou a CIT definir outra divisão de responsabilidades.
d)Reorganização das unidades sob gestão pública
(estatais, conveniadas e contratadas), introduzindo a prática do cadastramento
nacional dos usuários do SUS, com vistas à vinculação de clientela e à
sistematização da oferta dos serviços.
e)Prestação dos serviços relacionados aos procedimentos
cobertos pelo PAB e acompanhamento, no caso de referência interna ou externa ao
município, dos demais serviços prestados aos seus munícipes, conforme a PPI,
mediado pela relação gestor-gestor com a SES e as demais SMS.
f)Contratação, controle, auditoria e pagamento aos
prestadores dos serviços contidos no PAB.
g)Operação do SIA/SUS quanto a serviços cobertos pelo
PAB, conforme normas do MS, e alimentação, junto à SES, dos bancos de dados de
interesse nacional.
h)Autorização, desde que não haja definição em
contrário da CIB, das internações hospitalares e dos procedimentos
ambulatoriais especializados, realizados no município, que continuam sendo
pagos por produção de serviços.
i)Manutenção do cadastro atualizado das unidades
assistenciais sob sua gestão, segundo normas do MS.
j)Avaliação permanente do impacto das ações do Sistema
sobre as condições de saúde dos seus munícipes e sobre o seu meio ambiente.
k)Execução das ações básicas de vigilância sanitária,
incluídas no PBVS.
l)Execução das ações básicas de epidemiologia, de
controle de doenças e de ocorrências mórbidas, decorrentes de causas externas,
como acidentes, violências e outras, incluídas no TFECD.
m) Elaboração do relatório anual de gestão e aprovação
pelo CMS.
Requisitos
a)Comprovar o funcionamento do CMS.
b)Comprovar a operação do Fundo Municipal de Saúde.
c)Apresentar o Plano Municipal de Saúde e
comprometer-se a participar da elaboração e da implementação da PPI do estado,
bem assim da alocação de recursos expressa na programação.
d)Comprovar capacidade técnica e administrativa e
condições materiais para o exercício de suas responsabilidades e prerrogativas
quanto à contratação, ao pagamento, ao controle e à auditoria dos serviços sob
sua gestão.
e)Comprovar a dotação orçamentária do ano e o dispêndio
realizado no ano anterior, correspondente à contrapartida de recursos
financeiros próprios do Tesouro Municipal, de acordo com a legislação em vigor.
f)Formalizar junto ao gestor estadual, com vistas à
CIB, após aprovação pelo CMS, o pleito de habilitação, atestando o cumprimento
dos requisitos relativos à condição de gestão pleiteada.
g)Dispor de médico formalmente designado como
responsável pela autorização prévia, controle e auditoria dos procedimentos e
serviços realizados.
h)Comprovar a capacidade para o desenvolvimento de
ações de vigilância sanitária.
I)Comprovar a capacidade para o desenvolvimento de
ações de vigilância epidemiológica.
j)Comprovar a disponibilidade de estrutura de recursos
humanos para supervisão e auditoria da rede de unidades, dos profissionais e
dos serviços realizados.
Prerrogativas
a)Transferência, regular e automática, dos recursos
correspondentes ao Piso da Atenção Básica (PAB).
b)Transferência, regular e automática, dos recursos
correspondentes ao Piso Básico de Vigilância Sanitária (PBVS).
c)Transferência, regular e automática, dos recursos
correspondentes às ações de epidemiologia e de controle de doenças.
d)Subordinação, à gestão municipal, de todas as
unidades básicas de saúde, estatais ou privadas (lucrativas e filantrópicas),
estabelecidas no território municipal."
Gestão Plena Do
Sistema Municipal :
"Responsabilidades
a)Elaboração de toda a programação municipal, contendo,
inclusive, a referência ambulatorial especializada e hospitalar, com
incorporação negociada à programação estadual.
b)Gerência de
unidades próprias, ambulatoriais e hospitalares, inclusive as de referência.
c)Gerência de unidades ambulatoriais e hospitalares do
estado e da União, salvo se a CIB ou a CIT definir outra divisão de
responsabilidades.
d)Reorganização das unidades sob gestão pública
(estatais, conveniadas e contratadas), introduzindo a prática do cadastramento
nacional dos usuários do SUS, com vistas à vinculação da clientela e
sistematização da oferta dos serviços.
e)Garantia da prestação de serviços em seu território,
inclusive os serviços de referência aos não-residentes, no caso de referência
interna ou externa ao município, dos demais serviços prestados aos seus
munícipes, conforme a PPI, mediado pela relação gestor-gestor com a SES e as
demais SMS.
f)Normalização e operação de centrais de controle de
procedimentos ambulatoriais e hospitalares relativos à assistência aos seus
munícipes e à referência intermunicipal.
g)Contratação, controle, auditoria e pagamento aos
prestadores de serviços ambulatoriais e hospitalares, cobertos pelo TFGM.
h)Administração da oferta de procedimentos
ambulatoriais de alto custo e procedimentos hospitalares de alta complexidade
conforme a PPI e segundo normas federais e estaduais.
