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A LIMITAÇÃO DAS LIMINARES: VIOLAÇÃO À LEI MAIOR

Luiz Alberto Gurgel de Faria
Juiz Federal e Professor da UFRN

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. LIMINAR: CONCEITO, NATUREZA JURÍDICA, PRESSUPOSTOS E CARACTERÍSTICAS. 3. LIMITAÇÃO DAS LIMINARES. 4. CONCLUSÃO. 5. BIBLIOGRAFIA.

  1. INTRODUÇÃO

Durante um século, o estudo do direito processual teve como objetivo principal destacar a sua autonomia. Tratados e tratados foram escritos a respeito do tema.

A preocupação com a questão era de tamanha envergadura que os operadores do Direito, na maioria das vezes, colocavam de lado o direito material, procurando sempre enaltecer a figura do processo.

Ocorre que, nos dias de hoje, o assunto já se encontra sedimentado. Com a superação da matéria, as atenções dos estudiosos foram se voltando para outra temática não menos importante: a celeridade e a efetividade da prestação jurisdicional.

Deveras, o processo é o meio para se alcançar o direito e não o seu fim, de modo que ele tem que se adequar a essa realidade para que, quanto mais rápido possível, possa cumprir a sua função na sociedade, como instrumento apaziguador das relações em conflito.

Diante do embate tempo X direito, ganham notoriedade os institutos utilizados para otimizar os resultados do processo, como as novéis tutelas antecipadas e específica (arts. 273 e 461, § 3º, CPC), além da antiga liminar.

Esta, de modo mais próximo, interessa ao presente trabalho.

Apesar de sua importância no ordenamento jurídico nacional, principalmente como forma de evitar um dano irreparável ao direito em debate, não raras vezes a liminar vem sendo obstaculizada e até mesmo vedada, o que justifica o estudo do tema.

A questão não é nova, mas se restaura neste momento, oportunidade em que os Governadores estão se mobilizando para a aprovação de um "pacote de medidas" já entregue ao Congresso Nacional, dentro do qual está previsto um projeto de lei suspendendo, até 31 de dezembro de 1998, a concessão de liminares que impliquem na utilização de recursos orçamentários dos Estados, Distrito Federal e Municípios.

2. LIMINAR: CONCEITO, NATUREZA JURÍDICA, PRESSUPOSTOS E CARACTERÍSTICAS.

O objetivo deste ensaio já se encontra especificado. Inobstante, não se pode cuidar do tema principal sem antes traçar rápidas linhas acerca dos elementos que delimitam o instituto.

A iniciar pela sua definição, que pode ser assim resumida: trata-se de provimento jurisdicional através do qual se resguarda o resultado útil do processo ou se antecipa os efeitos da sentença, de maneira a evitar a ineficácia da tutela caso deferida apenas no final da contenda.

O conceito exposto adota uma posição eclética em relação à bipartição doutrinária acerca da natureza jurídica do instituto.

Na realidade, a maioria dos autores nacionais, como Celso Agrícola Barbi, Othom Sidou, Alcides de Mendonça Lima, Diogo de Figueiredo Moreira Neto e Mílton Flaks advogam a tese de que a liminar é uma medida cautelar, enquanto outros notáveis juristas negam essa natureza, como Lopes da Costa, Pestana de Aguiar Silva, Hamílton de Moraes Barros e Humberto Theodoro Júnior (apud Adhemar Ferreira Maciel, Observações sobre a Liminar no Mandado de Segurança, in Mandados de Segurança e de Injunção, Coordenação do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Saraiva, São Paulo, 1990, p. 234/5).

É bem verdade que algumas das opiniões esboçadas foram feitas no estudo específico da liminar no mandado de segurança.

Apesar disso, com a devida vênia, entendo que não só nas demais ações em que se admite a liminar, como também no remédio heróico, há situações rotineiras na prática processual em que não se pode negar a presença da tutela ora como uma garantia do próprio processo, ora como uma antecipação dos efeitos da sentença.

