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Análise da
investigação preliminar de acordo com seus possíveis titulares
Claudio Geoffroy Granzotto*
*Advogado da União no Rio de Janeiro (RJ), especialista
1- Considerações iniciais:
Analisaremos os sistemas investigativos baseados na diversidade dos seus
titulares, demonstrando as vantagens e os inconvenientes destes procedimentos,
apresentando, ao final, algumas sugestões que, implementadas,
certamente iriam gerar maior eficácia à investigação preliminar.
Nesse sentido, será analisada a investigação criminal presidida pelo Juiz
(juizado de instrução), Promotor e, por fim, pelo Delegado de Polícia.
Antes, porém, faremos uma breve apresentação do instituto da investigação
criminal, tecendo alguns comentários sobre algumas de suas características.
2- INVESTIGAÇÃO CRIMINAL
2.1Conceito
A investigação criminal é um procedimento administrativo pré-processual, de
cognição sumária, cujo objetivo imediato é averiguar o delito e sua autoria,
fornecendo elementos para que o titular da ação penal proponha o processo
(oferecimento da peça exordial) ou o não processo
(arquivamento) (1).
Pela definição podemos identificar a natureza jurídica, a finalidade e o grau
de cognição da deste procedimento.
2.2 Natureza Jurídica
Quanto à natureza jurídica, trata-se de procedimento administrativo, não
obstante a possibilidade de serem praticados atos judiciais e até mesmo
jurisdicionais, como no caso de uma medida constritiva de direitos
fundamentais, tal qual a prisão preventiva.
Cabe ressaltar que, quando presidida por integrante do poder judiciário sua
natureza se transmuda para procedimento judicial.
Por fim, independente do órgão que o presida, jamais esse atos vão representar
uma relação processual, justamente por faltarem elementos necessários à
configuração da mesma, tais como, existência de partes potencialmente
contrapostas, um rito a ser seguido (2), publicidade de seus atos (3) e
encerramento por uma sentença.
2.3 Grau de cognição
No processo penal há três diferentes níveis de cognição, segundo se busque um
juízo de possibilidade, de probabilidade ou de certeza (4).
Para se chegar a um juízo de certeza, é necessário esgotar toda a matéria
probatória, através de uma cognição plena, o que justificaria uma sentença
condenatória.
Já para o início de uma ação penal, é necessário tão somente um juízo de
probabilidade, que seria o predomínio das razões positivas que afirmam a
existência do delito e sua autoria.
Quanto à investigação preliminar, para sua deflagração, basta um juízo de
possibilidade (razões favoráveis forem equivalentes às contrárias).
Por outro lado, como seu objetivo é tão somente averiguar os fatos, embasando
ou não uma futura ação penal, percebe-se, desde logo, que não há razões para
que se busque esgotar toda matéria probatória, o que só geraria morosidade desnecessária
ao procedimento preliminar.
Ademais, esgotando-se quase que totalmente a matéria probatória na fase
preliminar, haverá um grande prejuízo à defesa, eis que além de não ter podido
contar inteiramente com as garantias constitucionais naquela fase, tenderá a
haver na instrução judicial somente ratificação dos atos investigativos e não
propriamente produção de provas.
Logo, a investigação no plano de cognição deverá ser sumária, limitando-se a
atividade mínima de comprovação e averiguação dos fatos e da autoria, para
justificar o processo ou o não processo (5).
2.4 Finalidade
No que tange à sua finalidade, resta claro que visa à averiguação do fato tido
como criminoso, ressaltando que sua missão poderá ser alcançada, quer havendo
propositura da ação penal, como requerimento de arquivamento.
Nesse sentido, indo de encontro a grande parcela da Doutrina (6), entendemos
que o objetivo do inquérito é a busca da verdade dos fatos e não somente a preparação
para uma futura ação penal, pois se assim o fosse, restaria claro que este
procedimento estaria voltado apenas para a acusação.
Na verdade, os elementos colhidos durante a investigação podem servir de
embasamento para a propositura da ação penal, porém, não é este o seu objetivo,
mas tão-somente uma conseqüência deste procedimento.
De outra forma, se após a investigação restar claro que não houve crime, como
no caso de atipicidade de conduta ou presença de causas que excluam a
antijuridicidade, ainda assim estará sendo cumprida a finalidade do
procedimento preliminar. (7)
Com efeito, trazemos a colação o posicionamento de André Rovegno
(8):
...a investigação criminal em geral e o inquérito em particular destinam-se à
apuração da verdade plena, sobre fato supostamente criminoso, posto que jamais podem ser tidas como atividades preparatórias da ação penal,
sob pena de se fazer dessa delicadíssima atividade estatal uma fonte vigorosa
de processos penais desnecessários e equivocados. A investigação criminal,
conforme o caso, embasa o processo; jamais deve
deliberadamente prepará-lo.