i)Operação do SIH e do SIA/SUS, conforme normas do MS,
e alimentação, junto às SES, dos bancos de dados de interesse nacional.
j)Manutenção do cadastro atualizado de unidades
assistenciais sob sua gestão, segundo normas do MS.
k)Avaliação permanente do impacto das ações do Sistema
sobre as condições de saúde dos seus munícipes e sobre o meio ambiente.
l)Execução das ações básicas, de média e alta
complexidade em vigilância sanitária, bem como, opcionalmente, as ações do
PDAVS.
m)Execução de ações de epidemiologia, de controle de
doenças e de ocorrências mórbidas, decorrentes de causas externas, como
acidentes, violências e outras incluídas no TFECD.
Requisitos
a)Comprovar o funcionamento do CMS.
b)Comprovar a operação do Fundo Municipal de Saúde.
c)Participar da elaboração e da implementação da PPI do
estado, bem assim da alocação de recursos expressa na programação.
e)Comprovar capacidade técnica e administrativa e
condições materiais para o exercício de suas responsabilidades e prerrogativas
quanto à contratação, ao pagamento, ao controle e à auditoria dos serviços sob
sua gestão, bem como avaliar o impacto das ações do Sistema sobre a saúde dos
seus munícipes.
e)Comprovar a dotação orçamentária do ano e o dispêndio
no ano anterior correspondente à contrapartida de recursos financeiros próprios
do Tesouro Municipal, de acordo com a legislação em vigor.
f)Formalizar, junto ao gestor estadual com vistas à
CIB, após aprovação pelo CMS, o pleito de habilitação, atestando o cumprimento
dos requisitos específicos relativos à condição de gestão pleiteada.
g)Dispor de médico formalmente designado pelo gestor
como responsável pela autorização prévia, controle e auditoria dos
procedimentos e serviços realizados.
h)Apresentar o Plano Municipal de Saúde, aprovado pelo
CMS, que deve conter as metas estabelecidas, a integração e articulação do
município na rede estadual e respectivas responsabilidades na programação
integrada do estado, incluindo detalhamento da programação de ações e serviços
que compõem o sistema municipal, bem como os indicadores mediante dos quais será
efetuado o acompanhamento.
i)Comprovar o funcionamento de serviço estruturado de
vigilância sanitária e capacidade para o desenvolvimento de ações de vigilância
sanitária.
j)Comprovar a estruturação de serviços e atividades de
vigilância epidemiológica e de controle de zoonoses.
k)Apresentar o Relatório de Gestão do ano anterior à
solicitação do pleito, devidamente aprovado pelo CMS.
l)Assegurar a oferta, em seu território, de todo o
elenco de procedimentos cobertos pelo PAB e, adicionalmente, de serviços de
apoio diagnóstico em patologia clínica e radiologia básicas.
m)Comprovar a estruturação do componente municipal do
Sistema Nacional de Auditoria (SNA).
n)Comprovar a disponibilidade de estrutura de recursos
humanos para supervisão e auditoria da rede de unidades, dos profissionais e
dos serviços realizados.
Prerrogativas
a)Transferência, regular e automática, dos recursos
referentes ao Teto Financeiro da Assistência (TFA).
b)Normalização complementar relativa ao pagamento de
prestadores de serviços assistenciais em seu território, inclusive quanto a
alteração de valores de procedimentos, tendo a tabela nacional como referência
mínima, desde que aprovada pelo CMS e pela CIB.
c)Transferência regular e automática fundo a fundo dos
recursos correspondentes ao Piso Básico de Vigilância Sanitária (PBVS).
d)Remuneração por serviços de vigilância sanitária de
média e alta complexidade e, remuneração pela execução do Programa
Desconcentrado de Ações de Vigilância Sanitária (PDAVS), quando assumido pelo
município.
e)Subordinação, à gestão municipal, do conjunto de
todas as unidades ambulatoriais especializadas e hospitalares, estatais ou
privadas (lucrativas e filantrópicas), estabelecidas no território municipal.
f)Transferência de recursos referentes às ações de
epidemiologia e controle de doenças, conforme definição da CIT.
Para a regulamentação da NOB 01/96 o Ministério da
Saúde editou a Instrução Normativa nº 01/98 de 02 de janeiro de 1998 que
regulamenta os conteúdos, instrumentos e fluxos do processo de habilitação de
Municípios, de Estados e do Distrito Federal às novas condições de gestão
criadas pela Norma Operacional Básica do Sistema Único de Saúde - NOB SUS
01/96. Nesse diapasão, tomando-se por base que a NOB 01/96 foi bem sucedida na
expansão da municipalização da gestão, já que cerca de 99% dos municípios
brasileiros já eram participantes de alguma das formas de gestão estabelecidas,
mas que ainda restava a regionalização e hierarquização preconizada pela Lei
8.080/90. Assim sendo, postulou-se na NOAS-SUS 01/2001 a elaboração por parte
dos Estados-membros e Distrito Federal do Plano Diretor de Regionalização que
em harmonia com o plano estadual de saúde deve assegurar o mais amplo acesso
possível do cidadão às atividades de proteção à saúde em qualquer nível de
complexidade. São os PDRs os documentos que devem prever e estabelecer as
regiões ou microrregiões de saúde que serão divididas pelo critério de melhor
atendimento administrativo a situações comuns a diversos municípios e
estados-membros; os módulos assistenciais, que são unidades com poder de
resolução no plano básico de assistência abrangendo um ou mais municípios, que
nesse caso deverá eleger uma sede e4 as unidades territoriais de qualificação
na assistência à saúde, nas Unidades da federação em que o modelo de
regionalização não permitir microrregiões de saúde.