Na tentativa de melhor explicar a nossa posição, vamos a dois exemplos.

Digamos que um candidato habilitado em todas as etapas de um concurso público não tenha o seu nome incluído na lista dos aprovados por um erro na contagem de seus títulos, acarretando média inferior à prevista no edital. Desde que os fatos sejam incontroversos e observado o prazo legal, ele poderá manejar o mandado de segurança para dirimir a questão, requerendo liminarmente, por medida de cautela, a reserva de sua vaga.

Em outra situação, pensemos em um poupador que estivesse com viagem inadiável para o exterior a fim de se submeter a um transplante de medula, sendo que o dinheiro depositado no banco destinado às despesas médicas e hospitalares restou bloqueado em face das medidas econômicas adotadas pelo Governo. Ele poderia ingressar com o writ, solicitando, in limine, a liberação do numerário, o que, caso concedido, representaria a antecipação dos efeitos da sentença.

Como se pode ver, a liminar, a depender da urgência e da necessidade da tutela pretendida, pode se configurar em uma simples medida cautelar ou numa verdadeira antecipação do direito.

A sua concessão, por sua vez, está sujeita à presença conjunta de dois pressupostos básicos: a fumaça do bom direito e o perigo na demora da prestação jurisdicional.

Levando em consideração que a liminar é admitida não apenas em uma ação, mas em várias, v.g. mandado de segurança, ação civil pública, ação popular, ação para obrigação de fazer ou não fazer versando sobre direito do consumidor etc., a denominação dos referidos requisitos pode mudar, mas, em sua essência, estão ligados sempre à mesma idéia: o direito demonstrado aparenta ser razoável (com forte possibilidade de merecer a guarida judicial) e a sua proteção tem que ser feita de imediato, sob pena de não mais ser possível no final do processo.

Não é demais repetir que os pressupostos exigidos devem se apresentar conjugados, de maneira que a presença isolada de um deles não autoriza a liminar.

Utilizando a especificação dos atos judiciais inseridas no art. 162 do Estatuto Processual Civil, o pronunciamento judicial que aprecia a medida liminar é interlocutório, pois há uma decisão do Juiz a respeito de uma questão incidente, sem que, contudo, ponha-se fim ao processo. Em conseqüência, o recurso cabível contra esse decisum é o agravo de instrumento (art. 522, CPC).

Há de se registrar que a medida em destaque é aceitável, também, em sede desse recurso, diante de sua nova disciplina (Lei nº 9.139, de 30.11.95), desde que o relator reconheça a presença das exigências justificadoras da liminar denegada em primeira instância.

A assertiva, embora ainda controvertida, vem sendo reforçada com recentes decisões dos Tribunais (que acolhem a tese apresentada), como também junto à melhor doutrina. Nesse sentido é o magistério de Hugo de Brito Machado (O Mandado de Segurança e a Reforma do Agravo, in Teia Jurídica, revista editada na Internet, março/96):

" Penso que a norma do art. 527, inciso II, do CPC, na redação que lhe deu a Lei nº 9.139/95, não deve ser interpretada literalmente, mas com especial atenção para o elemento teleológico. Se a finalidade da alteração do regime jurídico do agravo foi precisamente tornar desnecessário o uso do mandado de segurança, com a amplitude já consagrada na jurisprudência, é evidente que naquela norma deve ser vista uma autorização para o Relator atender, provisoriamente, a pretensão do agravante. Em outras palavras, com fundamento no inciso II, do art. 527, o Relator pode não apenas dar efeito suspensivo ao agravo, mas igualmente conceder o provimento que a decisão atacada negara". (Grifei).

O assunto, como já se disse, não é pacífico, mas a solução apresentada é a que melhor se assemelha com a feição do novo agravo.

