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VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR: É POSSÍVEL PROTEGER A CRIANÇA?

 

 

 

Maria Regina Fay de Azambuja[1]

 



SUMÁRIO: Introdução. – I. O tratamento dispensado à criança ao longo da história. – II. A chegada da criança ao sistema de Justiça: de onde provêm os encaminhamentos? – III. Reflexos da violência sexual intrafamiliar na vida da criança vítima: como fica o direito à convivência familiar? – IV. A negação e o segredo: como o sistema de Justiça lida com as duas facetas da violência sexual praticada contra a criança? – V. Alternativas à proteção da criança. – Conclusão. – Referências Bibliográficas.

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

A mudança de paradigmas no que tange aos direitos da criança, operada no nosso país, a partir da Constituição Federal de 1988 e do Estatuto da Criança e do Adolescente, reflete-se em todas as áreas do conhecimento, mas, de forma especial, na esfera dos sistemas de Proteção e Justiça.

 

Com a vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, a sociedade como um todo, assim como o sistema de Justiça Infanto-Juvenil necessitou reestruturar-se a fim de atender, com adequação, as novas normas, embasadas no princípio de que a criança é pessoa em desenvolvimento, é sujeito de direitos e é prioridade absoluta.

 

O texto aborda o tratamento que as legislações, ao longo da história, dispensaram à criança, a iniciar pelo Código de Hamurábi até a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente. Posteriormente, mostra a chegada da criança vítima de violência sexual intrafamiliar ao Sistema de Justiça e as principais dificuldades observadas pelos profissionais para o enfrentamento do fenômeno. Por último, são apontadas alternativas à proteção da criança à luz da legislação vigente.

 

 

I. O tratamento dispensado à criança ao longo da história

 

A humanidade tem dispensado à criança um tratamento legislativo que se coaduna com a compreensão do significado da infância presente em cada momento histórico. Já em seus primórdios, os homens praticavam várias formas de violência à criança, “desde os egípcios e mesopotâneos, passando pelos romanos e gregos, até os povos medievais e europeus, não se considerava a infância como merecedora de proteção especial[2], muitas vezes contando com o beneplácito da própria legislação e da cultura dominante.

 

 Ao tempo do Código de Hamurábi (1700 a.C-1600 a.C), no Oriente Médio, ao filho que batesse no pai havia a previsão de cortar a mão, uma vez que a mão era considerada o objeto do mal. Também o filho adotivo que ousasse dizer ao pai ou à mãe adotivos que eles não eram seus pais, cortava-se a língua; ao filho adotivo que aspirasse voltar à casa paterna, afastando-se dos pais adotivos, extraíam-se os olhos. Em Roma (449 a. C), a Lei das XII Tábuas permitia ao pai matar o filho que nascesse disforme mediante o julgamento de cinco vizinhos (Tábua Quarta, nº 1), sendo que o pai tinha sobre os filhos nascidos de casamento legítimo o direito de vida e de morte e o poder de vendê-los (Tábua Quarta, nº 2). Na Grécia antiga, as crianças que nascessem com deficiência eram eliminadas nos Rochedos de Taigeto. Em Roma e na Grécia a mulher  e os filhos não possuíam qualquer direito. O pai, o Chefe de Família, podia castigá-los, condená-los à prisão e até excluí-los da família.

 

É no final do século XVIII que a infância começa a ser vista como uma fase distinta da vida adulta. Até então, participavam das mesmas atividades. As escolas eram freqüentadas por crianças, adolescentes e adultos. Com o surgimento do entendimento de que a infância era uma fase distinta da vida adulta também passam a ser utilizados os castigos, a punição física, os espancamentos através de chicotes, paus e ferros como instrumentos necessários à educação. Na Inglaterra, em 1780, as crianças podiam ser condenadas à pena de enforcamento por mais de duzentos tipos penais.

 

Somente em 1871, é fundada em Nova York a Sociedade para a Prevenção da Crueldade contra as Crianças, a partir do caso da menina Mary Ellen. Mary Ellen era uma menina órfã de mãe, abandonada pelo pai, que sofreu severos maus-tratos na família substituta. O fato causou profunda indignação na comunidade da época que percebeu não haver um local própria destinado a receber este tipo de denúncia. Em razão disto, o caso da menina Mary Ellen foi denunciado na Sociedade para a prevenção da Crueldade contra os Animais. Necessitou ser equiparada ao animal para que seu caso pudesse ser examinado pelo Tribunal da época. Pouco tempo depois, na Inglaterra, é fundada uma sociedade semelhante, voltada a proteção da criança.

 

No Brasil, a situação da criança não foi diferente. Contam os historiadores que as primeiras embarcações que Portugal lançou ao mar, mesmo antes do descobrimento, foram povoados com as crianças órfãs do rei. Nas embarcações vinham apenas homens e as crianças recebiam a incumbência de prestar serviços na viagem, que era longa e trabalhosa, além de se submeter aos abusos sexuais praticados pelos marujos rudes e violentos. Em caso de tempestade, era a primeira carga a ser lançada ao mar. Até o advento da Constituição Federal de 1988, a criança não era considerada sujeito de direitos, pessoa em peculiar fase de desenvolvimento e tampouco prioridade absoluta. A partir de 1988, no Brasil, passamos a contar com uma legislação moderna, em consonância com a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, inaugurando uma nova época na defesa dos direitos daqueles que ainda não atingiram os dezoito anos de idade.

 

 

II. A chegada da criança ao sistema de Justiça: de onde provêm os encaminhamentos?

 

Os casos de violência sexual intrafamiliar praticados contra a criança chegam ao Sistema de Justiça através do Conselho Tutelar ou nos disputas familiares envolvendo guarda, visitas ou processos de suspensão e destituição do poder familiar.

 

Dentro do contexto sócio-jurídico-cultural construído pela humanidade, ao longo dos tempos, torna-se indiscutível que a nova postura do ordenamento jurídico brasileiro, alicerçada em documentos internacionais, em especial a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 20 de novembro de 1989, e assinada pelo Governo brasileiro, em 26 de janeiro de 1990, promulgado pelo Decreto Presidencial 99.710, de 21 de novembro de 1990, passou a constituir-se em um instrumento incentivador e facilitador do enfrentamento da violação dos direitos à criança, em especial, à violência intrafamiliar.