A investigação, por outro lado, tem também uma função mediata, indireta, qual seja, assegurar a paz e a tranqüilidade social,
consubstanciada na garantia que todas as condutas tidas como delitivas serão
objeto de averiguação, gerando a atuação estatal um estímulo negativo para a
prática de novas infrações (9).
Cumpre salientar que a investigação criminal possui uma finalidade mediata, de
cunho eminentemente garantista, de filtro processual
(10), evitando acusações infundadas.
Nessa esteira, se a instrução definitiva busca certificar se há provas ou não
para uma condenação, através da cognição plenária, a investigação criminal visa
buscar se há elementos para que se proceda ao processo ou não.
Assim, as investigações fundadas em meras probabilidades não devem prosperar, sendo seu destino o arquivamento e não uma
acusação infundada, que geraria diversas cargas negativas ao réu, como por
exemplo, a estigmatização social derivada do processo
penal.
Nesse diapasão, trazemos a lição de Lopes Jr (11):
O termo estigmatizar encontra sua origem etimológica no latim stigma, que alude à marca feita com ferro candente,
o sinal da infâmia, que foi, com a evolução da humanidade, sendo substituída
por diferentes instrumentos de marcação. O processo penal e, geral e acusação
formal em especial são hoje manifestações de infâmia, tendo sido o ferro
candente substituído pela denúncia ou queixa abusiva e infundada
A pessoa submetida ao processo penal perde sua identidade, sua posição e
respeitabilidade social, passando a ser considerada desde logo como
delinqüente, ainda antes mesmo da sentença e com o simples indiciamento. Em
síntese, recebe uma nova identidade, degradada, que altera radicalmente sua
situação social. Ademais, se o processo como um todo pode ser considerado uma
cerimônia degradante, no seu interior é possível identificar determinados atos
que aumentam esse grau de vexação, especialmente as medidas cautelares pessoais
e a publicidade abusiva dos atos de investigação ou do processo.
Vale ressaltar que a finalidade da investigação varia de acordo com o órgão que
a presida. Desta forma, como será visto adiante, um órgão que tenha interesse
(seja parte na futura ação penal), poderá vir a conduzir o procedimento
preliminar de maneira que melhor lhe convenha, dando um maior enfoque na busca
de elementos que embase seu desiderato final.
Por outro lado, um órgão neutro, que não tenha pretensão em eventual e futura
ação penal, tenderá a ter uma atuação imparcial na busca da elucidação dos
fatos.
3- SISTEMAS DE INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR
Analisaremos os modelos de investigação, de acordo com o órgão que o presida,
dando enfoque para os aspectos positivos e negativos de cada um, para que
possamos, no fim desta obra, propor um modelo que atenda aos anseios dos atores
do Processo, sobretudo de nossa Carta Magna.
3.1- JUIZ INVESTIGADOR (JUIZADOS DE INSTRUÇÃO)
Nesse sistema, o juiz instrutor é a máxima autoridade, devendo por sua própria
iniciativa e sem necessidade de provocação, salvo nos delitos privados,
determinar a instauração da investigação preliminar, dirigindo e/ou realizando
as mesmas. Para isto, terá a Polícia judiciária para auxiliá-lo, a qual está
diretamente subordinada no plano funcional.
O juiz instrutor poderá, dentre outras medidas, interrogar
o suspeito, utilizar medidas cautelares pessoais ou reais, ordenar perícias,
etc.
A iniciativa probatória esta inteiramente em suas mãos, limitando a
participação da defesa e do Ministério público, em regra, a solicitar
diligências, as quais serão deferidas ou não a seu critério
(12).
Atualmente, nos países que adotam esse sistema (13), o juiz que preside a
instrução preliminar fica impedido de atuar como julgador no futuro processo,
tendo em vista os riscos decorrentes da contaminação com o seu envolvimento
direto com os elementos investigativos.
3.1.2 AGUMENTOS FAVORÁVEIS AO SISTEMA DO JUIZ INVESTIGADOR
Partindo-se do pressuposto que o juiz que instrui não é o mesmo que julgará
(abandono do sistema do juiz inquisidor), a principal vantagem desse sistema é
que a autoridade diretora é um órgão suprapartes,
imparcial e com diversas garantias.