Quanto às características da liminar, podem ser assim sumariadas: urgência, cognição sumária, provisoriedade e revogabilidade.

A primeira delas legitima a própria razão da existência da liminar, que não teria sentido sem a necessidade de uma medida inadiável para tutelar o direito em perigo.

Já a cognição há de ser sumária, ou seja, simples, célere, através da qual se examina a aparência do direito em debate e o perigo de dano, restando um estudo mais aprofundado da lide (cognição exauriente) a ser realizado no momento adequado: na sentença.

As demais particularidades da liminar são uma conseqüência da sumariedade, pois a sua duração encontra limite no exame percuciente da lide, ocasião em que a medida poderá ser substituída por um provimento definitivo ou simplesmente revogada. O seu caráter provisório está, dessa forma, ligado à revogabilidade, sendo válido destacar que a ab-rogação pode ocorrer em qualquer fase do processo (desde que demonstrado que os pressupostos autorizadores da medida não mais se fazem presentes) e não apenas na sentença.

3. LIMITAÇÃO DAS LIMINARES.

Conforme já tive oportunidade de expor, o tema não é recente. Surgiu, inicialmente, através da Lei nº 2.410, de 29.01.55, seguida da Lei nº 2.770, de 04.05.56, que, em seu art. 1º, assim dispunha: "Nas ações e procedimentos judiciais de qualquer natureza, que visem obter a liberação de mercadorias, bens ou coisas de qualquer espécie procedentes do estrangeiro, não se concederá, em caso algum, medida preventiva ou liminar que, direta ou indiretamente, importe na entrega de mercadoria, bem ou coisa".

A norma teve como causa a proteção da indústria automobilística nacional, que se encontrava no início de suas atividades, como também objetivava evitar abusos na liberação imediata de veículos que, no decorrer do processo, constatava-se que o ingresso no território indígena era ilegal.

Posteriormente adveio a Lei nº 4.348, de 26.06.64, que, em seu art. 5º, determina: "Não será concedida medida liminar de mandados de segurança impetrados visando à reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou à concessão de aumento ou extensão de vantagens." A citada vedação foi ampliada na Lei nº 5.021, de 09.06.66, art. 1º, § 4º: "Não se concederá medida liminar para efeito de pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias."

Mais tarde, foi editada a MP nº 173/90, convertida na Lei nº 8.076, de 22.08.90, que, em seu art. 1º, suspendia, até 15 de setembro de 1992, a concessão de medidas liminares nos mandados de segurança e nos procedimentos cautelares que versassem sobre as matérias reguladas pelas leis que especificava, todas resultantes do Plano de Estabilização Econômica implantado pelo novo Governo, mais conhecido como "Plano Collor".

Há poucos anos atrás, foi promulgada a Lei nº 8.437, de 30.06.92, que proíbe a "concessão de medida liminar contra atos do Poder Público, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, toda vez que providência semelhante não puder ser concedida em ações de mandado de segurança, em virtude de vedação legal" (art. 1º).

Agora, de acordo com a mídia televisiva e com a imprensa escrita (v.g. Gazeta Mercantil/SP, 19.10.96, Jornal do Comércio/PE, 30.10.96) a pretensão é que uma nova lei suspenda, até 31 de dezembro de 1998, a concessão de liminares que impliquem na utilização de recursos orçamentários das entidades político-administrativas.

Surge, portanto, a seguinte indagação: as restrições impostas às liminares são compatíveis com a Lei Ápice em vigor ?

A resposta negativa merece prevalecer.

A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XXXV, contém um de seus princípios mais importantes: o da inafastabilidade do controle jurisdicional.

Com efeito, de nada valeria assegurar direitos aos indivíduos se eles não dispusessem de um meio para proteger ou resgatar tais prerrogativas quando elas estivessem ameaçadas ou violadas.