 

Cabe ao Conselho Tutelar receber, entre outras situações de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente, os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos praticados contra a referida população, mostrando-se de extrema urgência a sua criação e instalação, em todos os municípios, “para a efetivação da política de atendimento à criança e ao adolescente, tendo em vista assegurar-lhes os direitos básicos, em prol da formação de sua cidadania”[3].

 

Embora as formas de maus-tratos e violência praticados contra as crianças sejam muitas, procuraremos nos deter, ao longo do trabalho, na abordagem da violência intrafamiliar, especificamente através do abuso sexual, pois, “ainda que a violência com visibilidade seja a que ocorre fora de casa, o lar continua sendo a maior fonte de violência”[4]. Pesquisa realizada em 1997, pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul, apontou que, em uma amostra de 1.579 crianças e adolescentes em situação de rua, 23,4% não retornavam para casa porque seriam vítimas de maus-tratos. Flores e cols., em 1998, “estimaram que 18% das mulheres de Porto Alegre, com menos de 18 anos, sofreram algum tipo de assédio sexual cometido por pessoas de sua família”[5].

 

Pode-se afirmar que a violência doméstica contra a criança e o adolescente

 

representa todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra crianças e adolescentes que –sendo capaz de causar dano físico, sexual e/ou psicológico à vítima- implica, de um lado, uma transgressão do poder/dever de proteção do adulto e, de outro, uma coisificação da infância, isto é, uma negação do direito que crianças e adolescentes têm de ser tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento[6].

 

Os maus-tratos infantis supõem e existência de uma criança espancada, nomenclatura adotada por C. Henry Kempe, não se conhecendo, com suficiência, a relação entre causa e efeito. Um dos modos de melhor conhecer os maus-tratos se dá através do estudo dos sintomas apresentados pela criança, ou através das ações dos adultos que têm responsabilidade sobre as crianças (pais, cuidadores e amigos)[7]. A violência doméstica pode se manifestar através da violência física, da violência sexual, da violência emocional e da negligência, constituindo “um problema que atinge milhares de crianças e adolescentes e não costuma obedecer a algum nível sócio-cultural específico, como se pode pensar[8]. Segundo Viviane Nogueira de Azevedo Guerra, a violência doméstica “permeia todas as classes sociais como violência de natureza interpessoal”[9].

 

 A violência sexual ou exploração sexual “se configura como todo ato ou jogo sexual, relação hetero ou homossexual entre um ou mais adultos e uma criança ou adolescente, tendo por finalidade estimular sexualmente esta criança ou adolescente ou utilizá-la para obter uma estimulação sexual sobre sua pessoa ou de outra pessoa[10]. É também definida como o envolvimento de crianças e adolescentes, dependentes e imaturos quanto ao seu desenvolvimento, em atividades sexuais que não têm condições de compreender plenamente e para as quais são incapazes de dar o consentimento informado ou que violam as regras sociais e os papéis familiares. Incluem a pedofilia, os abusos sexuais violentos e o incesto, sendo que os estudos sobre a freqüência da violência sexual são mais raros dos que os que envolvem a violência física[11]. O abuso sexual pode ser dividido em familiar e não familiar. Autores apontam que “aproximadamente 80% são praticados por membros da família ou por pessoa conhecida confiável”, sendo que cinco tipos de relações incestuosas são conhecidas: pai-filha, irmão-irmã, mãe –filho, pai-filho e mãe-filha, sendo possível que o mais comum seja irmão-irmã; o mais relatado é entre pai-filha (75% dos casos), sendo que o tipo mãe-filho é considerado o mais patológico, freqüentemente relacionado com psicose [12]. A violência sexual doméstica praticada contra a criança, de cunho intrafamiliar, “retém os aspectos do abuso relativos ao apelo sexual feito à criança, bem como destaca tal ocorrência no interior da família”[13]. Insere-se o abuso sexual da criança em uma gama extensa de situações de violação dos direitos da infância.

 

A demanda do Conselho Tutelar, no que se refere à violência intrafamiliar, abarca situações difíceis de serem enfrentadas, podendo ser apontado, entre outros fatores, que ao mesmo grupo familiar pertencem os dois pólos da ação, agressor e vítima, sendo que “as crianças- vítimas inocentes e silenciosas do sistema e da prática de velhos hábitos e costumes arraigados na cultura do nosso povo - são as maiores prejudicadas neste contexto calamitoso”[14]. Aponta Salvador Célia, referindo-se à situação da infância brasileira:

 

A maioria das crianças brasileiras começa a ser agredida ainda no ventre materno, pela desnutrição materna e pela violência contra a mulher, e quando sobrevive às doenças perinatais, respiratórias e preveníveis por vacinação, quando sobrevive à fome e à diarréia, chega à idade adulta agredida pela falta de oportunidade do mercado de trabalho, depois de sofrer o fenômeno da evasão (diga-se “expulsão escolar”), quando então poderíamos falar no maltrato da instituição escolar, que entre outras causas multifatoriais apresenta um currículo completamente desligado da aplicação para as reais necessidades da maioria da população brasileira[15].

 

Ao Conselho Tutelar aporta uma demanda que, até o momento, não pode ser devidamente dimensionada, não só pelo fato de que o reconhecimento da violência doméstica é recente, como também em decorrência da “utilização de diferentes definições do fenômeno pelas instituições e pesquisadores responsáveis pelas estatísticas disponíveis, a diversidade das fontes de informações existentes e a inexistência de inquéritos populacionais nacionais”[16], fatores que dificultam sobremaneira a oferta de estimativas mais apuradas.

 

Sempre que estiver presente notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente (art. 136, inciso IV, ECA), bem como se mostrar necessário o ajuizamento de ações de suspensão ou destituição do poder familiar (art. 136, inciso XI, ECA), independentemente das medidas de proteção ou aplicáveis aos pais (arts. 101 e 129 ECA), o Conselho Tutelar encaminhará ou representará ao Ministério Público. De posse das informações, o Ministério Público avaliará a necessidade do ajuizamento de ação de suspensão ou destituição do poder familiar, assim como a adoção das medidas legais cabíveis, tanto na área cível como criminal. Ao propor a ação, no âmbito cível ou mesmo criminal, o Ministério Público aciona o sistema de Justiça, dando início a uma nova fase na vida da criança ou do adolescente e de seus pais.

 

As causas motivadoras da ação de suspensão ou destituição do poder familiar, na atualidade, vêm elencadas nos artigos 1.637 e 1.638 do Novo Código Civil, assim como no artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente. O desvirtuamento do instituto do poder familiar “legitima o agente ministerial a intentar Ação de Suspensão ou Destituição do Pátrio Poder, sempre que constatar a ocorrência de casos de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável”[17].