Nesse sentido, um órgão imparcial irá colher as provas, mas sem pesar a linha
de investigação para qualquer lado, senão ao da busca das provas de cargo e descargo, servindo o material investigativo, ao final da
instrução, tanto para a acusação como para a defesa, tendo em vista sua falta
de pretensão na futura ação penal.
Por outro lado, um órgão dotado de garantias estaria livre para colher as
provas, sem temer a pressão que assola certas autoridades (14), principalmente
nos casos de grande repercussão.
3.1.3 ARGUMENTOS CONTRÁRIOS AO SISTEMA DO JUIZ INSTRUTOR
O principal argumento contrário ao sistema de investigação judicial é o excesso
de poderes conferidos a uma única pessoa.
Nesse diapasão, o juiz da instrução é quem autoriza os atos investigativos
tendentes a restringir direitos fundamentais (medidas cautelares reais e
pessoais). Logo, como pode a mesma pessoa entender conveniente um ato de
investigação e ao mesmo tempo avaliar sua legalidade? São funções
incongruentes, que não podem ficar na mão de um mesmo órgão, sob pena de quebra
do sistema de freios e contra pesos, mormente o equilíbrio processual.
O juiz tem que primar em zelar sua imparcialidade, e não se confundir com a
parte e contaminar-se com a investigação, pois ai estaria afastado de sua
função maior durante a investigação, preservar os direitos do investigado (15).
Por outro lado, a celeridade do feito estaria comprometida, pois o juiz da
instrução, por vício da atividade jurisdicional, não se contentaria na busca da
mera probabilidade, e sim chegar à certeza dos fatos, convertendo a
investigação preliminar, que por sua natureza é sumária, em cognição plena.
Ademais, esses atos, ainda que gerem um juízo de certeza, deverão ser
produzidos em juízo, onde nesta fase o acusado poderá exercer plenamente seus
direitos inerentes à defesa.
Todavia, conforme já abordamos quando do estudo do grau de cognição da fase
preliminar, haverá uma tendência em somente se confirmarem os atos da instrução
pré-processual.
Por fim, cabe ressaltar que as razões que levaram ao veto do sistema dos
juizados de instrução, em nossa legislação, foram relativas a
densidade geográfica de certas comarcas, e não ao famigerado excesso de poderes
conferidos a um único órgão (16).
3.2- PROMOTOR INVESTIGADOR
Em certos países europeus há uma tendência em se atribuir ao promotor a figura de diretor da investigação, substituindo-se o
modelo de instrução judicial (17).
No sistema do promotor investigador, ele é o diretor da investigação,
cabendo-lhe receber diretamente a notitia criminis ou indiretamente, através do auxílio da
Polícia.
Não obstante o comando da investigação preliminar, o parquet
dependerá de autorização judicial para realizar as medidas constritivas de
direitos fundamentais, como prisão cautelar, busca e apreensão, as quais serão
analisadas pelo juiz da instrução inicial (18) e não o instrutor, tendo em
vista que analisará, tão somente, a legalidade e não a conveniência dos atos
investigativos.
Os atos praticados pelo promotor, no curso da investigação, são administrativos
e de limitado valor probatório, devendo os mesmos serem
renovados em juízo, onde só ai haverá a plenitude do contraditório e da ampla
defesa na coleta dessas provas.
3.2.1. VANTAGENS DO SISTEMA DO PROMOTOR INVESTIGADOR
As vantagens levadas à cabo pela Doutrina seriam
basicamente acerca da finalidade da instrução preliminar, como um fase
preparatória ao processo (19).
Nessa linha, se é o próprio parquet que irá
propor a ação penal, maiores razões teria para investigar, na medida em que
estaria prestigiando sua ulterior função no processo penal.
De outra forma, seria ilógico que, sendo o promotor titular a ação penal,
tivesse que ficar limitado ao material investigativo do juiz ou da polícia,
para a buscar de elementos mínimos para a propositura
da ação penal.
Corroborando esses argumentos, trazemos a lição de Lopes JR (20),
... melhor acusa quem por si mesmo investiga e melhor
investiga quem vai em, juízo, acusar
... é um paradoxo que o juiz instrua (ou a polícia)
para o promotor acusar
Assim, resta evidente que a figura do promotor na presidência da investigação
tende a fortalecer sua atuação em um futuro processo penal.