Para finalizar esse capítulo sobre a estrutura legal do
SUS devo ainda aduzir algum comentário sobre a Emenda Constitucional 29, de
13.09.2000. Tal modificação à Lei Fundamental de 1988 pretendeu vincular
percentual das receitas tributárias à política de saúde, assim como o
constituinte originário houvera feito com a educação.
A EC 29, de 13.09.2000 alterou os artigos 34,
35,156,160,167 e 168 e acrescenta o art. 77 ao ADCT, afirmando as bases
fundamentais dos valores a serem repassados pelos entes federativos na
constituição de um piso orçamentário para as atividades de saúde. Dessa
maneira, o art.77 do ADCT estabelece o ano de 2004 como termo final para os ajustes
orçamentários a serem introduzidos com acréscimos de 5% para a União em relação
ao exercício de 2000 reajustado consoante a variação nominal do PIB entre 2001
e 2004. Para os Estados e Distrito federal até 2004 o aumento orçamentário com
a saúde deve ser de 12% e para os Municípios de 15%.
PRINCÍPIOS REGULAMENTADORES DO
SUS: COMPETÊNCIA DAS TRÊS ESFERAS DE GOVERNO
Sobre o conceito de autonomia e descentralização:
Ensina RAUL MACHADO HORTA, maior autoridade sobre
federalismo na doutrina jurídica nacional, citando farta bibliografia
alienígena, que a jurisprudentia atribui inúmeros e multifários sentidos ao
termo "autonomia", ora alargando-o ora restringindo-o. Não há um
modelo próprio de federação no direito comparado, ressaltando apenas algumas
condições objetivas para uma caracterização mínima capaz de identificar a forma
de Estado mencionada, tais como:
"1. A decisão constituinte criadora do
Estado-federal e de suas partes indissociáveis, a federação ou União, e os
Estados-membros;
2.A repartição de competências entre a federação e os
Estados-membros;
3.O poder de auto-organização constitucional dos
Estados-membros, atribuindo-lhes autonomia constitucional;
4.A intervenção federal, instrumento para restabelecer
o equilíbrio federativo, em casos constitucionalmente definido;
5.A câmara dos Estados, como órgão do poder legislativo
federal, para permitir a participação do Estado-membro na formação da
legislação federal;
6.A titularidade dos Estados-membros, através de suas
Assembléias Legislativas, em número qualificado, para propor emenda à
Constituição Federal;
7.A criação de novo Estado ou modificação de Estado
existente dependendo da aquiescência da população do Estado afetado.
8.A existência no Poder Judiciário Federal de um
Supremo Tribunal ou Corte Suprema, para interpretar e proteger a Constituição
Federal, e dirimir litígios ou conflitos entre a União, os Estados, outras
pessoas jurídicas de direito interno, e as questões relativas à aplicação ou
vigência da lei federal", porém, faz observar o autor adiante que,
"não obstante a permanência de determinados requisitos, como a repartição
de competências, a autonomia constitucional do Estado-membro, a intervenção
federal, a Câmara dos Estados, recebem eles definições individualizadoras e
contrastantes nos diversos modelos reais de federalismo. Em alguns casos a
autonomia constitucional do Estado-membro praticamente deixa de existir, quando
a Constituição Federal se encarrega de preordenar o Estado-membro em seu texto,
tornando a Constituição Federal um documento híbrido, federal e Estadual"
(1995:347).
De fato, o que se depreende do trecho suso colecionado
é que se configura possível, sem agressão à doutrina ou ao direito comparado,
uma federação centralizada, como sem sombra de dúvida, é a direção implicada
nas recentes reformas efetuadas pelo governo federal brasileiro, o que não é novidade
neste país. A bem da verdade, a história da federação brasileira desde a
proclamação da República, onde encontra o seu nascedoiro, tem sido a
alternância entre modelos mais ou menos centralizados. Finda com a república
velha uma nefasta experiência nacional em termos de debilidade do governo
federal, onde a descentralização descambou para a cruel realidade da política
oligárquica, fenômeno que inscreveu seu nome na história brasileira como
"coronelismo", prostrando a política nacional, a começar pela manipulação
e distorção dos resultados eleitorais (que já era uma realidade no Império) até
a marginalização de Estados-membros não participantes do restrito pacto.
Retirado de: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5420