 

A legitimidade para a propositura da ação de suspensão ou destituição do poder familiar é atribuída ao Ministério Público ou a quem tenha legítimo interesse, onde se destaca, por exemplo, o guardião que pretende pleitear a adoção da criança que se encontra sob sua guarda. Nas hipóteses em que estiver presente o motivo grave, poderá a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar, em caráter liminar ou incidental, a suspensão do poder familiar, ficando a criança confiada a pessoa idônea, mediante termo de responsabilidade (artigo 157 do ECA).

 

O desafio que se impõe, neste momento histórico, é que ambas as medidas, suspensão e destituição do poder familiar, de cunho essencialmente drástico, hão de ser aplicadas somente quando se mostrarem a melhor alternativa para a criança ou adolescente envolvido, e não como uma simples punição ou um castigo aos pais, especialmente em face do disposto no art. 6º da Lei nº 8.069/90, que assim reza:

 

Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

 

 

Verifica-se, pelo alerta que o mencionado dispositivo traz, que a nova lei regulamentadora do art. 227 da Constituição Federal passa a significar um “movimento mais amplo de melhoria, ou seja, de reforma da vida social no que diz respeito à promoção, defesa e atendimento dos direitos da infância e da juventude”[18]. Por sua vez, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, em seu art. 3.1, salienta que “todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança”.

 

Não há mais como admitir, neste nascer de século, por parte do Poder Público, uma atuação descomprometida com a “defesa dos interesses da criança que sofre maus-tratos praticados, muitas vezes, por aqueles que teriam legitimidade e possibilidade de defendê-las”[19].

 

Assim, embora as causas que autorizam a suspensão ou a perda do poder familiar venham elencadas no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente, frente aos princípios constitucionais introduzidos com a Carta de 1988, há que se buscar, sempre, o melhor interesse da criança. Na prática, uma das tarefas mais desafiadoras e difíceis para os profissionais do Direito reside em identificar o melhor interesse da criança, especialmente nas demandas que aportam ao Poder Judiciário, envolvendo pedido de suspensão ou destituição do poder familiar. Observa-se a existência de casos de “prova mal formada, prova mal produzida, prova precária, em que, mesmo assim, ajuiza-se temerariamente a ação de destituição do pátrio poder, como se esta fosse a cura para todos os males da criação e da má orientação dos pais” [20]

 

Mesmo que os casos de violência sexual intrafamiliar praticados contra a criança, recebidos pelo sistema de Justiça brasileiro, sejam muito inferiores aos números que realmente ocorrem, como sugerem os estudos realizados em outros países, certo é que passa a ser, o sistema de Justiça, o destinatário da demanda que o Conselho Tutelar não conseguiu, dentro de sua esfera de atribuições, assegurar a proteção integral às crianças cujos direitos foram ameaçados ou violados.

 

Estarão os integrantes do sistema de Justiça capacitados para enfrentar a demanda envolvendo violência sexual intrafamiliar praticada contra a criança?

 

O tema exige constante reflexão, atenção, e avaliação por parte dos profissionais que integram as diversas instituições que compõem o sistema de Justiça, sob pena de ser a criança exposta a uma nova forma de violência, praticada em nome do Poder Público, por órgão ou instituição que têm o dever de zelar pelo cumprimento das disposições legais previstas na Constituição Federal e na Lei nº 8.069/90.

 

III. Reflexos da violência sexual intrafamiliar na vida da criança vítima: como fica o direito à convivência familiar?

 

Sempre que os casos de violência sexual intrafamiliar chegam ao sistema de Justiça, ou já houve o afastamento da criança de sua família natural, quer pela sua colocação em abrigo, quer retirada do abusador do lar, ou presente está o risco de que o afastamento venha a ocorrer, gerando a negação ou a ameaça a um dos direitos fundamentais que lhe vem assegurado na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente.

 

O direito à convivência familiar é, antes de tudo, um direito que integra a condição humana. No dizer de Hannah Arend:

 

A condição humana compreende algo mais que as condições nas quais a vida foi dada ao homem. Os homens são seres condicionados: tudo aquilo com o qual eles entram em contato torna-se imediatamente uma condição de sua existência[21].

 

A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança sinaliza para a importância do “direito da criança de viver com seus pais a não ser quando incompatível com seus melhores interesses; o direito de manter contato com ambos os pais caso seja separada de um ou de ambos e as obrigações do estado nos casos em que tal separação resulta de ação do Estado”, assim como “a obrigação do Estado de promover proteção especial às crianças desprovidas do seu ambiente familiar e assegurar ambiente familiar alternativo apropriado ou colocação em instituição apropriada, sempre considerando o ambiente cultural da criança[22].

 

Seja o enfoque que buscarmos, indiscutivelmente, a família desempenha um papel essencial na vida, na formação e no desenvolvimento da criança, justificando a sua inclusão entre os seus direitos fundamentais, na medida em que se constitui instrumento essencial na formação do “ego maduro”, capaz de “discriminar a realidade, pensar sobre ela e, a partir de sua capacidade de antecipação, analisar os possíveis caminhos a serem escolhidos, até assumir, por opção e com responsabilidade, a ação a ser realizada, a qual anteriormente passou por um processo de reflexão, decisão, planejamento, para culminar na sua execução”[23]. As crianças, seres humanos estruturalmente dependentes, embora titulares de direitos, necessitam de proteção e cuidado dos pais ou substitutos a fim de que possam vencer as etapas iniciais do seu desenvolvimento, pois “o desenvolvimento pleno de um bebê só poderá ocorrer se contar com o amor de seus pais, que vai-se expressar como uma íntima relação que os estudiosos denomina de apego”[24].

 

As disfunções apresentadas pela família, especialmente as que envolvem a violência sexual, repercutem diretamente na vida e na saúde das crianças, porquanto pessoas em desenvolvimento, como bem foi salientado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, “sendo do interesse da sociedade e do Estado o desenvolvimento biopsicológico da população infanto-juvenil em condições de normalidade”[25]. Traz a nova lei, para o sistema de Justiça, conceitos e achados que há muito vinham sendo considerados no campo da educação e saúde, sem que o mundo do Direito tivesse deles se apropriado, como era de se esperar no decorrer do século passado.