Por outro lado, a celeridade da investigação tenderia a ser assegurada, na
medida em que órgão ministerial se reservaria a não esgotar o grau de
conhecimento (21) da matéria probatória, mas tão somente averiguar os mínimos
elementos necessários para que se possa propor a ação penal.
Finalmente, há uma tendência mundial em atribuir a direção das investigações na
mão do promotor, contudo, no plano da efetividade esta medida é falha, eis que,
não obstante sua direção, na prática a polícia continua conduzindo as
investigações, só remetendo suas conclusões ao parquet
ao fianl do procedimento.
3.2.2 ARGUMENTOS CONTRÁRIOS AO SISTEMA DO PROMOTOR INVESTIGADOR
Remetemos o leitor ao ítem 7
da primeira parte deste livro, onde apresentamos as desvantagens da
investigação direta pelo parquet.
3.3 POLÍCIA INVESTIGADORA
Neste sistema, a Polícia Judiciária está encarregada do poder de direção da
fase preliminar, decidindo qual linha de investigação será seguida. Praticará
ela as provas técnicas que julgar necessárias, decidindo de acordo com sua
conveniência.
Assim, a polícia não seria um mero auxiliar do juiz ou do promotor, mas sim
titular (22) de todo o procedimento, só devendo pedir autorização para praticar
certos atos quando se tratar de restrição a Direitos Fundamentais.
Cabe acrescentar que apesar do inquérito policial existir em outros
ordenamentos, a figura do delegado de polícia, bacharel em Direito, comandante
das investigações, é exclusividade do procedimento preliminar brasileiro (23).
3.3.1 VANTAGENS DO SISTEMA DE INVESTIGAÇÃO POLICIAL.
A Doutrina costuma apontar como vantagens do sistema de investigação policial a
amplitude de seu atendimento, tendo em vista que a mesma pode atuar em qualquer
lugar do país, desde os grandes centros até os vilarejos mais afastados (24).
Esse, inclusive, foi o argumento utilizado pelo legislador brasileiro de 1941
(25), para ratificar a permanência do inquérito policial.
Contudo, podemos vislumbrar uma função mais nobre para a sua manutenção, qual seja, a neutralidade do diretor da investigação, eis que o
mesmo é uma autoridade estranha ao futuro processo penal.
Nesse sentido, o delegado de polícia é um agente imparcial, pois não age só
para fornecer elementos para a acusação, mas sim buscar a verdade dos fatos.
Desse modo, menores serão as chances do mesmo se contaminar com o ímpeto
acusador, tendo melhores condições de se controlar, na medida em que não terá a
perspectiva de um futuro embate em juízo (26).
Essa neutralidade na presidência da investigação fortalecerá mais a igualdade
processual, na medida em que o acusador não se confundiria com o investigador,
só colhendo elementos que lhe conviesse.
Com efeito, o delegado de polícia na condução das investigações tende a implementar a principal finalidade deste procedimento, qual
seja, a busca da verdade, e não somente a colheita de provas para uma futura
ação penal.
Defendendo a manutenção do inquérito policial, Orlando Miranda Ferreira (27)
aduz que,
Ao contrário do que pregam seus detratores, é o inquérito policial instrumento
de caráter eminentemente garantista, já que essencial
ao processo penal democrático. Instaurado e presidido por Delegado de Polícia,
à luz da legalidade, busca a minuciosa restauração da verdade sobre um
determinado fato criminoso, evitando que acusações levianas arrastem inocentes
as barras dos tribunais e possibilitando a exata e justa aplicação do Direito
àqueles que transgridem as leis penais.
Cumpre salientar que, atualmente, os países que adotam o sistema do promotor
investigativo, os fizeram em substituição ao ultrapassado modelo do juizado de
instrução (28), não tendo ao menos podido vislumbrar a direção da investigação
nas mãos da polícia, tendo em vista a inexistência da figura do delegado de polícia,
agente bacharelado em Direito, com vasto conhecimento jurídico e formação
técnica voltada à apuração de crimes (29).
Ademais, em grande parte de onde se adota a figura do promotor diretor do
procedimento preliminar, o que ocorre na prática é o fenômeno da policização integral da investigação, num
quadro em que o parquet só tomará contato com
a investigação quando a polícia o considerar concluído (30).
3.3.2. ARGUMENTOS CONTRÁRIOS AO SISTEMA DE INVESTIGAÇÃO POLICIAL
Parte considerável da Doutrina entende que o inquérito policial é um
procedimento ultrapassado, em descompasso com Carta Magna, provocando
descontentamento em todos os atores do processo penal (31).
