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A lição americana da limitação dos poderes federais

É preciso limitar os poderes do Executivo para construirmos um país sólido e confiável, onde as leis sejam aplicadas e seja respeitado o Estado de Direito. Os EUA são a prova viva desta receita de sucesso. Quanto menor e mais restrito forem os poderes do

Márcio C. Coimbra

A formação do estado nos Estados Unidos se deu modo muito peculiar, extremamente diferente daquela colonização que tivemos no Brasil. Isto resultou em um sistema federativo único, onde os estados que compõe a federação, gozam de certas autonomias em algumas matérias. Entretanto, a interferência federal, que originariamente deveria ser mínima, vem aumentando e diminuindo, de acordo com o período histórico e os acontecimentos nacionais.


Durante a constituição da federação norte-americana, os "Founding Fathers", George Washington, James Madison, Thomas Jefferson, John Adams, Benjamin Franklin e Alexander Hamilton, desenharam um sistema em que o poder federal exercia uma influencia mínima perante os Estados. Os americanos, naquela época, já consideravam o governo e o Estado um mal necessário, portanto, um governo central pairando perante todos os governos estaduais, não era o mais desejado. Mesmo enfrentando resistências internas, como externas, ou seja, a guerra pela independência com a Inglaterra, os Estados Unidos se constituíram em uma só federação.


O poder federal era extremamente restrito, denominado pelos americanos como "limited powers", e assim continuou por um grande período. A engenharia usada foi a seguinte: tudo aquilo que fosse competência federal, estaria exposto na Constituição. O que não estivesse ali, eram poderes dos Estados-membros, como deixa claro a 10ª emenda da Constituição americana. Portanto, os poderes, tanto do executivo, quanto do legislativo, se tornaram extremamente limitados. As cortes federais, denominados como "watch dogs", foram constituídas no intuito de vigiar os outros dois poderes, para que estes atuassem dentro de seu limite. Exemplos de competências federais são, por exemplo, regulação de comércio, conflito entre estados e falências.


Já neste século, algo começou a mudar. A presidência de Kennedy foi um marco. Muitas mudanças foram feitas durante seus três anos na Casa Branca. Como resultado de uma atuação marcante dentro do executivo, a partir de 1960, o poder federal começou a expandir. Nesta época foram desenvolvidos conceitos e legislações acerca de leis de defesa do consumidor, direito ambiental e principalmente direitos civis. Kennedy conseguiu expandir o poder federal com a adoção de novos conceitos.


Com a chegada de Reagan ao poder na década de 80, o poder federal começa a diminuir. Os republicanos não estavam preocupados em criar novos direitos nacionais, pois o foco da administração, naquele momento, era a diminuição da alta taxa de inflação deixada pelo governo Carter, além da tentativa de retomada dos rumos da economia. Bush, logo após, segue com a mesma política, que criou o ambiente propício para o mar de prosperidade econômica que vive o país nos dias de hoje. Com Clinton, o poder federal de regulação do governo americano chega a um equilíbrio. Mais preocupado com questões mundiais e herdeiro uma economia em ótimo estado, pode se preocupar com questões como direito ambiental e a perigosa regulação de comércio.


A lição que pode ser retirada da história dos Estados Unidos é a limitação do poder. É a prova de que um Estado com poderes federais limitados, pode gerar desenvolvimento. Apesar de nos EUA, mais recentemente, existir uma balança entre maior e menor intervenção federal, este conceito está dentro do "estado mínimo", portanto, a intervenção estatal se desloca dentro de uma banda restrita, muito menor daquela que encontramos em nosso país.


No Brasil, uma limitação tanto dos poderes federais, quanto dos estaduais, com um controle efetivo do Ministério Público, vigiando os atos governamentais, é o primeiro passo para construirmos um país mais confiável e sólido, onde as leis sejam aplicadas e seja respeitado o Estado de Direito. Quanto menor e mais restrito forem os poderes do Estado, maiores serão as oportunidades de o cidadão desenvolver suas potencialidades. Os EUA são a prova viva desta receita de sucesso.


Márcio C. Coimbra é advogado em Porto Alegre, RS

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