 

Os casos que desembocarem no sistema de Justiça estão a exigir, muitas das vezes, a adoção de medidas que implicam no afastamento da criança do agressor, quer pela sua retirada do lar, quer pelo afastamento compulsório do abusador do ambiente familiar.

 

A Lei nº 9.086/90 traz a possibilidade, há muito esperada pelos profissionais envolvidos com a proteção da criança, de afastamento do agressor da moradia comum, sempre que verificada a hipótese de opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável (art. 130 do ECA), sendo que “a provisional autorizada pelo artigo deve ser concedida liminarmente, sem audiência do agressor, ad cautelam, exatamente para não frustrar a proteção, apesar de terapêutica”[26]. Trata-se de providência que vem ao encontro do princípio da doutrina da proteção integral da criança, uma vez que, historicamente, a vítima, já com as marcas da violência, era sistematicamente institucionalizada, arcando com o prejuízo adicional de se ser privada do convívio com o restante do grupo familiar, permanecendo o agressor a usufruir do conforto do lar.

 

A prática tem mostrado que a aplicação do novo dispositivo legal nem sempre se mostra eficaz, porquanto a ordem judicial não tem o condão de manter o agressor longe da moradia comum, especialmente nos casos em que conta o abusador com a conivência da mulher ou companheira, “na medida em que, não implicando restrição ou privação de liberdade do agressor, não impede que venha a retornar em momento posterior ao do afastamento coercitivo por ato judicial, ficando a moradia da vítima e restante do grupo familiar desguarnecidos de qualquer proteção”[27]. Murillo José Digiácomo afirma que a lei “privilegia a manutenção da criança ou adolescente em sua família de origem, determinando o afastamento cautelar não do vitimizado (o que consistiria em mais uma violência contra ele), mas sim do vitimizador, que dependendo da situação pode mesmo ter sua custódia decretada[28], porquanto o descumprimento da ordem judicial de afastamento, em tese, caracteriza o tipo penal previsto no artigo 330 do Código Penal, autorizando a decretação da prisão preventiva.

 

As dificuldades encontradas para o afastamento do agressor da moradia comum, em que pese possam ser futuramente sanadas com reformas legislativas, não podem servir de obstáculos à adoção de medidas que efetivamente favoreçam a criança, assegurando-lhe “todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade” (art. 3º do ECA).

 

Especialistas apontam que, em estudo

 

sobre famílias fisicamente abusivas que tinham um filho alocado fora de casa devido ao abuso, a baixa condição sócio-econômica, idade mais avançada da criança, maior gravidade do abuso e/ou problema comportamental escolar na vítima foram preditivos de má evolução no esforço de reabilitação da agência de assistência social, e de uma necessidade de cuidado institucional permanente para as vítimas (Barth et al., 1985-1986)[29].

 

Um dos aspectos mais relevantes nas demandas que envolvem a violência sexual contra a criança consiste em avaliar adequadamente a viabilidade ou não da permanência ou do retorno do agressor ou da vítima para a moradia comum. Como avaliar corretamente a situação? Entre as medidas a serem adotadas, encontramos a oitiva do grupo familiar, a fim de averiguar “se é seguro o retorno da criança/adolescente para a companhia imediata dos agressores”, bem como o encaminhamento da família para programas de ajuda especializada, além da necessidade de se “pensar na recuperação dos agressores”, uma vez “que agressores de crianças e adolescentes foram quase sempre vítimas de agressão em sua própria infância”[30].

 

Presente também a necessidade de serem adotadas medidas que visem a interrupção física do abuso, nos casos em que presente está a violência sexual, sendo que “a primeira preocupação deve ser a de avaliar a capacidade da família de proteger a criança de novos abusos e a necessidade ou não do afastamento imediato da criança (hospitalização, casa de parente, vizinho ou instituição)”. No Hospital de Clínicas de Porto Alegre, “a suspeita de abuso leva à realização de uma avaliação breve que muitas vezes requer a hospitalização da criança”[31].

 

 

Como já se afirmou, uma das decisões mais difíceis e delicadas a ser tomada no âmbito do sistema de Justiça refere-se à decisão de afastar ou não a criança abusada sexualmente de sua família. Não raras vezes nos deparamos com situações em que a mãe não consegue reconhecer o abuso a que foi submetida sua filha, fator impeditivo ao desempenho da necessária proteção que a criança necessita. Nestes casos, faz-se necessário investir na possibilidade de a mãe vir a perceber o risco enfrentado pela filha, cabendo salientar:

 

O trabalho da negação geralmente leva a mudanças psicológicas e interacionais que possibilitam à mãe reconhecer e acreditar na criança, e tornar-se protetora. O trabalho da negação também pode mostrar que não é possível nenhuma mudança e que a criança não deve ficar com a mãe, quando o abusador entrar novamente em cenário familiar[32].

 

Há que se considerar que a separação da criança da família, em razão do abuso sexual intrafamiliar, somente deve ser buscada na impossibilidade de afastar o abusador da moradia comum, hipótese em que a criança deve receber uma completa explicação dos motivos de seu afastamento, pois, caso contrário, “se sentirá acusada, punida e abandonada”, não havendo razão para impedir “o contato entre a criança e sua mãe, irmãos e amigos, exceto quando as mães não acreditam na criança, a acusam e rejeitam pelos problemas que se seguem à revelação”[33].

 

Não havendo possibilidade de a criança retornar ao lar, em caráter temporário ou definitivo, por absoluta falta de condições de os pais assumirem os deveres para com o filho, oferece a lei a medida de proteção, prevista no art. 101, inciso VIII, do Estatuto da Criança e do Adolescente, consistente na colocação em família substituta. Vem a colocação em família substituta, na condição de medida de proteção, oportunizar à criança a convivência em família, em atenção ao artigo 227 da Constituição Federal e ao artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente. Três são as formas de colocação em família substituta previstas na Lei nº 8.069/90: guarda, tutela e adoção. A primeira não pressupõe a prévia suspensão ou destituição do poder familiar; a segunda exige, no mínimo, a anterior suspensão do poder familiar, ao passo que a adoção vai implicar sempre em perda ou extinção do poder familiar.

 

Observa-se que, na prática, assegurar o direito à convivência familiar à criança vítima de violência intrafamiliar, em especial a violência sexual, não se mostra uma tarefa simples, especialmente pela presença de inúmeros fatores que passam a se constituir em empecilhos ou complicadores para que se opere o direito fundamental em comento.

 

 

IV. A negação e o segredo: como o sistema de Justiça lida com as duas facetas da violência sexual praticada contra a criança?