Necessário se faz salientar que o princípio restou reforçado pelo Constituinte de 1988, uma vez que a defesa da "ameaça a direito" passou a ser expressamente prevista no novo texto.

Como é do nosso conhecimento, o ordenamento jurídico pátrio veda a autotutela privada (salvo raríssimas exceções, como a autodefesa - art. 502, CC), de maneira que o Estado deve colocar à disposição da comunidade todos os instrumentos imprescindíveis à eficaz proteção do direito.

Nesse particular, o Constituinte também foi bastante feliz ao criar novos remédios a serem manejados pelos jurisdicionados, como o habeas data, o mandado de segurança coletivo e o mandado de injunção.

Assim, as diversas modalidades de ações que podem ser promovidas pelos interessados, cada uma adequada ao tipo de tutela pretendida, tornam possível o perfeito cumprimento do princípio em destaque.

Ocorre que, por vezes, a proteção ao direito intimidado ou violado não comporta a demora que normalmente transcorre entre o início de um processo e a efetiva entrega da prestação jurisdicional, sob pena desta findar ineficaz.

Daí exsurge a importância das tutelas de urgência, como as liminares, a serem examinadas num processo de cognição simples e célere - sumária.

De fato, há situações em que a proteção ao direito tem de ser imediata ou, caso contrário, o tempo cuidará de consolidar a ofensa de modo definitivo.

Dessa forma, o princípio insculpido no art. 5º, XXXV, CF, deve ser compreendido não só como o direito à ação, mas também à tutela jurisdicional adequada, de maneira que a limitação de liminares viola o preceito.

Voltemos ao exemplo do poupador enfermo, que teve as suas economias bloqueadas no Plano Collor e que precisava do dinheiro para fazer um transplante urgente no exterior. Impetrado o mandado de segurança e demonstrados os requisitos necessários à liminar, a medida não poderia ser deferida em face do art. 1º da Lei nº 8.076/90 supracitada. A se cumprir o comando previsto neste diploma legal, o provimento judicial teria que ser adiado e, quando concedido, a medida poderia restar ineficaz, diante do passamento do suplicante.

Vamos a uma questão mais simples: uma francesa com visto permanente no Brasil, Doutora em Sociologia, submete-se a concurso público para professor de uma Universidade Federal, com base no permissivo contido no art. 207, § 1º, CF (com a redação que lhe foi dada pela EC nº 11/96), sendo aprovada com louvor em primeiro lugar. Nomeada, empossada e já em exercício, aguarda, com tranqüilidade, a sua remuneração, sendo surpreendida, após dois meses de labor, com a notícia de que ainda não foi possível o seu cadastramento na folha de pagamento, pois o sistema do órgão competente do Ministério da Administração (que atualmente controla toda a folha de pessoal da Administração Pública Federal) não está "programado" para aceitar a inclusão de estrangeiro. Promovida a ação competente e provados os pressupostos respectivos, a tutela de urgência não seria deferida, a se atender a regra inserida no art. 1º, § 4º, da Lei nº 5.021/66. Enquanto isso, a docente passaria meses sem ter como garantir as suas despesas básicas, pois o seu salário não era pago. Este caso aconteceu recentemente na Seção Judiciária do Rio Grande do Norte, sendo que a tutela imediata postulada foi concedida.

Ora, os exemplos apresentados são mais do que suficientes para demonstrar que a limitação das liminares impede a concessão da tutela jurisdicional adequada e, em conseqüência, viola o princípio da inafastabilidade, ofendendo, assim, a Constituição.

É essa a lição de Luiz Guilherme Marinoni (in Tutela Cautelar e Tutela Antecipatória, RT, São Paulo, 1992, p. 96):

"Efetivamente é por demais evidente que determinadas pretensões somente se compatibilizam com tutelas de urgência. E as liminares e as ações urgentes, para estes casos, são os instrumentos que concretizam o direito à adequada tutela jurisdicional. A restrição do uso da liminar, portanto, significa lesão evidente ao princípio da inafastabilidade."

