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Alexandre Atheniense*
Recentemente, presenciamos o
desencadeamento da operação de abrangência nacional, denominada I-Commerce, contra o comércio de produtos piratas pela
internet. Trezentos e cinqüenta policiais apreenderam milhares de cópias
ilegais de CDs e DVDs quase
simultaneamente em 13 estados (Bahia, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais,
Paraíba, Pernambuco, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rondônia, Rio
Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo) e no Distrito Federal.
Pelo que se teve notícia, pelo menos
81 pessoas estavam envolvidas na venda de produtos ilegais pela internet. Nesta
operação, 20 pessoas já haviam sido presas e 57, indiciadas. A maioria dos
envolvidos tem entre 18 e 30 anos. Muitos são jovens de classe média que usavam
sites como o Mercado Livre e Orkut para venda destas
cópias.
Foi a primeira
vez no Brasil que as gravadoras adotaram a estratégia de reprimir criminalmente
pessoas que praticam comércio de produtos piratas. Não há dúvidas da legalidade
da adoção desta medida, uma vez que as gravadoras têm legitimidade para agir e
tal prática está tipificada no nosso Código Penal pelos artigos 180, 184, 186 e
334. Mas o qual seria verdadeiramente a intenção desta estratégia adotada pela
indústria fonográfica?
Segundo as declarações do
representante da Federação Internacional da Industria
Fonográfica (IFPI), entidade que coordenou esta estratégia em diversos países,
"essas pessoas não são nossos clientes, eles estão roubando música. O que
eles fazem não é diferente de entrar numa loja e roubar um CD".
Para o diretor da Associação
Brasileira dos Produtores de Discos (ABPD), "o nosso objetivo propriamente
não é processar as pessoas, mas mandar um aviso aos usuários ilegais".
Ocorre que por trás desta medida
criminal está em jogo um debate muito mais acalorado: o regime autoral sobre a
troca de arquivos pela internet e o modelo de negócio para venda de criações
intelectuais por meio eletrônico.
Durante a declaração dos resultados da
campanha do IFPI e ABDP no Rio de Janeiro, professores da Fundação Getúlio
Vargas (FGV) e representantes no Brasil da Creative Commons tiveram o seu acesso vedado ao recinto onde estava
ocorrendo a reunião com a imprensa. Diante deste fato,
instaurou-se uma controvérsia entre a indústria fonográfica e a entidade que
luta pela popularização de um novo regime de licenciamento de obras autorais.
Por um lado, a FGV alega que defenderá
quem for processado. Se a indústria musical está pronta para atacar a sociedade
brasileira, é importante que saiba que há instituições prontas para defender o
interesse público, assegurou Ronaldo Lemos, advogado representante no Brasil do
Creative Commons (CC). Esta
iniciativa apresenta um modelo gradativo de proteção dos direitos autorais de
obras como textos, música, fotos. Segundo ele, os dados dos usuários que são
obtidos podem representar lesões ao consumidor e de privacidade. Ressalte-se
que a FGV é observadora permanente da Organização Mundial de Propriedade
Intelectual, vinculada à ONU.
Em abaixo assinado na internet, os
professores sustentam uma mudança do artigo 46 da lei autoral. Pelo que se vê, a lei brasileira antiga, de 1973, era melhor que a
atual, de 1998. Existe uma contradição entre a tecnologia e a experiência do
cidadão. A legislação não permite copiar a música de um CD comprado para um
tocador de MP3. A lei de direitos autorais brasileira é incompatível com os
desenvolvimentos tecnológicos recentes. Nosso atual regime de direito autoral
transforma qualquer usuário de internet em um potencial criminoso e infrator de
direitos.
Neste sentido, foi
elaborada um abaixo assinado online sustentando quais
deveriam ser as mudanças propostas para alterar a legislação brasileira de
direitos autorais.
Na ótica das gravadoras, Fernando
Brant, presidente da União Brasileira de Compositores, afirma que o CC é
horroroso. "Não sei como o ministro Gilberto Gil pode defendê-lo."
Hoje,o Creative Commons tem 140 milhões
de obras licenciadas em 50 países. Lemos criticou Brant, dizendo que "quem
fala isso acha melhor processar do que criar modelos de negócio para que a
tecnologia faça as pazes com o direito". Indaga-se: Será que o marketing
do medo propagado pela indústria fonográfica é uma estratégia que pode dar
certo para reprimir as cópias de músicas trocadas pela internet? Para o
professor Joaquim Falcão, esta iniciativa é uma luta perdida.
Considero importante a discussão deste
novo modelo de negócio, pois a aposta da indústria fonográfica é no crescimento
dos sites legalizados de vendas de música, que têm contratos com as gravadoras.
Esse mercado ainda é bastante incipiente no Brasil, e os próprios empresários
vêem dificuldades em conquistar consumidores. Já existem 350 sites no mundo que
vendem música pelo meio eletrônico. Os maiores acervos
como o Itunes da Apple
ainda não vendem suas obras para o Brasil, enquanto vários sites nacionais já
vêm ganhando popularidade na venda de músicas pelo meio
eletrônico.
Acho que o modelo atual deverá ser repensado, pois a música sofreu com a internet uma separação entre a mídia e a mensagem. Ou seja, uma obra musical para ser executada ou copiada necessariamente não precisa estar vinculada a qualquer dispositivo corpóreo. Por este motivo, temos que repensar a legislação vigente para que se adapte as novas tecnologias diante das inúmeras alternativas de negócio que podem surgir por meio eletrônico.
*Advogado
Disponível em: <http://conjur.estadao.com.br/static/text/49645,1 >. Acesso em: 28 out. 2006.