 

Todas as formas de violência contra a criança produzem conseqüências nefastas ao desenvolvimento infantil, não encontrando amparo no ordenamento jurídico pátrio. A violência, o abuso ou a exploração sexual, no entanto, apresentam particularidades que acarretam maiores dificuldades para a prevenção, identificação e diagnóstico, assim como para o atendimento, os encaminhamentos e tratamentos que passam a necessitar, tanto a vítima como o agressor e o grupo familiar.

 

A violência doméstica, de um modo geral, em face de suas características,

 

é uma violência interpessoal; um abuso de poder disciplinador e coercitivo dos pais ou responsáveis; um processo de vitimização que às vezes se prolonga por vários meses e até anos; um processo de imposição de maus-tratos à vítima de sua completa objetalização e sujeição; uma forma de violação dos direitos essenciais da criança e do adolescente como pessoas e, portanto, uma negação de valores humanos fundamentais como a vida, a liberdade, a segurança; tem na família sua ecologia privilegiada[34].

 

Na sociedade, é observada sensível diferença na forma de encarar a violência física e a sexual da criança. Um dos fatores responsáveis pela diferença de visão vem apontado na assertiva de que “no abuso físico, um pouquinho de violência física é considerada aceitável, e somente as formas severas de violência ou punição física são identificadas como abuso”[35]. Em contrapartida, “qualquer violação sexual da integridade da criança é rotulada como abuso e a definição normativa é muito mais estreita para o abuso sexual do que para o abuso físico”, sendo que, “enquanto nenhum dos pais é levado ao tribunal e nenhuma criança recebe cuidados se eles dão uma palmada no traseiro da criança, um pai bem pode acabar na prisão por ter esfregado levemente os genitais da criança”[36].

 

O abuso sexual ganhou espaço nas pesquisas e estudos há aproximadamente três décadas, tendo como fato propulsor o contexto cultural de proteção aos direitos da mulher e da criança. Há trinta anos atrás, o ingresso de uma criança em um hospital, em decorrência de maus-tratos, era considerado um caso raro e dramático, sendo vista a criança como vítima inconfundível de uma ação criminal [37].

 

A violência sexual da criança, manifestada através da pedofilia (preferência de um adulto por relações sexuais com crianças, através da adição), de atos violentos de abuso sexual ou através do incesto, por pertencer à esfera privada, “acaba se revestindo da tradicional característica de sigilo”[38]. A negação, via de regra, acompanha a situação de violência sexual, sendo-lhe atribuída natureza específica de síndrome de segredo, para a criança e a família, e síndrome de adição, para a pessoa que comete o abuso[39].

 

O medo de ser castigada, não acreditada e protegida pode levar a criança a não revelar o abuso sexual, que “permanece um segredo de família, até mesmo depois de uma clara revelação, e inclusive quando as ameaças legais e estatutárias há muito tempo já foram removidas; este é o resultado da negação, não da mentira; a mentira relaciona-se ao conceito legal de prova, a negação pertence ao conceito psicológico de crença e assunção da autoria”[40]. Afirma-se que a negação constitui um mecanismo de defesa utilizado pelos membros da família:

 

O pai pode utilizar a negação por considerar o incesto como educação sexual para sua filha. A mãe é incapaz de reconhecer e processar os óbvios sinais de incesto, porque isto colocaria em risco seu relacionamento com o marido. A filha utiliza a negação e a constrição de afeto para diversos propósitos: como proteção contra a vergonha e a culpa, para obscurecer a consciência da perversão do pai e preservar a família intacta”[41].

 

Fatores externos, assim como fatores psicológicos, contribuem para a manutenção do segredo no abuso sexual intrafamiliar. Entre os fatores externos, podemos citar a inexistência de evidências médicas, o que leva a família a não ter como comprovar o fato; ameaças contra a criança vítima e suborno; falta de credibilidade na palavra da criança leva-a, muitas vezes, a não revelar o abuso com medo de ser castigada pela “mentira”; temor pelas conseqüências da revelação, com a concretização das ameaças que recebeu. Entre os fatores psicológicos, destaca-se: a culpa, no sentido legal, é do abusador, mas, no sentido psicológico, é também da criança; a negação, no sentido psicológico, é diferente da mentira; no mecanismo de defesa conhecido como dissociação, a vítima separa o abuso sexual (fato real) dos sentimentos que o ato lhe provoca[42].

 

O rompimento do segredo, levando à denúncia do fato, pode ser influenciado por alguns fatores, como por exemplo, a ameaça isolada ou combinada com medo da perda de integridade física; tentativa de suicídio; contágio por doença sexualmente transmissível; receio da perpetuação da vitimização com irmãs/irmãos; risco de gravidez; restrição das atividades típicas da adolescência; desconfiança da mãe e disque denúncia[43].

 

A adição, por sua vez, é complementar ao abuso sexual como síndrome de segredo para a criança; “para o abusador, o abuso sexual da criança funciona como adição (abusador= adito; criança= droga); ele sabe que o abuso é prejudicial à criança e mesmo assim abusa”[44].Para a melhor compreensão da síndrome da adição, Tilman Furniss descreve:

 

 

 

Eu atendi pais que relatavam quão desesperadamente haviam tentado parar de abusar sexualmente de seus filhos, mas a qualidade aditiva do abuso sexual da criança como uma síndrome de adição fazia-os prosseguir[45].

 

O abuso sexual da criança, como síndrome da adição, “se desenvolve pela compulsão à repetição; os sentimentos de culpa e conhecimento de estar prejudicando a criança podem levar a uma tentativa de parar o abuso, mas em razão da compulsão à repetição, o abusador não consegue seu intento”[46]. A dependência psicológica decorre do alívio das tensões, constituindo-se a “excitação do abusador” o elemento aditivo central[47].

 

Há que se considerar que a criança, por ser uma pessoa em desenvolvimento, carece biologicamente de “maturação nos níveis emocional, social e cognitivo”, levando-a a comportar-se, relacionar-se e a pensar de uma forma diferente dos adultos [48]. A diferença de condições encontradas na criança e no adulto acaba por se refletir na forma como a primeira enfrenta e reage a uma situação de abuso sexual, bem como pela maneira como se manifesta quando é chamada a falar sobre o fato ocorrido; enquanto a criança tem medo de falar, o adulto teme ouvi-la, favorecendo a clandestinidade.