Nesse sentido também é a opinião de Betina Rizzato Lara (in Liminares no Processo Civil, 2ª edição, RT, São Paulo, 1994, p. 74):

"Todo e qualquer veto à concessão de liminares, no nosso entender, é inconstitucional, mesmo que o motivo justificador para tal vedação seja o interesse público."

Idêntica é a posição de Francisco Barros Dias (Inconstitucionalidade das Normas Impeditivas de Liminares, in Revista de Processo, nº 59, p. 134):

"Na atualidade, não resiste qualquer idéia da constitucionalidade das normas impeditivas de liminares, quer sejam anteriores ou posteriores à Constituição, frente à clareza do inc. XXXV, do art. 5º, do Texto Magno".

Teresa Celina de Arruda Alvim Pinto (in Medida Cautelar, Mandado de Segurança e Ato Judicial, Malheiros, São Paulo, 1992, p. 24) também defende essa tese:

"Por causa de indesejáveis abusos que houve, há hipóteses em que, hoje, se proíbe a concessão de medida liminar. São estas proibições, a nosso ver, inconstitucionais, justamente pelo que afirmamos, com relação à importância da medida liminar e sua ligação com a natureza e finalidade do mandado de segurança."

Não é outro o magistério do saudoso jurista Hely Lopes Meirelles (in Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção e "Habeas Data", 13ª edição, RT, São Paulo, 1991, p. 53), ao comentar a questão no tocante à proibição das liminares pertinentes à remuneração dos servidores públicos:

"Tais restrições se nos afiguram inconstitucionais por desigualarem os impetrantes no mandado de segurança, em detrimento do servidor público, quando a Constituição da República não faz essa distinção ao instituir o mandamus."

Sérgio Ferraz (in Mandado de Segurança, Malheiros, São Paulo, 1992, p. 109) também comunga com esse pensamento:

"É inconstitucional a norma legal ou regulamentar que proíba, transitória ou definitivamente, a concessão de liminar".

Como se pode constatar, a maioria da doutrina vem se manifestando contrária à vedação das liminares, diante de sua inconstitucionalidade.

Não se pode deixar de registrar, porém, que há vozes abalizadas em contrário, como as de Galeno Lacerda (apud Betina Rizzato Lara, ob. cit., p. 75) e de Lázaro Guimarães (in As Ações Coletivas e as Liminares contra Atos do Poder Público, Visão Editora, Salvador, 1992, p. 28), que assim se posiciona:

"A mera restrição ao poder de cautela do juiz, em casos determinados e diante de razões plausíveis, não conflita com a regra geral do amplo recurso ao Judiciário. A apreciação da demanda é sempre permitida, inviabilizando-se apenas o seu atendimento imediato, nas situações especificadas em lei, como medida de proteção ao Erário Público".

Com o devido respeito às manifestações em contrário, não creio que esse entendimento mereça prevalecer, uma vez que, de acordo com o já esboçado, a tutela jurisdicional adequada seria impedida.

A preocupação com o Erário Público é louvável e digno de atenção, mas a questão certamente não há de ser resolvida com a vedação das liminares, sob pena de criar situações incontornáveis à proteção ao direito do jurisdicionado, violando a Lei Maior.

Na busca de alternativas plausíveis para evitar prejuízos futuros ao demandado que terá de sofrer os efeitos da liminar, boa parcela dos doutrinadores vem optando pela prestação de caução, conforme revela Betina Rizzato Lara (ob. cit., p. 76).

Creio, com a devida vênia, que não é essa a melhor solução.

A audiência prévia do ente público, na forma prevista no art. 2º da Lei nº 8.437/92, pode configurar uma alternativa a ser estendida a liminares em outras ações, mormente se considerando que a manifestação do suplicado ensejaria esclarecimentos que poderiam refutar a presença dos pressupostos autorizadores da medida.