Nesse diapasão, o futuro órgão acusador entende que fica refém da atuação
policial, na medida que esta investiga o que lhe
convém, tendendo a prejudicar uma futura propositura da ação penal. Já o
Judiciário assevera a demorada e pouco confiável prova produzida no inquérito.
A defesa, por sua vez, alega que as mínimas garantias constitucionais não estão
sendo respeitadas nesta fase, o que pode acarretar desigualdades em uma futura
relação processual.
4- SUGESTÕES PARA UM SISTEMA COMPATÍVEL COM A NOSSA CARTA MAGNA.
Conforme já abordado, a Carta Magna adotou o sistema acusatório. Aliás, a
postura constitucional em face do processo penal não poderia ser outra, eis que
o sistema acusatório é a expressão da democracia, que, por sua vez, se revela
presente no Estado Democrático de Direito (32).
Por outro lado, por mais que a noção de sistema inquisitivo ou acusatório
esteja atrelada a noção de processo judicial, e não a
de outros expedientes jurídicos de natureza diversa, entendemos que o inquérito
policial é o sistema investigativo que mais se coaduna com o formato
acusatório, tendo em vista a desconcentração de poderes.
Nesse diapasão, teríamos a atuação de três sujeitos, quais sejam, autoridade
policial imparcial, titular do direito potencial de acusar e o investigado
(33).
De igual maneira, não obstante defendermos reformas pontuais em nossa
legislação processual, sobretudo na fase preliminar, entendemos
que o problema que assola a investigação não é somente de cunho normativo, mas
sim no plano da efetividade (34) das normas.
O atual modelo investigativo pátrio não precisaria passar por uma grande
reformulação legislativa, mas tão somente por uma real implementação
das legítimas funções de seus atores.
A condução da investigação pode perfeitamente continuar nas mãos dos delegados
de polícia, pois estes, como os juizes e promotores, são bacharéis em Direito e
submetem a uma difícil prova para ingresso na carreira. Ressalta-se, porém que
maior eficiência (35) teria sua atuação se o mesmo tivesse garantias
constitucionais, mormente a inamovibilidade (36).
No que tange ao promotor, no plano normativo, entendemos que suas funções
durante as fases da persecução penal já estão bem delineadas pela Magna Carta,
quais sejam, exercer o controle externo da atividade policial e promover ação
penal.
De outra parte, resta claro que sua simples designação como titular da
investigação preliminar não iria resolver os problemas desse procedimento, podendo,
quiçá, criar outros de natureza vultuosa, como, por
exemplo, o comprometimento e desequilíbrio do sistema processual.
Logo, o que se propõe é uma atuação mais integrada entre a instituição policial
e o promotor, devendo este implementar as atividades
discriminadas na Lei Complementar 75 (37) concernentes ao acompanhamento
efetivo da investigação criminal (38), e não a uma simples revisão ao final
deste procedimento.
Para que ocorra esse desiderato, deverá haver um entrosamento perfeito entre
essas instituições, como, por exemplo, disponibilidade dos registros de fatos
criminosos por parte da autoridade policial ao promotor, podendo este
requisitá-los de acordo com sua conveniência.
Cabe ressaltar que no processo penal constitucional brasileiro, o parquet afastado da direção da investigação, terá
melhores condições de analisar a conveniência e a legalidade da mesma, podendo,
para isso, provocar a atuação do judiciário em caso de vícios.
No que tange ao juiz, preservando sua imparcialidade, estaria vedada sua
interferência na fase da investigação, só devendo agir, mediante provocação,
quando houver medidas constritivas de direitos fundamentais, tais como, prisão
cautelar, arresto ou, ainda, por ocasião do arbitramento de uma fiança.
Por fim, não poderíamos deixar de lado a defesa, que, por mais que não tenha
uma atuação considerável na primeira fase da persecução, não é de toda afastada
sua atuação.
Com efeito, por mais que o inquérito policial não possa gerar um juízo de
condenação, e tão-somente embasar uma futura ação penal, vários
aspectos negativos podem advir desta fase, como, por exemplo, a já citada estigmatização social e jurídica geradas.
Logo, se o jus libertatis está protegido
inteiramente na fase processual, não pode ser completamente desprezado durante
a primeira etapa da persecução penal (39).
Assim, a partir do momento que alguém figure como indiciado, terá a seu alcance
as prerrogativas da ampla defesa, inerentes ao "acusados em geral",
conforme alude o art. 5º, inciso LV da Carta Magna (40).
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