 

Nos casos de abuso sexual intrafamiliar da criança, torna-se necessário envolver a mãe no processo de revelação, sem desconhecer que, até as mães apoiadoras, muitas vezes, “ficam tão perturbadas durante a entrevista, que transmitem à criança a mensagem direta ou indireta de não revelar; ou as crianças ficam tão ansiosas que se fecham para protegerem as mães”[49].

 

Fator facilitador da manutenção do segredo é encontrado no mito, construído ao longo do tempo, de que a família é um “bom meio natural”. A assertiva “encobre uma verdadeira ditadura familiar, corroborando para a construção de um imaginário social denegatório e permitindo que a família incestogênica se perpetue imune e intacta a intervenções externas”[50].

 

Nos casos de abuso sexual da criança, de cunho intrafamiliar, que se constitui o objeto de estudo do presente trabalho, raramente é feito o diagnóstico, o que impede a chegada do caso ao sistema de Justiça. As famílias, aparentemente, levam “uma vida normal e tranqüila na comunidade”. A realização de um exame mais aprofundado, no entanto, permite perceber que a família “apresenta um contato limitado com o mundo extrafamiliar[51]. A relação incestuosa intrafamiliar, que tende a se protelar por vários anos, pode apresentar as seguintes características:

 

“O pai pode ter uma personalidade passiva e introvertida e geralmente a vida sexual do casal é pobre. Inicia a relação com sua filha num período de ‘stress’, solidão e dependência. A atividade incestuosa pode não ser motivada pelo sexo, mas representar uma necessidade de afeto”[52]. A mãe, por sua vez, mesmo conhecendo a relação incestuosa, pode ignorá-la ou mesmo incentivá-la, “pois assim sua filha a estará substituindo num papel onde se sente incapaz”, sendo comum as crianças vítimas do incesto “se tornarem pequenas mães, assumindo deveres domésticos que seriam tarefas da mãe”[53]. Já a filha “utiliza a negação e a constrição de afeto para diversos propósitos: como proteção contra a vergonha e a culpa, para obscurecer a consciência da perversão do pai e preservar a família intacta. A persistência da negação da criança sobre o abuso sexual previsivelmente complica sua avaliação e tratamento”[54].

 

Nas famílias incestuosas “há confusão referente às fronteiras intergeracionais e há pouco respeito pelo espaço físico, privacidade e pertences dos membros”, observando-se “falta de recato com relação à nudez e toalete, e também deficiências no estabelecimento de limites”, sendo que “as fronteiras rígidas entre a família incestuosa e o mundo externo contrastam de forma aguda com a indistinção de fronteiras entre as gerações dentro da família”[55]. Marceline Gabel afirma que “as fronteiras das gerações não são respeitadas na transgressão que representa uma relação sexual pai-filha”, pois, ao mesmo tempo que a relação coloca o casal pai/filha, mantém, no mesmo nível,  mãe e filha[56].

 

 A negação ou síndrome do segredo envolve todo o desenrolar do processo de abuso sexual intrafamiliar, tanto nas etapas em que o fato ainda não foi identificado, e que pode durar vários anos, acompanhado de freqüentes ameaças; como nas etapas que se desenvolvem junto ao sistema de saúde ou de Justiça, cabendo referir que, “sobreviver ao abuso sexual da criança como pessoa intacta pode ser tão difícil para o profissional como é para a criança e para os membros da família”[57].

 

Envolver a mãe no processo de revelação, assim como os irmãos da vítima, são providências necessárias, exigindo que cada caso seja avaliado para se buscar a melhor forma de trabalhar com o grupo familiar. O índice de admissão da prática do abuso por parte dos abusadores aumenta na medida em que “a intervenção é bem preparada pela rede profissional, existem mais fatos disponíveis e a pessoa que confronta o suposto abusador é bem apoiada pela rede profissional e pelos fatos da evidencia perante ele”[58].

 

A falta de compreensão e entendimento do abuso sexual intrafamiliar, verificado, com freqüência, tanto nas agencias de saúde, como no sistema de Justiça, pode gerar intervenções inadequadas, com sensíveis prejuízos especialmente à criança. A nomeação do abuso sexual da criança “cria o abuso como um fato para a família”, podendo “refletir-se na rede profissional e no nosso próprio pânico e crise profissionais, quando intervimos cegamente em um processo que muitas vezes não compreendemos”[59].

 

Além da negação, por parte dos envolvidos no abuso sexual da criança, no âmbito intrafamiliar, que permite que a violência seja mantida em segredo por longos anos, escapando, por vezes, inclusive, da percepção do sistema de Justiça, encontramos também, de um modo geral, um evidente despreparo dos profissionais que compõem o sistema de Justiça para intervir de modo adequado nos casos que uma suspeita é levantada. Entre os aspectos que apontam o despreparo dos profissionais que integram o sistema de Justiça podemos citar a inabilidade para a oitiva da vítima criança. Sabe-se que

 

ouvir uma criança não é o mesmo que ouvir um adulto, principalmente uma criança abusada sexualmente é preciso preparo técnico-emocional e, ainda, muita sensibilidade, até mesmo para entender que não podemos ficar nos lugares em que, normalmente, estamos, no sentido mais amplo, e permanecer ao lado da criança de modo a não deixá-la ainda mais oprimida e humilhada[60].

 

É preciso, pois, que os integrantes do sistema de Justiça tenham consciência de que “o processo de renovado segredo e a recaída na negação psicológica secundária são parte de um processo terapêutico no abuso sexual da criança como síndrome de segredo e de adição, que tem como núcleo terapêutico a transição da negação e do segredo para a realidade, privacidade e responsabilidade”[61], o que poderá evitar a tomada de decisões que venham de encontro ao melhor interesse da criança. Indiscutivelmente, os profissionais do Direito “necessitam de conhecimentos específicos sobre a dinâmica do abuso sexual infantil, sobre a estrutura familiar, no caso de o abuso ser intrafamiliar, e noções sobre conceitos básicos de psicologia para melhor inquirir a criança”[62]. Igualmente, “é de crucial importância comunicar-se no nível real de desenvolvimento cognitivo, intelectual, psicossocial e psicossexual da criança”[63], pois, caso contrário, nossa intervenção se distanciará da realidade, diminuindo as possibilidades de proteção para a vítima.