Tal providência, aliada aos instrumentos postos à disposição da parte demandada - o novo agravo, que admite a atribuição de efeito suspensivo (art. 527, II, CPC), bem como a suspensão das liminares (art. 4º, Lei nº 4.348/64, e art. 4º, Lei nº 8.437/92), consubstanciariam um maior controle das liminares.

Não é demais salientar que alguns poucos abusos ocorridos na concessão de liminares não podem servir como argumento para tolher um instituto tão nobre e indispensável, sendo certo que a adoção regular da audiência prévia, ligada ao recurso competente (a provocar a célere manifestação do Tribunal), certamente inibirão as exorbitâncias.

Há de se observar, porém, que, se no caso concreto a ouvida anterior pudesse tornar ineficaz a medida (em face da extrema urgência na tutela pretendida), obviamente tal prevenção não seria exercida, devendo o Juiz decidir de imediato.

A solução passa, pois, por um controle mais efetivo da concessão das liminares e na possibilidade mais rápida de reformar a decisão.

Destarte, dúvidas não restam no sentido de que a limitação das liminares fere a Constituição.

Com apoio no escólio de Luiz Guilherme Marinoni (ob. cit., p. 96), há de se verificar que a ofensa não se restringe ao princípio da inafastabilidade, pois "se a norma preceitua que está proibida a concessão de liminar, ela está, em outras palavras, afirmando que jamais existirá necessidade de tutela urgente, ou seja, está valorando aquilo que deve ser objeto da cognição do magistrado. Desta forma arranha-se, realmente, ainda que de forma sutil, o princípio do juiz natural".

É digno de nota, ainda, que o Colendo Supremo Tribunal Federal, nos autos da ADIN 223-6-DF, Relator o Exmo. Sr. Ministro Sepúlveda Pertence, embora tenha negado o pedido de declaração de inconstitucionalidade da MP nº 173/90, que veio a ser convertida na Lei nº 8.076/90, deixou claro que o Juiz, no caso concreto, poderia julgar inconstitucional as restrições impostas à concessão da liminar, vindo a deferi-la.

4. CONCLUSÃO

Como se pôde noticiar neste trabalho, o processualista moderno está voltado cada vez mais para a necessidade de agilizar a prestação jurisdicional, daí porque a importância das tutelas de urgência, como a liminar, vem sendo, dia a dia, enaltecida.

A medida mencionada é manejada para resguardar o resultado útil do processo ou antecipar os efeitos da sentença, de maneira a evitar a ineficácia da tutela caso deferida apenas ao fim da contenda, ora configurando uma cautelar, ora não estando revestida dessa natureza.

Para a sua concessão, faz-se necessária a presença conjunta de dois pressupostos básicos: a fumaça do bom direito e o perigo na demora da prestação jurisdicional.

Por sua vez, o tema da limitação das liminares não é novo, já tendo sido objeto de diversos diplomas legais, todos inconstitucionais, tendo em vista que impedem o direito à tutela jurisdicional adequada, violando, em corolário, o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, além do legislador invadir esfera de cognição própria do Magistrado, ofendendo o preceito do juiz natural.

Ademais, as restrições impostas se encontram na contramão da história, no momento em que novos institutos são criados exatamente para abreviar e antecipar os efeitos da sentença.

Há de se recordar a célebre frase de Carneluti: "o tempo é um inimigo do direito, contra o qual o juiz deve travar uma guerra sem tréguas" (apud Cândido Rangel Dinamarco, A Reforma do Código de Processo Civil, 2ª edição, Malheiros, São Paulo, 1995, p. 138).

Na busca de uma prestação jurisdicional mais célere e efetiva, não só os Magistrados, como também os demais operadores do Direito devem ingressar nessa luta, manifestando-se, na hipótese estudada, contrariamente à vedação das liminares.

Retirado de http:// www.jurisnet-rn.com.br