 

 

V. Alternativas à proteção da criança

 

Para que as Instituições possam se adequar às normas constitucionais que elegeram a criança como prioridade absoluta, é necessário investir em novos recursos. Entre as formas de violência praticadas contra a criança, a violência sexual intrafamiliar é a que apresenta maior dificuldade de manejo. Há que se investir em novos recursos como, por exemplo, a constituição de equipes interdisciplinares nas Instituições de Saúde, Proteção e Justiça. Investimentos contínuos na capacitação dos profissionais que atuam nas diferentes esferas, bem como dos estudantes, em especial nos cursos de Direito, Enfermagem, Serviço Social, Psicologia e Medicina. Também não podemos esquecer o abusador, havendo que se desenvolver programas destinados a esta população, em especial aos que cumprem pena privativa de liberdade.

 

Nos feitos judiciais, seja na esfera cível como criminal, é preciso assegurar à criança a proteção integral, evitando buscar a prova da materialidade nos crimes que envolvem violência sexual intrafamiliar através do depoimento da criança.

 

É momento de pensarmos em mecanismos de considerar o dano psíquico causado na vítima criança como prova da materialidade em crimes que envolvem violência sexual. Sabemos que raramente é possível apurar os danos físicos, sem que com isto o crime não tenha acontecido. As marcas mais importantes, segundo apontam os especialistas, se situam na esfera psíquica das pequenas vítimas, cujas seqüelas podem se estender por toda a vida, com reflexos no desenvolvimento social, cognitivo e psíquico da criança.

 

 

CONCLUSÃO

 

O desconhecimento, por parte dos profissionais integrantes do sistema de Justiça, do funcionamento das famílias em que está presente o abuso sexual da criança, assim com a ausência da utilização dos instrumentos jurídicos por um ângulo clínico (especialmente o conteúdo das perícias psiquiátricas dos pais e das vítimas; falta de exploração do trabalho terapêutico voltado para os pais que se encontram no sistema carcerário), contribuem para a pouca eficácia da intervenção do sistema de Justiça na vida das pequenas vítimas.

 

A efetiva proteção da criança vítima de violência sexual intrafamiliar pressupõe investimentos em novas alternativas, pois, caso contrário, estaremos repetindo práticas que não mais se coadunam com as regras constitucionais.

    

É preciso que os profissionais, integrantes ou não do sistema de Justiça, tenham a consciência de que, invariavelmente, cometerão erros e desacertos ao lidarem com o abuso sexual da criança, principalmente em decorrência da complexidade que o tema se reveste, devendo a constatação ser colocada a serviço da reflexão, da avaliação e da busca de melhores condições para o desempenho de suas funções. Em bom momento, o sistema de Justiça começa a perceber a relevância do seu papel, tanto no campo da pesquisa a serviço da prevenção social, como do campo terapêutico-clínico, desenvolvendo, cada vez mais, a compreensão de que o trabalho realizado sob o manto da interdisciplinariedade pode proporcionar maior proteção à criança.

 

  

 

 

 

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Disponível em : < http://scholar.google.com/scholar?hl=pt-BR&lr=&q=cache:3WLtVSoJYC0J:www.tj.rs.gov.br/institu/c_estudos/doutrina/Violencia_Sexual_Intrafamiliar.doc+eca+artigo > / Acesso em : 26 out. 2006



[1] Minicurrículo: Procuradora de Justiça do Ministério Público do Rio Grande do Sul, com atuação na 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça. Especialista em Violência Doméstica pela USP, Mestre em Direito pela UNISINOS, Palestrante na Escola Superior do Ministério Público e professora de Direito Civil na Faculdade de Direito da PUCRS. Tem vários artigos publicados nas áreas da infância e família, tendo lançado, recentemente, a obra intitulada VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR: É POSSÍVEL PROTEGER A CRIANÇA? É organizadora e uma das autoras do livro INFÂNCIA EM FAMÍLIA: UM COMPROMISSO DE TODOS, publicado pelo IBDFAM. É sócia do Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul (IARGS), da Sociedade Riograndense de Bioética (SORBI), sócia e membro da diretoria do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e Associação Brasileira das Mulheres da Carreira Jurídica (ABMCJ). É voluntária no Programa de Proteção à Criança e Centro de Atendimento Psicossocial – CAPS do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).

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[2] ANDRADE, Anderson Pereira de. A Convenção sobre os Direitos da criança em seu décimo aniversário: avanços, efetividade e desafios. Revista Igualdade, Curitiba: Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Infância e Juventude do Ministério Público do Paraná, v. 8, n. 28, jul./set. 2000, p. 2.

[3] CARVALHO, Rose Mary de. Comentários ao art. 136 do ECA. In: CURY, Munir (coord.); AMARAL E SILVA, Antônio Fernando (coord.); GARCÍA MENDEZ, Emílio (coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: comentários jurídicos e sociais. 1.ed. São Paulo: Malheiros, 1992, p. 419/420.

[4] KRISTENSEN, Chistian Haag; OLIVEIRA, Margrit Sauer; FLORES, Renato Zamora. Violência contra crianças e adolescentes na Grande Porto Alegre. In: ______ et. al. Violência Doméstica. Porto Alegre: Fundação Maurício Sirotsky - AMENCAR, 1998, p. 115.

[5] Idem, p. 73.

[6] GUERRA, Viviane Nogueira de Azevedo. Violência de Pais contra Filhos: a tragédia revisitada. 3.ed. São Paulo: Cortez, 1998, p. 32/33.

[7] KEMPE, Ruth S.; KEMPE C. Henry. Ninõs maltratados. 4.ed. Madrid: Ediciones Morata, S. L., 1996, p. 26/27.

[8] BRAUM, Suzana. A violência sexual infantil na família: do silêncio à revelação do segredo. Porto Alegre: AGE, 2002, p. 16.

[9] GUERRA, Viviane Nogueira de Azevedo. Op. cit., p. 31.

[10] Idem, p. 33.

[11] KEMPE, Ruth S.; KEMPE, C. Henry. Op. cit., p. 84.

[12] ZAVASCHI, Maria Lucrecia Scherer et. al. Abuso sexual em crianças: uma revisão. Jornal de Pediatria, v. 67 (3/4), 1991, p. 131.

[13] MEES, Lúcia Alves. Abuso Sexual, trauma infantil e fantasias femininas. Porto Alegre: Artes e Ofício, 2001, p. 18.

[14] ALBERTON, Marisa Silveira. Op. cit., p. 26.

[15] CÉLIA, Salvador. Maltrato e negligência: intervenção a nível preventivo. In: LIPPI, J. R. Abuso e negligência na infância: prevenção e direitos. Rio de Janeiro: Científica Nacional, 1990, p. 43.

[16] REICHENHEIM, Michael E.; HASSELMANN, Maria Helena; MORAIS, Claudia Leite. Conseqüências da violência familiar na saúde da criança e do adolescente: contribuições para a elaboração de proposta de ação. Ciência e Saúde Coletiva, 4 (1), 1999, p. 110.

[17] SCHREIBER, Elisabeth. Os Direitos Fundamentais da Criança na Violência Intrafamiliar. Porto Alegre: Ricardo Lenz, 2001, p. 137.

[18] CURY, Munir (coord.); AMARAL E SILVA, Antônio Fernando (coord.); GARCÍA MENDEZ, Emílio (coord.). Op. cit., p. 38.

[19] SCHREIBER, Elisabeth. Op. cit., p. 80.

[20] FONSECA, Antônio Cezar Lima da. A ação de destituição do pátrio poder. Revista Igualdade, Curitiba: Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Infância e Juventude do Ministério Público do Paraná, v. 8, n. 29, out./dez. 2000, p. 10.

[21] AREND, Hannah. A condição humana. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 17.

[22] CURY, Munir; GARRIDO DE PAULA, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da Criança e do Adolescente Anotado. 3.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 238.

[23] VASCONCELLOS, Amélia Thereza de Moura. A relação família, escola, comunidade. In: FICHTNER, Nilo (org.). Transtornos mentais da infância e da adolescência, um enfoque desenvolvimental. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997, p. 60.

[24] ZAVASCHI, Maria Lucrecia Scherer; COSTA, Flávia; BRUNSTEIN, Carla. O bebê e os pais. In: EIZIRIK, Cláudio Laks; KAPCZINSKI, Flávio; BASSOLS, Ana Margareth Siqueira. O ciclo da vida humana: uma perspectiva psicodinâmica. Porto Alegre: Artes Médicas, 2001, p. 43.

[25] BRANCHER, Leoberto Narciso. Maus-tratos na infância, implicações jurídicas do atendimento da vítima. Revista Jurídica da Associação dos Defensores Públicos do Estado do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, v. 1, n. 1, 1997, p. 69.

[26] VIEIRA, Francisco Xavier Medeiros; CURY, Munir (coord.); AMARAL E SILVA, Antônio Fernando (coord.); MENDEZ, Emílio García (coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: comentários jurídicos e sociais. 1.ed. São Paulo: Malheiros, 1992, p. 403.

[27] BRANCHER, Leoberto Narciso. Op. cit., p. 71.

[28] DIGIÁCOMO, Murillo José. O Conselho Tutelar e a Medida de Abrigamento. Revista Igualdade, Curitiba: Centro Operacional das Promotorias da Infância e Juventude do Ministério Público do Paraná, v. 8, n. 27, abril/jun. 2000, p. 7/8.

[29] KAPLAN, Sandra J. Abuso Físico e Negligência. In: LEWIS, Melvin (org.). Tratado de psiquiatria da infância e adolescência. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995, p. 1.029.

[30] GOLDENBERG, Gita W. Violência Doméstica contra Crianças e Adolescentes. Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, n. 2, 1994, p. 191.

[31] ZAVASCHI, Maria Lucrecia Scherer; TETELBOM, Miriam; GAZAL, Christina Hallal; SHANSIS, Flávio Milman. Abuso sexual na infância: um desafio terapêutico. Revista de Psiquiatria, Porto Alegre, n. 13, set./dez. 1991, p. 139.

[32] FURNISS, Tilman. Abuso Sexual da Criança: uma abordagem multidisciplinar, manejo, terapia e intervenção legal integrados. Traduzido por Maria Adriana Veríssimo Veronese. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993, p. 286.

[33] Idem, p. 225.

[34] GUERRA, Viviane Nogueira de Azevedo. Op. cit., p. 32.

[35] FURNISS, Tilman. Op. cit., p. 13.

[36] Idem. Ibidem.

[37] KEMPE, Ruth S.; KEMPE, C. Henry. Op. cit., p. 32.

[38] GUERRA, Viviane Nogueira de Azevedo. Op. cit., p. 32.

[39] FURNISS, Tilman. Op. cit., p. 29.

[40] FURNISS, Tilman. Op. cit., p. 31.

[41] GREEN, Arthur H. Abuso sexual infantil e incesto. In: LEWIS, Melvin (org.). Tratado de psiquiatria da infância e adolescência. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995, p. 1. 033.

[42] DOBKE, Veleda.  Abuso Sexual: a inquirição das crianças, uma abordagem interdisciplinar. Porto Alegre: Ricardo Lenz, 2001, p. 34/35.

[43] OLIVEIRA, Suzana Braum Antunes. O segredo nas famílias incestogênicas: do silêncio ao rompimento. In: ELSEN, Ingrid (org.). Livro Programa, Livro Resumo do Congresso Internacional Família e Violência. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 1999, p. 261.

[44] DOBKE, Veleda. Op. cit., p. 36.

[45] FURNISS, Tilman. Op. cit., p. 18.

[46] DOBKE, Veleda. Op. cit., p. 36.

[47] Idem. Ibidem.

[48] FURNISS, Tilman. Op. cit., p. 14.

[49] Idem, p. 198.

[50] OLIVEIRA, Suzana Braun Antunes de; PINHEIRO, Lucilene de Souza. Mitos e Fatos Acerca da Vitimização Sexual contra Crianças e Adolescentes. In: ELSEN, Ingrid (org.). Livro Programa, Livro Resumo do Congresso Internacional Família e Violência. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 1999, p. 229. 

[51] ZAVASCHI, Maria Lucrecia Scherer et. al. Op. cit., p. 131.

[52] ZAVASCHI, Maria Lucrecia Scherer et. al. Op. cit., p. 131.

[53] Idem. Ibidem..

[54] GREEN, Arthur H. Op. cit., p. 1.033.

[55] Idem. Ibidem.

[56] GABEL, Marceline (org.). Crianças vítimas de abuso sexual. Traduzido por Sonia Goldfeder. São Paulo: Summus, 1997, p. 176.

[57] FURNISS, Tilman. Op. cit., p. 1.

[58] Idem, p. 200.

[59] FURNISS, Tilman. Op. cit., p. 200.

[60] DOBKE, Veleda. Op. cit., p. 96.

[61] Idem, p. 290.

[62] Idem, p. 96.

[63] FURNISS, Tilman. Op. cit., p. 197.